O IMPACTO DO EVANGELHO - PARTE I

PRIMEIRA PARTE


 O Impacto  do  Evangelho
             (Der evangelische Anzatz)


            CAPÍTULO  UM


             SOB A IRA DE DEUS


            1. A EXPERIÊNCIA PRIMEVA1  (Das Urerlebnis)

            A primeira parte da Confissão de Augsburgo inicia com um artigo sobre Deus.  Ela termina com um artigo sobre os santos. Deus, porém, é mais do que o princípio.  Ele é mencionado em toda parte, mesmo no artigo intitulado "Da Ordem Política e do Governo Civil" (Cf. Livro de Concórdia, Trad.: Arnaldo Schuler, 1980, 1a ed. p. 35).  E os santos vêm por último apenas porque são o fim das obras de Deus.  A confissão toda tem a ver com essas obras.  Aqui Deus é o pressuposto auto-evidente sobre o qual se poderia procurar em vão por qualquer "prova" na Confissão de Augsburgo. A Confissão de Augsburgo, certamente não foi escrita para aqueles que não participam desse pressuposto - o que, na verdade, não deve ser entendido como afirmação de que seus conteúdos não têm nenhuma validade para eles.(p.17)  Pelo contrário.  O que é dito sobre Deus deve possuir validade incondicional precisamente por causa da Lei e do Evangelho, aos quais se apela como autoritários,  tem  validade  incondicional como Palavra de Deus. Se, porém, eles possuem validade mesmo quando o homem nada sabe a seu respeito, Deus, de qualquer modo, é independente de nossa consciência.  E se alguém investigar adiante, encontrará como princípio de todas as coisas lá do conhecimento que a consciência do homem como consciência de si mesmo está em oposição original contra Deus, quer ele saiba disso, quer não.  Nenhum homem é sem pecado.  Nem existe qualquer campo neutro entre o pecado e a justiça.  E não existe nenhum pecado que não seja inimizade contra Deus. (p.18)

            Esses enunciados estão na base das teses com que Lutero, pela primeira vez, atraiu divulgada atenção pública.  São a base da sua luta mais árdua contra toda espécie de pelagianismo.  As contendas veementes que ocorreram na era de Flácio, foram causadas pelo temor que esses enunciados pudessem ser obscurecidos.  Esses enunciados separam Lutero do idealismo que se seguiu.  Nem a submersão de si mesmo no seu próprio pensamento nem colocação de idéias próprias da "pessoa ética" podem levar a qualquer outro resultado que não seja a oposição contra Deus. Pois tudo o que o homem descobre em si mesmo e tudo que ele empreende é pecado e, por isso, condenado por Deus. (p.18)

            Num primeiro lance, isso parece monstruoso.  Isso implica uma condenação de tudo que, entre os homens, parece ser grande e nobre.  Aparentemente, paralisa toda atividade ética, todo passo adiante.  Ofende ao Católico, que crê nos seus santos.  Isso leva à frieza de Goethe e ao ódio de Nietzsche contra o Luteranismo. Isso foi tão duro de suportar que sempre de novo Melanchthon foi tentado a cortar-lhe fora uma parte, e os dogmáticos do século 17 às vezes parecem havê-lo retido apenas na sua forma.  Em toda semelhança, todos eles se tornariam culpados nesse assunto se uma ruptura com o mesmo não tivesse sido entendida como uma ruptura com o resultado da própria Reforma. (p.18)

            A descrição básica total da existência do homem é desenvolvida por Lutero, exaustivamente, mas igualmente com inigualável obscuridade na preleção que ofereceu sobre o Sl 90, em 1534 (Edição de Erlangen 18, 264-334).  "No meio da vida, estamos na morte" (Media vita in morte sumus), é o tema. "Calamidades, miséria, brevidade de vida, terrores de uma consciência aflita, desespero, morte temporal, morte eterna, morte" (Calamitates, miseria, brevitas vitae, angores conscientaiae afflictae, desperatio, mors temporalis, mors aeterna, mors) e sempre de novo "morte" (mors) - essas são as variantes.  Aqui, o poeta que escreveu esse salmo é "Moisés no grau superlativo, isto é, o inflexível servo da morte, da ira de Deus e do pecado" (Mosissimus Moses, hoc est, severus minister mortis, irae Dei et peccati). (p.18)  Pode-se perguntar se essa descrição negra pintada em preto não é um completo testemunho pessoal de Lutero, que aqui demonstra corretamente que ele permanecia um monge por toda a sua vida.  Contudo, o próprio Lutero considera essa visão pessimista como sendo universalmente válida.   Realmente, ele afirma enfaticamente que existe também uma outra visão da vida.  Ele sabe muito bem que existem aqueles que evitam qualquer pensamento de morte [276], que estão entregues tão somente a prazeres e cuidados temporais [325].   Ele também sabe que outros não demonstram o pensamento de morte, mas esperam ter lidado com a morte ao menosprezá-la [266].  Por outro lado, ele mesmo reconhece o valor do homem e da vida humana.  A canção da morte é tão horrenda precisamente porque ela golpeia "essa nobre criatura" [286, 292].  Aqui, no entanto, Lutero não se posiciona a favor do que é nobre e lindo contra aquilo que é mau e vil.  Pois tal posicionamento pressupõe um desmembramento da vida - um desmembramento que ignora a questão principal.  A vida deve ser tomada como um todo.  Mas, como um todo, ela está indubitavelmente escravizada pela morte.2 (p.19)

            E a morte, de maneira alguma, é apenas o fim da existência temporal.  Mesmo se alguém desejasse considerá-la apenas cronologicamente, ela seria infinita [284, 310].  A vida, no entanto, é finita.  Por que, então a morte não seria mais forte do que a vida?  A vida passa como uma sombra [321].  Ela é idêntica ao tempo, que não tem quaisquer dimensões, que nunca "é".  Como tempo, a vida - mesmo que passe algumas centenas de anos - é meramente um ponto matemático (punctum mathematicum) [321], meramente um ponto de intersecção, sem superfície, sem espaço.  O reconhecimento que a nossa vida é apenas um ponto matemático é pretendido quando Moisés exige "que nos transfiramos para fora do tempo e olhemos para a nossa vida com os olhos de Deus" (ut transferamus nos extra tempus et Dei oculis inspiciamus nostram vitam) (291). Aqui, então, encontramos Deus. "Pois a morte do homem é algo diferente da morte dos animais, que morrem segundo a lei da natureza.  Ademais, ela não ocorre em razão de coincidência ou tempo.  Ela é uma ameaça de Deus; ela tem sua origem na ira e estranheza de Deus." [284].  Por conseguinte, ao tomar a vida como um todo, isto é, como um ponto matemático, compreende-se por que ela sempre está acompanhada pela ameaça da morte. (p.19)
            Sim, por quê?
            Porque a contínua ameaça que faz a vida reduzir-se a um ponto matemático donde se pode olhar para todos os lados nas profundezas da morte deve realmente referir-se  a toda a vida, à totalidade de suas relações naturais e éticas, sim, mesmo à sua relação com Deus - ao Deus cuja existência a teologia, a filosofia e a igreja certamente ensinaram Lutero a reconhecer como uma verdade enorme e auto evidente.(p.19)   Após o irrompimento do conhecimento que levou à Reforma, ele caracterizou a totalidade da sua relação como ratio.3  Tudo o que ele possuía em razão do pensar e conhecer, era auto evidente, isto é, auto evidente em si mesmo e de si mesmo: que o homem como uma "pessoa moral" devia estar sujeito a Deus e por isso obedecer aos Seus mandamentos; que, quando ele não prossegue em fazer assim ou, por último, não prossegue inteiramente, ele deve utilizar-se do tesouro de méritos em posse da igreja; que ele deve seguir os exemplos dos salvos e dos santos;  que Deus não pode exigir dele qualquer coisa além do que exige daqueles, e igualmente que o homem será capaz de realizá-lo se tiver a boa vontade necessária.  De outra forma, Deus não poderia realmente exigir isso dele.  Tudo isso é compreensível, sim, auto evidente, exatamente como a filosofia de Aristóteles, que se educa de seu pensamento e se alimenta do seu conhecimento, e em que tudo prossegue num caminho racional. (p.20)

            Contudo, quando absorvido nesse racionalismo do mundo e nessa clara concepção do que deveria ser feito, o homem, instantaneamente, cai aos pedaços.  O medo o domina.  De que?  Talvez toda religião comece com o medo.   Aqui, porém, não se trata de um mero sentimento de dificuldade mundana - o sentimento de que o homem ao seu redor é fantástico, enigmático e irracional.  Nem se trata de um mero temor da sua própria insuficiência, de envelhecer, ou de morrer.   Nem é um sentimento de se ver oprimido pelo infinito.   Pelo contrário, trata-se do medo que ele tem quando à noite, subitamente, dois olhos demoníacos o encaram - olhos que o paralisam na imobilidade e o enchem da certeza que esses são os olhos daquele que o matará naquele exato momento.  Nesse momento, todo o embuste da filosofia da religião, que definiu Deus como to on, como "algo infinito" (ens infinitum), como um "ato puro" (actus purus); nesse momento todas as precauções e garantias que a igreja tem a oferecer contra a punição para o pecado, contra a destruição temporal e eterna - tudo passou e foi esquecido.   A partir de um objeto de meditação, de um parágrafo num livro de dogmática, Deus se tornou, subitamente, uma Pessoa que me chama pessoalmente.   E essa Pessoa me chama para me dizer que o meu tempo se esgotou.   Diante disso, toda oração por libertação é vã.  A vontade de viver, morre - a vontade de viver a vida que se tem chegou até esse instante. E o tempo fica imóvel. (p.20)

            Mas, por que o homem é tomado por esse medo, quando Deus chama por ele diretamente? (p.20)  Para essa pergunta, Lutero procurou e encontrou a resposta em seu livro Do Servo Arbítrio (De servo arbitrio).4   Na superfície das controvérsias exegéticas com Erasmo, ele luta por uma compreensão desse medo de Deus.   Ele captou a razão para o mesmo.   Nesta situação é natural olhar primeiro para o homem.   Alguém tenta explicar para si mesmo esse medo, psicologicamente.  Sob os olhos de Deus, porém, o homem chega a uma conclusão totalmente diferente.  Pois ele  se encontra completamente nas mãos de um poder fora de si mesmo e que a ele se opõe.  E, ainda, num sentido duplo.  Primeiro, Deus lhe exige uma prestação de contas.  Deus o responsabiliza.5  O fato que Deus o responsabiliza lhe mostra conclusivamente que ele realmente tinha uma obrigação de ser algo, fazer algo, ou deixar de fazer algo.  Mas, agora, a terrível descoberta.  Deus o mantém responsável por algo que ele nunca consegue realizar.6  A razão é que para o cumprimento do grande "Deves" que está sobre a sua vida  toda,  ele não possui a primeira coisa mais importante - o livre arbítrio.  Sua vontade é escrava.7  Somente quando o homem não pode mais ter dúvida quanto ao poder misterioso que o prende incondicionalmente e, por isso, o impede de fazer o que deveria, esse conhecimento se torna terrível em total medida.   É o próprio Deus.   Este é o segundo sentido em que Deus tem poder sobre o homem.   Deus faz exigências ao homem e, a despeito disso, efetua nele exatamente o oposto.8  Como que por menosprezo, contudo, Ele o mantém responsável por não cumprimento.  O homem deveria fazer o que é bom, mas ele necessita fazer o que é mau.   Sabemos por que Lutero está cheio de medo.   Agora conhecemos a conexão entre a morte e Deus.   Ademais, ficamos sabendo que essa morte é algo diferente do outro fim.  Ela é o fim da "pessoa moral". (p.21)

            Na sua ansiedade, o homem olha para Deus que lhe infligiu essa coisa monstruosa.  Mas o que é que ele aprende?  Ele vê ira flamejante.9  O mal deve ser extirpado, pois é inimizade contra Deus.10  Além disso, o próprio Deus colocou nas mãos do homem as armas que usou quando fez o que é mau e, assim, lutou contra Deus [WA 18,710,1-30].  Pois, tudo o que o homem tem vem de Deus [18,614,12].  Porém, a vitória na batalha não pode ocorrer na dúvida.   Aqui o homem implora por uma resposta ao por quê!  Por que Deus o colocou nessa situação desesperadora?11  No entanto, ele não obtém nenhuma resposta.   Ele se encontra diante de um mistério inescrutável.   Ele sente a culpa que estava ligada à sua natureza humana desde o princípio, por causa do "Tu deves".  No entanto, ele não sabe por quê.   Enquanto ele faz essas últimas perguntas, a escuridão se torna impenetrável.  Não há nenhuma resposta.12 Esse Deus que nos mantém responsáveis por exigências que não conseguimos cumprir, que nos faz perguntas que não podemos responder, que criou para nós aquilo que é bom e que, a despeito disso, não nos deixa nenhuma opção senão fazer o que é mau - esse é o "Deus oculto" (Deus absconditus).  É o Deus da predestinação absoluta.13   É o Deus que endurece o coração de Faraó e odeia Esaú antes dele haver nascido, o oleiro forma vasos que enchem alguém de tédio14 - e, apesar de tudo isso, retumba contra essas infelizes criaturas de uma maneira brutalmente despótica: "Tua culpa!" (Tua culpa!). (p.22)

            Aqui, moral e ratio realmente chegam a um fim.   E deve-se acompanhar Lutero até esse ponto a fim de se perceber o que revelação, graça e fé significam para ele.  Aqui, ao mesmo tempo, está o ponto de retorno.  Ele escreve a Erasmo que "isso é obviamente repugnante ao sentido comum,  Deus ser guiado unicamente pela sua própria vontade quando abandona o homem, endurece-lhe o coração e exige dele.  Pois Ele parece ter prazer nesses pecados e no tormento eterno dos infelizes, muito embora pregadores louvem a grandeza da sua misericórdia e amorosa benevolência. (p.22) Parece que por essa razão deve-se olhar para Deus como desleal e brutal, como intolerável.  O pensamento repugnante levou  muitas pessoas distintas de todos os tempos ao desespero.  E quem não o acharia repugnante?  Mais do que uma vez, isso me lançou ao mais profundo abismo do desespero e fez-me desejar nunca haver nascido - até que aprendesse quão salutar é esse desespero e quão próximo ele está para a graça." [WA 18, 719]15  (p.22)    No entanto, sem o Evangelho, a experiência primeva (Urerlebnis) termina em desespero, ódio contra Deus e blasfêmia.16  (p.23)

            O escrito contra Erasmo contém a razão para aquela perspectiva tenebrosa da vida, que Lutero desenvolveu no seu comentário ao Salmo 90.  Será notado, de fato, que à luz do Evangelho é apresentada uma descrição  totalmente diferente e que, por isso, a validade de tudo isso é meramente provisional.   Realmente, seria um erro concluir a partir disso que Lutero tivesse uma mente fechada com respeito à sua visão pessimista do mundo.  Porém, mesmo essa análise posterior do que fora desenvolvido até aqui, leva ao perigo de má interpretação e desenvolvimento falho - conforme o ensina a história.  Em todo caso, é necessário ter em mente sem qualificação, num primeiro plano, a relação que a experiência primeva (Urerlebnis) tem com Deus e, num segundo momento, a indissolúvel conexão entre os elementos do destino e da moral. (p.23)

            A negação do livre arbítrio (liberum arbitrium), por Lutero, já fora condenada na bula papal de 15 de junho de 1520 e, Aleander, o núncio papal, sabia o que  pretendia quando no Edito de Worms deixou que a acusação de paganismo fosse feita contra Lutero.17  A posição de Lutero contra o livre arbítrio, sobre o qual Aleander baseou sua acusação, pôde realmente parecer uma ruptura com todo o sistema de ética, não apenas com a ética oficial da igreja.   Sua queima do livro de lei eclesiástica, mencionada adiante, parecia confirmar  que no seu caso a  consciência   ética  estava  realmente  sem articulação.  Nessa conexão, o edito destacou que a doutrina de Lutero tinha uma linha de antepassados, e isso tinha como objetivo acabar com ele na medida em que era considerada a opinião pública na cristandade.  A negação do livre arbítrio equivalia, assim se parecia, a uma negação da responsabilidade.  Porém, então, eram emitidas somente conclusões estóico-fatalistas ou de libertinismo.  Quer Lutero inferisse a última ou a primeira, parecia em qualquer caso que ele se colocara em oposição à crença cristã em Deus.(p.23)  Na convicção que essa crença abarcava a justiça de Deus como Juiz, que separa as boas obras do homem das suas más ações e, por conseguinte, pressupõe a decisão livre e, conseqüentemente, o "livre arbítrio" do homem, os representantes da igreja tinham os humanistas a seu lado, isto é, no sentido geralmente aceito, toda a visão ética normal da vida. (p.24)

            Aqui já se pode perceber uma má interpretação que resultou da consideração unilateral de um dos dois elementos que Lutero sustentava estarem firmemente conectados.  Pois Lutero, de modo algum, negava a responsabilidade humana.  Desde as suas teses contra as indulgências,  todo o seu apelo à igreja tem sido um grande chamado ao arrependimento.  Contudo, é auto evidente que uma negação da responsabilidade teria anulado esse chamado.  Em inúmeros sermões sobre questões individuais pertinentes à ética, especialmente no que ele escreveu sobre as boas obras (1520), tinha no topo de tudo isso proclamado um ethos positivo que estava em oposição a qualquer forma de libertinismo, bem como a qualquer ética baseada no fatalismo. (p.24)

            De fato, havia ainda um ponto de vista sobre o qual Lutero estava pronto a reconhecer que há um livre arbítrio (liberum arbitrium). Era o mesmo ponto de vista que Melanchthon enfatizava.  No Loci de 1521, que refletia uma forma de pensar estritamente determinista, o próprio Melanchthon afirmou que há "uma certa liberdade de obras exteriores" (libertas quaedam externorum operum).  O conselho dado em Ansbach, em 1524, se expressava numa forma bem similar.  Esse não foi de nenhum modo um afastamento da posição original, quando Melanchthon ainda incluía o tema da moralidade antiga em suas preleções e, como um meio de justificar a inclusão, afirmava que essa moralidade poderia ser obtida mediante o poder da vontade do homem.18  Ele defendeu na Confissão de Augsburgo e na Apologia, que o homem tem um livre arbítrio "até certo limite" em assuntos "que a razão compreende".    Finalmente, até a Fórmula de Concórdia, a despeito de seu ataque ao sinergismo, pôde aduzir enunciados similares por Lutero.  Pois Lutero, igualmente defendeu - e precisamente no seu escrito contra Erasmo - que o homem é senhor sobre as coisas que estão sob o pecado, que em relação a estas, ele possui "direito e livre arbítrio" (jus et liberum arbitrium).19  Portanto, nos escritos de Lutero e em todo o Luteranismo antigo, a negação do livre arbítrio não teve sua base nem no libertinismo, nem no determinismo filosófico. (p.24)   Quando Lutero falou sobre "as coisas inferiores" (inferiora), que ele esperava serem entendidas como subordinadas à liberdade do homem, ele pretendia exatamente o que Melanchthon tinha em mente quando disse isso sobre as coisas que estão sujeitas à razão (ratio): o âmbito interior da existência humana, do mundo, da consciência humana enquanto se aplica ao mundo.  Enquanto se mantém a posição da imanência, pode-se, por vontade própria, emitir  pensamentos e decisões.  Aqui o homem é autônomo.  Imanência e autonomia andam juntas. (p.25)
            Contudo, o nó da polêmica de Lutero não se encontra na questão se o homem tem a habilidade de fazer o que ele deseja fazer; ele deve ser encontrado na outra questão: se ele é capaz de fazer o que ele deveria fazer.  Em todas as circunstâncias, no entanto, o "deve" o golpeia de fora e por isso significa que foi aberta uma brecha na imanência.  O julgamento moral se extravia, quando tenta avaliar o homem segundo a medida da sua concordância com o "sentido moral" fixado pelo  próprio "sentido moral". O que é o pecado, o que é uma boa obra, aprender-se-ia antes "dos mandamentos de Deus e não da aparência, grande ou numerosa que as próprias obras possam ser, nem da aprovação dos homens ou da lei ou costume do homem" [WA 6,204,20].  A autonomia moral é destruída tão logo haja um rompimento com a imanência, que está sujeita ao mandamento divino.  Isso é o que Lutero pretende, quando nega que haja um livre arbítrio.  "O livre arbítrio é, por último, contra Deus" (Cessat liberum arbitrium erga deum) (WA 7,146,37).  Por conseguinte, a obrigação e responsabilidade do homem para com o "deve", ordenado por Deus, não está sendo, como o Edito de Worms falsamente conclui, deturpado ou mesmo negado.  Pelo contrário, elas são enfatizadas com o maior rigor. (p.25)

            Ao mesmo tempo, no entanto, a consideração de responsabilidade perante Deus leva consigo a auto acusação (accusatio sui) da parte do pecador.  E mais ainda, a admissão do pecado se estende a todas as áreas da vida.  Enquanto permanece o julgamento moral dentro do âmbito do que é meramente humano, pode-se medir um caso individual com base num caso individual.  Segundo a primeira tese da Reforma, no entanto, toda a vida deve ser arrependimento (WA 1,233,10).20  Essa palavra "toda" não deve ser tomada como a soma total de vários casos individuais; ela deve ser tomada como significando uma totalidade sobreposta.  O arrependimento deve conduzir diretamente para fora da esfera de reflexões que são meramente humanas. (p.25)  Ele deve colocar a totalidade da natureza humana diante de Deus.  Em todas as circunstâncias a invocação de Deus nos golpeia de fora - mesmo quando ela nos golpeia em nossa "própria" consciência - porque ela distribui um golpe destrutivo diretamente contra o que é puramente a própria natureza interior, isto é, nossa auto determinação autônoma.  Se a soma total da nossa vida moral é o resultado dessa auto determinação, a invocação a Deus, por isso, distribui um golpe destrutivo também ao homem todo, não apenas aos seus atos individuais.  Do íntimo, somos autônomos - portanto, também responsáveis.  Contudo, quando, conforme Lutero exigia, "olhamos para fora de nossa vida com os olhos de Deus", a vida e ao mesmo tempo a autonomia se reduzem ao "ponto matemático".  Perante Deus a autonomia não pode atingir cumprimento compreensivo.  Ela permanece apenas como uma exigência do nosso ego.  Contudo, essa exigência abraça tanto a nossa responsabilidade como nossa culpa diante de Deus.   Por isso, o que Lutero destacou em seu comentário sobre o Salmo 90, torna-se bem claro: o lado externo de nossa vida é morte. (p.26)

            Se, então, todas as inferências deterministas foram retiradas da experiência primeva (Urerlebnis), mesmo as inferências fatalistas não trazem nenhum alívio seja qual for a tensão terrível em que ela nos colocou.  Se as primeiras estão fundamentadas numa avaliação falsa do elemento moral, as últimas têm sua base na má interpretação da idéia de destino nelas contidas.  Poder-se-ia imaginar, de fato, que todo o medo de Deus teria sido aliviado, desde que o homem fosse capaz de reconhecer o poder do destino numa forma totalmente lógica e assim confiar-se completamente à mão do Criador.  Então esse reconhecimento e essa entrega de si mesmo realmente significaria que se "dá glória a Deus".  Nesse caso, a fenda seria tirada e a paz seria estabelecida entre Deus e Sua criatura.   Nessa crença, o misticismo alemão está de acordo com Espinoza e Goethe.  E mesmo Nietzsche andou por esse caminho: "Você não pode mais suportar seu destino dominador?  Ame-o!  Você não tem outra escolha!" (p.26)

            A primeira pergunta é:   Como é que o poder do destino que Deus tem sobre a vida realmente se torna imperceptível? Precisamente quando  ele  repousa  sobre  autoridade    absoluta (somente   então, de fato, faria sentido essa tentativa de relaxá-lo)  é que ele deveria ser apresentado como sendo tão extensivo quanto possível.   Na medida em que o homem é considerado, deve, por conseguinte, o poder do destino ser encontrado na totalidade da relação do homem com a vida.  Pois tudo o que vemos e reconhecemos, experiência e sofrimento, é nosso destino.  Evidentemente, o fato que nos Catecismos e alhures Lutero descreve a relação do homem ao seu meio ambiente enfatizando a origem divina do destino como a razão para se dar graças ou como um objeto de oração, não pode nos levar além desse ponto; pois ali ele está falando da perspectiva da fé.(p.26)  O homem, a quem são entregues as outras criaturas, já se encontra noutra relação para com Deus, diferente daquela da experiência primeva (Urerlebnis). (p.27)

            Pelo contrário, a pergunta é:  Como é que o homem experimenta o destino divino sem Cristo?  A resposta de Lutero é indubitável:  "Aquele que não tem fé, é prostrado perante todas as criaturas, e não há qualquer criatura que possa consolá-lo. Pois aquele que tem Deus como seu inimigo tem igualmente todas as criaturas de Deus em sua oposição; e isso nunca termina." (Qui fidem non habet, infa omnes creatures deiicitur, nec ulla creatura est, quae consolari ipsum possit.  Nam qui deum habet inimicum, is et omnes creaturas dei habet contrarias, hi non consistunt.)  (WA, 24,23,1).  Segundo Lutero, é precisamente a identificação de Deus com as criaturas ao nosso redor, isto é, com nosso meio ambiente - a identificação que edifica Spinoza e Goethe - que deprime  o homem sem Cristo, sim, intensifica seu temor.  "Todas as criaturas parecem ser nada, senão Deus e a sua ira, muito embora sejam uma folha sussurrante, conforme Moisés o diz em Lv 16" (WA 19,226,14). Aqui todas as criaturas tornam-se "chicotes e armas de Deus" (WA 17 II,59,6), onde está "o oceano com suas ondas e vagas" (WA 19,227,3) ou "doença, fome, peste, fogo, água, guerra"... ou "o governo" (WA 17 II, 59, 3ss.).  Tudo aterroriza, não porque não se pode superá-lo mas porque, estritamente falando, essas são armas de Deus dirigidas contra nós.21  (p.27)

            Será que Lutero está vendo fantasmas?  Estará falando aqui a fantasia cheia de adornos de um monge?  Ou está ele aqui meramente construindo uma situação com o objetivo posterior de ser capaz de extrair dela,  mais eficazmente, a liberdade e animação da pessoa que foi justificada - uma situação que realmente nenhum homem já experimentou?   Não se pode chegar a uma resposta completa antes de se saber o que Lutero entende por pecado.  Se o pecado fosse apenas desobediência, isto é, o desvio de uma norma, o dano poderia ser reparado imediatamente pela obediência, e o problema do destino estaria resolvido por "compostura".  Na realidade, no entanto, o pecado, no sentido estrito, é "inimizade contra Deus", isto é, oposição ativa à vontade de Deus, que, num grau semelhante é contra o pecado.  Deus responde ao pecado com um julgamento que pode terminar somente na nossa morte.  Mas, uma vez que, conforme desenvolvido anteriormente, aos olhos de Deus a marca do pecado não se adere apenas aos atos individuais, mas à totalidade da nossa vida, tornamo-nos desesperadamente sujeitos a esse julgamento, mesmo se, a partir de um momento particular em diante, tentemos pôr um fim à nossa oposição a Deus. (p.27)  Estava totalmente em conformidade com o que Lutero entendia quando mais tarde um aluno de Johann Musaeus disse como forma de objeção ao conceito de religião de Espinosa, segundo o qual, a obediência a Deus não poderia nunca levar em total consideração a relação do pecador com Deus, nem a relação da pessoa justificada com Deus; pois isto, também, era determinado, entre outras coisas, pelo "medo da ira divina" (metus irae divinae).22    Isso significa que não é a fé em Cristo que, a princípio, se dirige contra o "amor ao destino" (amor fati) de Espinosa, mas que mesmo na experiência elementar do destino Espinosa visualizou um ponto essencial.  Lutero também diz que é realmente o medo da ira de Deus.   É a expectativa do julgamento divino - não, contudo, apenas um mero temor de punição, mas como a experiência primeva (Urerlebnis) em que simplesmente não é possível equilibrar o pecado e a punição um contra o outro.  O poder de Deus sobre o destino é visto, não no fato que Ele molda nosso destino em geral, mas no fato que ele o molda de tal maneira que não podemos evitar o pecado.  Logicamente, a "submissão ao destino" implica igualmente submissão à inevitabilidade do pecado.  O "amor ao destino" (amor fati),que é ensinado como obediência a Deus, inclui a corroboração da oposição a Deus.  Mesmo que ele preferisse atingir o oposto, é ao mesmo tempo uma renovada provocação a Deus. (p.28)

            Se, portanto, o poder soberano de Deus sobre o destino realmente engloba todos os relacionamentos em nossa vida, não é nenhuma fantasia de Lutero mas um fato inegável que todas as criaturas, também, devem, em suas relações conosco, servir para executar o Seu inescrutável juízo sobre nós.  Para nós, "todas as criaturas estão mortas, pois todas elas têm uma conexão com Deus" (WA 24,578,5).  Mesmo o fatalismo não traz nenhum livramento do tormento da experiência primeva (Urerlebnis). (p.28)


            2. O PECADO 1(23)


            A experiência primeva (Urerlebnis) deve ser entendida como "relacionamento natural" do homem com Deus.  Ele é cheio de contradições existenciais.  Para isso o Iluminismo apontou e o tentou destruir.  A prontidão para revelação resulta da realização e reconhecimento da existência das contradições existenciais. (p.28)  A contradição contida no todo retorna da necessidade em conexão com todos os elementos individuais envolvidos pelo todo. (p.29)

            Isso é visto com clareza especial no conceito do pecado original.  O conceito é a síntese mais elementar do destino e da culpa, da dependência e da responsabilidade.  Realmente, uma consideração superficial pareceria indicar que aqui o problema real seria deferido e que o enigma do destino estaria "solucionado" com base em alguma história prévia.  É verdadeiro que o pecado original tem uma referência ao passado, a saber, ao fato que originalmente toda humanidade estava ligada ao princípio da nossa raça.  No entanto, por essa razão apenas, foi impossível para Lutero falar dele nos Artigos de Esmalcalde como pecado principal.  Pois o envolvimento que está no passado poderia, certamente, nos libertar, quanto muito, da responsabilidade.  E quando a Confissão de Augsburgo diz que o pecado original nos escraviza "desde o nascimento" (von Mutterleibe), o ponto é, não que ele está lá "desde o nascimento" mas, conforme Melanchthon enfatiza infatigavelmente na Apologia, que ele afetou todas as coisas envolvidas pela vida que nos foi transmitida.  O enunciado que o pecado original é concupiscência presta atenção à totalidade.  Pois é destacado enfaticamente que o homem todo está sob o domínio do pecado original.2 (24)   Contudo, a experiência primeva (Urerlebnis) se faz ouvir ainda mais agudamente quando o pecado original é caracterizado por se afirmar que o homem não pode possuir nenhum verdadeiro temor de Deus, nenhuma fé em Deus (CA II, AC I:8).  O erro de Flácio foi causado pelo medo que algo poderia ser subtraído da totalidade.  E quando a Fórmula de Concórdia o contestou, ela não tinha nenhuma intenção sequer de puncionar buracos nessa totalidade - que, ao contrário, ela manteve em toda sua extensão (DS I:11) - mas ela esperava definir a totalidade apenas de modo tal que a necessidade humana por livramento não indicasse que ele não poderia ser libertado.   Em nenhum caso a Fórmula de Concórdia desejou que a possibilidade de ser libertado fosse entendida como alguma predisposição "moral-religìosa" que seria isentada do relacionamento-culpa determinado pelo pecado original.  Lutero, igualmente, manteve a "aptidão passiva" (aptitudo passiva) ensinada pelos dogmáticos posteriores.  De fato, ele agira assim já contra Erasmo (WA 18,636, 18ss.). (p.29)   Quando a Fórmula de Concórdia oferece o motivo para essa aptidão ao enfatizar que, a despeito do pecado original, o homem é criatura de Deus, e isto é realmente um grande conforto para o homem de fé, com cujos olhos o assunto é observado.  No estado  do pavor primevo (Urgrauen), no entanto, este é o impulso final (Anstoss) para o desespero.  Pois a angústia (Not) da experiência primeva (Urerlebnis) encontra a mais aguda expressão precisamente no fato que a criatura de Deus está engolfada em desesperada oposição ao seu Criador. (p.30)

            Certamente, a doutrina do pecado original permitiu ao Luteranismo antigo manter vivos os seguintes fatores ligados à experiência primeva:  primeiro, que toda a nossa vida enquanto constituída pela natureza está bem distante de Deus;  segundo, a consideração de responsabilidade perante Deus  para toda a substância da nossa vida - ambos encontram-se dentro do conceito de pecado; terceiro, outrossim, igualmente a consideração que nossa vida toda é dependente  da origem a que estamos destinados - isso está dentro do conceito de pecado original.  Assim, a doutrina do pecado original estabelece o estado contraditório de negócios na experiência primeva (Urerlebnis) tão compreensivelmente quanto possível.   Certamente se poderia imaginar um procedimento doutrinário que deriva o conceito de pecado daquele do pecado original, visto que realmente em todas as circunstâncias o último inclui o anterior como um fator e também reconhece o estado de negócios em questão tão compreensivelmente quanto possível.  Talvez esta foi a norma da teologia escolástica - talvez, também, apenas a descrição convencionada pelo termo "pecado original" - que induziu os dogmáticos de uma época mais tardia a proceder de maneira completamente diferente.  O termo "pecado original" leva involuntariamente à tentação de interpretar seu conteúdo pretendido como uma instância especial do conceito geral de pecado.  Contudo, caso se proceda da última conclusão ao invés da primeira, logo surgiria o perigo de superficialidade.  Então a inevitabilidade do pecado facilmente parece ser um mero suplemento que poderia também ser abandonado.   Realmente, até a era do Iluminismo, a dogmática ainda não sucumbiu a esse perigo, porque ela aderiu firmemente à doutrina do pecado original conforme sustentada pela Reforma e constantemente procurou formular o conceito de pecado de tal maneira que o pecado original pudesse, afinal, ser incluído nesse conceito. Inobstante, os elementos contraditórios inerentes no estado de assuntos foram negados e, por fim, completamente ignorados. (p.30)

            Para Lutero, o conceito de pecado estava constantemente dirigido a Deus - não a uma lei impessoal que é transgredida.  Ele é dirigido a essa lei somente na medida em que essa lei é compreendida diretamente como a vontade de Deus.  Naturalmente, Lutero se apropria da doutrina paulina da Lei, especialmente os enunciados que a Lei leva ao conhecimento do pecado e - externamente - mantém ao sem Deus em cheque.  Mas, precisamente quando ela revela seu efeito completamente, conduz - no caso em que o Evangelho não for ouvido - mais profundamente à inimizade contra Deus. (p.30)  Com o pecado, Deus é ofendido.  (p.31) Murmuração contra Deus, sim, ódio de Deus, está inevitavelmente relacionado a isso.3 (25)   Mesmo em seu escrito contra Erasmo, Lutero - a despeito da sua ênfase na tese pertencente ao destino - declarou que o homem está em direta oposição a Deus.  Sobre Faraó, ele diz que, por causa da maldade de sua vontade, ele não poderia fazer diferente, senão odiar ao que estava "em oposição a ele" (contrarium sibi) (WA 18, 711, 35).  O endurecimento produzido por Deus leva a esse contrarium.  Ao ver Faraó devolvendo com ódio, Lutero - a despeito do "determinismo" - lhe atribui não apenas independência vis-à-vis Deus, mas igualmente uma ativa manifestação do seu ego, uma manifestação que é mais do que uma mera transgressão de obrigações legais.  (p.31)
É afirmado mais adiante (714,4) que Faraó é endurecido a tal ponto que ele resiste a Deus.  Ademais, também, nesse livro Lutero escreve sobre guerra, luta, inimizade, ódio humano contra Deus.4(26) Para ele, tudo isso é um resultado inevitável da reivindicação por autonomia, a reivindicação implícita na ilusão de que há um "livre arbítrio" (liberum arbitrium).   Aqui, Lutero igualmente não deixa nenhuma dúvida que em toda essa hostilidade contra Deus o pecado não é um tropeço ocasional, mas se liga sem vacilar a cada um de nossos passos.  "O homem sem Deus peca contra Deus quer ele coma ou beba" (In Deum peccat impius sive edat, sive bibat) (768,23). (p.31)

            "O coração do homem é inescrutável" (Cor hominis inscrutabile est), diz Lutero ao apropriar-se da expressão paulina "inimizade contra Deus" (WA 43,203,30).  Por isso a natureza do pecado realmente se torna incompreensível em mais do que um sentido.  No seu sermão do dia de ascensão, de 1522, Lutero reduz a relação primeva (Urerhaltnis) do homem que ainda está para ser gerado a uma fórmula inequívoca: "Portanto sempre há inimizade entre o homem e Deus, e eles não podem ser amigos ou estar em acordo um com o outro." (WA 10 III, 136,7).  É impossível expressar com maior rigidez a desproporção, no sentido de Lutero, do conceito que define o pecado meramente como um desvio do caminho correto.(p.31)   No entanto, mesmo no conceito geral de pecado de Lutero - não apenas do pecado original - aquela contradição insolúvel é mantida viva precisamente dessa forma.  O Criador cria a criatura, zela por ela e a guia.  Mas ele a cria de tal modo que ela é capaz de lutar contra Ele, sim, de odiá-Lo.  Como resultado, Ele próprio reage a isso com morte e destruição. (p.32)

            Muito embora se olhe em vão nos escritos de Melanchthon pela direitura desse conhecimento que Lutero possuía, já Melanchthon nunca desprezou a oposição a Deus que está implícita no pecado.  Quando ele define o pecado como conflito contra a Lei de Deus, ele não deixa de acrescentar "ofendendo a Deus" (offendens Deum). Contudo, desobediência à Lei é também "não apenas atual, mas universal, que na natureza humana é oposta a Deus" (non tantum actualis sed universa, quae est in natura hominis adversus Deum) (CR 21, 667).  E quão seriamente ele espera o relacionamento com Deus a ser assumido, é revelado no enunciado: "A razão entende que há ofensas contra a Lei de Deus, porém ela permanece indiferente para com a ira de Deus" (Ratio intelligit vitia contra legem Dei esse, sed iram Dei negligit). Ele, igualmente, está ciente do elemento completamente incompreensível na natureza do pecado.  Paulo, declara ele, fez uso daquela "expressão terrível" (Rm 87) a fim de permitir ao leitor considerar que a corrupção da natureza humana é muito grande para ser suficientemente entendida e estimada pela razão humana (CR 15,661).  Na Confissão de Augsburgo ele diz a respeito dos ateus que eles são hostis a Deus (XX,25).  Ele também está ciente da possibilidade do ódio a Deus (CR 16,286; 21,98,163).  Na edição final do Loci já é afirmado daqueles que não são convertidos a Deus que eles permanecerão "eternos inimigos de Deus" (21,876). (p.32)

            Conforme foi colocado, foi o propósito primário dos dogmáticos posteriores expressar o conceito de pecado de tal maneira que o pecado original pudesse ser incluído.  Por outro lado, a responsabilidade humana não deveria ser comprometida.  Por longo tempo foi evitada uma definição voluntarista, que deve ter sido melhor adaptada a fim de evitar que se perca de vista o elemento da contradição interior, obviamente porque parecia tornar-se perigosamente próxima ao "livre arbítrio" (liberum arbitrium).5(27)  Por isso a afirmação de João que o pecado é "transgressão da lei" (anomia) (1Jo 3.4) era muito bem-vinda.(p.32)  Ela era tão flexível que tanto o elemento ativo de "pecados em obras" (Tatsunden) e o elemento destino-controlado (schicksalhaft) do pecado original podiam ser incluídos nela; e ao mesmo tempo permitia uma conexão com as linhas de pensamento paulinas concernentes à Lei, pecado, culpa e punição.6(28)   Certamente a partir desse ponto em diante tudo o que os dogmáticos têm a dizer sobre o pecado está concentrado grandemente no enunciado: "O pecado é um desvio da Lei divina" (Peccatum est aberratio a lege divina).7(29)  Naturalmente, essa sentença  poderia igualmente ser o ponto de partida para a compreensão que a Reforma baseava em Paulo.  Contudo, ela não expressava o relacionamento diretamente pessoal com Deus.  Pelo contrário, essa definição está fundamentada sobre a descrição de um errante que se  perde do caminho certo.   Fazendo assim, ele certamente se expõe ao perigo, sim, talvez já esteja caído no abismo. Normalmente, no entanto, surge o socorro chamando-o de volta para fora do abismo, reerguendo-o, ou auxiliando-o a sair dele.  Essa definição ignora o elemento da oposição real a Deus que determina o conceito de pecado de Lutero.  Conseqüentemente ela igualmente pode iludir a pessoa como para aquele estado de negócios na experiência primeva (Urerlebnis) e dar apoio franco à idéia que o homem pode fazer correções  às transgressões individuais das exigências da Lei.  Então isto seria o fim não apenas da teologia de Lutero, mas também de Paulo. (p.33)

            Os dogmáticos do Iluminismo sucumbiram a esse perigo.  A partir daquela alegada definição de pecado em 1Jo 3.4, Johann Gottlieb Tollner desenvolveu, entre outras coisas, as duas afirmações: "Todo pecado atual surge de um conceito vago" e "todo pecado atual surge da falha no uso da liberdade." 8(30)  Aqui o fato que o pecado é uma atividade desempenhada diretamente contra Deus é completamente ignorada. (p.33)   Na realidade, ele não é mais nem julgado com base na Lei objetiva de Deus.  Ele é agora apenas aquilo que impede nossa realização do homem ideal.  Ali onde há conhecimento do pecado, o pensamento do homem não está mais direcionado a Deus, mas a si mesmo.(p.34)

            O segundo enunciado de Tollner aponta além de si mesmo para a filosofia da religião, de Kant.  Exatamente assim como os antigos dogmáticos, Kant, também, denomina o pecado uma "transgressão da lei moral enquanto mandamento divino".9(31)  É verdade que ele não se refere à falha no exercício da liberdade, assim como Tollner.  Pelo contrário, ele mantém a inteligibilidade daquilo "que é radicalmente mau na natureza humana", precisamente a fim de preservar o seu caráter de liberdade.10(32)  Ademais, Kant e Tollner estão de acordo na convicção que deve "ser possível sobrepujar" a propensão má (que é radicalmente má) "porque ela é encontrada no homem como algo que possui liberdade de ação."  Aqui se percebe como a humanização do  conceito de pecado igualmente leva consigo um mau julgamento catastrófico do que o homem pode fazer.  É igualmente lógico quando nos escritos de dogmáticos racionalistas como Semler e Wegscheider a associação do pecado com a doutrina da liberdade leva a um ataque furioso à doutrina do pecado original conforme mantida pela Reforma.  Neste, Wegscheider - referindo-se ao sermão de Reinhard, "Que todo homem tem seu preço, pelo qual se rende" (Das jeder Mensch seinen Preis hat, wofur er sich hingibt) - vê o perigo mais grave para aquele que está moralmente errado.11(33)  Agora havia apenas um passo a Schiller, que considerou o direito de um filósofo "congratular" a natureza humana no primeiro pecado, esse "fabuloso progresso da humanidade."12(34)  No primeiro enunciado de Tollner, que todo pecado atual surge de um conceito vago - e, conforme afirma mais tarde, "confuso", pode-se encontrar o precursor do ensino de Schleiermacher que todo pecado "atual" é "uma contaminação da consciência de Deus" (Glaubenslehre, 2 ed. 74,2).  Porém, não se pode negar que ao relatar o pecado contra Deus - muito embora apenas na forma de consciência de Deus -Schleiermacher está, num certo sentido, voltando à doutrina da Reforma. (p.34)

            Realmente, mesmo em Kant e Schiller, pode-se encontrar sugestões da experiência primeva (Urerlebnis) da Reforma.  Schiller, o dramaturgo, sabe da trágica síntese do destino e da culpa - um conhecimento que, em vista dos fatos da nossa vida, nenhuma pessoa eticamente esclarecida pode fugir.  Na filosofia da religião, de Kant, realmente se procura em vão.  Por outro lado, seu dualismo da razão teórica e a razão prática fornece evidência de uma teologia correlata.  A primeira ensina o envolvimento incondicional do homem na interdependência de causa e efeito na natureza;  a última ensina a sua independência da natureza enquanto um "ser moral". (ein sittliches Wesen).  Já a segunda permanece apenas uma exigência.  Pode-se falar em independência moral atual apenas enquanto se mede o homem meramente por sua própria razão.  No entanto, essa independência parece uma ilusão se, assim como em Lutero, ela confronta a Deus.(p.35)


            3. A LEI E A IRA DE DEUS 1(35)

            Perante o "Deus oculto", a experiência primeva (Urerlebnis) chega ao fim.  Mas o fato que Deus é oculto não significa que não conhecemos absolutamente nada sobre Ele.  Duas coisas nós sabemos muito bem: que Ele ordena "Tu deves" e que Ele nos deixa nascermos num estado que torna o cumprimento desse "Tu deves" impossível para nós.  O sentido e propósito dessa contradição nos são  ocultos.   O próprio Deus está oculto a nós, porque ele tem outros pensamentos, diferentes,  a nosso respeito.  Falando logicamente, a desconfiança que nos sobrevém enquanto consideramos a incapacidade da nossa razão para resolver a contradição, deve igualmente ter um ponto de apoio em toda a tentativa presente de se chegar a um conhecimento de Deus.   Se nós somos totalmente pecado - na totalidade do nosso fazer e pensar - será isso, talvez, também a experiência primeva toda? Lutero não hesita em dar uma resposta afirmativa a essa pergunta. Pois a experiência primeva produz descrença. (p.35)

            Contudo, a inevitabilidade de nosso destino torna-se clara pelo fato que, além de tudo, não podemos de modo algum negar os fatos individuais que têm um ponto de apoio um no outro na experiência primeva.  A fim de preservar-nos, acima de tudo, da auto-decepção, como se fôssemos capazes de fugir do pecado ignorando o "Tu deves", Deus se nos "revela" na Lei.  Realmente, essa revelação já ocorreu - segundo Paulo - na consciência, que ouvimos falar-nos na experiência primeva.  Aí, somos assaltados pela dúvida, e o desespero da incredulidade nos obscurece. Em segundo lugar, essa revelação ocorre na história, quando Deus dá a Lei.   A Escritura nos fala a respeito.  Esses dois anúncios sobre a vontade divina, possuem uma relação recíproca uma com a outra.  A outorga divina da Lei, registrada no Antigo Testamento, deve ser entendida como uma proclamação ao antigo povo da aliança; ela não pode ser transferida sem alarido futuro a outros povos e épocas.  Outrossim, ela confirma o que a consciência conhece: que Deus fez exigências definidas sobre os homens. Sim, acima e além disso, a consciência igualmente afirma aquelas exigências segundo o seu conteúdo específico - além do que nada as caracteriza como irrepetíveis na história.  "portanto, eu guardo os mandamentos que Moisés deu, não porque Moisés os deu, mas porque eles foram implantados em mim por natureza; e aqui Moisés está em acordo com a natureza" (WA 24,10,3).  Naturalmente a correspondência da Lei escrita ou proclamada com a Lei implantada não é acidental.  A primeira nos deixaria intocáveis, caso não existisse a última. Se ela é proclamada, o coração do homem responde: "Assim é!"  Mas o oposto também é verdadeiro: a oposição de Satanás cega o coração de tal modo que a Palavra proclamada precisa primeiro despertar aquela voz do coração (WA 16,447,10).  Por meio daquela correspondência a voz da Lei em nossa consciência aponta através de si mesma a algo supra individual e transmundano, a um regulamento que possui validade quer o afirmemos ou não.2(36)  A Lei encara a consciência na condição de algo além, algo que exige sem mostrar a possibilidade de cumprimento (WA 18,677,7ss.), algo que faz uma acusação e requer satisfação (WA 12,679,17ss.).  A consciência e a Lei de modo algum são idênticas.  Chega um momento em que a consciência até se livra da Lei, quando ela diz a Moisés, que deseja lutar contra ela: "Você é um herege!" (WA 40 I, 558,4).  Mas isso realmente pressupõe o Evangelho.  A partir desse momento, a consciência deve em cada caso afirmar incondicionalmente o regulamento que a confronta.  A correspondência entre a consciência e a Lei destaca que ambas têm a sua origem no Criador (WA 50,331,15). (p.36)

            O reconhecimento da validade da Lei não é cumprimento.   Pelo contrário, a Lei nos confirma a exatidão da experiência primeva.   Ela nos revela a incompatibilidade entre  nossa capacidade e obrigação.  Ela ilumina a escuridão em que estávamos perdidos; mas ela é "uma luz de tal natureza que revela doença, pecado, mal, morte, inferno e ira de Deus. (p.36)  Porém ela não nos ajuda ou liberta disso.  Ela se contenta em havê-lo revelado.  Então o homem, após considerar a doença do pecado, fica triste, aflito, sim, em desespero." (talis lux, quae ostendat morbum, peccatum, malum, mortem, infernum, iram Dei.  Sed non iuvat nec liberat ab istis.  Ostendisse contenta est.  Tum homocognitio morbo peccati tristatur, affligitur, imo desperat.)  (WA 18, 766, 25). A Lei mostra ao homem "o que ele deveria fazer, não o que ele pode fazer" (WA 50, 474,20).  Ela nos torna culpados.  Ela acusa, amaldiçoa, mata.  Ela faz do coração um inferno e confirma para nós que a experiência primeva ocorre com a cooperação de Deus.3(37)

            A Lei ainda parece dirigir-se além da situação anteriormente desenvolvida, em que o pecador está em conflito com Deus.  Se naquela situação o homem encarou Deus em absoluta solidão, que o "assalta" (angreift) pessoalmente no seu todo, e o precipita arbitrariamente, assim o parece, em completa necessidade enquanto são considerados o conhecimento e a benevolência, sim, o conduz ao desespero, dessa forma o conceito e o conteúdo da Lei introduzem um elemento de ordem, um elemento que primeiro parece servir como uma libertação.(p.37)  Depois de tudo, a vontade de Deus, vis-à-vis a criatura, inobstante não é pura arbitrariedade.  Ele a colocou numa forma que é "eterna e inalterável" e, como resultado, também oferece uma certa medida de segurança.  Em acréscimo, a forma imperativa da Lei rompe a compulsão determinada pela natureza e troca o néscio "precisas" por um brilhante "deves".  A percepção desse "deves" nos torna seres humanos racionais.  É a consciência que nos distingue do asno, a quem se proclamaria a Lei em vão por centenas de anos, porque ele não sente a Lei no seu coração (WA 16,447,10).(p.37)

            Em conexão a essas reflexões, certamente é correto dizer que mediante a Lei algo geral entra no semelhante caráter de todo individual do mandamento divino, algo que em qualquer caso proíbe o pensamento de arbitrariedade da parte de Deus.  No entanto, Ele não é, de fato, apenas o Legislador.  Ele é também o Juiz.  Ter Deus como Juiz, proíbe alguém ainda de referir-se a Seu julgamento unicamente a assuntos individuais em nosso vida e naquilo que fazemos, para oferecer-Lhe ações ou desculpas, obras ou méritos.(p.37)  Ele está além dos limites da nossa vida.  Por isso, ele sempre vê a nossa vida como um todo.   Realmente, Ele precisa sempre julgá-la como um todo.  Isso, porém, imediatamente faz vir sobre nós um elemento de incerteza, porque sempre vemos apenas os assuntos individuais e, como resultado, mesmo no caso de cumprimento de mandamentos individuais, nunca poderíamos ter certeza que temos satisfeito os requerimentos do todo (WA 18,783,26).  Sim, essa incerteza muda bem rapidamente para a terrível certeza que Eu fui sem sucesso não apenas em assuntos individuais e, por isso, tenho cometido pecado, mas que Eu sou um pecador.  A moralidade do homem não pode ser determinada pela soma total dos seus pensamentos e ações.  O caso é o oposto.  Seus pensamentos e ações podem obter seu caráter moral somente a partir da personalidade total (WA 1, 188,12ss.; WA 7,32,4ss.). A Lei não deve apenas ser guardada; ela deve ser amada (WA 10 I,1,467,6). Porém, se o homem nunca pode transformar-se noutra pessoa, nem a Lei, por qualquer modo, o tira da angústia em que anteriormente o vimos submerso.  Pelo contrário, a Lei reforça com inquestionável clareza a contradição em que o homem se encontra por natureza: "Tu não cumpriste, nem és capaz de fazê-lo.  Não obstante, tu deverias." (Non implesti, nec potes, et tamen debes) (WA 40 I,256,15). (p.38)

            O acréscimo que a Lei significa para a tensão entre Deus e o pecador não está finalmente no conceito da Lei.  Se ela impede o pensamento da arbitrariedade de Deus num mau sentido, ela igualmente impede a esperança da Sua arbitrariedade num bom sentido.  Um juiz procede segundo o direito e a lei.  Por isso ele não sentencia arbitrariamente.  Mas ele também não pode absolver arbitrariamente.   Encarando o homem na qualidade de Legislador e Juiz, Deus revela um aspecto da Sua natureza que está fundamentado na Sua qualidade de Criador, mas não é exaustivamente expressa por essa característica.  Quando Deus impõe exigências legais sobre as Suas criaturas, a pura inter-relação de causa e efeito entre Deus e o homem é rompida em cada caso num só lado.  Mas dessa maneira, o relacionamento legal é estabelecido, em que Deus e o homem encaram um ao outro em relativa independência.  E esse relacionamento legal já está implícito no conceito de Lei -  por isso, conforme será mencionado aqui, não parece de início a doutrina Luterana da justificação. (p.38)

            No sentido de Lutero, no entanto, deve-se ter em mente que o Legislador e Juiz é e permanece sendo também o Criador.   Se para Ele o pecado não é apenas a ultrapassagem de um limite mas, conforme demonstrado , "inimizade contra Deus", Lutero igualmente aprende da Escritura, e especialmente ainda de Paulo, que Deus não pode dar uma resposta a isso além da forma de um juiz que não está  pessoalmente preocupado.(p.38) "Toda a raça humana estava reservada ao ódio" (WA 1,274,28).  A justiça e fidelidade de Deus que o impelem a guardar Sua própria Palavra incondicionalmente, fazem dele, ao mesmo tempo, um fanático que não pode tolerar o pecado (WA 40 II,332,3).  Contra o pecador, esse zelo pela Sua justiça parece ira que deve consumir o pecador precisamente porque os pecados são conseqüências de todo o ser do pecador (WA 14,595,34).  Como Juiz, Deus deve punir; como Criador e Senhor sobre todas as Criaturas, Ele pode punir e deseja fazê-lo. (WA 28, 582,3). Deus, em sua majestade, e as criaturas humanas, são inimigos (WA 40 II, 329,10).  E visto que a consciência é aquele lugar no homem onde sua consciência de ser uma criatura está ciente da oposição à Lei, para Lutero ela é ao mesmo tempo o ouvido com que ele ouve a voz da ira divina (WA 42,429,6). (p.39)

            Lutero destaca sempre de novo como a razão se eriça diante da idéia da ira de Deus.  Ela seria capaz de reconhecer Sua justiça, se é que, por esse meio, pode ser pretendida uma relação razoável entre o pecado e a punição.  Isso, porém, implicaria um estabelecimento imanente,  que ignora ou nega a própria transcendência da Majestade divina.  É precisamente na Sua ira que Sua majestade se expressa, e a sua ira vai além de um equilíbrio segundo a razão.   Toda a ética da igreja medieval, especialmente a doutrina da penitência, estava preocupada com a idéia de um estabelecimento segundo a razão. Portanto, os defensores dessa doutrina "tornaram-se seguidores de Aristóteles, o gentio morto, maldito" (WA ! 10 I,1,472,10).  Essa doutrina presumia "lidar com Deus como se Deus e a nossa natureza fossem bons amigos" (473,19).  Assim teve o resultado que "ninguém, reconhece, lamenta ou deplora a terrível ira de Deus contra nós."  O choque da relação de Deus com o homem como Legislador e Juiz  (que Lhe permite exigir e sentenciar)  com a Sua relação como Criador  (que faz do homem o que ele é)  isso é realmente a mais profunda ofensa à razão.  A razão assim considera: "Está errado  uma tão suprema Majestade fazer isso" (WA 36,556,12).  Ela exige "que Deus aja segundo a lei humana e faça o que lhes parece ser correto ou que Deus permitiria ser correto" (ut Deus agat jure humano et faciat quod ipsis rectum videtur eut Deus esse sinat) (WA 18,729,15). Ela tenta sempre de novo encontrar fundamentos imanentes para justificar a atitude de Deus.  "Porém, a fé  e o espírito julgam diferente.  Eles crêem que Deus é bom, mesmo se Ele destruísse todos os homens." (Sed fides et spiritus aliter judicant, qui Deum bonum credunt, etiam si omnes homines perderet.) (WA 18,708,7ss) (p.39)

            A fé e o espírito (naturalmente, eles não podem chegar a isso sozinhos).  Se eles somente, a despeito de todo o estado de ocupações, que encerra com a maldição do homem, são capazes de reconhecer a bondade de Deus, isso é a prova final do fato imanente que é impossível resolver os enigmas aqui presentes.(p.39)  Ao mesmo tempo, a conclusão que a incredulidade é o maior pecado começa a derrubar, sim, a conclusão que a incredulidade é a essência real do pecado (Preleções sobre Hebreus, 188,7; WA 18,782,13).  Essa conclusão, porém, não pode ser completa até que o homem tenha aprendido a crer. (p.40)

            Nas confissões, nada tem sido subtraído do ensino de Lutero sobre a ira de Deus, sobre a sua relação próxima com a Lei, a morte e a consciência.  Assim como Lutero, Melanchthon (também na Apologia), relaciona o erro fundamental da ética medieval com o fato que essa ética nunca conheceu o que é a ira de Deus. Segundo o mesmo, essa é a razão para a sua crença que se pode amar a Deus sem primeiro receber o perdão dos pecados.  Pode-se temer o Deus irado, mas não se pode amá-lo.  É igualmente impossível confrontar a ira de Deus com os méritos próprios 4(38)   Por quê? Lutero o sublinha com a idéia que então é que Deus estaria lidando com o homem segundo a "lei humana" (jure humano).  Então se confundiria a ira de Deus com a justiça imanente. Melanchthon, igualmente, considera a tentativa de se colocar a Lei de Deus e as obras humanas numa relação plausível uma "doutrina da razão" (doctrina rationis) (III,167). Quando, em contraste, ele destaca que a Lei de Deus revela a Sua ira (II,79), ele igualmente vê na ira de Deus uma realidade que se encontra além dos conceitos humanos de direito e justiça.  Ele também considera "inexplicável" (inexplicabilis) a ira de Deus (V,34); e Justus Jonas afirma na tradução em Alemão que está "além da compreensão e pensamento humanos quão terrível ira de Deus nós herdamos" (43).5(39)  Exatamente assim como Lutero, a Apologia vê a consciência como o lugar onde a ira de Deus golpeia (32); e, assim como ele, ensina que a morte não é considerada uma punição até que essa ira tenha caído (VI,56).  Assim como em Lutero, ouvimos que a Lei não tem apenas a tarefa de dar instrução a respeito da vontade de Deus, mas também de acusar constantemente e atormentar consciências (V,34), visto que ela revela a ira de Deus.  De fato, nosso coração se altera diante disso; ele tenta aquietar-se na segurança; ele "despreza a ira, o juízo e as ameaças de Deus.  É malicioso e hostil ao Seu julgamento." (II,35).   No entanto, isto apenas agrava nossa culpa, pois a dúvida a respeito da ira de Deus não é um adiáphoron (I,42).  Finalmente, em contraste com o ensino Calvinista, deve-se ainda destacar que segundo a Apologia todos os homens são merecedores da "ira eterna" (ira aeterna) (II,40). (p.40)

            Em todos os pontos decisivos, igualmente, a Fórmula de Concórdia permanece naquilo que Lutero pensava sobre a ira de Deus.6(40)   Tanto quanto Flacius é considerado, isso é auto evidente.  Mas então um sutil declínio iniciou-se.  É verdade que em conexão com a doutrina sobre a Lei, a punição e especialmente a morte, eles usam regularmente a expressão "ira de Deus".  Contudo, isso se parece com uma punição entre outras.  Isso se torna perceptível até nos escritos de Johann Gerhard.  Aqui o pecado e a ira de Deus encontram-se numa inter relação simples de causa e efeito.  A ira é "a justa ira do Deus vingativo" (justa vindicis Dei ira) (Loci XX,178).  Ela está na proporção exata com o pecado (199).  Por isso, Gerhard precisa propor a questão se a doutrina sobre a ira de Deus é de todo compatível com a Sua justiça.  A isto ele responde que a Escritura usa a expressão "somente com referência ao sentimento humano" (anqrwpopaqwz). Sem nenhum comentário, ele cita a opinião de Agostinho que a Escritura chama de ira de Deus aquilo que é feito no caso dos seus servos, porque é feito por meio das leis divinas.  Ele se apropria da argumentação dos escolásticos que, estritamente falando, não se pode atribuir qualquer ira a Deus.(III,176)  Se para Lutero e também para a Apologia de Melanchthon a ira de Deus era prova de que não se deve nem se pode compreender a relação de Deus com o pecador segundo "lei humana" (jure humano), no sentido da "doutrina da razão" (doctrina rationis), a segurança contra esse erro corre risco de se perder por causa dos devaneios de Gerhard.   Isso é visto claramente no fato que, com respeito a essa questão, ele luta contra os Arminianos e os Socinianos com armas insignificantes (VII,47s.). A incapacidade toda dos dogmáticos posteriores captarem a doutrina de Lutero sobre a ira de Deus num sentido mais profundo está ligada ao progresso feito pela "teologia natural", conforme será descrito adiante.(p.41)

            As restrições de Gerhard possibilitaram até aos dogmáticos do Iluminismo empregarem o conceito da ira de Deus.  Para eles, ela é meramente uma expressão bíblica da desaprovação de Deus ao pecado.  De acordo com o seu sistema todo, o pecado e a reação de Deus ao pecado estão, conforme eles vêem a situação, em proporção aritmética.7(41) (p.41)

            Foi feita uma outra tentativa de levar em consideração, como assunto de dogmática, o terrível mistério que Lutero percebeu na ira de Deus.  Foram os dogmáticos do século XIX que tentaram fazê-lo.  Eles partiram de vários pontos.  Embora A. Ritschl tentasse banir totalmente esse conceito da dogmática cristã, ele ensinava que ainda tinha um direito de atribuir-lhe um sentido escatológico no Novo Testamento.  Julius Kaftan tinha uma opinião parecida.  Ele igualmente adotou uma interpretação proporcional - que, incidentalmente, volta a Agostinho - quando ilustrou sua força e sua magnitude afirmando que essa ira "pode ser satisfeita e silenciada somente por miséria constante e infindável de nossa parte".   Por fim, ele chega perto da interpretação de Lutero, quando associa a angústia de consciência diretamente com a ira de Deus.  Com base nas suas conclusões bíblicas, Kähler considerou que o conceito da ira enfatiza a personalidade de Deus em conexão com a Sua reação ao pecado.  Ele também diz que a conseqüência destaca que aquele que é excluído da comunhão com Deus ao avaliar algo, nunca chega ao valor real.   Frank, igualmente, liga a ira com a reação pessoal de Deus ao pecado.  Quando ele descreve a ira a partir do "Deus absoluto , pessoal, em Sua relação com o mundo", não se pode permitir que a recordação desse conceito de absoluto leve à conclusão que ele, também, chegou bem próximo à interpretação de Lutero.  Afinal, tanto aqui, como também em Lutero o pressuposto que Deus lida com o pecador segundo a "lei humana" (jure humano) está fora de questão.8(42) (p.42)

            Contudo, esta é de fato a consideração decisiva de Lutero, em que ele ensina a respeito da ira de Deus.  A Lei certamente revela a "lei moral do mundo", e a consciência certamente não pode evitar o reconhecimento da validade dessa lei.  Porém a distância que a consciência percebe entre ela mesma e a Lei é algo totalmente diferente da descoberta que em lugar da lei moral o homem colocou a confusão, que ele transgredira várias secções.  A Lei, de nenhum modo pode neutralizar o chamado pessoal de Deus que o homem ouve em sua consciência.  Nem pode sugerir liberdade moral ao homem.  Antes, ela o convence da sua falta de liberdade. O homem perde a liberdade tanto porque a Lei lhe fora dada e porque ele não é capaz de cumpri-la.  Uma mera ciência de transgressão poderia ser considerada fácil se um pecado individual pudesse ser expiado por uma punição individual correspondente.  Isso regularia o assunto segundo a "lei humana" (jure humano). Segundo a Lei divina, porém, uma transgressão individual torna alguém culpado do todo:  o homem todo está em oposição a Lei toda - como criatura total, ele está em oposição ao seu Criador.  Sendo isso verdadeiro quanto  à existência toda do homem conforme estabelecida pelo Criador, o homem conclui: "Deus me odeia" (Odit me Deus).  Esta, afirma Lutero, é "a maior tentação" ( summa tentatio).  Mas enquanto ele conhece a Deus apenas como o Criador e Legislador, o homem não pode olhar para isso como uma tentação que pode ser vencida.   Ele é incapaz de descobrir qualquer lógica imanente nessa relação com Deus - nem qualquer justiça compreensível segundo a "lei humana" (jure humano).  A lei, essa "lei moral do mundo", é a maldição que oprime o homem. (p.43)


                        4. MEDO 1(43)

            Os conceitos de medo da Lei e da ira de Deus impedem a conclusão que a experiência primeva (Urerlebnis) nada mais era senão uma ocorrência individual na vida de Lutero.  Dever-se-ia ante afirmar que ninguém que toma a sério os fatos do "Tu deves" e a incapacidade para obedecer, da culpa e do destino,  da mesma maneira pode fugir da consideração de Lutero: "Tu não cumpriste, nem és capaz de fazê-lo. No entanto, tu deves" (Non implesti, non potes, et tamen debes).  Aquele que reconhece a voz de Deus no "Tu deves", Seu veredicto sobre o pecado, Sua obra no destino, este se encontra, assim como Lutero, necessariamente, perante o "Deus oculto" (Deus absconditus), em cuja presença não se pode estar cheio de nada mais além do terror.  Conforme o que foi apresentado concernente à atenuação dos conceitos de pecado e da ira de Deus, não surpreende que no Luteranismo antigo esse conhecimento logo foi deturpado, por fim, completamente perdido. (p.43)  Em conexão com a experiência primeva (Urerlebnis), que interliga esses conceitos teologicamente, a falsificação prossegue em duas direções.  Por um lado, o medo de Lutero, com sua base existencial de conhecimento, nada mais se tornou senão um assunto de emoção.   A tarefa de se usar o evangelho para se superar o "medo" daqueles que estavam atribulados foi acertadamente atribuída à proclamação da igreja.  Isto, no entanto, levou à crença - e isso não era correto - que não era nem imperativo, nem necessário, perseguir futuramente o conhecimento em que se baseava o medo de Lutero.  O que era ensinado com respeito a um conhecimento de Deus pré-evangélico e extra-cristão poderia, supunha-se, ser entendido de tal maneira que as consciências não precisavam ser terrificadas por causa disso.  A "teologia natural" que resultou disso, foi o segundo atalho para a falsificação.(p.44)

            Seria uma interpretação totalmente inadequada do medo de Lutero defini-lo como um mero medo de punição.  Certamente pode-se também encontrá-lo no seu temor (WA 5,217,26).  De forma semelhante, ele contém um pessimismo universal que transfere a obscura perspectiva do futuro próprio para o julgamento do mundo em geral (cf. A Cruz e o Vale de Lágrimas).  No entanto, esse pessimismo também se encontra na periferia como um efeito acidental.  O pavor primevo (Urgrauen) não é, realmente, um alarme sobre o próprio destino; ele é pavor de Deus.  Ele é alarme sobre o próprio destino somente enquanto procedente do conhecimento que, a despeito da Lei e da vontade de cumprir a Lei, o indivíduo se encontra em estado de culpa permanente e deve servir ao pecado (WA 40 II,8,7).    Esse conhecimento, porém, é terrível porque olhar para o Criador e Senhor de nosso destino não o alivia, mas o confirma ou até concretiza  diretamente.  Aqui, o homem se encontra novamente perante a majestade de Deus; mas "então o próprio pescoço é quebrado, Lúcifer cai e há desespero eterno" (da folget hals stortzen, casus Luciferi et desperationes sempiternae) (ibid., 330,12). (p.44)

            Conforme fora demonstrado, Melanchthon, seguindo os caminhos de Lutero, tentou deixar se revelarem teologicamente não apenas o elemento ativo do pecado, mas também a ira de Deus e a doutrina do pecado original.  Poder-se-ia pensar que então ele deve também sentido a contradição insolúvel da experiência primeva (Urerlebnis).  Ele, porém, logo acrescentou qualificativos. Timidamente fugiu do ensino que a culpa e o destino estão entrelaçados - o ensino que não pode ser evitado quando a doutrina do pecado original é apresentada logicamente.  Ele conhece apenas o ensino estóico do destino, e alerta contra ele (CR 21,650).  Aqui já se tem a noção do primeiro ímpeto contra a racionalização.  Seria melhor não dizer nada a respeito do destino.  Além do mais, a responsabilidade, isto é, a moralidade é posta em perigo.(p.44) A conseqüência inevitável é que então o pecado, a ira e a punição são colocados numa cadeia simplesmente lógica que é totalmente compreensível à razão,2(44) enquanto Lutero fala da ira precisamente porque a razão é incapaz de entender a atitude de Deus contra o pecado.  Por conseguinte, em Melanchthon se perde o elemento agnóstico do "cancelamento" de Deus e o medo de Deus, que em Lutero estão inseparavelmente unidos. É verdade que o conhecimento original, adequado de Deus é perdido por causa do pecado (21, 669).  Será observado mais adiante que no processo afirma-se que a "ignorância na mente" (ignorantia in mente) permaneceu após uma variedade de bons remanescentes.  Em acréscimo a isso, existem, como conseqüência posterior do pecado, os terrores de consciência sobre os quais Melanchthon também pôs forte ênfase, mas que não possuem nenhuma ligação íntima com o primeiro resultado.   Este é exatamente o caso nos escritos dos dogmáticos posteriores, a partir de Martin Chemnitz e desde Johann Gerhard.  Assim como a ira de Deus é uma proporção aritmética para o pecado, assim esta é para os terrores de consciência.  Do medo primevo (Urgrauen) surgiram em parte o temor  da punição e em parte um conhecimento "imperfeito" de Deus. 3(45) (p.45)

            Se, por essa razão, o conhecimento profundo que, no caso de Lutero, está no centro do medo primevo (Urgrauen) é esquecido nos dogmáticos, pode-se estar pouco surpreso que na pregação da igreja seu temor de Deus igualmente se torne algo completamente diferente.  Em Lutero, trata-se de algo que simplesmente deve ser vencido.  O Evangelho traz um conhecimento de Deus que é exatamente o oposto - um conhecimento, realmente, que pode ser obtido somente pela fé, visto que é a fé que deve vencer aquele pavor primevo (Urgrauen).  No entanto, mesmo na literatura da morte (Sterbeliteratur) que continua a surgir no Luteranismo no século XVI segundo normas medievais, aparecem elementos individuais do terror de Lutero como características de um crente. Eles não devem ser derrotados, porém cultivados. Naturalmente, não os terrores de consciência - contra esses são direcionados os livros de Johann Arnd sobre o verdadeiro cristianismo (1603) e as Meditações Sagradas (Meditationes sacrae) de Johann Gerhard (1606), discípulo de Arnd. (p.45)  Pensa-se, outrossim, naqueles elementos pessimistas universais que  igualmente estão contidos no terror de Lutero mas, juntamente com esse terror, devem ser vencidos pela fé (cf. A Cruz e o Vale de Lágrimas).  Por volta de 1593, no Manual de Preparação para a Morte (Manuale de praeparatione ad mortem) de Martin Möller, pastor em Sprottau, é firmado que um cristão deveria ser induzido a pensar constantemente na morte.  E Johann Arnd, assim como Johann Gerhard, tenta incutir em seus leitores a futilidade e a transitoriedade do mundo. Em Lutero o ensino sobre a morte e a transitoriedade é (devido à sua compreensão deste a partir de Deus) um elemento no terror de Deus, por conseguinte, uma forma de se expressar a dúvida a respeito de Deus, que, com a ameaça da morte, parece contradizer a Sua vontade como Criador ou antes, em vista da culpa do homem, deve contradizê-la.  No entanto, por causa da Palavra do Evangelho, a fé chega ao conhecimento que o Criador não nega a Sua criatura mas a reconhece.  Por conseguinte, o crente enquanto anda através da natureza de Deus, experimentará as alegrias de Paul Gerhardt, não as angústias de Johann Gerhard. (p.46)

            Em contradição à sua intenção de recomendar as alegrias do céu, a literatura de transitoriedade se liga precisamente ao presente mundo ao instruir o cristão a fazer dos sofrimentos empíricos e da necessidade da morte física a base da sua consciência vital.  Heinrich Müller, de Rostock, nas suas Horas de Conforto Espiritual (Geistliche Erquickstunden) (1664), pode oferecer um franca descrição dos "perigos de uma vida longa" e instruir seus leitores a temerem a vida neste mundo mais do que a morte.  Aqui um outro elemento do temor de Lutero é desenredado do pavor primevo (Urgrauen): a conclusão de inevitável confusão na culpa e o medo de não ser capaz de livrar-se do pecado.  Mas enquanto aqui também Lutero se livra desse temor mediante a fé, em Müller a escravidão deve ser mantida artificialmente.   Sob a influência do pietismo, do qual Müller já é um adepto, essa deturpação do sentido do terror e o ensino da morte igualmente se insinua dentro da ortodoxia.  Em 1745, portanto, Valentin Ernst Löscher, superintendente em Dresden, encontro a "Academia Cristã de Preparo para  a Morte" (Christleche Akademie der Sterbensbereitung), e no seu livro com o mesmo título ele oferece instrução na arte do morrer cristão.  Sebastian Friedrich Trescho está ocupado com o mesmo assunto na sua obra "A Ciência do Morrer uma Morte Abençoada e Feliz, ou a Bíblia da Morte" (Wissenschaft selig und frohlich zu sterben oder Sterbenbibel) (segunda edição, 1767).  O quanto o ensino sobre a morte se afastou aqui do medo elementar da experiência primeva (Urerlebnis) pode ser percebido pelo fato que o mesmo Trescho pode inclusive escrever uma contrapartida: "A Arte de Viver Feliz" (Die Kunst glucklich zu leben) (1765).(p.46)  A propósito, a sugestão para fazê-lo veio-lhe de Fraulein von Klettenberg que, no livro de Goethe, assim diz nas confissões de uma alma bela: "Eu considerava, realmente, onde eu havia sido indigna, e também descobri onde eu sempre fui indigna; mas o conhecimento das minhas deficiências foi de todo sem medo...Eu não esperava faltar com a seriedade.  Deixei-me persuadir para o momento, e eu teria alegremente levado uma vida que fosse triste e cheia de terrores.  Mas quão espantada fiquei porque de uma vez por todas isso não era possível!" (Wilhelm Meister, livro VI).  Essas sentenças revelam que sempre se conhece a idéia da morte apenas como algo que deve ser evocado artificialmente.  A época conhece a melancolia da poesia de cemitério inglesa como a sente Klopstock, mas jamais ela conhece o horror de Deus. (p.47)

            Se por meio desse psicologizar gradual o medo está desprovido do seu sentido teológico intrínseco, outros, no entanto, não esqueceram totalmente o conhecimento de Lutero.  E esses outros, igualmente, são agora testemunhos históricos de que não se trata de modo algum de um mero assunto de perspectivas individuais de Lutero.  Assim, nos escritos de Jakob Böhme pode-se encontrar introspecções que são muito importantes, uma vez que ele evidentemente não dispunha de maior familiaridade com as obras de Lutero. Além disso, ele prestou atenção por anos aos sermões de Martin Möller, cujo último pastorado foi em Görlitz. É verdade que Böhme está familiarizado com os elementos puramente emocionais do medo.  Ele está familiarizado com o medo da punição.  Mas também com o pavor da indescritível fúria de Deus, e descreve como foge completamente à descrição feita por ele que é torturado pela angústia de consciência.  Assim como Lutero, ele vê o diabo em ação no desespero do homem; e o diabo emprega todo truque a fim de evitar que o homem creia, para arremessar-lhe seus pecados pelos dentes e induzi-lo a cometer suicídio.  Segundo Lutero, ele aconselha a opor o Hans Preto (Schwartz-Hans) à Palavra de Deus, a olhar para a cruz de Cristo, e buscar refúgio na luz do amor de Deus.  Como em Lutero, questões pertinentes à predestinação (das pradestinatianische Fragen) são consideradas como pertencentes à esfera da razão (Vernunftdenken), que devem ser vencidas pela fé.  No seu caso, tudo isso está misturado à especulação mágica e expresso na linguagem da sua psicologia mágica.  Contudo, a direitura da relação do medo primevo (Urgrauen) de Deus, que exige, compele e considera culpado segundo o destino (schicksalhaft), é claramente discernível nos seus escritos. (p.47)

            Na literatura sermonal do século XVII há igualmente inúmeros instantes de um sentimento que a relação natural do homem com Deus equivale a uma agonia real. (p.47)  De fato, dificilmente é colocado que se trata de angústia enquanto é considerado o conhecimento.   Já naquela época renomados pregadores da igreja lidavam muito mais seriamente com as "consciências apavoradas".  Homens como Valerius Herberger, Christian Scriver e Joachim Lütkemann declaram em seus sermões que o temor não devia ser evocado, mas superado por meio do Evangelho e da fé.  Realmente, eles, assim como Lutero, estão convencidos que o pensamento e experiência naturais do homem, se realmente pensados e experimentados até ao fim, devem terminar afinal em desconsolo e que realmente um otimismo não baseado no Evangelho está fundamentado na auto decepção. Johann Albrecht Bengel, também, comentou sobre o meio artificial de se provocar os pensamentos de morte.  Segundo ele, "muitos colocam toda a teologia na arte de morrer.   Mas isso está errado.  Para o cristão é mais importante vir do pecado à graça e então não esperar a morte, mas olhar para a frente com júbilo para o aparecimento de Jesus" 4(46)  Do mesmo modo, ao findar do século XVIII, um homem chamado Matthias Claudius, igualmente está em oposição aos "fornecedores da melancolia de cemitério."  Em suas obras também há lirismo de túmulo, mas como um elemento que foi superado - exatamente assim como o temor é encontrado na fé de Lutero como um elemento que foi superado.  Se o Wandsbecker Bote 5(47) prefixa "Morte, o Esqueleto (Freund Hein, der Knochenmann) às obras colecionadas de Claudius ou põe uma grande cruz preta sobre as Cartas a Asmus (Brief an Asmus) 6(48), aqui os fantasmas do túmulo, a morte e o cemitério são conjurados a serem espantados.  O "Bote" os encara firmemente.  Claudius os conhece, bem como seus terrores. Contudo, a sua fé em Cristo terminou com eles (p.48)

            Em seu livro intitulado O que é o medo? (Begriff der Angst) (1844), Kirkegaard adotou uma determinada abordagem à compreensão teológica do horror primevo (Urgrauen).  Ele revive a conclusão de Lutero que "o indivíduo é formado para a fé unicamente através do medo."  Aqui ele não pensa mais no medo no sentido sentimental do pietismo e do Iluminismo.  Ele procura concebê-lo como um pressuposto transcendental da liberdade e, por conseguinte, também do pecado.  Pois ele não conhece nenhuma outra liberdade, senão a liberdade para pecar.  Logo, o medo é o apriori da culpa.  É verdade que ele igualmente o considera o resultado do pecado. Ele fala sobre o medo do mal e o medo demoníaco daquilo que é bom.   Isso não significa que o "medo" de Kirkegaard corresponde perfeitamente ao horror primevo de Lutero (Urgrauen).  Primeiramente, ele ignora o relacionamento estritamente pessoal com Deus.  E, ainda, contém uma introspecção à necessidade de se tornar culpado sem se tornar o próprio conceito de culpa fatalista e, assim sendo, anulando-o.(p.48)  E Kirkegaard, assim como Lutero, também sabe que o medo de Deus como dúvida sobre o próprio Deus é o pecado primevo (Ursünde). (p.49)

            Finalmente, poder-se-ia citar Schopenhauer como uma testemunha fidedigna para a validade universal da experiência primeva (Urerlebnis).  "Quando eu tento imaginar", diz ele, "que estou parado diante de um ser individual a quem diria: 'Meu Criador, primeiro eu nada era; porém tu me produziste, de modo que agora eu sou algo, e, o que é mais importante, que Eu sou Eu' - e acrescenta: 'Agradeço-te por esse carinho' - e finalmente: 'Se eu tenho sido bom para nada, é minha própria culpa' - então preciso responder que como resultado do meu estudo de filosofia e Induísmo minha cabeça tornou-se incapaz de suportar tal pensamento." 7(49)  Aquilo que Schpenhauer rejeita aqui como algo impossível de imaginar, firma os fatores decisivos que estabelecem a experiência primeva (Urerlebnis) em Lutero. (p.49)
Schopenhauer os rejeita porque não pode suportá-los.  Essa impossibilidade de suportar, Lutero chama de desespero. Schopenhauer está em total concordância com ele neste ponto, que com base nessas considerações Deus nada mais pode ser senão o "Deus oculto" (Deus absconditus).  Ele segue o caminho do Budismo.  Lutero crê na revelação de Deus em Cristo.  Em última análise, a diferença é esta, que Lutero considera o que não pode ser negado, a saber, o entrelaçamento do pecado, culpa e destino, enquanto Schopenhauer declara no final, que isto, assim como o mundo, é fazer-crer (make-believe).  E a razão mais profunda de Schopenhauer para isso é ser encontrado em sua má-vontade de considerar ou reconhecer que Deus pisa fora de Seu encobrimento. Ademais - ou antes por essa mesma razão - Schopenhauer permanece uma testemunha contra a esperança do Iluminismo, que fantasia que poderia chegar  a um conhecimento de Deus sem a crença na revelação mantida pela Reforma. (p.49)


                                   5. A TEOLOGIA NATURAL 1(50)

            "E se porventura um pirata de indulgências aparecesse entre nós, ele não faria um bom negócio; pois ninguém possui uma consciência inquieta e alarmada."  Assim se expressou August Tholuck num de seus sermões que data de meados do século dezenove.2(51) (p.49)  Esta foi, sem dúvida, uma visão correta da situação.  Se alguém perguntar o que levou a tal estado de emoções, a primeira causa que encontra deve, obviamente, ser achada naquilo que a igreja proclamava.  Por inúmeros anos a pregação da igreja da Reforma estava voltada para o objetivo de prevenir a angústia de consciência através do Evangelho. Essa obra foi legada à igreja pela própria Reforma.  O resultado foi maior do que se poderia esperar.  A angústia da consciência foi superada em indivíduos que, conforme aconteceu com Lutero e na sua época, sentiram essa angústia "por natureza".  Gerações posteriores, no entanto, tiveram uma experiência completamente diferente.  Aqui se tem um exemplo notável de como uma palavra, que originalmente se aplica de uma maneira totalmente pessoal a um indivíduo e pode ser corretamente entendida somente por indivíduos, é capaz de produzir resultados que vão além do indivíduo.   Assim como nos dias de Lutero a angústia de consciência era inata, por assim dizer, no homem, assim a paz de consciência era inata naqueles que vieram depois.  Esqueceu-se, porém, que não há nenhum sentido em se falar sobre  paz antes de ter havido luta.(p.50)

            Conforme foi demonstrado, o Luteranismo como um todo nunca se desviou.  Outrossim, o fato que era de todo possível seguir errado não foi falha somente  da igreja proclamante; foi a falha da teologia.  Mesmo quando a Reforma  estivesse surgindo, a igreja viu-se confrontada por uma situação similar.  Naquele tempo a instrução dos visitadores para a Saxônia Eleitoral, em 1528, fez uma exigência urgente de não se separar a fé da penitência.  Esta foi uma demonstração de uma maneira prática de monopólio da ilusão que  fé é possível sem um rompimento com a natureza humana. "E eles deveriam diligentemente lembrar ao povo que essa fé não pode existir sem arrependimento íntimo e verdadeiro temor de Deus... A outra coisa, onde não há arrependimento, é uma fé fictícia; pois a fé verdadeira traria conforto e júbilo em Deus.  Tal conforto e júbilo não é sentido  onde não existe arrependimento e temor." (WA 26, 203, 26ss; 34ss).  A dogmática posterior não fez justiça a essa necessidade, mas extraiu o seu sistema a partir da posição da fé.  Na dogmática cristã isso não pode ser diferente.  Além disso, a dogmática posterior também falou sobre o conhecimento atingido pelo "homem natural".  Isso ela tinha tanto o direito como a obrigação de fazer - ao permanecer com o exemplo de Paulo.  Mas porque não pretendia abandonar a posição da fé,  ela tratou esse conhecimento "natural"  simplesmente como o primeiro passo em direção ao conhecimento da fé. (p.50) É verdade que o seu ensino sobre a relação entre a penitência e a fé era certo de uma maneira formal. Contudo, ela deixou de lado a conexão íntima entre o conhecimento natural de Deus e a necessidade da penitência.  Ela esqueceu que o conhecimento "natural" de Deus no homem leva à dúvida sobre Deus, por isso, à descrença, o que torna necessária a penitência, e que em todas as circunstâncias a fé pressupõe uma ruptura com o conhecimento natural.  À luz dessa teologia,  poderia parecer que o conhecimento evangélico de Deus fosse realmente inato no homem. Por conseguinte, era possível entender a obra de proclamação da igreja de maneira tal que a igreja necessita apenas clarear e fazer surgir a consideração do que é mais ou menos auto evidente a cada homem "por natureza".  É verdade que essa última conclusão não foi tirada até a emergência da teologia e da pregação do racionalismo.  Contudo a dogmática ortodoxa já criara o pressuposto sobre o qual ela se baseia. (p.51)

            Devido à importância por elas atribuída ao pecado original, as confissões viram-se obrigadas a negar que o homem natural possa ter qualquer conhecimento salvífico de Deus.  Na Apologia, Melanchthon inclui a "ignorância de Deus" (ignorantia Dei) entre os efeitos do pecado original - Deus não pode ser conhecido de outra maneira, senão através da Palavra.   Em todas as circunstâncias, o homem não tem temor de Deus - o temor sendo entendido no sentido em que é usado nos Catecismos de Lutero.  O coração do homem sente apenas "que Deus está horrivelmente irado e nos oprime com calamidades temporais e eternas" (Deum horribiliter irasci et opprimere nos temporalibus et perpetuis calamitatibus).  A doutrina da Fórmula de Concórdia - que o homem natural não sente nem mesmo a ira de que Deus está cheio por causa do pecado - não é estranha a Melanchthon.  Ele até acusa seus oponentes teológicos de não conhecerem o que são a ira e o juízo de Deus.  Noutra parte, ele atribui ao pecado o fato que o homem não reconhece a ira de Deus (CR 21,672).  E em todo caso, a Fórmula de Concórdia não deixa nenhuma dúvida "que por nascimento e por natureza todos herdamos de Adão um coração, uma disposição e pensamentos que com toda a sua capacidade e de acordo com a luz da razão são imaginados e constituídos diretamente em oposição a Deus e Seus principais mandamentos, sim, são inimizade contra Deus, especialmente em assuntos divinos, espirituais" 3(52) (Ver: AC II: 7ss,14; FC,DS II:20,21)  Isto esgota o que as confissões têm a dizer sobre o "conhecimento natural de Deus".  Pois é auto evidente que o ensino de Lutero no Primeiro Artigo do Credo sobre o relacionamento das criaturas com o Criador não pertence aqui, porque é apresentado a partir da posição da fé.(p.51)

            Todavia o mesmo Melanchthon já aceitava os elementos essenciais da posterior "teologia natural", na medida em que o material é tratado.  Ele demonstra as provas naturais da existência de Deus (CR 13,200ss; 21,641ss.) (p.51)  Para ele a moralidade filosófica é - pelo menos no último período da sua vida - idêntica à Lei divina.  Para ensinar o conhecimento da vontade divina, ela emprega fundamentos baseados na razão, a relação causal entre a falha e a punição; ela define as virtudes, mostra o alvo moral final do homem (16,167ss.).  Provas da imortalidade da alma são também buscadas dos filósofos, de Platão, Xenofontes e Cícero (13, 175).  Mais adiante, Melanchthon está ciente do postulado de Kant sobre uma equalização da virtude e da felicidade - uma equalização que deve ocorrer para o futuro, mas está ausente na presente vida (13, 176).  Todo o seu conhecimento é fragmentário; em parte também deturpado, encoberto - tudo por causa do pecado.  Nem permite o pecado que esse conhecimento tenha seu efeito pleno numa vida moral.  Sem o pecado, no entanto, ele apresentaria um sistema auto contido que engloba a área total do conhecimento do mundo e de Deus, bem como do conteúdo ético.   É verdade que um remanescente do conhecimento de Deus permanece - um resto que em todas as circunstâncias deveria ser reservado para a revelação especial.  Ele pertence, acima de tudo, ao mistério da Trindade e à intenção de Deus de fundar para Si uma igreja entre a raça humana (13,199).  Além do mais, todo o conhecimento natural de Deus deve estar subordinado ao "conhecimento da Lei" (notitia legis).  Em nenhum ponto, portanto, pode ignorar completamente o elemento do pecado.  Como "conhecimento da Lei" (notitia legis), ele se estende, na direção de leis naturais, a Deus como Criador, Preservador e Senhor da providência; na direção de lei moral ele se estende a Deus como Legislador, como um Juiz que pune e recompensa.  Ainda entre os atributos divinos acessíveis ao conhecimento natural, aparecem também, quase furtivamente, os conceitos "benéfico" (beneficus) e "fiel" (verax).4(53) Certamente o conhecimento desses atributos está obscurecido, exatamente como o homem natural se deixa iludir numa segurança contra o poder punitivo de Deus. (p.52)  No entanto, tanto quanto a idéia é tratada, esse conhecimento pertence ao sistema racional realmente atingido nos picos da história da filosofia - por exemplo, em Platão.(p.53)

            Quão distante estamos de Lutero!  É verdade que Melanchthon enfatizaria sempre de novo que, por natureza, nenhum  homem tem o direito de referir a si próprio a boa vontade de Deus, sem o perdão de pecados.  Aqui ainda o perdão dos pecados, com todos os seus pressupostos, parece, pela posição do conhecimento natural, meramente uma restauração de um edifício desgastado.  Lutero aceitaria isso como válido se tivesse sido dito sobre a relação entre o perdão de pecados e o "estado primevo" (Urstand). Mas a relação do estado primevo (aqui Melachthon, também, ensina de acordo com a Reforma) afirmava-se haver sido perdido, não apenas corrompido, pela irrupção do pecado.  A partir disso, resultou para Lutero um relacionamento do homem com Deus que (mesmo quando a razão se empenha ao último, sim, precisamente quando o assunto é aprofundado) deve terminar num colapso do conhecimento de Deus. Inobstante, na opinião de Lutero, ele estava de todo ausente no homem por natureza.  Contudo, ele termina em pontos que absolutamente não podem ser reconciliados no pensamento de alguém.  A partir do pensamento sobre o Legislador e Juiz divino, chega-se ao temor da punição e a uma consideração da responsabilidade própria.  A partir do pensamento sobre o Criador e Administrador do mundo, chega-se à experiência do destino.  Até mesmo a desobediência aos mandamentos divinos é em si mesma inimizade contra Deus.  Mas aqui a razão também se revolta contra Ele.  Segundo Lutero, ela não pode atingir nenhum outro alvo.  Esta é a transcendência de Deus no sentido mais estrito; não há quaisquer pontes de conhecimento guiando até ela.  Todas as evidências empíricas da sua boa vontade caem por terra face ao conhecimento de que Ele decretou-nos uma morte eterna.  E Lutero nunca admitiria que o conhecimento da "fidelidade de Deus" (veracitas Dei) possa ser desenvolvido a partir dos componentes do pensamento racional.  Não é boa vontade que Deus tem à disposição para nós, é ira, e a questão concernente à Sua fidelidade deve - sem Cristo - terminar na dúvida.  Para Lutero, o conhecimento de Deus não é pernicioso, como ele é para Melanchthon; para ele o mesmo se encontra além de todas as possibilidades racionais.(p.53)

            Uma vez que  Melanchthon - assim como os dogmáticos medievais - voltou à senda da teologia natural, não havia qualquer fim.  Apenas uma vez o desenvolvimento parecia chegar a uma paralisação: em conexão com as disputas com Flacius.  A fim de defender sua tese sobre o pecado original, o próprio Flacius teve de provar a totalidade da corrupção do homem.  Suas inúmeras referências a Lutero não eram meramente superficiais em natureza.  Tratava-se de um perfeito pensamento Luterano quando, em oposição a Simon Musäus, demonstrou que o pecado original não é "uma massa confusa de diversos males" (chaos diversorum malorum), mas um poder unificado no homem e acima do homem. 5(54)  (p.53)  Acima de tudo, ele falou sobre a "razão" (ratio) pecaminosa do homem de tal maneira que em parte alguma é imaginável um ímpeto para o conhecimento natural de Deus de Melachthon. 6(55)  Nenhum dos teólogos daquela época preservou tão energicamente como ele o pensamento de Lutero que o pecador é "hostil, militante e em guerra" (inimicus, militans, belligerans) em relação a Deus, que a razão em paticular se conduz "de maneira hostil" (hostiliter) contra Deus.  E seus comentários também admoestam a serem cautelosos aqueles que lhe opunham em assuntos pertinentes à teologia natural.  Por conseguinte, realmente numa disputa que ocorreu em 1572 sob Tilemann Hesshusius, ele foi confrontado com a objeção que a sua doutrina do pecado original era insustentável porque retinha certo conhecimento que deveria ser considerado uma obra notável e dom do santo Deus.  (p.54)  Agora, a despeito de todas as reminiscências de Melanchthon, a descrição desse conhecimento e essas capacidades foi verbalizada de tal maneira que a acusação de Pelagianismo em Flacius, constantemente manifesta, mesmo com referência à capacidade da razão - poderia ser considerada sem fundamento. 7(56)  Como noutro caso, também aqui o resultado final foi que a Fórmula de Concórdia voltou à posição de Lutero. (p.54)

            Mais tarde, no entanto, mesmo no caso de Martin Chemnitz, co-autor da Fórmula de Concórdia, o legado de Melanchthon se reafirma sem reservas.(p.54)   Para Chemnitz, o conhecimento natural de Deus é "não existente ou imperfeito, ou fraco" (aut nulla aut imperfecta aut languida).  O primeiro dos três adjetivos é correto porque a filosofia, como conselheira legal desse conhecimento, nada sabe sobre o perdão dos pecados; o segundo porque sem Cristo o homem possui apenas uma pequena parte desse conhecimento;  o terceiro, porque o homem neutraliza esse conhecimento com dúvidas terríveis.  Os seus limites são vistos no fato que embora ela ensine que existe um Deus e que é necessário reverenciá-lo, não é capaz de dizer como isso deve ser feito.  Ela também ensina que o conhecimento do Criador não pode ser totalmente certo e produtivo pela razão apenas.  Segundo Hb 11.3, a fé precisa ser adicionada. Ademais, ela ensina que no caso de competição o conhecimento natural deve, auto evidentemente, estar subordinado à revelação na Palavra. 8(57)  Heerbrand e Hafenreffer fornecem uma exposição detalhada de provas da existência de Deus a partir do "livro da natureza" (ex libro naturae).  Como primeira delas, Hafenreffer menciona a evidência a partir da consciência dos  bons e dos maus.  Aqui ele pode dizer com toda inocência: "Pois os bons rejubilam corretamente nos testemunhos das suas obras em cada aspecto de coisas, confiando na justiça e na bondade do ser divino" (Boni namque recte factorum testimoniis in omni rerum vultu gaudent, freti divini numinis justitia et bonitate).9(58) O que diria Lutero se aqui, na esfera do homem natural existe discurso sobre "bons seres humanos" que, com base no testemunho das suas ações, descansam na justiça e bondade do ser divino? (p.55)

            Aqui se pode perceber agora para onde poderia levar o método de procedimento de Melanchthon.  É verdade que nos escritos dos dogmáticos do século XVII não se encontrará tal ruptura com as asseverações básicas da teologia de Lutero.  No caso de alguns deles - Leonard Hutter, por exemplo - a teologia natural não desempenha nenhum papel ao todo digno de menção. Contudo, o mais importante é que na tradição doutrinária estabelecida por Johann Gerhard o rompimento preciso entre a relação natural do homem com Deus e o seu relacionamento com Ele pela fé, conforme existia em Lutero, é constantemente sempre mais deturpado, sim, obliterado.  Por exemplo, o uso formal da razão, a necessidade do que Melanchthon já estabeleceu na dogmática, também fixado em artigos que são materialmente mais importantes, tal como aquele sobre a natureza e atibutos de Deus.  É totalmente auto evidente que a conclusão baseada em causa e efeito é empregada na doutrina sobre Deus e a providência.  Gerhard, é verdade, considera impossível fornecer uma definição real do conceito de Deus.(p.55)  Suas razões, porém, são  de um tipo lógico-dialético.  Se - como no primeiro artigo da Confissão de Augsburgo - Melanchthon e os dogmáticos antigos - como Heerbrand, Chemnitz, S.Pauli, Selnecker, Hafenreffer, Hutter - já designaram Deus como "uma essência espiritual" (essentia spiritualis), o ponto de partida metafísico de Johann Gerhard é completamente neutralizado.  Nos seus escritos, assim como nos escritos dos escolásticos e místicos medievais, Deus ainda é "o supremo ser, um ato puro" (summum ens, actus purus). Calov, König, Scherzer e Quendsted aderem mui cautelosamente a Melanchthon.  Hollaz e Baier, porém, ainda definem  "ser espiritual" (ens spirituale).  Aqui, portanto, Deus é em primeiro lugar, um neutro - as características que marcam a pessoa são acidentais.  Aquele que define Deus dessa maneira, não está mais consciente de responsabilidade pelo que pensa sobre Ele. Essas definições deixam fora de consideração inevitável alternativa entre a incredulidade e a fé.  É ateísmo falar sobre Deus como se ele fosse uma coisa ou uma hipótese provável ou improvável, enquanto na realidade cada um de nossos pensamentos é um sim ou não ao chamado divino.(p.56)

            Por essa razão os últimos representantes da ortodoxia, como Johann Musäus, lutaram contra os adeptos do Iluminismo, tais como Herbert von Cherbury, com armas ensangüentadas quando tentaram provar-lhes "insuficiência" do conhecimento natural de Deus.  Musäues, realmente não estava errado ao afirmar que dependia se o conhecimento natural de Deus era suficiente "para a salvação" - o que devia ser negado.10(59)  No entanto, ele não tirou a conclusão necessária: que por essa razão ele poderia levar apenas à "maldição" (Unseligkeit).  Ele não foi nem mesmo capaz de chegar a ela, porque a própria dogmática ortodoxa cria poder falar sobre Deus usando o gênero neutro, conforme foi demonstrado.(p.56)

            Aquela mistura ocorreu ainda de outra forma.  Lutero ouviu a Palavra da Escritura como Palavra de Deus, porque a ouviu como uma maldição e uma promessa, como Lei e Evangelho.  E a primeira edição dos Loci de Melanchthon é uma excelente aplicação disto. Contudo, a despeito da doutrina da inspiração, à qual esta aderiu - ou pela qual talvez foi até desencaminhada - a dogmática ortodoxa considerou essa obra um livro de instrução com respeito a todos os seus conteúdos heterogêneos.  Estes pertencem, em parte, às condições imanentes do mundo, que, como é inevitável, são também o assunto do conhecimento "natural".  O fato que isso levou a conflitos que mais tarde levaram a teologia apologética dos séculos XVIII e XIX a sangrar até à morte, não foi o pior resultado.(p.56)  As concordâncias imaginárias ou reais estabelecidas entre a doutrina "revelada", diga, concernente à origem do mundo e a doutrina sobre o conhecimento "natural - neste caso ciências ou filosofia naturais - foram seguidas de conseqüências muito mais graves.  Pode-se deixá-lo passar quando Chyträus novamente encontra em cada capítulo do primeiro livro de Moisés a prova para um ou mais loci da dogmática, ou quando, um século depois, August Pfeiffer, superintendente geral de  Lübeck, igualmente esperava encontrar em Gênesis todos os vinte e oito artigos da Confissão de Augsburgo, ou quando J. Deutschmann apresentou evidência conclusiva que Adão foi o primeiro verdadeiro teólogo Luterano.11(60)  Lutero abriu o caminho com  interpretações relativas de Gênesis.   Mais importante foi que na exegese dessas passagens as descobertas das ciências profanas foram agora empregadas como provas da "verdade da revelação divina". Aqui Kepler, a despeito dos alertas do seu colega teológico Hafenreffer, tornou-se o grande fazedor de experiências (cf. The Relativity of the Worl Picture  - "A Relatividade da Descrição do Mundo").(p.57)  Realmente era atraente atestar para alguém a harmonia da Palavra de Deus com a "ciência" das avançadas autoridades.  Não apenas nos comentários, mas também nas obras de dogmática - por exemplo, em Abraham Calov - pode-se chegar a percebê-lo.  Aqui a teologia natural se torna um perfeito abonador da revelação.  Na "Teologia Natural" (Natural Theology - 1862) de Otto Zücler, apresentam-se provas que o ar é "a esfera em que são reveladas a onipresença e a espiritualidade de Deus", "o ciclo das águas, o lugar onde são reveladas a fidelidade e veracidade de Deus", "o reino animal é o lugar onde é revelada a bondade divina".  "A Trindade divina é comprovada pelas tríades reais e ideais do mundo das criaturas."  "Cura, convalescença e o viver a própria vida" são consideradas "a esfera em que se revela a misericórdia de Deus". As coisas nunca chegaram mais alto!   Será demonstrado mais adiante que, mesmo segundo Lutero, Deus e o mundo estão numa relação positiva. Contudo, para ele isso era certo no sentido mais estrito de se falar em razão da promessa de Deus em Cristo, isto é, em razão da revelação num sentido totalmente diferente.  Crer nessa revelação deve firmar-se em oposição ao homem natural, mesmo em oposição ao seu conhecimento natural.(p.57)

            O desenvolvimento da "teologia natural" é o marco da história a partir da experiência primeva (Urerlebnis) de Lutero até o Iluminismo.  Encerrou-se com o erro nefasto que a fé cristã em Deus e o "conhecimento natural de Deus" são essencialmente idênticos.  Isto foi um conforto e satisfação para os apologistas ingênuos, para muitos dogmáticos, e mesmo para muitos dos políticos que almejavam "preservar a religião para o povo".(p.57) Para o filisteu da igreja, conforme se lhe dirigiu Tholuck, foi motivo para não mais se saber duma consciência angustiada.  Mas aí surgiu Ludwig Feurbach.  Então, Karl Marx e Nietzsche.  Estes mostraram que o conhecimento "natural" do homem chega a um resultado totalmente diferente. E quando ele chegou ao grande teste da revelação da bondade de Deus, sua fidelidade e misericórdia em terra, mar e ar - que Zöcler e muitos outros falavam - o resultado foi decididamente negativo. Foi alguma surpresa que a geração da guerra e do colapso declarou que a crença cristã em Deus é uma ilusão porque foi refutada pelos terrores e o destino que foram experimentados?  Se aquela geração tivesse ouvido Lutero ao invés da teologia do século XIX e a pregação que reaviva tal teologia - ela o teria entendido em seu terror primevo (Urgrauen). (p.58)

Nenhum comentário:

Pesquisar este blog

Marcadores

1 CO 1.18-25 1 CO 12.2 1 CO 15.20-28 1 CO 15.50-58 1 CO 2.1-5 1 CO 6.12-20 1 CO2.6-13 1 CORÍNTIOS 1 CR 28.20 1 JO 1 JO 1.1-10 1 JO 4.7-10 1 PE 1.13-21 1 PE 1.17-25 1 PE 1.3-9 1 PE 2.1-10 1 PE 2.18-25 1 PE 2.19-25 1 PE 2.4-10 1 PE 3.13-22 1 PE 3.15-22 1 PE 3.18-20 1 PE 4.12-17 1 PE 5.6-11 1 PEDRO 1 RS 19.4-8 1 RS 8.22-23 1 SM 1 1 SM 2 1 SM 28.1-25 1 SM 3 1 SM 3.1-10 1 TIMÓTEO 1 TM 1.12-17 1 Tm 2.1-15 1 TM 3.1-7 1 TS 1.5B-10 10 PENTECOSTES 13-25 13° APÓS PENTECOSTES 14° DOMINGO APÓS PENTECOSTES 15 ANOS 16-18 17 17º 17º PENTECOSTES 1CO 11.23 1CO 16 1º ARTIGO 1º MANDAMENTO 1PE 1PE 3 1RS 17.17-24 1RS 19.9B-21 2 CO 12.7-10 2 CO 5.1-10 2 CO 5.14-20 2 CORINTIOS 2 PE 1.16-21 2 PE 3.8-14 2 PENTECOSTES 2 TM 1.1-14 2 TM 1.3-14 2 TM 2.8-13 2 TM 3.1-5 2 TM 3.14-4.5 2 TM 4.6-8 2 TS 3.6-13 2° EPIFANIA 2° QUARESMA 20º PENTECOSTES 24º DOMINGO APÓS PENTECOSTES 25º DOMINGO PENTECOSTES 27-30 2CO 8 2º ADVENTO 2º ARTIGO 2º DOMINGO DE PÁSCOA 2TM 1 2TM 3 3 3 PENTECOSTES 3º ARTIGO 3º DOMINGO APÓS PENTECOSTES 3º DOMINGO DE PÁSCOA 3º DOMINGO NO ADVENTO 4 PENTECOSTES 41-43 4º DOMINGO APÓS PENTECOSTES 4º DOMINGO DE PENTECOSTES 4º FEIRA DE CINZAS 5 MINUTOS COM JESUS 5° APÓS EPIFANIA 500 ANOS 5MINUTOS 5º DOMINGO DE PENTECOSTES 5º EPIFANIA 5º PENTECOSTES 6º MANDAMENTO 7 ESTRELAS Abiel ABORTO ABSOLVIÇÃO ACAMPAMENTO AÇÃO DE GRAÇA ACIDENTE ACIR RAYMANN ACONSELHAMENTO ACONSELHAMENTO PASTORAL ACRÓSTICO ADALMIR WACHHOLz ADELAR BORTH ADELAR MUNIEWEG ADEMAR VORPAGEL ADMINISTRAÇÃO ADORAÇÃO ADULTÉRIO ADULTOS ADVENTISTA ADVENTO ADVERSIDADES AGENDA AIDS AILTON J. MULLER AIRTON SCHUNKE AJUDAR ALBERTO DE MATTOS ALCEU PENNING ALCOOLISMO ALEGRIA ALEMÃO ÁLISTER PIEPER ALTAR ALTO ALEGRE AM 8.4-14 AMASIADO AMBIÇÃO AMIGO AMIZADE AMOR André ANDRÉ DOS S. DREHER ANDRÉ L. KLEIN ANIVERSARIANTES ANIVERSÁRIO ANJOS ANO NOVO ANSELMO E. GRAFF ANTHONY HOEKEMA ANTIGO TESTAMENTO ANTINOMISTAS AP 1 AP 2 AP 22 AP 22.12-17 AP 3 APOCALIPSE APOLOGIA APONTAMENTOS APOSTILA ARNILDO MÜNCHOW ARNILDO SCHNEIDER ARNO ELICKER ARNO SCHNEUMANN ARREBATAMENTO ARREPENDIMENTO ARTHUR D. BENEVENUTI ARTIGO ASAS ASCENSÃO ASCLÉPIO ASSEMBLEIA ASTOMIRO ROMAIS AT AT 1 AT 1-10 AT 1.12-26 AT 10.34-43 AT 17.16-34 AT 2.1-21 AT 2.14a 36-47 AT 2.22-32 AT 2.36-41 AT 2.42-47 AT 4.32-37 AT 6.1-9 AT 7.51-60 ATANASIANO ATOS AUDIO AUGSBURGO AUGUSTO KIRCHHEIN AULA AUTO ESTIMA AUTO EXCLUSÃO AUTORIDADE SECULAR AVANÇANDO COM GRATIDÃO AVISOS AZUL E BRANCO BAIXO BATISMO BATISMO INFANTIL BELÉM BEM AVENTURADOS BENÇÃO BENJAMIM JANDT BIBLIA ILUSTRADA BÍBLIA SAGRADA BÍBLICO BINGOS BOAS NOVAS BOAS OBRAS BODAS BONIFÁCIO BOSCO BRASIL BRINCADEIRAS BRUNO A. K. SERVES BRUNO R. VOSS C.A. C.A. AUGSBURGO C.F.W. WALTHER CADASTRO CAIPIRA CALENDÁRIO CAMINHADA CAMPONESES CANÇÃO INFANTIL CANCIONEIRO CANTARES CANTICOS CÂNTICOS CANTICOS DOS CANTICOS CAPELÃO CARGAS CÁRIN FESTER CARLOS CHAPIEWSKI CARLOS W. WINTERLE CARRO CASA PASTORAL CASAL CASAMENTO CASTELO FORTE CATECISMO CATECISMO MENOR CATÓLICO CEIA PASCAL CÉLIO R. DE SOUZA CELSO WOTRICH CÉLULAS TRONCO CENSO CERIMONIAIS CÉU CHÁ CHAMADO CHARADAS CHARLES S. MULLER CHAVE BÍBLICA CHRISTIAN HOFFMANN CHURRASCO CHUVA CIDADANIA CIDADE CIFRA CIFRAS CINZAS CIRCUNCISÃO CL 1.13-20 CL 3.1-11 CLAIRTON DOS SANTOS CLARA CRISTINA J. MAFRA CLARIVIDÊNCIA CLAÚDIO BÜNDCHEN CLAUDIO R. SCHREIBER CLÉCIO L. SCHADECH CLEUDIMAR R. WULFF CLICK CLÍNICA DA ALMA CLOMÉRIO C. JUNIOR CLÓVIS J. PRUNZEL CODIGO DA VINCI COLÉGIO COLETA COLHEITA COLOSSENSES COMEMORAÇÃO COMENTÁRIO COMUNHÃO COMUNICAÇÃO CONCÓRDIA CONFIANÇA CONFIRMACAO CONFIRMAÇÃO CONFIRMANDO CONFISSÃO CONFISSÃO DE FÉ CONFISSÕES CONFLITOS CONGREGAÇÃO CONGRESSO CONHECIMENTO BÍBLICO CONSELHO CONSTRUÇÃO CONTATO CONTRALTO CONTRATO DE CASAMENTO CONVENÇÃO NACIONAL CONVERSÃO CONVITE CONVIVÊNCIA CORAL COREOGRAFIA CORÍNTIOS COROA CORPUS CHRISTI CPT CPTN CREDO CRESCENDO EM CRISTO CRIAÇÃO CRIANÇA CRIANÇAS CRIOULO CRISTÃ CRISTÃOS CRISTIANISMO CRISTIANO J. STEYER CRISTOLOGIA CRONICA CRONOLOGIA CRUCIFIXO CRUZ CRUZADAS CTRE CUIDADO CUJUBIM CULPA CULTO CULTO CRIOULO CULTO CRISTÃO CULTO DOMESTICO CULTO E MÚSICA CULTURA CURSO CURT ALBRECHT CURTAS DALTRO B. KOUTZMANN DALTRO G. TOMM DANIEL DANILO NEUENFELD DARI KNEVITZ DAVI E JÔNATAS DAVI KARNOPP DEBATE DEFICIÊNCIA FÍSICA DELMAR A. KOPSELL DEPARTAMENTO DEPRESSÃO DESENHO DESINSTALAÇÃO DEUS DEUS PAI DEVERES Devoção DEVOCIONÁRIO DIACONIA DIÁLOGO INTERLUTERANO DIARIO DE BORDO DICOTOMIA DIETER J. JAGNOW DILÚVIO DINÂMICAS DIRCEU STRELOW DIRETORIA DISCIPLINA DÍSCIPULOS DISTRITO DIVAGO DIVAGUA DIVÓRCIO DOGMÁTICA DOMINGO DE RAMOS DONS DOUTRINA DR Dr. RODOLFO H. BLANK DROGAS DT 26 DT 6.4-9 EBI EC 9 ECLESIASTES ECLESIÁSTICA ECUMENISMO EDER C. WEHRHOLDT Ederson EDGAR ZÜGE EDISON SELING EDMUND SCHLINK EDSON ELMAR MÜLLER EDSON R. TRESMANN EDUCAÇÃO EDUCAÇÃO CRISTÃ EF 1.16-23 EF 2.4-10 EF 4.1-6 EF 4.16-23 EF 4.29-32 EF 4.30-5.2 EF 5.22-33 EF 5.8-14 EF 6.10-20 ÉFESO ELBERTO MANSKE Eleandro ELEMAR ELIAS R. EIDAM ELIEU RADINS ELIEZE GUDE ELIMINATÓRIAS ELISEU TEICHMANN ELMER FLOR ELMER T. JAGNOW EMÉRITO EMERSON C. IENKE EMOÇÃO EN ENCARNAÇÃO ENCENAÇÃO ENCONTRO ENCONTRO DE CRIANÇA 2014 ENCONTRO DE CRIANÇAS 2015 ENCONTRO DE CRIANÇAS 2016 ENCONTRO PAROQUIAL DE FAMILIA ENCONTROCORAL ENFERMO ENGANO ENSAIO ENSINO ENTRADA TRIUNFAL ENVELHECER EPIFANIA ERA INCONCLUSA ERNI KREBS ERNÍ W. SEIBERT ERVINO M. SPITZER ESBOÇO ESCATOLOGIA ESCO ESCOLAS CRISTÃS ESCOLÁSTICA ESCOLINHA ESCOLINHA DOMINICAL ESDRAS ESMIRNA ESPADA DE DOIS GUMES ESPIRITISMO ESPÍRITO SANTO ESPIRITUALIDADE ESPÍSTOLA ESPORTE ESTAÇÃODAFÉ ESTAGIÁRIO ESTAGIÁRIOS ESTATUTOS ESTER ESTER 6-10 ESTRADA estudo ESTUDO BÍBLICO ESTUDO DIRIGIDO ESTUDO HOMILÉTICO ÉTICA EVANDRO BÜNCHEN EVANGELHO EVANGÉLICO EVANGELISMO EVERSON G. HAAS EVERSON GASS EVERVAL LUCAS EVOLUÇÃO ÊX EX 14 EX 17.1-17 EX 20.1-17 EX 24.3-11 EX 24.8-18 EXALTAREI EXAME EXCLUSÃO EXEGÉTICO EXORTAÇÃO EZ 37.1-14 EZEQUIEL BLUM Fabiano FÁBIO A. NEUMANN FÁBIO REINKE FALECIMENTO FALSIDADE FAMÍLIA FARISEU FELIPE AQUINO FELIPENSES FESTA FESTA DA COLHEITA FICHA FILADÉLFIA FILHO DO HOMEM FILHO PRÓDIGO FILHOS FILIPE FILOSOFIA FINADOS FLÁVIO L. HORLLE FLÁVIO SONNTAG FLOR DA SERRA FLORES Formatura FÓRMULA DE CONCÓRDIA Fotos FOTOS ALTO ALEGRE FOTOS CONGRESSO DE SERVAS 2010 FOTOS CONGRESSO DE SERVAS 2012 FOTOS ENCONTRO DE CRIANÇA 2012 FOTOS ENCONTRO DE CRIANÇAS 2013 FOTOS ENCONTRO ESPORTIVO 2012 FOTOS FLOR DA SERRA FOTOS P172 FOTOS P34 FOTOS PARECIS FOTOS PROGRAMA DE NATAL P34 FP 2.5-11 FP 3 FP 4.4-7 FP 4.4-9 FRANCIS HOFIMANN FRASES FREDERICK KEMPER FREUD FRUTOS DO ES GÁLATAS GALILEU GALILEI GATO PRETO GAÚCHA GELSON NERI BOURCKHARDT GENESIS GÊNESIS 32.22-30 GENTIO GEOMAR MARTINS GEORGE KRAUS GERHARD GRASEL GERSON D. BLOCH GERSON L. LINDEN GERSON ZSCHORNACK GILBERTO C. WEBER GILBERTO V. DA SILVA GINCANAS GL 1.1-10 GL 1.11-24 GL 2.15-21 GL 3.10-14 GL 3.23-4.1-7 GL 5.1 GL 5.22-23 GL 6.6-10 GLAYDSON SOUZA FREIRE GLEISSON R. SCHMIDT GN 01 GN 1-50 GN 1.1-2.3 GN 12.1-9 GN 15.1-6 GN 2.18-25 GN 21.1-20 GN 3.14-16 GN 32 GN 45-50 GN 50.15-21 GRAÇA DIVINA GRATIDÃO GREGÓRIO MAGNO GRUPO GUSTAF WINGREN GUSTAVO D. SCHROCK HB 11.1-3; 8-16 HB 12 HB 12.1-8 HB 2.1-13 HB 4.14-16 5.7-9 HC 1.1-3 HC 2.1-4 HÉLIO ALABARSE HERIVELTON REGIANI HERMENÊUTICA HINÁRIO HINO HISTÓRIA HISTÓRIA DA IGREJA ANTIGA E MEDIEVAL HISTÓRIA DO NATAL HISTORINHAS BÍBLICAS HL 10 HL 164 HOMILÉTICA HOMOSSEXUALISMO HORA LUTERANA HORST KUCHENBECKER HORST S MUSSKOPF HUMOR IDOSO IECLB IELB IGREJA IGREJA CRISTÃ IGREJAS ILUSTRAÇÃO IMAGEM IN MEMORIAN INAUGURAÇÃO ÍNDIO INFANTIL INFERNO INFORMATIVO INSTALAÇÃO INSTRUÇÃO INTRODUÇÃO A BÍBLIA INVESTIMENTO INVOCAÇÕES IRINEU DE LYON IRMÃO FALTOSO IROMAR SCHREIBER IS 12.2-6 IS 40.1-11 IS 42.14-21 IS 44.6-8 IS 5.1-7 IS 50.4-9 IS 52.13-53-12 IS 53.10-12 IS 58.5-9a IS 61.1-9 IS 61.10-11 IS 63.16 IS 64.1-8 ISACK KISTER BINOW ISAGOGE ISAÍAS ISAQUE IURD IVONELDE S. TEIXEIRA JACK CASCIONE JACSON J. OLLMANN JARBAS HOFFIMANN JEAN P. DE OLIVEIRA JECA JELB JELB DIVAGUA JEOVÁ JESUS JN JO JO 1 JO 10.1-21 JO 11.1-53 JO 14 JO 14.1-14 JO 14.15-21 JO 14.19 JO 15.5 JO 18.1-42 JO 2 JO 20.19-31 JO 20.8 JO 3.1-17 JO 4 JO 4.5-30 JO 5.19-47 JO 6 JO 6.1-15 JO 6.51-58 JO 7.37-39 JO 9.1-41 JOÃO JOÃO 20.19-31 JOÃO C. SCHMIDT JOÃO C. TOMM JOÃO N. FAZIONI JOEL RENATO SCHACHT JOÊNIO JOSÉ HUWER JOGOS DE AZAR JOGRAL JOHN WILCH JONAS JONAS N. GLIENKE JONAS VERGARA JOSE A. DALCERO JOSÉ ACÁCIO SANTANA JOSE CARLOS P. DOS SANTOS JOSÉ ERALDO SCHULZ JOSÉ H. DE A. MIRANDA JOSÉ I.F. DA SILVA JOSUÉ ROHLOFF JOVENS JR JR 28.5-9 JR 3 JR 31.1-6 JUAREZ BORCARTE JUDAS JUDAS ISCARIOTES JUDAS TADEU JUMENTINHO JUSTIFICAÇÃO JUVENTUDE KARL BARTH KEN SCHURB KRETZMANN LAERTE KOHLS LAODICÉIA LAR LC 12.32-40 LC 15.1-10 LC 15.11-32 LC 16.1-15 LC 17.1-10 LC 17.11-19 LC 19 LC 19.28-40 LC 2.1-14 LC 23.26-43 LC 24 LC 24.13-35 LC 3.1-14 LC 5 LC 6.32-36 LC 7 LC 7.1-10 LC 7.11-16 LC 7.11-17 LC 9.51-62 LEANDRO D. HÜBNER LEANDRO HUBNER LEI LEIGO LEIGOS LEITORES LEITURA LEITURAS LEMA LENSKI LEOCIR D. DALMANN LEONARDO RAASCH LEOPOLDO HEIMANN LEPROSOS LETRA LEUPOLD LIBERDADE CRISTÃ LIDER LIDERANÇA LILIAN LINDOLFO PIEPER LINK LITANIA LITURGIA LITURGIA DE ADVENTO LITURGIA DE ASCENSÃO LITURGIA DE CONFIRMAÇÃO LITURGIA EPIFANIA LITURGIA PPS LIVRO LLLB LÓIDE LOUVAI AO SENHOR LOUVOR LUCAS ALBRECHT LUCIFER LUCIMAR VELMER LUCINÉIA MANSKE LUGAR LUÍS CLAUDIO V. DA SILVA LUIS SCHELP LUISIVAN STRELOW LUIZ A. DOS SANTOS LUTERANISMO LUTERO LUTO MAÇONARIA MÃE MAMÃE MANDAMENTOS MANUAL MARCÃO MARCELO WITT MARCIO C. PATZER MARCIO LOOSE MARCIO SCHUMACKER MARCO A. CLEMENTE MARCOS J. FESTER MARCOS WEIDE MARIA J. RESENDE MÁRIO SONNTAG MÁRLON ANTUNES MARLUS SELING MARTIM BREHM MARTIN C. WARTH MARTIN H. FRANZMANN MARTINHO LUTERO MARTINHO SONTAG MÁRTIR MATERNIDADE MATEUS MATEUS KLEIN MATEUS L. LANGE MATRIMÔNIO MAURO S. HOFFMANN MC 1.1-8 MC 1.21-28 MC 1.4-11 MC 10.-16 MC 10.32-45 MC 11.1-11 MC 13.33-37 MC 4 MC 4.1-9 MC 6.14-29 MC 7.31-37 MC 9.2-9 MEDICAMENTOS MÉDICO MELODIA MEMBROS MEME MENSAGEIRO MENSAGEM MESSIAS MÍDIA MILAGRE MINISTÉRIO MINISTÉRIO FEMENINO MIQUÉIAS MIQUÉIAS ELLER MIRIAM SANTOS MIRIM MISSÃO MISTICISMO ML 3.14-18 ML 3.3 ML NEWS MODELO MÔNICA BÜRKE VAZ MORDOMIA MÓRMOM MORTE MOVIMENTOS MT 10.34-42 MT 11.25-30 MT 17.1-9 MT 18.21-45 MT 21.1-11 MT 28.1-10 MT 3 MT 4.1-11 MT 5 MT 5.1-12 MT 5.13-20 MT 5.20-37 MT 5.21-43 MT 5.27-32 MT 9.35-10.8 MULHER MULTIRÃO MUSESCORE MÚSICA MÚSICAS NAAÇÃO L. DA SILVA NAMORADO NAMORO NÃO ESQUECER NASCEU JESUS NATAL NATALINO PIEPER NATANAEL NAZARENO DEGEN NEEMIAS NEIDE F. HÜBNER NELSON LAUTERT NÉRISON VORPAGEL NILO FIGUR NIVALDO SCHNEIDER NM 21.4-9 NOITE FELIZ NOIVADO NORBERTO HEINE NOTÍCIAS NOVA ERA NOVO HORIZONTE NOVO TESTAMENTO O HOMEM OFERTA OFÍCIOS DAS CHAVES ONIPOTENCIA DIVINA ORAÇÃO ORAÇAODASEMANA ORATÓRIA ORDENAÇAO ORIENTAÇÕES ORLANDO N. OTT OSÉIAS EBERHARD OSMAR SCHNEIDER OTÁVIO SCHLENDER P172 P26 P30 P34 P36 P40 P42.1 P42.2 P70 P95 PADRINHOS PAI PAI NOSSO PAIS PAIXÃO DE CRISTO PALAVRA PALAVRA DE DEUS PALESTRA PAPAI NOEL PARA PARA BOLETIM PARÁBOLAS PARAMENTOS PARAPSICOLOGIA PARECIS PAROQUIAL PAROUSIA PARTICIPAÇÃO PARTITURA PARTITURAS PÁSCOA PASTOR PASTORAL PATERNIDADE PATMOS PAUL TORNIER PAULO PAULO F. BRUM PAULO FLOR PAULO M. NERBAS PAULO PIETZSCH PAZ Pe. ANTONIO VIEIRA PEÇA DE NATAL PECADO PEDAL PEDRA FUNDAMENTAL PEDRO PEM PENA DE MORTE PENEIRAS PENTECOSTAIS PENTECOSTES PERDÃO PÉRGAMO PIADA PIB PINTURA POEMA POESIA PÓS MODERNIDADE Pr BRUNO SERVES Pr. BRUNO AK SERVES PRÁTICA DA IGREJA PREEXISTÊNCIA PREGAÇÃO PRESÉPIO PRIMITIVA PROCURA PROFECIAS PROFESSORES PROFETA PROFISSÃO DE FÉ PROGRAMAÇÃO PROJETO PROMESSA PROVA PROVAÇÃO PROVÉRBIOS PRÓXIMO PSICOLOGIA PV 22.6 PV 23.22 PV 25 PV 31.28-30 PV 9.1-6 QUARESMA QUESTIONAMENTOS QUESTIONÁRIO QUESTIONÁRIO PLANILHA QUESTIONÁRIO TEXTO QUINTA-FEIRA SANTA QUIZ RÁDIO RADIOCPT RAFAEL E. ZIMMERMANN RAUL BLUM RAYMOND F. SURBURG RECEITA RECENSÃO RECEPÇÃO REDENÇÃO REENCARNAÇÃO REFLEXÃO REFORMA REGIMENTO REGINALDO VELOSO JACOB REI REINALDO LÜDKE RELACIONAMENTO RELIGIÃO RENATO L. REGAUER RESSURREIÇÃO RESTAURAR RETIRO RETÓRICA REUNIÃO RICARDO RIETH RIOS RITO DE CONFIRMAÇÃO RITUAIS LITURGICOS RM 12.1-18 RM 12.1-2 RM 12.12 RM 14.1-12 RM 3.19-28 RM 4 RM 4.1-8 RM 4.13-17 RM 5 RM 5.1-8 RM 5.12-21 RM 5.8 RM 6.1-11 RM 7.1-13 RM 7.14-25a RM 8.1-11 RM 8.14-17 ROBERTO SCHULTZ RODRIGO BENDER ROGÉRIO T. BEHLING ROMANOS ROMEU MULLER ROMEU WRASSE ROMUALDO H. WRASSE Rômulo ROMULO SANTOS SOUZA RONDÔNIA ROSEMARIE K. LANGE ROY STEMMAN RT 1.1-19a RUDI ZIMMER SABATISMO SABEDORIA SACERDÓCIO UNIVERSAL SACERDOTE SACOLINHAS SACRAMENTOS SADUCEUS SALMO SALMO 72 SALMO 80 SALMO 85 SALOMÃO SALVAÇÃO SAMARIA Samuel F SAMUEL VERDIN SANTA CEIA SANTIFICAÇÃO SANTÍSSIMA TRINDADE SÃO LUIS SARDES SATANÁS SAUDADE SAYMON GONÇALVES SEITAS SEMANA SANTA SEMINÁRIO SENHOR SEPULTAMENTO SERMÃO SERPENTE SERVAS SEXTA FEIRA SANTA SIDNEY SAIBEL SILVAIR LITZKOW SILVIO F. S. FILHO SIMBOLISMO SÍMBOLOS SINGULARES SISTEMÁTICA SL 101 SL 103.1-12 SL 107.1-9 SL 116.12-19 SL 118 SL 118.19-29 SL 119.153-160 SL 121 SL 128 SL 142 SL 145.1-14 SL 146 SL 15 SL 16 SL 19 SL 2.6-12 SL 22.1-24 SL 23 SL 30 SL 30.1-12 SL 34.1-8 SL 50 SL 80 SL 85 SL 90.9-12 SL 91 SL 95.1-9 SL11.1-9 SONHOS SOPRANO Sorriso STAATAS STILLE NACHT SUMO SACERDOTE SUPERTIÇÕES T6 TEATRO TEMA TEMPLO TEMPLO TEATRO E MERCADO TEMPO TENOR TENTAÇÃO TEOLOGIA TERCEIRA IDADE TESES TESSALÔNICA TESTE BÍBLICO TESTE DE EFICIÊNCIA TESTEMUNHAS DE JEOVÁ Texto Bíblico TG 1.12 TG 2.1-17 TG 3.1-12 TG 3.16-4.6 TIAGO TIATIRA TIMÓTEO TODAS POSTAGENS TRABALHO TRABALHO RURAL TRANSFERENCIA TRANSFIGURAÇÃO TRICOTOMIA TRIENAL TRINDADE TRÍPLICE TRISTEZA TRIUNFAL Truco Turma ÚLTIMO DOMINGO DA IGREJA UNIÃO UNIÃO ESTÁVEL UNIDADE UNIDOS PELO AMOR DE DEUS VALDIR KLEMANN VALDIR L. JUNIOR VALFREDO REINHOLZ VANDER C. MENDOÇA VANDERLEI DISCHER VELA VELHICE VERSÍCULO VERSÍCULOS VIA DOLOROSA VICEDOM VÍCIO VIDA VIDA CRISTÃ VIDENTE VIDEO VIDEOS VÍDEOS VILS VILSON REGINA VILSON SCHOLZ VILSON WELMER VIRADA VISITA VOCAÇÃO VOLMIR FORSTER VOLNEI SCHWARTZHAUPT VOLTA DE CRISTO WALDEMAR REIMAN WALDUINO P.L. JUNIOR WALDYR HOFFMANN WALTER L. CALLISON WALTER O. STEYER WALTER T. R. JUNIOR WENDELL N. SERING WERNER ELERT WYLMAR KLIPPEL ZC ZC 11.10-14 ZC 9.9-12