Versículo 23
E antes de vir a fé, estávamos guardados em custódia sob a lei, confinados para a fé que estava destinada a ser revelada,
Versículo 24
de modo que a lei veio a ser nosso tutor (guia) para Cristo, a fim de que fôssemos justificados pela fé.
Versículo 25
Mas vindo a fé, já não mais estamos sob tutor.
Paulo usa o exemplo do que acontecia na sociedade. PAIDAGOGO era um escravo que acompanhava a criança de seu senhor por onde ela fosse. Era seu dever ensinar boas maneiras, levar à Escola, testar seus conhecimento. De uma certa forma, o tutor significava para a criança uma limitação da sua liberdade, que seria atingida quando alcançada a idade adulta. (Bruce, 182)
Lutero1 se detém, na exposição destes versículos, na questão da aplicação da Lei hoje, para os cristãos e não cristãos. Ele diz:
“A Lei tem ainda este benefício: mesmo se os corações dos homens permanecem tão ímpios quanto possível, a Lei deté, os ladrões, assassinos e criminosos públicos até um certo ponto, pelo menos externa e politicamente.2... (336)
“Além disso, a Lei confina os homens não apenas política, mas também teológicamente. Ou seja, a Lei é também uma prisão espiritual e um verdadeiro inferno; pois quando ela revela po pecado e ameaça a morte e a eterna ira de Deus, o homem não pode nem fugir, nem encontrar qualquer conforto.3 ... (337)
“Assim a Lei é uma prisão tanto política como teologicamente. Em primeiro lugar, ela refreia e confina os politicamente ímpios, assim que não são conduzidos pelas suas paixões em toda sorte de crimes. Segundo, a Lei nos mostra o nosso pecado espiritualmente, terrificando e humilhando-nos, de modo que quando fomos amedrontados desta forma, reconhecemos nosso pecado e condenação. E este último é o verdadeiro e próprio uso da Lei.” (337)
Lutero ainda alerta para o fato que precisamos saber usar a Lei corretamente, dando a ela a função de atuar somente até que venha o Evangelho.4 Ao vir a tentação, o cristão deve saber apela para o Evangelho, não dando à Lei poder sobre aquilo para o que ela não foi dada. (338)
A Lei ainda vale para o cristão, desde que confinada ao seu “tempo”:
“Na experiência do cristão, portanto, ambos são encontrados, o tempo da Lei e o tempo da graça. O tempo da Lei é quando ela me disciplina, envergonha e entristece, quando ela me traz o conhecimento do pecado e o aumenta. Então a Lei está sendo usada no seu uso próprio, que o cristão experimenta constantemente, enquanto viver. ...
“O tempo da graça é quando o coração é encorajado novamente pela promessa da misericórdia gratuita de Deus. ...” (341)
Versículo 26
Pois todos sois filhos de Deus mediante a fé em Cristo Jesus.
Versículo 27
Pois todos quantos fostes batizados em Cristo, fostes vestidos em Cristo (vos vestistes com Cristo).
Três importantes temas estão aqui unidos: a filiação a Deus, fé em Cristo, Batismo. O Batismo é considerado o fim do período de estar sob tutor (isto é, sob a lei). Assim, o Batismo é visto como promessa, como evangelho, como graça de Deus, como agente pelo qual a justificação é obtida.
O ser revestido com Cristo significa o receber de Sua justiça e o desfrutar de Seu caráter de Filho de Deus. Pelo Batismo somos filhos de Deus, ainda que por adoção(Gl 4.5).
Versículo 28
Nào é um judeu, nem grego; não é um escravo, nem livre; não é um homem nem (e) mulher; pois todos vós sois um em Cristo Jesus.
Versículo 29
E se vós [sois] de Cristo, então [sois] descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa.
GÁLATAS 4
14. Verdadeira Liberdade (4.1-7)
Versículo 1
E digo que em todo o tempo em que o herdeiro é menor, em nada difere de um servo, apesar de ser senhor de tudo.
Versículo 2
Mas está sob guardiães e administradores até o tempo fixado pelo pai.
Versículo 3
Assim também nós, quando éramos menores, estávamos escravizados sob os rudimentos do mundo.
Versículo 4
Mas quando veio a plenitude do tempo, Deus enviou Seu Filho, nascido de mulher, nascido sob lei,
Versículo 5
a fim de redimir os [que estavam] sob a lei, a fim de que recebêssemos a adoção.
Versículo 6
E porque sois filhos, Deus enviou o Espírito de Seu Filho para os nossos corações, o qual clama: Aba, Pai!
Versículo 7
De modo que já não mais és escravo, mas filho; e se és filho, também herdeiro através de Deus.
Paulo continua com a analogia da lei romana sobre minoridade de um herdeiro. Epítropos é um guardião de um menor de idade; oikonómos é um escravo que atua como supervisor das coisas na casa, cuidando de tudo para seu mestre; pode significar também uma pessoa contratada como administrador ou tesoureiro (uma espécie de gerente administrativo).
O "tempo fixado pelo pai" é a maioridade do filho. Quando esta chega, ele passa a ter mais liberdade, sem a tutela daquelas pessoas que o pai coloca sobre ele. Esta expressão é, de certa forma, paralela a outra, no v. 4 - "plenitude do tempo".
Esta analogia aponta com exatidào para o fato que a lei é algo provisório no plano de Deus. Com a vinda de Cristo ela não pode mais exercer domínio sobre o homem.
tá stoixéia toû kósmou - (v.3) - há várias explicações para esta expressão:
1. princípios fundamentais, elementares, como as letras do alfabeto. Hb 5.12. O texto de Gl pode estar usando deste significado. Seria, então, uma referência às formas elementares de religião, judaica e gentia, que foram superadas pela nova revelação em Cristo.
2. substâncias elementares - aquilo de que o mundo é feito. Para os gregos, os quatro elementos - terra, ar, água e fogo. 2 Pe 3.10,12.
3. Espíritos elementares, que as tendências religiosas da antiguidade associavam aos elementos formados do Universo.
4. Corpos celestes, aos quais eram associados poderes divinos. Aí entraria a crença nos signos do Zodíaco. (BAGD, 769)
No caso presente, em Gl 4, com a situação que se conhece dos gálatas e a argumentação de Paulo, o sentido mais provável é o contido na explicação (1) acima. A expressão é, assim, uma referência específica às coisas terrenas com as quais a lei trata. Os judeus davam grande ênfase sobre os elementos rituais legalísticos da lei. Esta explicação tem o apoio de Cl 2.20, onde a mesma expressão é usada e o contexto trata muito claramente de legalismo em questões como; comer, beber, festas judaicas. No versículo 3, na verdade, Paulo se refere à situação concreta das pessoas, entre as quais se inclui, quando estavam sem Cristo. Mais adiante, no versículo 9, Paulo mostra que os judaizantes estavam levando os gálatas a se escravizarem a coisas passadas, sem valor para aquele que está em Cristo. Estavam, neste sentido, retrocedendo.
A "plenitude do tempo" - plérwma é uma palavra importante para denotar o cumprimento de algo que se esperava ou o ápice de algum acontecimento, ou algo que signifique totalidade, como se vê nos textos em que a palavra (ou verbo cognato) é usada:
Mc 1.15 - Jesus proclama, ao iniciar Seu ministério: "o tempo está cumprido e é chegado o reino de Deus; por isso, arrependei-vos e crede no evangelho".
Ef 1.10 - todas as coisas (aquilo que perfaz a vontade e mistério de Deus) convergiram em Cristo, na plenitude dos tempos.
Cl 2.9,10 - em Cristo habita corporalmente a plenitude da divindade - Ele é Deus! E nós, nele, chegamos à plenitude (não há necessidade de nada mais para chegarmos lá onde Deus espera de nós).
A "plenitude do tempo" inclui duas verdades principais:
1. a vinda de Cristo cumpre plenamente as promessas de Deus. Ele é nào só a revelação completa de Deus, mas a realização da vontade e do mistério de Deus, oculto na eternidade e desvendado só no próprio Cristo.
2. o arranjo de outros fatores, na História da humanidade, que forma importantes no propósito de Deus de salvar o mundo em Cristo ( a linguagem universal usada na época - o grego; a pax romana, que dava condições de tranquilidade para viagens que difundiam o evangelho; as estradas abertas pelos romanos, que serviam como caminhos para a propagação do evangelho).
"Nascido de mulher, nascido sob lei" - aqui o verbo gínomai tem um sentido quaee passivo de gennáw (cf. 1 Ed 4.16; Tobias 8.6; Sabedoria 7.3; Siraque 44.9; Jo 8.58). (Bruce, 195)
Cristo veio sob a lei, a fim de resgatar (comprar) os que estavam sob a lei - nascendo de um lar judeu, Jesus nasceu sob a lei. Na verdade, era preciso que isto acontecesse, pois veio par tomar o lugar, como Substituto, daqueles todos que, por não poderem guardar a lei, estavam sob maldição.
huiothesía - adoção - é o termo técnico para o processo de adoção de crianças. Enfatiza a verdade de que não somos filhos de Deus por natureza, nem por qualquer feito nosso, mas somos filhos adotivos, através da graça de Deus em Cristo. Em 3.26 Paulo deixou claro que é pela fé em Cristo que alguém vem a ser filho de Deus.
"O Espírito para os nossos corações" - a mesma verdade é afirmada por Paulo em Rm 8.15. Lá Paulo contrasta o Espírito de adoção ao espírito de escravidão. Ele afirma ainda que o Espírito guia aqueles que são filhos de Deus e declara à pessoa que ela é filha de Deus.
O clamor do Espírito - "Abba, Pai" - é o mesmo clamor de Jesus (Mc 14.36), ao orar ao Pai. É o mesmo Espírito que habitou em Jesus, que habita naqueles que forma resgatados e tornados filhos através da fé. "Abba" era o "termo doméstico, pelo qual uma pai era chamado na intimidade afetiva do círculo familiar" (Bruce, 199).
"Mediante Deus" - esta expressào tem causado dificuldade, devido à preposição, que parece colocar Deus como agente intermediärio da filiaçào. Uma melhor traduçào seria: "feitos assim por Deus". (Bruce, 201)
2Este é o primeiro uso da Lei.
3Segundo uso da Lei.
4Lutero entende isto tanto historica (Lei - Dez Mandamentos preparou o caminho para o Evangelho - vinda de Cristo), como existencialmente (a Lei nos prepara para ouvirmos e Evangelho). (Ver: Luther’s Works. Lectures on Galatians. V. 26: 340)