Pesquisar este blog

23 maio 2011

JOÃO 14.15-21

15– Se me amais, guardareis os meus mandamentos.
16 – E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco,
17 – o Espírito da verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê, nem o conhece; vós o conheceis, porque ele habita convosco e estará em vós.
18 – Não vos deixarei órfãos, voltarei para vós outros.
19 – Ainda por um pouco, e o mundo não me verá mais; vós, porém, me vereis; porque eu vivo, vós também vivereis.
20 – Naquele dia, vós conhecereis que eu estou em meu Pai, e vós, em mim, e eu, em vós.
21 – Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama; e aquele que me ama será amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele.

15 Orar de forma a ser atendido pressupõe que nossa vida e serviço tenham a orientação correta. ―Se me amais, guardareis os meus mandamentos.‖ Com essa afirmação Jesus não torna a submeter seus discípulos à ―lei‖. A ―lei de Cristo‖ (Gl 6.2) é algo diferente que a ―lei do Sinai‖. Por essa razão Paulo pode ser livre da lei e apesar disso estar na ―lei de Cristo‖ (1Co 9.21). Jesus situa-se acima de seus discípulos como o ―Senhor‖, que lhes mostra sua vontade em ―mandamentos‖ ou ―incumbências‖. Esses seus ―mandamentos‖ precisam ser ―preservados‖, observados, cumpridos. Mas é um Senhor amado a quem eles servem, um Senhor que os salvou da perdição por meio de sua própria morte e lhes concede vida eterna. Do amor agradecido a ele ―guardar os seus mandamentos‖ torna-se seu anseio mais próprio. Notemos o fato de que Jesus não está falando na forma imperativa, e sim na simples forma afirmativa: ―Guardareis os meus mandamentos.‖ Vós o fareis, ―se me amais‖. Jesus falará sobre isso outra vez com seus discípulos em Jo 15.9-12. Agora, porém, podemos considerar que os ―mandamentos‖ de Jesus representam o único ―novo mandamento‖ do amor mútuo, que é cumprido com base no amor de Jesus aos discípulos e no amor dos discípulos a Jesus (Jo 13.34).
16 A promessa subseqüente evidencia imediatamente que em seu serviço a Jesus os discípulos já não se encontram sob a lei, mas sim, que obtêm uma existência completamente nova. ―E eu da minha parte rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Advogado, a fim de que esteja convosco eternamente.‖ De acordo com a maioria das traduções conhecemos e amamos na presente frase, bem como mais adiante nos discurso de despedida, a designação do Espírito Santo como o ―Consolador‖. Sem dúvida o Espírito também exerce o ministério da consolação. Contudo, na vida cristã, e muito menos no serviço dos discípulos, não se trata primordialmente de ―consolo‖. Os discípulos no ―mundo‖ lá fora precisam de um ―Advogado‖, ou seja, aquele que assume a causa deles, que os defende, conduz e protege. Até então Jesus foi esse ―Advogado‖ deles. Porém, sendo Jesus um ser humano, esse Advogado somente podia estar por breve tempo entre eles. O ―outro Advogado‖, que o Pai dará a pedido do Filho, está eternamente com os discípulos.
Ele na verdade não é o ―Advogado‖ dos discípulos perante Deus! Ali eles não carecem de ―outro Advogado‖. Ali o próprio Jesus, o Cordeiro de Deus, que carregou o nosso pecado é e continua sendo o único Defensor plenamente suficiente. É o que declara o próprio João em 1Jo 2.1; e Paulo, em Rm 8.34; Hb 4.14-16.
17 O ―Advogado‖ que Jesus promete a seus discípulos para sua caminhada é o ―Espírito da verdade‖. O discípulo e mensageiro de Jesus não precisa de mais nada em seu serviço e em sua luta no ―mundo‖. Ele não há de ser poupado do caminho do sofrimento, sim, da morte. Não é preciso que o Espírito confira ao discípulo artes especiais de retórica e discussão. Contudo todo mensageiro de Jesus tem de ser capaz de afirmar com Paulo: ―Recomendamo-nos à consciência de todo homem, na presença de Deus, pela manifestação da verdade‖ (2Co 4.2). Uma ―manifestação da verdade‖ dessas, que possui o poder de atingir a consciência das pessoas, não está em nosso próprio poder. Unicamente o Espírito pode abrir caminho até a verdade com tanta eficácia, motivo pelo qual ele é chamado de ―o Espírito da verdade‖. Está em jogo aquela ―verdade‖ essencial, que o ser humano nem sequer é capaz de conhecer por natureza. É somente o Espírito que ―convence‖ dela o mundo (Jo 16.8ss).
Obviamente isso não significa que o mundo todo será alcançado e convencido interiormente pelo Espírito de Deus. Justamente por ser o ―Espírito da verdade‖, o Espírito Santo não pode agir mecanicamente e transformar o mundo sem a vontade dele. O mundo, enquanto e na medida em que for ―mundo‖, ―não pode recebê-lo, porque não o vê, nem o reconhece‖. É bem verdade que o mundo experimenta o agir do Espírito em pessoas. Mas ele vê nisso somente ―processos psíquicos‖, que ele rejeita como tolice ou fanatismo. Em decorrência, fecha-se contra o Espírito de Deus e não o pode ―receber‖. E apesar disso, o Espírito de Deus supera sempre de novo também pessoas renitentes e escarnecedoras de tal maneira que elas o ―reconheçam‖ e aceitem. No instante em que isso acontece essas pessoas deixam de ser ―mundo‖. De ―mundo‖ são transformadas em ―igreja‖, tornam-se ―discípulas‖, para as quais vale: ―Vós o reconheceis, porque ele habita convosco e estará em vós.‖ Sempre captamos o acontecimento no Espírito Santo apenas de tal forma que vemos simultaneamente: só quem acolhe o Espírito e o traz dentro de si é capaz de reconhecê-lo, e somente quem o vê e reconhece pode e há de recebê-lo. Em termos lógicos isso é uma contradição. Mas a realidade viva apenas pode ser descrita desse modo contraditório.
18 Novamente Jesus nos confronta com um mistério. Ele falou de um ―Advogado‖, o Espírito, que na verdade parece ser inicialmente um ―substituto‖ para Jesus. Mas na seqüência Jesus mostra logo que não é essa a intenção. Como um ―substituto‖ desses poderia consolar os discípulos, depois que Jesus lhes declarou em todas as suas poderosas palavras ―Eu sou‖ que justamente ele em pessoa ―é‖ tudo aquilo pelo que anseiam? Não, eles precisam dele, do próprio Jesus. Por isso ele lhes promete: ―Não vos deixarei órfãos, voltarei para vós.‖ Jesus não lhes assegura o que esperaríamos depois de tudo o que foi dito: eu não vos deixarei órfãos, pois o Espírito vem a vós. Não, é a ele pessoalmente que terão outra vez. Então, ―o outro Advogado‖ não se torna desnecessário? Não, porque Jesus retorna não mais como pessoa entre pessoas, mas no Espírito Santo. Ele ―vem‖ numa forma completamente nova de existência, da qual Paulo escreverá mais tarde: ―O Senhor é o Espírito‖ (2Co 3.17). O Espírito de Deus não pode ser separado nem do Pai nem do Filho. Unicamente dessa maneira torna-se viável essa imbricação íntima e viva, da qual falará agora o v. 20:
20 ―Naquele dia, vós conhecereis que eu estou em meu Pai, e vós, em mim, e eu, em vós.‖ Outra vez fica claro que o relacionamento dos discípulos com Jesus corresponde exatamente ao relacionamento de Jesus com o Pai e constitui o efeito e praticamente é a ―continuação‖ desse relacionamento divino. O incompreensível ―Eu no Pai e o Pai em mim‖, que ainda assim deixa existindo o Pai e o Filho como ―pessoas‖ independentes, vivas, torna-se para os discípulos um fato igualmente incompreensível e não obstante permanentemente vivenciado em seu relacionamento com o Senhor: ―Vós em mim, e eu em vós.‖ Não acontece nenhuma fusão entre o Senhor e seus discípulos. Jesus continua sendo o ―Senhor‖ sobre eles. Eles permanecem pessoas autônomas sob o Senhor, obedecendo a ele e confiando nele. Apesar disso estão ―em Cristo‖, e Cristo está ―neles‖.
19 Quando isso haverá de acontecer? Quando é ―aquele dia‖? Jesus o diz: ―Ainda por um pouco, e o mundo não me verá mais. Vós, porém, me vedes, porque eu vivo e vós também vivereis.‖ Não é à parusia que ele se refere. O v. 3 do capítulo não é repetido. Porque na parusia de Jesus todos o verão, não apenas os discípulos. Agora, porém, se faz uma distinção entre ―mundo‖ e ―discípulos‖. ―Ainda por um pouco, e o mundo não me verá mais.‖ Em vinte e quatro horas Jesus estará na sepultura, afastado dos olhares do mundo, até a parusia. Mas para os discípulos já se tornará realidade em três dias que: ―Vós, porém, me vedes, porque eu vivo.‖ Isso é Páscoa. Nos dias da Páscoa os discípulos viram Jesus como aquele que verdadeiramente ―vive‖ (cap. 20 e 21). Porém, em parte alguma do NT a ressurreição de Jesus é algo que acontece apenas para Jesus e apenas enriquece
a ele. O ―por nós‖ do acontecimento da cruz vale de igual forma para a ressurreição de Jesus. Ela traz a vida não apenas para ele, mas também para nós. Em 1Co 15.12-28 Paulo se esforça para mostrar aos coríntios esse significado abrangente da ressurreição do Senhor. Cumpre-se a promessa de Jesus: ―e vós também vivereis.‖ Com a Páscoa começa para os discípulos aquela ―vida‖ que Jesus já havia prometido reiteradas vezes a todos os que crêem como ―vida eônica‖ (Jo 3.15,16 e depois várias vezes no presente evangelho). Com realidade plena ela é conferida aos discípulos e à igreja de todos os tempos na efusão do Espírito. Pentecostes está inseparavelmente ligado à Páscoa, como se torna visível precisamente no testemunho do evangelho de João. Páscoa e Pentecostes juntos formam ―aquele dia‖, em que os discípulos possuirão essa verdadeira ―vida‖ e esse ―vós em mim, e eu em vós‖ como um fato incontestável. Outra vez fica explícito que o envio do ―outro Advogado‖ e a própria vinda de Jesus aos discípulos representam opostos, mas formam uma unidade coesa.
21 O que Jesus promete aos seus é algo extraordinariamente grandioso. Por essa razão, Jesus tenta protegê-lo contra quaisquer equívocos. Será uma ―experiência mística‖ que aguarda os discípulos? Será que seus discípulos por isso também se igualarão em sua atitude e seu estilo de vida aos ―místicos‖ de todas as religiões? Não devem sê-lo nem o serão! O ―amor‖ que liga o discípulo com seu Senhor não é caracterizado por Jesus como experiências sentimentais, mas como obediência ao mandamento dele. ―Aquele que tem os meus mandamentos e os guarda, esse é o que me ama.‖ Novamente nos encontramos com ―aquele que‖ que confronta com a decisão em liberdade, abrindo o acesso a cada pessoa; cf. Jo 7.37,38; 8.12; 11.25s; 12.25s. Dessa maneira, diferente do v. 20, o foco recai sobre o indivíduo. A promessa do v. 20 agora é assegurada expressamente a cada discípulo, quando cumpre a condição de um amor obediente. Esse indivíduo será muito pessoalmente ―amado por meu Pai, e eu também o amarei e me manifestarei a ele‖. Por mais que Jesus esteja empenhado na fraternidade entre os seus, por mais que justamente seu amor recíproco se torne testemunho para o mundo (Jo 13.35), cada discípulo em separado pode esperar para si mesmo uma vida plena e realizada no amor do Pai e no amor de seu Senhor. Jesus promete ―manifestar-se‖ com seu amor a esses discípulos. Será que com isso ele assegura a esse discípulo novas ―revelações‖, que ultrapassam aquilo que está sendo revelado a todos nós no evangelho? O termo aqui empregado denota que Jesus não quer dizer isso. Contudo Jesus entrará na vida do discípulo e se tornará tão eficaz nela que o discípulo virá a conhecê-lo de forma cada vez mais profunda. Experimentar o amor de Jesus e ser presenteado com sempre novas atualizações e auto-revelações do Senhor faz parte da ―vida cristã normal‖. Contudo, ele está vinculado à condição prévia de que o discípulo de Jesus ―tenha meus mandamento e os guarda‖.

16 maio 2011

1 PEDRO 2.4-10

Quinto Domingo de Páscoa
9 de maio de 1993
I Pedro 2.4-10
1. Leituras do dia
O Sl 146 convida a louvar o Senhor (1-2), porque Ele age em favor dos necessita- dos e dos que Nele confiam (5-9), como nenhum homem pode fazer (3-4). Em At 17.1-15 vemos Paulo e seus companheiros em dificuldades na proclamação evangéli- ca entre os gentios. Aqui, pela objeção dos judeus. Jo 14.1-12: Diante da incerteza e incompreensão dos discípulos sobre o futuro, Jesus lhes fala para que creiam (v.1), porque Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida (v.6). Esta permanência de fé em Cristo e a observância de seus mandamentos confere poder (vv.12,13).
2. Contexto
A grande temática de I Pedro é a salvação e a conduta dos crentes. I Pe 2.4-10 está inserido no contexto do novo "status" dos cristãos e suas conse- qüências. Em particular, I Pe 2.4-10 é uma exortação ao avanço ou cresci- mento do cristão na sua salvação, sobre o fundamento que é Cristo.
3. Texto
V.4 - "Chegando..." (proserchomenoi). O particípio indica continuidade. O crente deve continuar a achegar-se a Ele. A idéia de aproximar-se, neste sentido, é freqüente no NT: Hb 4.16: "Acheguemo-nos... ao trono da graça", Hb 7.25: "Os que por Ele chegam a Deus, Ef 2.18: "... por ele temos acesso ao Pai". O caminho está livre, pois houve reconciliação (Rm 5.1-2), pelo sacrifício de Cristo (Is 53). A "pedra que vive" (li- thos zonta) é o Cristo Ressurreto. Deus escolheu, elegeu (eklekton) esta pedra, que é Cristo, para a obra redentora, mas homens o rejeitaram (apodedokimasmenon). Homens não acreditaram e admitiram que Jesus fosse tão importante. Esta situação é prenunciada em Is 53.
V.5 - "Edificados" (oikodomeisthe). O passivo indica que não são os cristãos propriamente que edificam, mas o Senhor. A edificação dá-se pela aproximação à “pedra viva", Ef 2.20-22: somos edificados sobre Cristo, Ef 4.12: busca-se o aperfeiçoamento dos santos para a edificação do corpo de Cristo. Assim resulta a "casa espiritual" (oikos pneumaticos), que é uma metáfora para Igreja. Em coordenação a "casa espiritual" está "sacerdócio santo". A concepção de "sacrifícios espirituais (pneumaticas thisias) é comum na LXX, especialmente ao referir os holocaustos. Em Rm 12.1, a menção do sacrifício sugere não entrar no esquema do mundo, mas deixar a mente ser renovada e transformada por Deus. Em Hb 13.15 fala-se de sacrifício de louvor. Em 2 Tm 4.6 é o próprio apóstolo (sua vida) um oferecimento de sacrifício. Fp 2.17 e 4.18 fala da dedicação em amor como sacrifício. Todos estes sacrifícios têm sua validade em Cristo - o Grande Sacerdote (Hb 4.14-16, 5.1-10 e 7.20-28).
Vv 6-8 - Nestes versículos se reitera as afirmações acima com passagens da Escritura, que mostram os dois posicionamentos diante de Cristo. No v.6 cita-se Is 28.16, retratando o significado salvífico de Cristo para os crentes. No v. 7 cita-se Sl 118.22 e Is 8.14 onde Cristo é apontado como motivo de tropeço para os "descrentes" (apistu sin). O "tropeço" (skandalou) se efetiva na desobediência à pregação do Evangelho.
Vv 9-10 - Aqui aplica-se uma série de títulos de honra e compromisso da comunidade de crentes, tirados de Ex 19.6 e Is 43.20-21. Indica também uma designação es- catológica da comunidade cristã. "Geração eleita" (genos eklekton) - os cristãos são uma nova raça, diferente dos judeus e dos gentios. É o novo povo que assume os privilégios que pertenciam ao povo judeu. Todo povo de Deus (Igreja) é uma geração escolhida. E o resultado da eleição de Deus é uma "nação santa" (ethnos hagion) e um “povo de propriedade exclusiva" (laos eis peripoiesin).
O "sacerdócio real" (basileion ierateuma). É real porque serve ao Rei da Terra, em prol da basileia - reino de Deus. O sacerdócio e a honra do serviço a Deus que significa, no AT, poder aproximar-se ao altar para oferecer sacrifícios e ser mediador entre Deus e o povo. No NT o sacerdócio há de proclamar as virtudes de Deus. O "proclamar" (exangello) indica mais do que simplesmente anunciar, assume um caráter de demonstrar com a vivência. As "virtudes" (aretas) é a manifestação do poder divino, acima de tudo os maravilhosos feitos de Deus em Cristo
O v.10 finaliza, apresentando a grandeza da dádiva de Deus que nos fez povo e nos concedeu misericórdia, tirando-nos das "trevas (skotos) que denota ignorância espiritual ou mesmo perdição, trazendo-nos para a "luz" (fôs), isto é, para a esfera da salvação e da presença de Deus.
4. Dados homiléticos
4.1 - Pensamento central: A justificação pela graça em Cristo faz de todos os crentes sacerdotes reais que oferecem sacrifícios espirituais agradáveis a Deus. 4.2. Tema e partes:
OS CRISTÃOS SÃO SACERDOTES REAIS (v.10)
I - Porque foram edificados casa espiritual em Cristo
lI - Para oferecer sacrifícios espirituais agradáveis e Deus
Ill- Para proclamar as virtudes de Deus
4.3 Objetivo - Motivar a congregação para um cristianismo dinâmico em resposta ao amor de Deus.
Eliseu Teichmann

JOÃO 14.1-14

O PATRIMÔNIO DE FÉ DOS DISCÍPULOS – João 14.1-11
1 – Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim.
2 – Na casa de meu Pai há muitas moradas. Se assim não fora, eu vo-lo teria dito. Pois vou preparar-vos lugar.
3 – E, quando eu for e vos preparar lugar, voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, estejais vós também.
4 – E vós sabeis o caminho para onde eu vou (ou: Sabeis para onde vou e também o caminho).
5 – Disse-lhe Tomé: Senhor, não sabemos para onde vais; como saber o caminho?
6 – Respondeu-lhe Jesus: Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim.
7 – Se vós me tivésseis conhecido, conheceríeis também a meu Pai. Desde agora o conheceis e o tendes visto.
8 – Replicou-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta.
9 – Disse-lhe Jesus: Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? Quem me vê a mim vê o Pai; como dizes tu: Mostra-nos o Pai?
10 – Não crês que eu estou no Pai e que o Pai está em mim? As palavras que eu vos digo não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, faz as suas obras.
11 – Crede-me que estou no Pai, e o Pai, em mim; crede ao menos por causa das mesmas obras.

12 – Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço e outras maiores fará, porque eu vou para junto do Pai.
13 – E tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho.
14 – Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei.

1 Está bem claro que não devemos estabelecer aqui uma cesura, agrupando os cap. 14-16 como ―discursos de despedida‖. O diálogo de preparação com os discípulos tem continuidade imediata. A palavra que Jesus dirige agora a todos os discípulos olha em retrospecto ao que acabara de ser revelado a eles. ―Não se abale o vosso coração!‖ Havia muitas coisas que podiam ―abalar‖ o coração dos discípulos nessa hora. O próprio Jesus, ―abalado no espírito‖, havia falado do traidor no meio deles (Jo 13.21). Acontecimentos sombrios estavam diante deles, que até fariam com que uma pessoa como Pedro negasse a Jesus. E em todos os casos vivia a separação de seu Mestre, que ia para onde não podiam segui-lo. Como seu coração ―não se abalaria‖? Jesus cita imediatamente o único caminho para a superação desse abalo: ―Crede em Deus.‖ Em si mesmos os discípulos não encontram apoio. Tudo o que é visível em torno deles é somente ―arrasador‖. Todas as esperanças que eles tinham renovado por ocasião da entrada em Jerusalém ruíram nesses poucos dias. Nem mesmo seu círculo mais restrito está coeso e firme. Tudo é terrível e escuro em torno deles. No entanto, podem afastar o olhar de tudo que é visível, de si mesmos, em direção a Deus, encontrando nele o aconchego. É verdade que somente agora descobrirão o que vem a ser ―crer em Deus‖, o que como israelitas até então poderia ter-lhes parecido tão óbvio. Hão de vivenciar que: ―A fé começa somente no instante em que houver todas as razões para desistir dela.‖ Acontece que também agora a ―fé em Deus‖ não pode ser separada da ―fé em Jesus‖. Por isso Jesus acrescenta de imediato: ―E crede também em mim.‖ Durante três anos estiveram ouvindo a palavra de Jesus, viram seus feitos, e por fim sua vitória sobre a morte na sepultura de Lázaro. Nisso eles podem se agarrar com confiança, ainda que agora tudo pareça encaminhar-se para a ruína total de sua vida e sua causa.
2 Sem dúvida precisam manter o olhar dirigido para o alvo. Experimentam agora o poder do mundo e seu príncipe. Tudo pode ser perdido, inclusive a própria vida. Vitória terrena, honra e riqueza Jesus não pode nem pensa em lhes prometer. Contudo é firme e gloriosa a ―casa do Pai‖, para a qual ele está indo. Mas não apenas ele, o Filho, que ali está eterna e validamente ―em casa‖ (Jo 8.35!), encontra nela seu lugar. Não, ―na casa de meu Pai há muitas moradas‖, também para eles, seus discípulos. Sem dúvida, continua válido o que Jesus acabou de lhes dizer com tanta seriedade. ―Agora‖ eles não podem seguir a Jesus para lá. Uma longa vida de discípulo está diante deles, com ricos trabalhos, árduas lutas e múltiplos sofrimentos. Apesar disso, no final da longa trajetória encontra-se para eles essa ―casa do Pai‖. Sua ―cidadania nos céus‖ (Fp 3.20) está assegurada. Em função disso podem ser plenamente confiantes e considerar insignificantes os sofrimentos da atualidade em vista da glória vindoura (Rm 8.17). Ainda que ainda pensem angustiados: Certamente Jesus tem lá sua pátria, mas será que nós também teremos lugar nela?, ele pode afiançar-lhes: ―Se assim não fosse, eu vos teria dito que vou preparar-vos lugar.‖ Porém ele não precisa dizê-lo. O próprio Pai ama os discípulos (Jo 16.27) e por isso tem moradas prontas para eles. Em todas essas palavras de Jesus também não devemos pensar unilateralmente no ―céu‖. A metáfora da ―casa‖ se oferece involuntariamente quando se fala do ―Pai‖, e corresponde à metáfora do ―reino‖, quando Deus é visto como ―Soberano‖ e ―Rei‖. João não transladou o rico e poderoso futuro de todo o testemunho bíblico para um mero além celestial. Ele é israelita, não grego e ―platônico‖. Após morrerem fisicamente, com certeza o ―lugar‖ dos discípulos também é a morada celestial, o ―paraíso‖ (2Co 12.4). Mas também hão de encontrar sua ―morada‖ no reino dos mil anos, assim como no juízo final como co-juízes ao lado de seu Senhor (1Co 6.2s) e como servos, trazendo o nome dele na testa, sobre a nova terra (Ap 22.4).
3 Na seqüência voltamos a nos defrontar com aquela peculiaridade do presente evangelho, que a frase seguinte parece afirmar o que acabou de ser negado. Jesus prossegue: ―E, quando eu for e vos preparar lugar.‖ Portanto, será que Jesus realmente providencia apenas por meio de sua ida que os
discípulos encontrem morada na casa do Pai, ao passo que acabou de assegurar que as muitas moradas estão prontas? Contudo, já verificamos que é dessa maneira que é feita justiça à peculiar contradição e multiplicidade da própria realidade. Por mais que seja verdade que já existem muitas moradas, de fato se alcança apenas pelo pa ssamento de Jesus, por todo o seu sofrimento, sua morte e ressurreição que pessoas sobrecarregadas de culpa (também um negador como Pedro!) possam esperar com plena certeza por essas moradas. Cada uma das frases contraditórias defende uma verdade imprescindível.
Entretanto a segunda frase avança mais, fazendo ainda outra promessa além da ―preparação de lugar‖. Porque então ―voltarei e vos receberei para mim mesmo, para que, onde eu estou, estejais vós também.‖ Jesus ainda falará muito do que seguirá à sua cruz e ressurreição, do envio e da atuação do Espírito. Agora seu olhar vai até a última consumação em sua ―volta‖. Essa sua parusia é na verdade o verdadeiro conteúdo de sua promessa, e não a ―preparação do lugar‖ . Agora acontece que Jesus sintetiza numa única expressão sucinta o que depois se tornará cada vez mais claro para sua igreja, sob a direção do Espírito Santo, (Jo 16.13) como um acontecimento longo e multifacetado. Contudo o último alvo para o grupo dos discípulos está claro: ―Para que, onde eu estou, estejais vós também.‖ Jesus há de expor mais uma vez , em seu último diálogo na terra, ao coração do Pai sua vontade de que esse alvo se concretize(Jo 17.24). É sério o ―agora‖ em Jo 13.33,36: Somente ―agora‖ nem Pedro nem os discípulos podem ir com Jesus o caminho para a glória. No entanto, eles não devem ficar para sempre excluídos dele. Onde está Jesus, ali também eles devem estar e hão de estar.
4/6 Esse alvo não precisa ser distante e nebuloso. Porque Jesus pode pressupor: ―E vós sabeis o caminho para onde eu vou (ou: Sabeis para onde vou e também o caminho).‖ Porque agora conhecem o Pai, e também sabem qual o caminho até o Pai. No fundo é disso que se tratava tudo o que Jesus lhes havia mostrado nesses anos. Jesus, porém, terá de constatar que seus discípulos ainda assim não o compreenderam (v. 8,9). No princípio é novamente Tomé que faz uso da palavra cheio de incerteza. ―Disse-lhe Tomé: Senhor, não sabemos para onde vais; como saber o caminho?‖ Já conhecemos o jeito de Tomé de Jo 11.16. Justamente a ele Jesus não responde com explicações e descrições, mas com uma palavra que é capaz de conferir ao que pergunta uma certeza imediata. ―Respondeu-lhe Jesus: Eu mesmo sou o caminho, e a verdade, e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim.‖ Novamente estamos diante de uma afirmação ―Eu sou‖. Novamente Jesus abarca uma coisa grande e essencial de nossas vidas em sua própria pessoa e assim nos dá aquilo que no mais buscamos em vão. Ele ―é‖ pessoalmente o pão da vida e não apenas no-lo dá. Ele ―é‖ a ressurreição e a vida e não apenas as transmite. Isso se torna extraordinariamente importante e límpido quando está em jogo o caminho decisivo, o caminho até Deus, o Pai. Jesus não aponta longe de si para um ―caminho‖ pelo qual agora temos de avançar rumo ao Pai. Então jamais chegaríamos a Deus. É ―através dele‖, passando por ele que encontramos a Deus. Por que isso é assim? Conhecimento sobre Deus, um verdadeiro saber que nos torna responsáveis, existe também independente de Jesus. Contudo esse saber nos leva ao abismo de nosso pecado original, ao qual segue toda a nossa existência pecaminosa no abandono de Deus (Rm 1.21-32. Cf. o comentário na série CE). Como chegaremos ao ―Pai‖ sendo tão ímpios, pecadores, inimigos (Rm 5.5-10)! Unicamente Jesus é ―o caminho‖, porque só ele é ―a propiciação pelos nossos pecados‖ (1Jo 2.2). Em conseqüência, por meio de seu sofrimento, morrer e ressurgir, Jesus nos leva de volta ao Pai e nisso é pessoalmente ―o caminho‖. Por essa razão ele é ao mesmo tempo ―a verdade‖. Ele não ensina ―verdades‖, como fazem muitas religiões e visões de mundo, sobre Deus e sobre nós. Também no presente caso a ―verdade‖ está no singular e com artigo definido, tendo o sentido de ―realidade verdadeira‖. Em Jesus encontramos a realidade do Deus vivo. Por isso somente ele é ―a vida‖, a qual ele não apenas nos mostra ou transmite, mas a qual temos ―nele em pessoa‖ (1Jo 5.12,20). Nessa breve palavra de Jesus o evangelho se mostra a nós com toda a sua peculiaridade e glória.
7 Embora Jesus o tenha dito negativamente: ―Ninguém vem ao Pai senão por mim‖, ele o expressa mais uma vez de forma positiva: ―Se vós me tivésseis conhecido, conheceríeis também a meu Pai. De agora em diante o conheceis e [o] tendes visto.‖ ―De agora em diante‖, diz Jesus, precisamente com vistas ao que acontece ―agora‖ em sua ida para a cruz. É o ―agora‖ que de acordo com a mensagem do NT possui um papel preponderante. ―Agora‖ é tempo oportuno, ―agora‖ é o dia da salvação (2Co 6.2). ―Agora‖ se pode achar o Pai, sim, se pode ―vê-lo‖. Nisso é que consiste a salvação. Israel ―ouviu‖ muito sobre Deus. Apesar disso, persistem tantas coisas incertas. ―Agora‖ vem o cumprimento da palavra profética, o novo tempo, no qual todos, adultos e pequenos, podem
ver ao próprio Deus (Jr 31.34). ―Agora‖ Deus pode ser ―visto‖, porque agora acontece o perdão dos pecados.
8 No entanto, mostra-se nesse instante quão pouco os discípulos entenderam justamente dessa mensagem decisiva. ―Replicou-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta.‖ Filipe ignora que não se pode ―mostrar‖ Deus como um objeto existente, mas que ―encontra‖ o Pai aquele que ―vem‖ ao Pai e vive no Pai. Apesar disso, sua palavra é de uma maturidade considerável, como somente podia ser formada no convívio com Jesus. Que ―nos basta‖ ter o Pai é algo que Filipe viu em Jesus. Jesus ―tinha o bastante‖, porque tinha o Pai. Assim como era com Jesus também deveria ser com ele, Filipe, e com seus colegas discípulos. A isso ele se apega, também nessa hora, em que tantas coisas abalam seu coração. No entanto, ao mesmo tempo sua pergunta revela toda a sua incompreensão. Seria maravilhoso ter uma vida no aconchego de Deus assim como a tinha Jesus. Para isso, porém, precisavam ter a mesma certeza a respeito do Pai como Jesus. Mas era exatamente essa a questão: onde, afinal, está o Pai? Se ao menos agora na despedida Jesus lhes ―mostrasse‖ o Pai, com toda a clareza e certeza! Então ficariam bem. Isso lhes bastaria. É a última pergunta, o último anseio de toda a humanidade que irrompe na palavra de Filipe. Tudo poderia ser suportado, tudo poderia ser superado se apenas pudéssemos ver ―o Pai‖.
9 Jesus apenas pode responder de tal forma a revelar o equívoco de Filipe, que nesse ponto decisivo parece ter estado em vão durante todos esses anos junto de Jesus. ―Disse-lhe Jesus: Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? Quem viu a mim viu o Pai. Como dizes tu: Mostra-nos o Pai?‖ O Pai não pode ser ―mostrado‖ de uma maneira qualquer na natureza e na história. Deus não pode ser enquadrado e assegurado, para a nossa tranqüilidade, por meio de uma ―prova‖ qualquer. Mas o que Filipe pede, o que a humanidade busca, isso já foi concedido. O Deus invisível, eterno, o Pai, pode ser ―visto‖. Ele está diretamente presente. Por isso é desnecessário, sim, leva ao descaminho total pedir ―mostra-nos o Pai‖. Onde, porém, Deus pode ser achado? Pois bem, exatamente onde também se pode encontrar o pão da vida , a água viva, e a ressurreição e a vida. Dessa vez Jesus não pode dizê-lo por meio de um ―Eu sou‖. Contudo sua afirmação plenamente elucidativa corresponde, na substância, a suas palavras ―Eu sou‖: ―Quem viu a mim viu o Pai.‖
Já na vida da Antiga Aliança ver a Deus representava o anseio máximo, cf. Êx 33.18. As religiões de mistérios prometiam uma visão de Deus, também nas cidades da Ásia Menor a cujas igrejas João escreveu primordialmente seu livro. Contudo essas religiões iludem e não confrontam o ser humano com o Deus verdadeiro. Mas a igreja pode saber que ela possui a ―visão de Deus‖ quando olha para Jesus. É por isso que aqui, e unicamente aqui, alcança o sossego o último anseio da humanidade. Simultaneamente, porém, a palavra de Jesus nos mostra também o que é que temos de ver em Jesus. Não se trata de ver Jesus como uma personalidade grande e interessante, nem como um filho ilustre de Israel, tampouco como o exemplo inatingível da fé e do amor. Com tudo isso Jesus não nos ajudaria de verdade. Porém o milagre da existência cristã é que na pessoa de Jesus ―vemos‖ o próprio Deus. Foi por isso que justamente o Tomé que duvidou após a Páscoa deu expressão à simples e não obstante admirável fé cristã, quando se prostrou diante de Jesus com a exclamação: ―Meu Senhor e meu Deus!‖ (Jo 20.28).
10 Jesus prossegue de forma significativa: ―Não crês que eu estou no Pai e que o Pai está em mim?‖ Está dito aqui da forma mais sintética, e justamente por isso com toda a magnitude, o que Jesus ―é‖ na essência, antes de todas as dádivas e ajudas em particular. Jesus está ―no Pai‖, e o Pai ―está em Jesus‖. Tão essencial é o sentido da filiação divina de Jesus. Não é apenas uma maneira figurada de chamar Jesus de ―Filho de Deus‖, por ter sido um ser humano que viveu numa concordância especial com a vontade de Deus. Não, Jesus é ―o Filho‖ pelo fato de que possui todo seu ser no Pai e que a presença do Pai em Jesus é plenamente real. Apenas assim Jesus de fato pôde viver em concordância total com a vontade de Deus. E precisamente por isso Jesus é o único Revelador de Deus. O que nos foi dito no início do evangelho em Jo 1.18, torna-se explícito agora com toda a magnitude. Jesus não apenas ―anuncia‖ Deus como aquele que conhece a Deus de forma extraordinária. Pelo contrário, sendo pessoa Jesus é ao mesmo tempo a existência de Deus entre nós.
Essa palavra chama a atenção, pois ela interroga Felipe por sua ―fé‖. Jesus, afinal, acabara de afiançar que quem o havia visto, teria ―visto‖ o Pai. E esse ―ver‖ de Deus em Jesus tornou-se importante para nós. Será que não corresponde necessariamente ao ―ser‖ do Pai em Jesus? Será que novamente somos remetidos à mera aceitação de afirmações arrojadas, as quais temos de ―crer‖, sem
poder ―ver‖? Afinal, também no final do evangelho são proclamados como bem-aventurados ―os que não viram e apesar disso creram‖ (Jo 20.29).
Diversas vezes já constatamos que essas ―contradições‖ em nosso evangelho servem praticamente para que fique explícita a realidade completa em toda a sua profusão de tensões. Filipe deveria e poderia ter ―visto‖ em Jesus o Pai. Há uma repreensão na palavra de Jesus: ―Tanto tempo estou junto de vocês, e não me reconheceste, Filipe?‖ No entanto, ao mesmo tempo fica claro que Jesus não podia ter em mente um ―ver‖ que mesmo contra a nossa vontade nos convencesse daquilo que vimos. Tampouco se trata de ―vê-lo como ele é‖, o que está reservado à consumação vindoura (1Jo 3.2; 1Co 13.12). ―Ver‖ o Pai em Jesus constitui um presente, que apenas é concedido pela ―fé‖. Por isso Filipe é indagado agora por sua fé: ―Não crês…?‖ Não obstante, permanece válida a palavra de ―ter visto‖ o Pai. A ―fé‖, por sua vez, não é mero aceitar de concepções e doutrinas com base numa autoridade formal qualquer. Quem olha com fé para Jesus é persuadido intimamente da realidade da existência de Jesus no Pai e da presença do Pai em Jesus. É capaz de confessar com plena convicção com os apóstolos: ―Vimos a sua glória‖ (Jo 1.14).
Jesus não faz nenhuma tentativa de explicar ou justificar com mais detalhes o seu testemunho. O que ele expôs diante de seus discípulos constitui um mistério insolúvel. Mas, de modo simples, esse mistério torna-se concreto e essencial para a vida dos discípulos. Jesus aponta mais uma vez às suas palavras. Será que são formulações de seu próprio pensamento? Nesse caso, a princípio não estão acima das palavras de outras pessoas ilustres, que elaboraram pensamentos sobre Deus. Porém no caso de Jesus a situação é diferente. ―As palavras que eu vos digo não as digo por mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, faz as suas obras.‖ O Pai ―permanece nele‖. Deus não confia a Jesus palavras isoladas. Jesus não é ―profeta‖, capaz de atestar vez ou outra o que Deus diz. ―Permanentemente‖ o Pai está no Filho. Por isso, a palavra de Jesus é a palavra eficaz de Deus. Quando Jesus fala ―o Pai faz as suas obras‖, evidenciando assim que ele ―está em Jesus‖. Já nos deparamos diversas vezes com essas palavras plenipotenciárias, nas quais aconteceram os feitos de Deus. Na ―palavra‖ de Jesus: ―Lázaro, vem para fora‖ (Jo 11.43) o Pai realizou a obra da ressurreição dentre os mortos.
11 Por isso Jesus dirige o olhar dos discípulos para as ―obras‖, para tudo aquilo que eles haviam experimentado em acontecimentos nos quais se tornou claro esse ―eu no Pai‖ e ―o Pai em mim‖. À primeira vista essa troca de ―palavra‖ e ―obra‖ parece levar à confusão e ser arbitrária. Mas na verdade está sendo falado com clareza e profundidade tanto da ―palavra‖ quanto da ―obra‖. Afinal, ―obra da criação‖ acontece na ―palavra‖; e a palavra de Jesus é um ―agir‖ poderoso de Deus nele e através dele. Por isso Jesus é capaz de pedir mais uma vez a seus discípulos: ―Crede-me que estou no Pai, e o Pai, em mim; crede ao menos por causa das mesmas obras.‖

12 Os presentes capítulos do evangelho são discursos de despedida, preparação dos discípulos para o serviço futuro. Como será esse serviço? Um fraco reflexo das grandes obras que Jesus fez e que ele acaba de lembrar aos discípulos? Assim muitas vezes pensamos em nossa ―humildade‖; mas essa humildade é errada. Jesus vê a situação de forma bem diferente: ―Em verdade, em verdade vos digo que aquele que crê em mim fará também as obras que eu faço e outras maiores fará.‖ Isso naturalmente é uma promessa inaudita, que carece de um atestação especial por meio do duplo ―em verdade‖. Os discípulos, cujo coração agora está abalado e desanimado, podem ter plena confiança de que seu serviço se tornará grande e eficaz além de todas as expectativas. Naquela ocasião os discípulos dificilmente o terão acreditado. Nós, porém, temos o privilégio de ver o cumprimento total dessa asserção de Jesus. Essa palavra é verdadeira até mesmo em vista de suas demonstrações de ajuda maravilhosas. De acordo com At 5.16; 9.36-43; 19.11s; Tg 5.14 os apóstolos também realizam as obras que Jesus realizou, e ainda o fazem em proporção maior do que ele, individualmente, podia fazê-las. Contudo, a verdadeira ―obra‖ de Jesus reside em seu envio como Salvador do mundo. Como era pequeno o sucesso visível destinado à atuação de Jesus! Justamente agora, por ocasião da despedida de Jesus, isso pode ser visto com clareza assustadora. E como isso muda completamente no dia de Pentecostes! Nele Pedro pôde realizar uma obra que com os três mil salvos transcende em grandeza a tudo que Jesus fez durante sua permanência na terra. E na seqüência, os discípulos ultrapassam os limites que Jesus manteve rigorosamente para sua própria atuação, e levam a mensagem redentora aos ―gregos‖, ou seja, a todo o vasto mundo das nações. Chamar pessoas da morte para a vida, fazer de inimigos de Deus seus filhos amados: como essa obra dos discípulos aparecia universal e grandiosa diante de João, enquanto escrevia o evangelho e anotava essa palavra de seu Senhor, tendo em vista as igrejas existentes no final do séc. I. E quanto ―maior‖ do que a atuação temporal e fisicamente restrita de Jesus é tudo aquilo que hoje acontece por sobre o globo terrestre no serviço dos mensageiros e das mensageiras de Jesus!
Contudo, por que isso é assim? Será que os próprios discípulos são pessoas maiores que Jesus? Impossível! Nesse aspecto não pode haver equívocos. Jesus o diz pessoalmente: Vocês meus discípulos farão obras maiores do que eu em meu tempo aqui na terra, ―porque eu vou para junto do Pai‖. ―Obras maiores‖ dos discípulos não se originam de sua própria força, e sim da obra consumada de seu Senhor, de sua ―exaltação‖ naquele duplo sentido sobre o qual fomos informados. Por isso a condição para realizar essas obras é pronunciada logo no início da frase: Quem deseja fazê-las, tem de ser ―aquele que crê em mim‖. Porém, justamente pelo fato de que Jesus primeiro precisa criar o fundamento para as ―obras maiores‖ de seus discípulos pela sua caminhada até a cruz, acontece essa estranha situação de que a obra dos discípulos supera em magnitude universal e riqueza de frutos a tudo que Jesus podia alcançar em sua vida na terra. A obra terrena de Jesus aconteceu antes da cruz e se encaminhava para a cruz. A obra dos discípulos parte da ―exaltação‖ de Jesus.
13/14 As obras maiores dos discípulos são na verdade obras de Jesus, assim como a palavra e obra de Jesus eram na verdade vida e obra do Pai. O poderoso fluxo da revelação e da atuação do Pai para o Filho se prolonga do Filho aos discípulos fiéis. Jesus já mostrou isso em Jo 6.57. Assim Jesus o suplicará de novo de modo expresso em Jo 17.2,21. A obra do Filho acontece quando pede e recebe do Pai (Jo 11.41s). Consequentemente, também a obra dos discípulos está alicerçada sobre suas preces. ―Sucesso‖ é atendimento de oração. ―Por isso a promessa de sucesso se torna promessa de atendimento de oração, mais precisamente de atendimento irrestrito de todas as orações‖ (Büchsel). ―E tudo quanto pedirdes em meu nome, isso farei, a fim de que o Pai seja glorificado no Filho.‖ Tudo o que ouvimos nos evangelhos sinóticos em termos de incentivo à oração e de promessas de atendimento (Mt 7.7-11; 17.1-21; Lc 11.5-13), isso Jesus agora sintetiza na despedida de seus discípulos em breves frases. Jesus o confirma mais uma vez: ―Se me pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei.‖ Nessa frase Jesus indica a si mesmo como aquele a quem é dirigida a prece e que também a atende pessoalmente. Assim, está sendo outorgado expressamente à igreja o direito de
orar a Jesus. Em vista disso, os discípulos mais tarde serão caracterizados como aqueles ―que em todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo‖ (1Co 1.2). Importante é também que aqui o próprio Jesus entende a oração integralmente como ―pedir‖. A oração como ―pedir‖ corresponde à situação entre Criador e criatura, entre Senhor e discípulo. De nosso lado está a carência total, porque não encontramos em nós próprios aquilo de que precisamos. Do lado de Deus está toda a riqueza e a disposição plena de nos conceder essa riqueza de que precisamos.
No entanto, está sendo estabelecida enfaticamente para a oração uma premissa: a oração dos discípulos tem de acontecer ―em meu nome‖. É óbvio que isso não significa o uso do nome de Jesus como uma fórmula. Porém Daniel (Dn 9.18) já sabia que nossa oração nunca se pode apoiar sobre nossa justiça, e sim precisa apelar para a grande misericórdia de Deus. Essa misericórdia soberana de Deus veio pessoalmente até nós em Jesus. Portanto, pedir em nome de Jesus significa saber-se autorizado a orar unicamente por essa misericórdia de Deus em Jesus. Pecadores podem comparecer diante de Deus unicamente trajados com a ―justiça alheia de Cristo‖. Então poderão apelar perante Deus a todas as ordens e promessas de oração de seu Senhor. No entanto, se o fizerem seriamente submetem simultaneamente sua oração à verificação se realmente podem apresentar a Deus essas preces ―em nome de Jesus‖. Sim, mais ainda. Jesus declara que ele mesmo é aquele que faz o que está sendo pedido. Duas vezes ele assegura: ―Eu o farei‖. Nenhuma pessoa que ora a Jesus pode esperar que ele faça algo que contradiz sua essência. Contudo, com a mesma certeza ele pode solicitar tudo o que ele reconhece como sendo concorde com a atuação de Jesus. Nesse sentido conhecer progressivamente a Jesus representa uma escola de oração. No entanto, esse olhar para Jesus durante a oração não compromete a honra do Pai, e sim a aumenta. Pois Jesus, o Filho, pode e pretende ―fazer‖ tudo apenas ―a fim de que o Pai seja glorificado no Filho‖. Porque mesmo quando Jesus atende as orações dos seus, ele permanece fiel à regra básica que expôs aos líderes de seu povo por ocasião de sua primeira grande controvérsia sobre sua filiação divina: ―O Filho nada pode fazer de si mesmo, senão somente aquilo que vir fazer o Pai; porque tudo o que este fizer, o Filho também semelhantemente o faz‖ (Jo 5.19).