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29 setembro 2010

2 TIMÓTEO 1.1-14

A SEGUNDA EPÍSTOLA A TIMÓTEO
SAUDAÇÃO 1:1-2

l. Como sua antecessora, a segunda das epístolas a Timóteo começa com uma breve fórmula de saudação do padrão costumeiro. Conforme a maneira usual de Paulo, enfatiza-se que ele é apóstolo de Cristo Jesus (ou seja, não meramente o representante de uma igreja local), e que sua nomeação é pela vontade de Deus. Esta última expressão contrasta-se com "pelo mandato de Deus, nosso Salvador, e de Cristo Jesus, nossa esperança" em l Tm l: l e reproduz a forma paulina normal (l Co 1:1; 2 Cor: l; Ef l: l; Cl l: l). Tem sido objetado, como em l Tm l: l, que estas são renovações de confiança rígidas e formais que o cooperador tão íntimo quanto Timóteo dificilmente teria precisado. Mas esta objeção olvida o fato de que, como l Timóteo, esta carta não é simplesmente um item de correspondência particular; Paulo muito bem pode ter desejado deixar a congregação, à qual espera que seja lida, sem dúvida alguma quanto à posição e à autoridade dele.
As palavras de conformidade com a promessa da vida que está em Cristo Jesus (uma tradução literal) são obscuras à primeira vista. Acompanham bem de perto apóstolo de Cristo Jesus, não pela vontade de Deus. A preposição de conformidade com, i.é, "com referência a" (Gr. kata) define o alvo e o propósito do apostolado de Paulo, ao passo que promessa denota a promessa da vida eterna que, segundo a maneira cristã de entender o A.T., Deus desde o início ofereceu para aqueles que têm fé (cf. Tt 1:2). Destarte, o que é declarado é que a missão de Paulo é fazer conhecido que esta promessa recebe seu cumprimento mediante a comunhão com Cristo.
Em Cl 3:4 Cristo é descrito como sendo "nossa vida," ao passo que em Fp 2:16 a mensagem do evangelho é "a palavra da vida." O ensino de Paulo (que antecipa Jo 3:15) é que Cristo outorga novidade de vida, e que qualquer pessoa que, mediante a fé, "se reveste" de Cristo (Gl 3:27) pode participar desta vida. À luz desta exegese temos o direito de dar em Cristo Jesus nesta passagem a força integral que em Cristo regularmente tem nas cartas de Paulo.
Representa a união mística com Cristo que o crente desfruta como o feito da sua fé. Alguns críticos (e.g. B. S. Easton) preferem o sentido enfraquecido "dada por Cristo." Argumentam (ver sobre l Tm l: 14; 3:13) que, onde a frase leva o significado místico, é quase invariavelmente usada de pessoas, e que visto que assim nunca é o caso nas Pastorais, seu significado ali deve ser "dado por Cristo" ou "pelo fato da existência de Cristo" ou, simplesmente, "cristão." A teoria deles não recebe apoio algum de uma passagem como esta, onde o sentido místico "em união com Cristo" está completamente no seu lugar apropriado, ao passo que as alternativas propostas são forçadas e artificiais.
2. Para a descrição de Timóteo como amado filho, e também para a tríade Graça, misericórdia e paz, e a estrutura da saudação como um todo, ver notas sobre l Tm 1:1-2.

AÇÕES DE GRAÇAS 1:3-5

As cartas antigas começavam comumente, imediatamente após a saudação, com uma asseveração cortês de oração, ou alternativamente, uma expressão de gratidão, pela saúde e a prosperidade do endereçado.
Paulo seguia este procedimento, adaptando os sentimentos à sua linguagem cristã, na maioria das suas cartas (e.g. Romanos, l e 2 Coríntios, Filipenses), mas não em Gaiatas, onde não era apropriado para seu estado de ânimo, nem em l Timóteo ou Tito. Volta ao procedimento aqui, e a profunda emoção e afeição espontânea que suas palavras irradiam comprovam que, para ele, não era nenhuma fórmula meramente convencional. A frase é longa e envolvida, mas seu sentido se toma claro se nos lembrarmos que o v. 4 é um parêntese de emoção calorosa.
Seu propósito é estimular Timóteo a permanecer leal à fé e a estar disposto a sofrer por ela. Para reforçá-lo relembra-o, com ações de graças a Deus, da sincera piedade que herdou da sua família.
3. Como em l Tm 1:12 (ver a nota ali), Paulo emprega a construção charin echò para Dou graças, ou invés de eucharisto, que normalmente emprega. Estudiosos têm notado outros desvios do seu uso normal: (a) não há nenhuma frase-objeto "por vós (todos)" depois de Dou graças; (b) sem cessar é representado pelo adjetivo adialeiptos 'ao invés do advérbio (Rm 1:9; l Ts 1:2; 2:13); (c) mneian echò é usado para me lembro ("menciono") ao invés de mneian poioumai, e en tais deésesin mou para nas minhas orações ao invés de epi tón proseuchón mou. Estas diferenças podem ser devidas ao desenvolvimento do vocabulário do Apóstolo, ou (mais provavelmente) a uma mudança de amanuense.
Os críticos que são céticos quanto à autoria paulina naturalmente acham nelas apoio para seu argumento. Do outro lado, deve ser notado que a estrutura da passagem assemelha-se de modo notável às ações de graças paulinas normais, incluindo no v. 4 uma cláusula participial seguida por uma cláusula final.
O Apóstolo ressalta que o culto que presta a Deus não somente brota de uma consciência pura ("consciência" - ver a nota sobre l Tm l: 5), como também tem sido tradicional na sua família. Ao frisar o primeiro fato, tem em mente mais do que a pureza de intenção indispensável em toda a adoração que vale a pena. Como na totalidade desta carta, está dolorosamente consciente da sua posição como preso acusado de delitos criminosos, e, por implicação, está protestando sua inocência (cf. At 23:1). A referência aos seus antepassados deliberadamente prepara o caminho para v. 5, onde deliberadamente sublinha a excelente situação familiar que o próprio Timóteo teve. Nada há de incongruente no orgulho que Paulo aqui revela na criação religiosa judaica que recebeu. O mesmo orgulho aparece em Rm 9:3-5 e Fp 3:4-6, e fica claro que, embora, em certo sentido, sua aceitação de Cristo como seu Salvador representasse um rompimento total com sua piedade ancestral, noutro sentido era seu desenvolvimento e florescimento apropriado. Até mesmo a lei, que, conforme sua convicção firme, tinha sido substituída, servira seu propósito em trazê-lo a Cristo.
Paulo menciona Timóteo sem cessar. . . noite e dia, nas suas orações, assim como intercede constantemente pelos romanos (Rm l: 9), pêlos filipenses (Fp 1:3), pêlos colossenses (Cl 1:3), e, sem dúvida, por todas as comunidades que tinha evangelizado. As palavras noite e dia (a ordem judaica normal: ver sobre l Tm 5:5) estão ligadas por muitas autoridades com a cláusula seguinte, de modo que qualificam o particípio traduzido estou ansioso. Embora seja possível, é improvável, pois (a) noite e dia é um chavão que se associa regularmente com a oração, e (b) embora fosse convencional falar da oração ininterrupta, o quadro do Apóstolo ansiando vinte e quatro horas por dia por ver Timóteo parece afetado.
4. A afeição represada de Paulo irrompe no parêntese estou ansioso por ver-te, etc. Expressões semelhantes ocorrem em l Ts 3:6;Fp l: 8; Rm 1:11, mas a intensidade do sentimento é mais urgente e pessoal aqui. Em Lembrado das tuas lágrimas Paulo está se referindo à sua separação final do jovem, que parece ter dado vazão à emoção desinibida no Oriente. Alguns autores pensam que a referência, no caso de ser histórica, deve ser à cena de despedida em Mileto, quando se relata que todos os presentes (At 20:37) se dissolveram em lágrimas, mas aquilo aconteceu vários anos antes, e Paulo deve ter visto Timóteo no intervalo.
Supondo-se que a teoria de uma segunda prisão é correia, é natural inferir que Paulo está pensando na ocasião, decerto ainda recente na sua memória, quando, tendo sido preso mais uma vez, despediu-se pela última vez de Timóteo, presumivelmente em Éfeso, antes de ser levado para Roma. O Apóstolo quer ver Timóteo a fim de que transborde de alegria, e o mesmo desejo ansioso percorre a carta inteira. "Procura vir ter comigo depressa," roga em 4:9, e em 4:21 repete com renovada urgência: "Apressa-te a vir antes do inverno." A hora da sua execução está se aproximando, e sua ansiedade em ver seu jovem assistente, dedicado como nenhum outro, é compreensível. A justaposição da tristeza e da alegria é eficaz, e também é um toque caracteristicamente paulino (cf. 2 Co 7:8-9; Fp 2:17).
5. Paulo agora chega ao objeto das suas ações de graças: a/ë sem fingimento de Timóteo, cuja recordação se repete sempre que pensa no jovem. Porque o particípio traduzido a recordação que tenho está no aoristo ("tendo recebido uma lembrança de"), alguns têm conjeturado que deve ser uma referência alguma lembrança mais específica, tal qual o recebimento de uma carta ou de alguma notícia acerca de Timóteo. Para a expressão fé sem fingimento, cf. l Tm 1:5 (ver a nota). Tem sido argumentado que, como naquela passagem, aqui deve ter o significado enfraquecido de sentimento religioso, pois "a questão da sinceridade não pode surgir naquele relacionamento íntimo entre a alma e Deus que Paulo usualmente define como sendo fé" (E. F. Scott). Na teoria, isto pode ser a verdade, mas não pode haver dúvida alguma de que Paulo esteja pensando aqui especificamente da atitude de Timóteo para com Cristo. Pode ser sugerido que a fé no sentido rigorosamente paulino tem um aspecto externo bem como interno, e que a profissão dela pode ser irreal. Ao ressaltar a sinceridade, Paulo está enfatizando que não pode haver questão disto no caso de Timóteo. A passagem talvez possa ser ilustrada por l Ts 3:5 ss., onde achamos o Apóstolo perguntando acerca da qualidade da fé dos seus correspondentes.
Agora somos informados que esta fé primeiramente habitou na avó de Timóteo, Lòide e na sua mãe Eunice. O que Paulo quer dizer é que assim como sua própria vida religiosa tinha poderosas raízes familiares, assim também a de Timóteo estava fundamentada na da sua mãe e da sua avó. Tem sido argumentado que deve estar fazendo referência à criação devota judaica que as duas mulheres deram ao jovem na sua meninice, mas o contexto deixa claro que significa fé em Cristo.
Se for assim, a frase sugere ou que Lóide foi convertida ao cristianismo primeira, sendo seguida por Eunice, ou simplesmente (e mais provavelmente) que as duas mulheres eram as primeiras cristãs na família de Timóteo. Conforme At 16:1, sua mãe era "uma judia crente," expressão esta que somente pode significar uma convertida ao cristianismo, ao passo que seu pai era um pagão — fato este que explica a ausência de qualquer menção dele aqui. Uma passagem tal como esta, tão fiel à vida real e com sua nota delicadamente pessoal, cria dificuldades especiais para os que apóiam a teoria da pseudonimidade. Alguns deles estão dispostos a reconhecer que o escritor decerto estava fazendo uso de matéria genuinamente paulina.
Do outro lado, a sugestão de que, ao descrever com pormenores os antecedentes religiosos de Timóteo, seu objetivo real era impressionar sobre seus leitores sua "grande confiança e alegria nos ministros cristãos da terceira geração, e a segurança que sente no caso daqueles que, no lar, têm sido arraigados e fundamentados na forma recebida (paulina) do cristianismo" (F. D. Gealy) é um exemplo das interpretações artificiais às quais às vezes são forçados.

O DESAFIO AO TESTEMUNHO CORAJOSO l: 6-14

Depois das ações de graças breves, Paulo passa a procurar estimular a resolução do seu jovem discípulo, e, em particular, o encoraja a estar disposto a suportar o sofrimento por amor ao evangelho. A nota de ansiedade que permeia a passagem advém parcialmente do reconhecimento da parte do Apóstolo de que a inexperiência e a timidez natural de Timóteo precisam de reforços, e ainda mais porque está consciente das responsabilidades pesadas que logo devem recair sobre este. Mesmo assim, pode indicar a comissão divina dada na ordenação, ao exemplo da sua própria perseverança, e à vida nova outorgada aos homens mediante Cristo, como motivos que impulsionam a um esforço corajoso.
6. A transição da seção anterior é fácil e natural. É Por esta razão, i.é, porque sabe que Timóteo é um homem de fé solidamente estabelecida, que Paulo não hesita em exortá-lo a reavivar o dom de Deus, que há nele e que recebeu na sua ordenação. Há uma referência à ordenação de Timóteo em l Tm 4:14, onde Paulo também diz que ela transmitiu um "dom especial" (a mesma palavra que aqui: Gr. charisma) a ele. Aqui o dom é comparado a um fogo (cf. l Ts 5:19: "Não apagueis q Espírito"), a sugestão reavivar ("reacender") não é para significar que apagou-se, mas, sim, que as brasas sempre precisam ser remexidas constantemente (o verbo está no presente do infinitivo).
Notamos que, se a ordenação já é considerada como transmitindo uma graça positiva, a idéia de que esta graça opera automaticamente é excluída. O ministro cristão deve estar continuamente alerta para revitalizá-la.
Paulo relembra que o dom fora transmitido pela imposição das minhas mãos. Para o significado disto, ver a nota sobe l Tm 4:14, onde a questão importante de se a ordenação foi realizada pelo próprio Paulo, ou por uma mesa de presbíteros presidida por ele, também é discutida.
A linguagem aqui tem alguma possibilidade de estar consistente com este último ponto de vista, mas, interpretada de modo simples e direto, favorece o primeiro.
7. A graça que Timóteo então recebeu, Paulo passa a indicar, tem uma relevância direta com sua presente situação, pois "o espírito que Deus nos deu" forneceu exatamente o equipamento que Timóteo precisa para ela. Não está fazendo referência, como alguns deduziram do plural "nos", ao dom divino do Espírito Santo para os cristãos em geral, seja no Pentecoste, seja no batismo. O aoristo "deu" (que reflete o sentido do original melhor do que "tem dado") relembra o culto de ordenação que mencionou, e com nos quer dizer Timóteo e ele mesmo.
Poderia igualmente bem, e, com efeito, mais deliberado, ter escrito "a ti", mas um tato bondoso o impediu de fazer assim. De modo oblíquo, está repreendendo Timóteo por sua timidez, mas amacia o golpe por meio de classificar-se juntamente com ele. O espírito que ambos receberam no seu comissionamento não era espírito de covardia (para a expressão, cf. Rm 8:15), que poderia deixá-los hesitar ao serem confrontados com responsabilidades desafiantes, perigos, etc. Pelo contrário, era de poder (cf. l Co 2:4), capacitando-os a dominar qualquer situação com autoridade moral; de amor, i.é, de serviço afetuoso e com abnegação, prestado aos irmãos; e de moderação ("autodisciplina") que se requer de cada líder cristão.
A última destas três qualidades (Gr. sõphronismos) é mencionada somente aqui no N.T., mas cf. l Tm 2:9, 15 para o subs. Relacionado sóphrosuné; l Tm 3:2; Tt 1:8; 2:2, 5 para o adjetivo sõphrón; Tt 2:12 para o advérbio sôphronós; Tt 2:4 para o verbo sõphronizó; e Tt 2:6 para o verbo sophronein. Todas estas palavras expressam a idéia de "temperança," "autocontrole." Nas suas cartas reconhecidas, Paulo emprega sophronein duas vezes (Rm 12:3; 2 Co 5:13), mas a predileção das Pastorais pelo grupo inteiro é outro sinal da sua linguagem idiomática helenizada.
Mesmo assim, deve ser notado que a moderação não é considerada aqui, como também o poder e o amor, como ou uma dotação natural, ou o fruto de esforços diligentes. Todos os três são aspectos de um charisma divinamente outorgado, pois embora espírito neste contexto só denota diretamente o Espírito Santo, define graças específicas das quais Ele é o mediador.
8. Paulo desenvolve seu rogo. Fortalecido desta maneira, Timóteo não precisa envergonhar-se, portanto, do testemunho de nosso Senhor. Para a idéia de ter vergonha do evangelho, cf. Rm 1:16. O Grego (lit. testemunho de nosso Senhor) pode significar ou "testemunho dado por Cristo," ou "testemunho acerca de Cristo." Se for aceito o primeiro, o sentido será o de l Tm 6:13, sendo que a referência diz respeito ao testemunho que Cristo selou pela Sua morte sacrificial. O último, no entanto, é preferível de modo geral, pois concorda com a frase paralela (Gr. to marturion tou Christou) em l Co 1:6. Também é mais apropriado para o contexto, cuja razão de ser é estimular Timóteo a ser um evangelista destemido. Sabemos, com base em l Co 1:23, que o evangelho de um Salvador crucificado impressionava os judeus como sendo blasfemo, e os pagãos como sendo puro contra-senso, e é compreensível que uma pessoa tímida como Timóteo (para este traço do seu caráter, cf. l Co 16: 10) se recuasse a incorrer no inevitável desprezo e ódio.
Igualmente, não deve envergonhar-se, conforme muito bem poderia ser tentado a fazer, de associar-se com o próprio Paulo, a despeito de este estar acorrentado (a palavra traduzida encarcerado. Gr. desmios subentende isto) como um criminoso comum. Como noutros lugares (Ef 3:1; Fm l), o Apóstolo trata o que os de fora poderiam julgar uma situação vergonhosa como uma fonte de humilde satisfação. Embora talvez pareça ser o encarcerado do imperador, realmente é o Seu, i.é, de Cristo. O pensamento subjacente é, nSo apenas que os homens o prenderam por ser seguidor de Cristo, mas, sim, que Cristo o fez prisioneiro para Seus propósitos.
Longe de ter vergonha das humilhações e dos sofrimentos de Paulo, Timóteo deve criar coragem e participar deles, Se assim fizer, redundará em lucro para o evangelho - a favor do evangelho (um dativo de interesse). O verbo traduzido participa... dos sofrimentos (Gr. sunkakopathein) foi cunhado por Paulo, que tem uma predileção por compostos com sun ("com"). Se significado é, aqui, participa comigo dos sofrimentos a favor do evangelho, ao invés de "sofre com o evangelho" (Vulgata) ou "participa das aflições do evangelho" (AV, ARC). Paulo reforça seu apelo ao assegurar-lhe que, se robustecer para sofrer, será segundo o poder de Deus, i.é, o poder de Deus (cf. "espírito de poder" no v. 7) o sustentará.
Os dois versículos demonstram, em termos comoventes, as razões porque Timóteo, e, na realidade, qualquer cristão em qualquer era, pode depender do poder de Deus para o avanço triunfante através do sofrimento e da desgraça. Vem dAquele cujo propósito salvífico, baseado totalmente na graça e não nas realizações dos homens, tem estado operante desde antes da fundação do mundo e fez aquilo que eles nunca poderiam ter realizado por si mesmos, redimindo-os e, na missão histórica de Cristo, rompendo os laços da .morte e outorgando a vida eterna. No conceito de muitos estudiosos, estes versículos, que parecem ter o ar de um parêntese, são um extraio dalgum hino ou trecho litúrgico primitivo, e indicam suas antíteses cuidadosas, sua redação compacta, e seu tom elevado. É possível que tenham razão, mas contra a sugestão deles devemos notar: (a) a passagem não subsiste, como as demais citações nas Pastorais, por si mesma, mas, sim, é sintaticamente subordinada à cláusula anterior; (b) as idéias e a linguagem são paulinas, e também são características das Pastorais. Uma explicação mais provável seria, provavelmente, que Paulo, embora esteja fazendo uso de matéria catequética semi-estereotipada, molda-a livremente para seus propósitos e imprime sobre ela seu próprio selo.
9. A primeira lição de Paulo é que Timóteo, ao enfrentar o sofrimento, pode confiar na assistência divina porque Deus nos salvou. O título "Salvador" é aplicado a Deus seis vezes nas Pastorais (ver a nota sobre l Tm 1:1); para o uso do verbo como aqui, cf. l Co 1:21. Esta salvação, que envolve a libertação do pecado e da morte, é algo que os cristãos desfrutam aqui e agora. Seu outro lado é expresso na declaração de que Deus nos chamou com santa vocação. Na linguagem paulina o verbo "chamar" denota a primeira etapa no processo da salvação (Rm 8:30; l Tm 6:12), e o sentido da cláusula é que Deus, que é santo Ele mesmo, chamou os cristãos para fora do mundo para uma nova vida de consagração. São "chamados para ser santos" (l Co 1:2), ou "chamados em santificação" (l Ts 4:7). A sugestão, proposta nos interesses do ponto de vista de que a passagem é pós-paulina, e provavelmente do século II, que vocação tem aqui o sentido técnico do ministério cristão é extremamente forçada. Não somente a palavra (Gr. klèsis) nunca tem este significado estreito no N.T. (l Co 7:20 não é um paralelo, pois ali significa a posição que um homem tem na vida de modo geral), como também o contexto requer que a referência seja à chamada de Deus à santidade.
A segunda lição de Paulo é enfatizar (é o coração do seu evangelho) que a chamada divina não vem a nós segundo as nossas obras ("em virtude de qualquer coisa que tenhamos feito"), mas, sim, somente conforme a sua própria determinação e graça. Se dependesse dos nossos méritos, nossa posição seria na melhor hipóteses precária, e, mediante uma estimativa realista, desesperadora; mas visto que depende inteiramente de Deus, nossa confiança pode ser inabalada. Para a mesma rejeição de "obras," cf.Tt 3:5.
Para a determinação salvífica de Deus, cf. Rm 8:28; 9:11; Ef l: 11; 3:11. Naturalmente existiu desde toda a eternidade, mas aqui o Apóstolo (ou o refrão catequético que está citando) afirma que esta graça nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos. O pensamento tem relacionamento com aquele de Ef 1:4, onde está declarado que ". . . nos escolheu nele (i.é, em Cristo), antes da fundação do mundo." As duas passagens pressupõem a idéia da preexistência de Cristo, e também dão a entender que Ele é o único Mediador que transmite a graça de Deus aos homens, mediante a união deles com Ele.
10. O propósito gracioso de Deus, determinado antes da criação do mundo, foi manifestado agora, i.é, tomado visível, até mesmo concretizado, no processo histórico (cf. Rm 3:21; Cl 1:26), pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus. Para manifestação (Gr. epiphaneia), ver a nota sobre l Tm 6:14. Noutros lugares, o termo denota a volta de Cristo em glória, mas aqui (para o uso do verbo cognato com o mesmo sentido, cf. Tt 2:11; 3:4) Seu aparecimento na terra na encarnação, não subentende necessariamente Sua preexistência, mas, tendo em vista o ensino do versículo anterior, é provável este sentido. Cristo foi revelado como nosso Salvador porque incorpora, e assim torna visível e eficaz, o propósito salvífico de Deus.
Em l Tm 1:1 (veraneia); 2:3; 4:10; Tt 1:4; 2:10; 3:4 a descrição Salvador (Gr. sótér) é aplicada a Deus, mas aqui e em Tt 2:13; 3:6, a Cristo. Era geralmente corrente na religião helenística, pois era usado como título para os muitos deuses redentores do paganismo, e também para o imperador no culto estatal. É digno de nota que Jesus nunca o reivindicou para Ele, e que o Messias nunca é chamado "Salvador" no A.T. Estes fatos, combinados com suas associações helenísticas, provavelmente explicam por que o título nunca é usado para Cristo nas partes mais primitivas do N.T., que brotaram em solo palestiniano. Fora das Pastorais, vemos o uso começando em Fp 3:20 e Ef 5:23; depois disto, estabeleceu-se rapidamente e tomou-se normal. Pode haver pouca dúvida de que um dos motivos principais por detrás desta disposição crescente e sempre mais confiante de saudar Cristo como Salvador era a reação consciente contra as pretensões dos numerosos "salvadores" e do culto imperial, com sua aclamação Kaisar Sõtèr, em particular.
A obra salvífica de Cristo agora é resumida de forma breve: não só destruiu a morte, como trouxe à luz a vida e a imortalidade, mediante o evangelho. Paulo emprega o mesmo verbo "destruir" em l Co 15: 26, falando da morte como "o último inimigo a ser destruído." O texto não subentende que os cristãos estão isentos da morte, mas, sim, que para eles perdeu seu aguilhão (l Co 15:55). O verbo traduzido trouxe à vida (Gr. phótizein) originalmente significa "iluminar," "inundar com luz." Aqui é usado metaforicamente (cf. l Co 4:5; Ef 3:9) para sugerir que, mediante Sua ressurreição, Cristo revelou aos homens a natureza da vida, ressurreta que agora pode ser deles. É uma vida caracterizada pela imortalidade (Gr. aphtharsia, i.é, "incorruptibilidade"). A palavra é regularmente empregada por Paulo para o corpo da ressurreição (l Co 15: 42, 50, 53, 54); denota para ele alguma coisa que somente Deus pode outorgar (Rm 2:7).
Para alguns, o conceito da salvação esboçado nesta passagem tem parecido semelhante ao dos gnósticos, por ressaltar o conhecimento; outros acharam a linguagem (cf. "vida," "imortalidade," e especialmente "luz") remanescente dos mistérios. No que diz respeito a esta última sugestão, deve ficar claro que o vocabulário e as idéias são totalmente paulinos. A primeira sugestão é refutada pela cláusula final, em que Paulo afirma que esta revelação foi feita mediante o evangelho, com o que indica não apenas a mensagem crista, como também a revelação inteira de Deus em Cristo que forma seu conteúdo.
11. Ao mencionar o evangelho, uma nota quase de exaltação entra nas palavras que Paulo escreve. É para o qual (o evangelho) que ele, até mesmo ele (o eu é muito enfático no Grego), cujo encarceramento acaba de ser relembrado, foi designado pregador, apóstolo e mestre. A linguagem assemelha-se estreitamente àquela de l Tm 2:7, onde o verbo designado (Gr. etethén: cf. l Co 12:28) é também usado para sublinhar sua comissão divina. Alguns têm questionado se, sendo o escritor o próprio Paulo, teria precisado convencer Timóteo do seu direito de pregar o evangelho. Assim, no entanto, perde-se a moral da alusão. Paulo não está tanto procurando impressionar Timóteo quanto maravilhando-se que Deus o tenha selecionado para tais responsabilidades. Se as palavras são dirigidas a Timóteo, até certa medida, visam indicar que ele também descobrirá, quando o manto do Apóstolo descer sobre ele, que o privilégio de testificar de Cristo acarreta o sofrimento.
Se distinções delicadas devem ser tiradas entre pregador, apóstolo e mestre, a primeira palavra ressalta a audácia e a publicidade com as quais o evangelista deve proclamar sua mensagem, a segunda ressalta sua comissão especial, ao passo que a terceira chama atenção às suas obrigações pastorais.
12. Por isso, i.é., porque foi nomeado um pregador do evangelho, Paulo está sofrendo estas coisas. Alguns argumentaram que esta é uma expressão deliberadamente vaga que pretende capacitar todo "Timóteo" a relacionar seus próprios sofrimentos com seu papel de ministro do evangelho. É mais natural interpretá-la como sendo uma referência exata à miserável situação em que Paulo se acha no momento de escrever. A despeito dela, exclama: não me envergonho; pelo contrário, é uma honra sofrer por Cristo. O verbo é aquele que usou no seu apelo a Timóteo no v. 8; sua repetição contém um indício que, se Paulo não acha motivo de vergonha no seu sofrimento, não pode haver razão para outros se envergonharem no deles.
O Apóstolo passa a dar a razão para sua confiança: Sei em quem tenho crido. É difícil determinar se tem em mente Deus ou Cristo; há as duas possibilidades, mas tendo em vista que o poder de Deus foi ressaltado no v. 8, a primeira parece mais provável. O significado do que está dizendo é que o cristão sabe, com base na experiência pessoal, bem como nos fatos do evangelho, que Deus nunca o decepcionará. Caracteristicamente, a fé à qual apela aqui não é a f é num credo, mas, sim, numa Pessoa.
Como resultado, pode estar certo de que ele, i.é, Deus, é poderoso para guardar o meu depósito (i.é, a pessoa de Paulo) até aquele dia. A palavra-chave aqui (Gr. parathéké) ocorre também em 14 abaixo e l Tm 6:20 (ver a nota ali); é um termo jurídico que conota alguma coisa que uma pessoa coloca em confiança na salvaguarda doutra pessoa. É ambígua na presente passagem, e pode ser traduzida "o que confiei a Ele." Se esta tradução for preferida, Paulo estaria asseverando que colocou-se a si mesmo (talvez também sua obra, até mesmo seus convertidos) nas mãos de Deus, e que está confiante de que, sejam quais forem os desastres que ocorram, Ele vigiará por ele.
A objeção principal a esta interpretação é que entra em conflito com l Tm 6:20 e, acima de tudo, com o v. 14 imediatamente abaixo, onde parathéké claramente denota alguma coisa que Deus confiou à salvaguarda de Timóteo. Uma objeção menos importante é que a preocupação com seu próprio bem-estar parece fora de harmonia com o tom geral do Apóstolo. Parece melhor, portanto, entender esta palavra, como em l Tm 6:20, como a mensagem do evangelho considerada como um tesouro confiado à igreja; assim, tem-se a vantagem adicional de harmonizar bem com as instruções dadas em 2:2 abaixo.
Com aquele dia obviamente há referência ao grande dia quando "compareceremos perante o tribunal de Deus" (Rm 14:10). A expressão (cf. 1:18; 4:8) é freqüente na LXX; Paulo a emprega numa citação do A.T. em 2 Ts 1:10, mas normalmente prefere alguma outra forma (e .g. "o dia do Senhor"). A passagem como um todo expressa assim sua certeza suprema de que, sejam quais forem os infortúnios que possam sobrevir aos Seus ministros, o próprio Deus conservará a fé a eles confiada, isenta de corrupção, de modo que os capacitará, por assim dizer, a devolver sua custódia a Ele intata no julgamento final.
13. Em 9-12 Paulo ficou arrebatado por sua exposição do poder redentor de Deus. Agora retoma os conselhos que estava dando para Timóteo nos w. 6-8, conclamando-o a basear seus ensinos nos do próprio Paulo. Embora a construção do Grego não esteja livre de dificuldade, este é o significado claro da frase: Mantém o padrão das sãs palavras que de mim ouviste, uma tradução alternativa poderia ser: "Como modelo de ensino sadio, mantém diante de ti o que de mim ouviste." Paulo não está dizendo que Timóteo deve reproduzir seu ensino palavra por palavra, muito menos tem em mente alguma fórmula fixa de credo que deseja que recite sem alteração alguma. A palavra traduzida padrão (Gr. hupotupòsis: cf. l Tm 1:16) denota um esboço geral ou planta usado por um artista, ou, na literatura, um rascunho que forma a base de uma exposição mais plena. A sugestão contida na palavra, portanto, é que, embora Timóteo devesse ser leal à mensagem de Paulo, sem desvios, considerando-a seu padrão, deve estar livre para interpretá-la ou expô-la da sua própria maneira. Quanto às sãs palavras (ou "ensino"), uma expressão predileta nas Pastorais, ver a nota sobre l Tm 1:10.
Além disto, ao modelar seu ensino no do seu mestre, Timóteo deve fazê-lo com fé e com o amor que está em Cristo Jesus. Embora estejam próximas do verbo ouvistes, estas palavras dão um sentido intoleravelmente fraco se forem ligadas com ele. É muito mais satisfatório, e sintaticamente possível, ligá-las com Mantém o padrão e entendê-las tomo uma definição do espírito que deve caracterizar a ortodoxia de Timóteo. Ao expô-la aos outros, deve revelar, ele mesmo, "a fé e o amor que são nossos em Cristo Jesus" (NEB). Conforme mostra esta paráfrase, a fórmula em Cristo Jesus é muito mais rica no seu sentido do que "cristãos" (B. S. Easton: ver a nota sobre 1:1). Expressa a verdade de que a fé e o amor do cristão são os frutos da sua união com Cristo (ver nota sobre l Tm l: 14).
14. É precisamente este ensino de Paulo que agora é identificado como o bom depósito (Gr. parathéké) que foi confiado a Timóteo, e que ele é exortado a Guardar, i.é, conservar contra distorção e corrupção às mãos dos sectários. A implicação clara é que o Apóstolo o considera seu sucessor e herdeiro.
Ao levar a efeito este dever Timóteo deve confiar, não em recursos dele mesmo, mas, sim, mediante o Espírito Santo que habita em nós. Esta cláusula relembra Rm 8:9, onde Paulo fala do Espírito Santo habitando em cristãos e dirigindo suas vidas. Muitos consideram que este é o significado aqui, mas tendo em vista o destaque dado ao equipamento espiritual dos ministros em 6-7, parece que o pensamento primário de Paulo diz respeito a ele. Ao empregar o pronome nós, portanto, realmente significa, não cristãos de modo geral, mas, sim, "tu e eu." Era seu conceito, é claro (cf. l Co 12: 4 ss.), que cada função ministerial na comunidade tinha seu apropriado revestimento do Espírito, e era natural que, assim como a necessidade de impedir os hereges de manipular erroneamente com o evangelho ficava mais premente e óbvia, devia estender isto para as responsabilidades especiais de homens tais como Timóteo e ele mesmo, neste assunto. Dentro de muito breve (já a achamos claramente delineada em l Ciem. xlii. 2-4;xliv 2) haveria de ser elaborada a doutrina de que a hierarquia da igreja forma uma sucessão ordeira de mestres encarregados com a preservação da tradição apostólica e especialmente sustentada nisto pelo Espírito Santo. Alguns estudiosos acham esta doutrina nesta passagem, e, visto que sustentam que a igreja apostólica era "criativa" e "profética" mais do que "transmissional" e "sacerdotal", concluem que é um sintoma da data pós-paulina, provavelmente no século II. Dois comentários podem ser feitos para criticar este argumento, (a) Embora o germe do qual a doutrina posterior desenvolveu-se (de modo legítimo ou ilegítimo) possa ser indubitavelmente detectado aqui, é apenas o germe. Não há nenhum sinal de teoria, nenhuma teologia consciente, no texto sob discussão; sugere uma situação muito mais elementar, e presumivelmente mais primitiva, de que é pressuposta pela doutrina esmerada e bem articulada proposta até mesmo por um escritor tão antigo quanto Clemente, (b) A distinção entre as etapa "criativa" e "transmissional" na igreja do século I é inteiramente enganadora, pois a ênfase na tradição era destacada desde o próprio início.
Qualquer análise das cartas reconhecidas de Paulo revelará como estão repletas de matéria tradicional, e é compreensível que, nos seus derradeiros anos, sua preocupação com a preservação da tradição se tomasse cada vez mais evidente.
(Autor não citado no texto)

2 TIMÓTEO 1.1-14

A SEGUNDA EPÍSTOLA DO APÓSTOLO PAULO A TIMÓTEO
INTRODUÇÃO
(KRETZMANN)
Depois que Paulo escrevera sua primeira carta a Timóteo, ele continuou suas tarefas na Macedônia e no Oriente, ainda que é provável, com base de certas tradições históricas, que também visitou a Espanha. Mas por causa de algum motivo que não conhecemos, seu ministério foi repentinamente interrompido pela sua prisão e subseqüente transferência para Roma. Durante este último aprisionamento a situação do apóstolo foi completamente diferente da de sua estada anterior em Roma. Esteve em algemas, cap. 1. 8, 16.
Contrariamente de antes, ele não teve mais a expectativa de ser solto. É verdade que, momentaneamente, escapou dum grande perigo, cap. 4. 17. Mas ele está fortemente convicto que o tempo de sua partida está próximo, cap. 4. 6. Por isso, sua última carta está marcada por um caráter singular, assim que pode foi chamada, e não sem razão, o testamento do apóstolo moribundo ao seu filho espiritual e a toda a comunidade. A epístola foi escrita não muito depois de seu aprisionamento e em vista da morte que com certeza se aproximava, talvez em 66 ou 67, sendo que a tradição cita este último ano.
O tom familiar que está evidente na primeira carta é expresso aqui com força ainda maior. A epístola é uma conversa confidencial do apóstolo com o homem ao qual, desde o tempo de sua conversão, concedera o amor dum pai. Depois do endereçamento e da saudação há uma admoestação para continuar, por meio do poder de Deus, na corajosa confissão do evangelho. A seguir o apóstolo fala detalhadamente sobre a correta administração do ofício ministerial, dando referência a várias condições difíceis, enfatizando sempre a fidelidade como virtude essencial dum pastor. Em conclusão dá algumas informações sobre acontecimentos pessoas e um breve relato de sua primeira audição em juízo. Ele conclui com saudações e com sua bênção apostólica, cujo significado está até hoje em vigor.
Capítulo 1
Endereço E Saudação. 2. Tm. 1. 1, 2.
V. 1) Paulo, apóstolo de Cristo Jesus, pela vontade de Deus, de conformidade com a promessa da vida que está em Cristo Jesus, 2) ao amado filho Timóteo: Graça, misericórdia e paz da parte de Deus Pai e de Cristo Jesus nosso Senhor. É um endereço solene com que Paulo começa sua carta: Paulo, um apóstolo de Cristo Jesus pela vontade de Deus, para a proclamação da vida que está em Cristo Jesus, a Timóteo, meu filho amado.
Tal como na primeira carta, Paulo se chama aqui um apóstolo de Cristo Jesus, colocando de propósito a ênfase no ofício de Cristo, por meio do qual é eficaz o ofício apostólico. Paulo pertenceu àqueles primeiros mestres da igreja do Novo Testamento que tiveram uma medida extraordinária de dons para a obra da fundação desta igreja em todo o mundo. A eleição de Paulo para este ofício não ocorrera com base em sua própria escolha e desejo, mas pela vontade de Deus, que o escolhera e que, por meio de sua conversão e subseqüente vocação, dera uma direção completamente diferente à sua vida toda. Por isso, considerou este ofício e realizou a obra deste não por quaisquer motivos de auto-engrandecimento, mas com o propósito de proclamar, de anunciar, a verdadeira vida em Cristo Jesus, da vida que segue e que depende da pregação da palavra da graça. O conteúdo de toda pregação apostólica é a vida que Deus desde a eternidade projetou para as pessoas, a vida que desceu à terra pelo Filho unigênito de Deus, Jo. 1. 4; 1.Jo. 1.2, a vida que gozaremos na eternidade em sua medida mais rica, Cl. 3. 3, 4; Gl. 6. 8; Rm. 5. 17. É a vida que está em Cristo Jesus, pois sem Ele não pode haver vida verdadeira. Desta descrito, desta forma, seu ofício e dado um resumo de sua pregação, Paulo se dirige a Timóteo como seu filho amado, com o qual está unido pelos laços do amor mais cordial e paterno, 1. Co. 4. 17; Fp. 2. 20-22. A saudação do apóstolo é idêntica com a da primeira carta: Graça, misericórdia e paz de Deus
Pai e de Cristo Jesus nosso Senhor. Aquele que recebeu a reconciliação, a graça de Deus pela fé, também receberá com total confiança a garantia do amor misericordioso de Deus em Cristo, estando plenamente convicto que a paz de Deus que excede toda compreensão é a dádiva certa de Deus a todos os que crêem. Nós, tendo sido justificados pela fé, tendo-nos tornado participantes da graça e da misericórdia de Deus, temos paz com Deus por meio de nosso Senhor Jesus Cristo, Rm. 5. 1.
Paulo Lembra Timóteo De Sua Antiga Educação E Suas Obrigações. 2. Tm. 1. 3-7. V. 3) Dou graças a Deus, a quem, desde os meus antepassados, sirvo com consciência pura, porque sem cessar me lembro de ti nas minhas orações, noite e dia. 4) Lembrado das tuas lágrimas, estou ansioso por ver-te, para que eu transborde de alegria, 5) pela recordação que guardo de tua fé sem fingimento, a mesma que primeiramente habitou em tua avó Lóide, e em tua mãe Eunice, e estou certo de que também em ti. 6) Por esta razão, pois, te admoesto que reavives o dom de Deus, que há em ti pela imposição das minhas mãos. 7) Porque Deus não nos tem dado espírito de covardia, mas de poder, de amor e de moderação. Sem qualquer introdução, o apóstolo apresenta o assunto que enche sua mente.
Seu coração está a transbordar, e as idéias brotam no ansioso esforço para encontrar expressão: Graças rendo a Deus, a quem sirvo, desde os meus antepassados, de consciência pura (como constantemente faço menção de ti em minhas orações, noite e dia, desejando ansiosamente ver-te, recordando tuas lágrimas, para que eu seja tomado de alegria). Este é um verdadeiro começo Paulino duma carta, pois ele sempre encontra motivo para agradecimento a Deus, não interessando quão desencorajadora possa ser a situação em que se debata. Apesar do fato que teve atrás de si longos anos de árdua labuta e estava olhando para uma provável execução prematura, é ainda assim o sentimento de gratidão para com Deus que exprime quanto ao caso. Suas esperanças e orações em relação de Timóteo haviam sido mais do que cumpridas, estando ele mais do que satisfeito com o resultado de seus esforços. Mas, porque sua intenção foi recordar seu aluno das obrigações de sua anterior formação, ele descreve o Deus a quem suas preces sobem como o Senhor ao qual de consciência pura servia desde seus antepassados. Esta expressão não se opõe à afirmação de 1. Tm. 1. 13, como pensam muitos comentaristas. Antes é esta a situação: Com a exceção da concreta revelação do Messias em carne e do fato que agora vivemos no tempo do cumprimento, enquanto os patriarcas e seus seguidores viveram no tempo do tipo e da profecia, a fé e a esperança dos crentes do Antigo Testamento são idênticas com as dos cristãos do Novo Testamento. Paulo desde sua juventude fora instruído nesta fé e esperança, tal como havia acontecido com seus antepassados antes dele. Claro, foi algo terrível que ele fora um perseguidor e um blasfemador de Cristo e da religião cristã. Ele mesmo, porém, diz que esta atitude fora devido à ignorância. Sua antiga fé no Messias que devia vir, e a de seus anos posteriores foi essencialmente a mesma. Desta forma seu culto a Deus fora realizado de consciência pura, mesmo que tenha sido tola por causa do fato que o Messias já havia chegado. Paulo apresenta isto como uma explicação, não como uma desculpa.
Agora o apóstolo destaca, na forma duma observação em parêntesis, seu relacionamento com Timóteo, afirmando que tinha seu amado aluno continuamente na lembrança nas orações que, noite e dia, subiam a Deus. Ele lembrava todas as congregações com as quais estava ligado por meio de sua posição apostólica, mas, incidentalmente, seu relacionamento cordial com Timóteo o levou a, com fervor especial, fazer menção dele. Seu coração esteve
tomado de saudade para ver seu jovem amigo, especialmente porque não conseguia livrar-se da lembrança das lágrimas que Timóteo derramou na última reunião que tiveram; cf. At. 20. 37. O campo no qual Timóteo trabalhava se mostrara quase demais para sua inexperiência, em conseqüência do que fora aborrecido com pusilanimidade. Por isso, enquanto Paulo pensava sobre esta cena e sobre o fato que desde então não fora capaz de ver Timóteo, apareceu e aumentou novamente seu desejo para vê-lo e, assim, ser tomado de alegria.
Depois desta observação em parêntesis, o apóstolo menciona agora o motivo de suas orações de agradecimento: Pois evoco a fé sem fingimento que primeiro habitou em tua avó Lóide e em tua mãe Eunice; contudo, estou persuadido que também em ti. Provavelmente Paulo foi recordado fortemente de tudo isto por meio duma carta ou dum mensageiro de Timóteo. Por meio disso fora aprofundada a impressão que tivera sobre seu aluno.De coração grato, por isso, se volta ao Senhor, agradecendo-Lhe por preservar até então a fé de Timóteo. Foi uma fé sem fingimento, uma fé não misturada de hipocrisia, uma fé apoiada no conhecimento e que consistia na aceitação da salvação em e através de Cristo. Timóteo fora extraordinariamente feliz por ter recebido uma instrução correta na doutrina da verdade. Tanto sua avó Lóide como sua mãe Eunice, que ambas pertenciam, certamente, aos verdadeiros israelitas que esperaram pela revelação do verdadeiro Messias, também haviam abraçado o cristianismo. Mas a mesma fé cristã que nelas vivia também habitou no coração do neto e filho. Paulo esteve convicto disso, disso tivera o testemunho mais firme. 
Estas vantagens extraordinárias que gozava, contudo, também impuseram obrigações a Timóteo: Motivo pelo qual te lembro que reavives o dom da graça de Deus, que há em ti pela imposição das minhas mãos. Timóteo recebera, desde sua primeira infância, instrução nas Escrituras do Antigo Testamento. Por isso, sua conversão consistira em seu giro da espera dum Messias que ainda devia chegar para a confiança Naquele que fora manifestado.
Tendo ele recebido a graça de Deus em medida tão rica, tendo-lhe também sido concedida a capacidade para ensinar e a disposição de ensinar, como uma evidência especial da misericórdia de Deus, o apóstolo, por isso, julgou ser sua a incumbência de lembrá-lo de suas obrigações quanto a estes dons, tal como lhe foram transmitido pela imposição das mãos de Paulo por ocasião de sua ordenação. Naquela ocasião Timóteo recebera, de um modo único, numa medida extraordinária, a capacidade especial para administrar o ofício pastoral em todas as suas ramificações. Timóteo devia reavivar o dom da graça que lhe fora concedido. Ainda havia nele o fogo da fé, do amor, da confiança e da coragem de abrir sua boca na cordial proclamação do conselho de Deus, mas corria o perigo para negligenciá-lo.Por isso a admoestação de reavivá-la, para que, por conseqüência, o trabalho do Senhor não sofresse.
Paulo acrescenta em apoio de sua admoestação: Pois Deus não nos deu o espírito de timidez, mas de poder e de amor e de sensatez. O espírito que vive nos cristãos e que devia dar energia especialmente aos pastores não é de timidez, de falta de coragem e de covardia.
Este é o espírito que produz mercenários, homens que estão a serviço dos ouvidos que sentem coceira de seus ouvintes, e o espírito que finalmente conduz à hipocrisia e à negação da fé. O Espírito verdadeiro que devia atuar em todos os cristãos e em especial nos ministros da palavra é o Espírito de vigor e poder, ou seja, duma energia que está firmada na onipotência de Deus, o qual não conhece medo; o Espírito de amor que capacita uma pessoa a não somente apresentar-se livremente para o trabalho, mas também a oferecer sacrifícios pela causa do Senhor; o Espírito de sensatez, que capacita ao pastor cristão para usar em todas as situações o bom senso, a empregar o tato e a diplomacia que em todas as situações escolhem os melhores métodos, e que, desta forma, conquista amigos para o evangelho. Este é um dom da graça, através do Espírito, e por isso devia ser encontrado em todas os homens que estão empenhados no glorioso ministério de salvar almas, bem como em todos os cristãos que reconhecem seu dever de colocar suas energias e capacidades ao serviço do Senhor.

Uma Admoestação À Constância. 2. Tm. 1. 8-14.
V. 8) Não te envergonhes, portanto, do testemunho de nosso Senhor, nem do seu encarcerado que sou eu; pelo contrário, participa comigo dos sofrimentos, a favor do evangelho, segundo o poder de Deus, 9) que nos salvou e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos, 10) e manifestada agora pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, o qual não só destruiu a morte, como trouxe à luz a vida e a imortalidade, mediante o evangelho, 11) para o qual eu fui designado pregador, apóstolo e mestre, 12) e por isso estou sofrendo estas coisas, todavia não me envergonho; porque sei em quem tenho crido, e estou certo de que ele é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia. 13) Mantém o padrão das sãs palavras que de mim ouviste com fé e com o amor que está em Cristo Jesus. 14) Guarda o bom depósito, mediante o Espírito Santo que habita em nós. O conhecimento do amor de Deus em Cristo Jesus e o dom da graça de Deus são os fatores fundamentais no trabalho de Timóteo; eles o abrigam a mostrar toda firmeza na confissão de Cristo, na defesa da fé. O apóstolo expressa, em excelente diplomacia, este pensamento: Por isso não tenhas vergonha do testemunho de nosso Senhor nem de mim, Seu prisioneiro, mas junta-te a mim no sofrimento pelo evangelho conforme o poder de Deus. Timóteo não devia sentir pavor nem medo da desonra e da vergonha que sua confissão de Cristo certamente traria sobre ele. Não devia fugir da sorte que é inevitável aos seguidores de Cristo. Cf. Rm. 1. 16; Mc. 8. 38; Hb. 11. 26. O apóstolo chama toda a pregação do Novo Testamento como o testemunho de Cristo, porque Cristo é o conteúdo de toda a doutrina da salvação; Sua pessoa e obra deviam ser proclamadas de cada púlpito que traz o nome cristão; a mensagem do evangelho é a da vida eterna, porque testifica de Cristo, Jo. 5. 39; 1. Co. 1. 4. Exatamente, porque cada pessoa que confessava publicamente sua adesão à assim chamada seita dos cristãos devia esperar que fosse atingida por perseguição e desonra, Timóteo devia, bem por isso, não se envergonhar de sua confissão. Timóteo podia estar inclinado a se afastar de Paulo na atual situação infeliz deste último. Contudo, o apóstolo não esteve definhando na prisão por causa de qualquer crime que cometera. Ele foi um prisioneiro do Senhor. Fora aprisionado por causa de Jesus ao qual ele confessara de modo tão franco e cordial perante as pessoas.
Por isso seus grilhões foram suas insígnias de honra, e Timóteo devia reconhecê-las como tais. Timóteo, em vez de estar envergonhado de Jesus e de Paulo, Seu apóstolo, agora em cadeias por Sua causa, devia, antes, juntar-se a ele no sofrimento pelo evangelho. Caso o acertasse a mesma sorte que sobreveio ao seu querido mestre, Timóteo não devia hesitar um só momento para mostrar sua disposição em carregar o jugo de seu Senhor. Tanto ele seria
capaz de fazer, todavia, não por sua própria razão e força, mas de acordo com, na medida do, poder de Deus nele. Cristo, o Senhor de Sua igreja, sempre concede a necessária força que é preciso para suportar sofrimentos por Sua causa. Caso haja algum pensamento que, acima de quaisquer outros, nos devia tornar dispostos para sofrer perseguições por causa de nosso Senhor, então é o de nossa redenção em Cristo O qual nos salvou e nos chamou com santa vocação, não conforme as nossas obras, mas conforme Seu próprio propósito e graça, que nos foi dada em Cristo Jesus antes do tempo deste mundo. O apóstolo emprega o argumento mais forte que tem à disposição para incutir em Timóteo e em cada cristão a necessidade de permanecer constante na confissão de Cristo até ao fim. Foi Deus quem nos salvou, que é nosso Salvador. A salvação está completa, pronta ante os olhos e corações de todas as pessoas. E no que diz respeito à sua aplicação aos cristãos, o apóstolo diz que Deus nos chamou, que Ele nos estendeu o convite para aceitarmos a reconciliação feita em favor de todas as pessoas. Este convite foi um chamado santo, visto que proveio do próprio Deus santo, foi aplicada pelo Espírito Santo, e tem como propósito uma vida de consagração. De maneira alguma entra em consideração neste chamado o mérito do homem, visto que ele não nos foi alcançado por causa de nossas obras. Deus não olhou para pessoa alguma com a intenção de encontrar algo em seu caráter ou em sua atitude que o pudesse tornar mais voluntário a graça oferecida. Todavia, ao mesmo tempo, Ele não emitiu um chamado absoluto, simplesmente na base da majestade de Sua vontade divina. Antes, Ele chamou as pessoas conforme Seu próprio propósito e graça. Foi o conselho e a intenção pessoais e livres de Deus; foi um conselho da graça, do Seu livre amor e favor, cuja revelação ocorreu em Cristo Jesus. Antes que os fundamentos do mundo fossem lançados, antes que Deus havia criado um só ser humano, que foi formulado Seu conselho gracioso de amor, que resultou em nossa vocação, em virtude do qual devíamos ser Seus próprios filhos e viver com Ele por toda a eternidade. Em Cristo Jesus nos foi dada Sua graça, visto que Sua redenção no-la adquiriu. A graça de Deus em Cristo Jesus esteve, desta forma, presente e à disposição desde a eternidade. Depois disso, no cumprimento do tempo, Deus tornou conhecida Sua graça para a humanidade: Mas agora manifestada através do aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, quando tornou a morte ineficiente, mas trouxe vida e imortalidade à luz através do evangelho. A graça que foi planejada e preparada em Cristo Jesus, foi manifestada, não por meio dum mero ensinar ou pregar, mas por meio duma manifestação corporal que podia ser entendida pelos sentidos, Jo. 1. 14. A graça de Deus foi tornada manifesta através de toda vida, sofrimento e morte de Cristo. Foi assim que a graça de Deus foi trazida à atenção das pessoas em forma corporal e visível, na forma do Redentor, que foi seu irmão conforme a carne. Sua manifestação culminou quando tornou a morte sem valor, quando tirou o poder da morte temporal, tornando-a desta forma uma simples máscara, 1. Co. 15. 55-57. Visto que a morte, em sua verdadeira essência, significa uma separação de Deus e da vida em Deus, por isso é que para os cristãos ela perdeu seu terror. Para nós que estamos em Cristo, a morte já não pode mais nos vencer. Em vez disso, são nossa porção vida e imortalidade por meio da obra de nosso Salvador. Fomos readmitidos na comunhão da vida com Deus. A verdadeira vida em e com Deus se estende à nossa frente em imensurável plenitude. Foi novamente tornada possível a original condição bendita do paraíso. A vida em e com Deus se mostra em imortalidade e em incorrupção. A salvação com todas as glórias do céu são nossas. Ela não mais está oculto aos nossos olhos, mas pelo evangelho nos é exposta na luz mais brilhante e clara. Pois esta é a mensagem da plena redenção, da revelação da vida sem fim. Esta é a glória bendita do evangelho, como aqui o apóstolo o resumiu em breves palavras para Timóteo bem como aos cristãos de todos os tempos.
O apóstolo, quando expressa sua ligação com o evangelho, incidentalmente dá agora um motivo por que Timóteo não devia envergonhar-se dele: Para o qual foi apontado arauto e apóstolo e mestre. Cada palavra empregada pelo apóstolo destaca uma certa fase de seu trabalho. Ele é um arauto, um proclamador das grandes e maravilhosas obras de Deus. Pela sua pregação não só devia ser lançada a base para uma correta compreensão, mas pelo mesmo método os cristãos também deviam crescer no conhecimento de seu Senhor Jesus Cristo. Ele é um apóstolo, pertencendo ao número de homens que em todos os tempos deviam ser os mestres da igreja do Novo Testamento. E, por fim, Paulo foi um mestre, tal como todos os verdadeiros ministros deviam ser, sendo sem campo especial o dos gentios. 
Ele não operou com as excelências da sabedoria do homem, mas ensinou o mistério do reino de Deus, tanto em público como em particular. Acaso ainda podia acontecer que Timóteo se envergonhasse de seu mestre? Mas nem os sofrimentos de Paulo deviam provocar nele este sentimento de vergonha: Motivo pelo qual também sofro estas coisas, mas não me envergonho. A inimizade do mundo o atingiu no ministério, no ofício que Deus lhe confiou. Fora submetido à miséria, perseguição e prisão. Todavia, visto que estes sofrimentos devem ser esperados no desempenho regular do sacro ofício, ele, de modo nenhum, os encarou como uma vergonha. Sofrer por amor de Cristo não é uma desonra, mas uma honra. O apóstolo, por este motivo,
é capaz de escrever na jubilosa confiança de fé: Pois sei em quem minha fé repousa, e estou persuadido que Ele é capaz de guardar aquilo que Lhe confiei até aquele dia. Aqui cada palavra é uma expressão de confiança firme em Deus. Ele não se baseia em seus sentimentos, sobre suas próprias idéias e opiniões. Seu conhecimento está baseado na palavra e por isso não pode estar com vergonha. Ele alcançou uma convicção que é mais certa do que todas as asseverações de meras pessoas. Ele tem a promessa de Deus em Sua palavra infalível. Visto que o apóstolo entregou a salvação de sua alma ao Pai celeste, e sua fé tem a convicção baseada em Sua palavra, é que o precioso tesouro está seguro em Suas mãos, Jo. 10. 28. Pois Deus é capaz, plenamente competente, para guardar esta bênção inestimável. Somos guardados pelo poder de Deus através da fé para a salvação, 1. Pe. 1. 5. A seguir segue, como algo lógico, a admoestação: Segura firme o exemplo de sãs palavras que de mim ouviste, tanto na fé como no amor que está em Cristo Jesus. O exemplo pessoal de Paulo foi um fator importante em seu trabalho. O que fizera e dissera devia ser um tipo para Timóteo seguir. Parece que ele se refere a algum resumo ou disposição da verdade do evangelho que transmitira ao seu aluno, que foi um ensino das sãs palavras, estando totalmente livre das excrescências mórbidas que os pregadores do erro mostravam. Timóteo devia usar este resumo de doutrina na fé e no amor que há em Cristo Jesus. Tendo a convicção da fé que o evangelho, tal como ensinado por Paulo, foi a verdade, ele não toleraria tornar-se um apóstata desta verdade. Tendo no coração verdadeiro e cordial amor para com Cristo, saberia que cada deserção da verdade, que lhe fora entregue, magoaria profundamente seu Salvador. Uma adesão singela às palavras da Escritura é a maneira mais segura para evitar a maioria das dificuldades com que os sectários sempre estão em luta. Pois, somente quando uma pessoa vai além das palavras da revelação divina, é que ela topa com contradições ou afirmações aparentemente incompatíveis.
O apóstolo, em conecção a este pensamento, insiste mais uma vez com seu aluno: Guarda o tesouro excelente através do Espírito Santo, que habita em nós. Tendo, a instantes, admoestado Timóteo a aderir pessoalmente à forma da sã doutrina, Paulo, agora, martela a outra verdade, a saber, que este precioso depósito da verdade pura precisa ser guardado contra qualquer contaminação. É verdade que nenhum pastor, por seu próprio poder, por sua própria razão e força, é capaz de defender e guardar a doutrina de Cristo contra os vários ataques que são feitos contra ela, contra as desconfianças que sobre ela são espalhadas. Quando uma pessoa estuda a Bíblia do modo como o faz com qualquer outro livro, quando crê que a aplicação do mero saber mundano bastará para sua defesa, então ele descobrirá logo quão triste foi o erro de suas idéias. A preciosa bênção da verdade evangélica só pode ser guardada em segurança através do Espírito Santo. Este Espírito já no batismo fez em nós Sua habitação, e quer continuar no uso de nossos corações como Seu santuário enquanto continuamos nas palavras de nosso Salvador. Que consolo para o singelo e fiel ministro da palavra!
(KRETZMANN)