O Church Growth e sua Adaptação ao Luteranismo
Erní W. Seibert
INTRODUÇÃO
O crescimento da igreja é um dos temas que sempre preocupa os envolvidos no trabalho das con-gregações. Acontece que o crescimento sempre é aguardado, em alguma de suas dimensões, seja cres-cimento quantitativo, seja crescimento qualitativo, seja crescimento na semeadura da palavra de Deus. Este crescimento, por vezes, é difícil de ser medido. Diante disto, a dúvida, a angústia e a insegurança, muitas vezes, tomam conta daqueles que têm por tarefa analisar e planejar o trabalho da igreja. Pergunta-se se os resultados realmente estão sendo significativos, se os métodos e as estratégias são os mais apropriados, e pesquisa-se para saber se não haveriam outras formas mais efetivas para realizar a mesma tarefa de igreja com resultados mais animadores.
É em meio a perguntas e questionamentos desta natureza que surge a teoria do Church Growth (crescimento da igreja), uma teoria que se preocupa com a questão do crescimento da igreja e que tenta munir pastores e congregações com recursos de análise e métodos científicos de trabalho que promovam crescimento.
Biblicamente, há várias passagens que tratam do crescimento da igreja. O livro de Atos dos Apóstolos até documenta com bastante exatidão dados estatísticos que atestam o crescimento numérico da igreja. Mas a Bíblia não se resume a documentar crescimento numérico. Ela fala em crescer na graça, no conhecimento, nas obras, e assim por diante.
A preocupação pelo crescimento da igreja também se faz presente em todas as igrejas que realizam e publicam estatísticas de seu trabalho. Conta-se o número de membros e se espera que este, ano após ano, seja maior. Conta-se o número de ofícios religiosos, de participantes dos mesmos, conta-se a quantidade de ofertas, a quantidade destinada para cada aspecto do trabalho, e assim por diante.
A questão do crescimento da igreja tomou di-mensões bem especiais nas missões. O cristianismo tem como característica o testemunhar de sua fé a não-cristãos. A fé cristã crê que o Deus triúno é o único Deus e que seu Filho Jesus Cristo é o único salvador da humanidade. Assim sendo, e em obediência à vontade expressa de Deus, os cristãos sempre estiveram preocupados em testemunhar a sua fé, levando-a aos não-cristãos, para que estes também sejam salvos mediante a fé em Jesus Cristo. Esta preocupação pela difusão do evangelho para a salvação dos que não crêem, é uma das questões que mais tem a ver com o crescimento da igreja. Sabendo-se as taxas de crescimento da população mundial, sabendo-se o total da população mundial, e sabendo-se as taxas de crescimento da igreja cristã, e sabendo-se o total de pessoas cristãs, é possível fazer uma projeção no sentido de saber se de fato todas as pessoas, algum dia, chegarão a ser atingidas pelo evangelho, ou se a igreja, em vez de crescer, na realidade está diminuindo proporcionalmente em todo o mundo.
Esta preocupação de levar o evangelho à todas as nações fez com que surgissem em muitos grupos de cristãos a preocupação com as missões. Sociedades missionárias, métodos missionários, estudos mis-siológicos foram desenvolvidos. Nem sempre os métodos tinham uma base teológica sadia. Outras vezes a questão teológica era colocada em termos de mínimo necessário. Procurava-se algo que desse certo, que produzisse resultados, que demonstrasse efetivamente resultar em crescimento da igreja. Em meio a isto surgiu a teoria do Church Growth, a qual, daqui por diante, passaremos a designar como nome próprio, em sua língua original.
Aconteceu com o Church Growth o que já havia acontecido com outros movimentos e teorias surgidos. Alguns luteranos, julgando válidas suas preocupações e colocações, e, ao mesmo tempo, reconhecendo que a base teológica da teoria não era absolutamente a melhor, começaram a fazer adaptações desta teoria para a teologia luterana. Seriam válidas estas adaptações? Adaptações de métodos e teoria à teologia luterana não resultariam também na deformação da própria teologia, com todas as conseqüências daí advindas? Com esta preocupação nos propusemos ao presente estudo.
Neste trabalho não pretendemos analisar toda a teoria do Church Growth. A mesma já tem quase três décadas de história. Também não dispomos de toda a literatura que o movimento já publicou. As raízes deste movimento estão na Escola de Missão Mundial do Seminário Teológico Fuller, em Pasadena, Califórnia, EUA. Seus idealizadores mais significativos são os professores desta escola, Donald McGavran e C. Peter Wagner. Neste trabalho vamos nos ater mais a analisar dois autores, que sendo luteranos, são defensores das idéias do Church Growth, e fazem uso das mesmas em seus escritos. São eles o Dr. Waldo Werning, que é conhecido do público brasileiro, por ter obra sua traduzida para o português 1- e o Dr. Kent R. Hunter. Este último tem diversas obras publicadas sobre Church Growth e é o criador e Diretor do "Church Growth Analysis and Learning Center", o qual se preocupa em dar assistência a igrejas que pretendem trabalhar com os princípios desta teoria.
Neste trabalho iremos fazer uma tentativa de colocar o movimento de Church Growth numa pers-pectiva histórica, iremos analisar seu método prático em confrontação com o princípio teológico, e iremos chamar a atenção para as principais doutrinas envolvidas na teoria do Church Growth, as quais não podem ser deturpadas sob pena de se perder a genuína fé cristã. Também iremos apontar para algumas questões que julgamos positivas no movimento.
CAPÍTULO I
HISTÓRICO
E muito importante, ao se analisar um movimento surgido dentro do cristianismo, conhecer as origens do mesmo. 2 Via de regra, isto revela muito, porque nos diz se ele surgiu em oposição a alguma idéia, se ele surgiu como apoio a alguma idéia, ou se ele surgiu como modificação de algo. Assim, por exemplo, o estudo histórico da reforma luterana irá nos ajudar a compreender o seu conteúdo. Tem-se uma visão bem mais correta da reforma luterana quando estudamos a mesma dentro da perspectiva histórica.
Hunter, um dos autores em foco neste estudo, preocupou-se em fazer uma interpretação da história da igreja cristã e colocar o Church Growth dentro da mesma. Encontramos, no capítulo III de seu livro Foundations For Church Growth, esta tentativa. Ele diz que o crescimento da igreja cristã foi impressionante no primeiro século. Este crescimento era espontâneo e se dava à medida que as pessoas se reuniam diariamente em torno da palavra e dos sacramentos. Pelo quarto século, a igreja havia crescido tanto que penetrava até mesmo nas estruturas do
Império Romano, conquistando a devoção do Imperador Constantino. Aí a igreja tornou-se religião oficial do estado, perdendo muito de sua espontaneidade. Mas ela continuava crescendo, pois sempre que o Império conquistava uma nação, o cristianismo tornava-se a religião oficial.
Do século décimo ao décimo - quarto, o cres-cimento do cristianismo deveu-se, especialmente, à ação das ordens monásticas, as quais contribuíram em muito para a difusão do evangelho.
No décimo - sexto século, um monge da ordem dos agostinianos, Martinho Lutero, trouxe um mo-vimente que resultou na reforma da igreja. Este movimento, segundo Hunter, restaurou o tema central do evangelho: a salvação por graça, mediante a fé em Cristo. A reforma luterana se caracterizou pela impressão de muito material escrito, como Bíblias e catecismos. Isto foi um estágio preparatório para os esforços missionários do século dezenove.
No século dezenove, pela leitura sobre a natureza e a missão da igreja, surgiram sociedades missionárias, sociedades bíblicas, e missionários, que se espalharam por toda a terra. No entanto, no início do século vinte, dentro do protestantismo, surgiu um movimento liberal da teologia, que colocou como prioridade dentro de muitas igrejas a ação social, em lugar do evangelismo. Também ocorreram problemas nas novas missões, onde, em vez do evangelho, estavam sendo promovidas a cultura e costumes ocidentais, e onde muitas igrejas novas queriam reger a si próprias, sob a resistência das igrejas mães. Além disto, uma onda de nacionalismo varreu o mundo dificultando o relacionamento das igrejas e entravando o movimento missionário. 3
Após esta apreciação da história, Hunter diz textualmente:
Into this setting, the Church Growth Move- ment was born. Today, thousands of Chris- tian people are learning church growth prin- cipies and putting them into practice in con- gregations around the world. The Church Growth Movement is a renewal of God's design for the church. People are seeing the church as a living organism with a mission to the world. The foundations for church growth are being thought and practiced among Christians of every major denomination. 4
Nota de Rodapé
1 Waldo J. Werning, Chamado à Mordomia, 2. ed. (Porto Alegre: Concórdia, 1981).
2 Há uma boa introdução sobre a história do Church Growth e sobre aquele que é considerado seu principal idealizador, o Dr. Donald McGavran, no artigo de Elmer Mathias, "This Lutheran Sees Value en Church Growth", Concordia Journal, (St. Louis, Missouri: Concordia Seminary, March, 1984), pp. 53-55.
3 Kent R. Hunter, Foundations for Church Growth (New Haven, Missouri: Leader Publishing Company, 1983), pp. 54-55.
4 Idem, ibidem, p. 55. Tradução: "Por esta afirmação, o Movimento do Church Growth surgiu. Atualmente, milhares de cristãos estão aprendendo os princípios do Church Growth e colocando-os em prática em congregações em todo o mundo. O Movimento do Church Growth é uma renovação do plano de Deus para a igreja. As pessoas vêem a igreja como um organismo vivo com uma missão para o mundo. Os fundamentos para o crescimento da igreja estão sendo ensinados e praticados entre cristãos de todas as grandes denominações."
Esta interpretação do movimento do Church Growth dentro da história da igreja cristã, feita por um integrante do movimento, demonstra que o mesmo faz de si próprio uma imagem muito boa. Suas pretensões alcançam a totalidade da cristandade. Vêem-se como um novo movimento de reforma na igreja, a complementação prática do que Martinho Lutero teria promovido na doutrina. Diz Hunter:
Where as Martin Luther and the reformers of the 16th century brought about a re formation of theology, many people today believe that the Church Growth Movement is bringing about a reformation in practice. If this is correct, the church today is in the midst of another reformation. The Church Growth Movement doesn't reform the theology of the Reformation. It is based on it. Church growth puts into practice the great truths of Scripture which were emphasized by Luther and the reformers. 5
Como vemos, Hunter interpreta o movimento do Church Growth como descendente direto do movimento da Reforma feita por Martinho Lutero. Se assim fosse, o Church Growth poderia ser denominado um movimento de reavivamento surgido em conseqüência da teologia luterana.
A esta interpretação gostaríamos de contrapor algumas considerações. A grande preocupação do Church Growth é o evangelismo. Ele procura colocar o evangelismo como o grande objetivo do trabalho da igreja. É ganhando pessoas para a fé crista que a igreja cresce. Esta preocupação pela difusão da fé é legítima e bíblica. No entanto, a história da igreja tem demonstrado que esta preocupação teve seus desdobramentos no período que seguiu a reforma luterana. Assim sendo, não é absolutamente certo que o Church Growth seria resultante da reforma que Martinho Lutero promoveu na doutrina.
A preocupação luterana, expressa pela teologia luterana, está em confessar com exatidão a mensagem da salvação pela fé em Jesus Cristo, para que todo o que crê em Cristo não pereça, mas tenha a vida eterna. A ênfase está no Cristo Salvador por nós. Os meios da graça, palavra e sacramentos, são fundamentais. Ainda devemos lembrar que a reforma luterana surgiu em resposta à teologia romana que enfatizava a participação humana na obra da salvação, e que promovia o que os confessores luteranos chamaram de terrores da consciência, pois
nunca o cristão tinha certeza de haver feito o suficiente para a salvação.
Quase neste mesmo período começou a surgir o movimento que ficou conhecido como reformado, que teve seu expoente máximo em João Calvino. A ênfase desta teologia já não estava mais tanto no Jesus Salvador por nós, mas na Glória de Deus, e no Jesus Senhor. A teologia reformada dava também outros valores para o que luteranos consideravam meios da graça de Deus. Não havia a mesma ênfase nos sacramentos e na palavra de Deus não havia sempre a correia distinção entre lei e evangelho.
Com o desenvolvimento da história, dentro do luteranismo surgiu o pietismo, que, de certa forma, abriu algumas portas para o movimento reformado. No pietismo começou a ênfase na fé pessoal, na obediência pessoal ao salvador, o que tirou do centro da fé cristã a objetividade da vida e obra de Cristo por nós, abrindo o campo e colocando o centro na experiência pessoal, subjetiva.
Dentro do campo reformado, foram se desen-volvendo os que hoje são chamados de evangelicais. Eles, dando ênfase ao evangelismo, desenvolveram diversos métodos para realizar esta obra de evangeli-zação. Foram os responsáveis pelo surgimento das grandes cruzadas evangelíticas, pelo aparecimento de grande pregadores carismáticos, pelo chamado "Plano Kennedy de Evangelismo" e outros. Muitas vezes, luteranos, admirando-se dos resultados destes métodos, procuraram aprendê-los e adaptá-los para a teologia luterana.6
Dentro desta realidade reformada e não luterana, surgiu também o movimento do Chruch Growth. Discordamos, portanto, de Hunter que classifica o movimento como continuação da reforma luterana. O Church Growth tem como autores originais pessoas que batalham em igrejas e organizações descendentes da teologia calvinista, e, de forma mais ou menos evidente, seguem os princípios calvinistas no desenvolvimento de sua teoria. Como já havia ocorrido com outros movimentos evangelicais, também o Church Growth teve admiradores luteranos que procuraram torná-lo aceitável para luteranos, e, se possível, luteranizar completamente o movimento.
No entanto, apesar destas tentativas, muitas vezes, a origem histórica do movimento transparece, como vemos na seguinte citação de Hunter:
The only proper motive for church growth is
Nota de Rodapé
5 Idem, ibidem, p. 16. Tradução: "Enquanto Martinho Lutero e os reformadores do século XVI promoveram uma reforma da teologia, muitas pessoas hoje acreditam que o Movimento do Church Growth está promovendo uma reforma na prática. Se isto está correto, a igreja hoje está em meio à uma outra reforma. O Movimento do Church Growth não reforma a teologia da Reforma. Ela está baseado nela. O Church Growth coloca em prática as grandes verdades da Escritura as quais foram enfatizadas por Lutero e os reformadores."
6 Hans-Lutz Poetsch tece bom comentário sobre estas adaptações no artigo "Gnadenmittel und Evangelization", in Evangelium, 'euaggetion' Gospel (Bremen: Lutherischen Stunde, April, 1979).
obedience to Jesus Christ. To be a church growth person is to take the Lord at His Word. Church growth comes from the de-sire to serve God and to serve fellow man. It is a characteristic of true discipleship. Church Growth is God's will. The proper motive for being involved in church growth is obedience to His will. A church growth person is one who desires to be used by God in His plan of salvation for the internal and external growth of His kingdom to the glory and honor of Jesus Christ. 7
ning and participation of lay people, too little sensitivity to the authority and power of the Holy Spirit, and too easy acceptance of mi-nimal results long after the larger response should have been expected. Goals that are inadequate, immeasurable, or unattainable are avoided. There is concern about quantity and quality in testing the performance and setting goals and strategies for greater Gos-pel effectiveness and outreach. Thus the group seeks to be a responsible church. 9
Se palavras como as acima mostram a origem e a forte influência calvinista do Church Growth, por outro lado lembramos que este movimento pre-cisa ser visto dentro do contexto cultural norte-americano, sob cuja influência o movimento se de-senvolveu. Notadamente a maneira de pensar norte-americana é influenciada pelo pragmatismo. As teo-rias precisam ter resultados práticos. Na igreja, o resultado prático é o crescimento. Hunter reconhece que não se pode medir a fé, ou a igreja invisível, mas afirma que os frutos da fé e as estatísticas da igreja são mensuráveis. 8 A preocupação pelo crescimento da igreja é algo que pode, inclusive, assumir proporções angustiantes quando consideramos esta questão em frentes missionárias de crescimento lento ou em congregações com sérios problemas de estag-nação. Como ser mais efetivo e o que fazer para al-cançar resultados notáveis, são perguntas muito im-portantes para quem se preocupa seriamente com seu trabalho. O trabalho realizado deve produzir efeitos visíveis.
Esta presença da cultura tipicamente norte-americana na preocupação pelos resultados práticos é algo que os defensores do Church Growth apre-sentam. Waldo Werning diz:
Leaders attempt to identify negative factors such as defeatist altitudes, self-centeredness, bondage to human traditions, too much de-pendance upon paid workers, too little trai-
A preocupação em medir os resultados alcan-çados pelo trabalho da igreja não é um mal em si. Até, pelo contrário, pode ser útil na análise de um trabalho e pode ajudar a detectar problemas e a indi-car prioridades no trabalho de uma congregação. Hunter salienta isto ao dizer que estatísticas são ape-nas um meio e não um fim. Elas formam a base para um bom e sólido planejamento. (10) No entanto, no afã de colher resultados, os defensores do Church Growth se afastam dos princípios bíblicos, propondo que congregações estabeleçam objetivos de fé para o seu crescimento, em torno dos quais irão lutar. Nesta altura, a preocupação correta em torno do crescimento extrapola. O próprio crescimento se torna um fim em si, tomando o lugar do verdadeiro fim que é a salvação das pessoas mediante a prega-ção da palavra de Deus e a administração dos sacra-mentos. Vemos neste aspecto do Church Growth uma característica da maneira tipicamente norte-americana de pensar e não um princípio bíblico como os defensores do movimento querem fazer crer.
Sobre a questão da projeção de fé cabe ainda uma palavra. Hunter afirma que a projeção de fé para o crescimento da congregação está baseada na vontade de Deus. Examinando, porém, mais a fundo as palavras de Hunter, tem-se a impressão que o es-tabelecimento de uma projeção de fé para o cresci-mento da congregação está baseado muito mais em desejos humanos que em revelação divina. Isto con-cluímos destas palavras do autor em foco:
A faith projection is made when a congrega-tion sets a goal greater then its projected
Nota de Rodapé
7 Kent R. Hunter, op. cit., p. 43. Tradução: "O único motivo correto para o crescimento da igreja é a obediência a Jesus Cristo. Assumir o Church Growth é apegar-se ao Senhor em sua Palavra. O Church Growth provém da vontade de servir a Deus e ao próximo. É uma característica do verdadeiro discipulado. O Church Growth é da vontade de Deus. O motivo correto para se estar envolvido no crescimento da igreja é a obediência à vontade de Deus. Uma pessoa envolvida no Church Growth é aquela que deseja ser usada por Deus em seu plano da salvação para o crescimento interno e externo do Seu reino para a glória e honra de Jesus Cristo”.
8 Idem, ibidem, p. 128.
9 Waldo J. Werning, Vision and Strategy for Church Growth (Chicago: Moody Press, 1978), p. 12. Tradução: "Os líderes procuram identificar fatores negativos tais como atitudes derrotistas, egocentrismo, dependência a tradições humanas, dependência demasiada de obreiros remunerados, pouco treinamento e participação de leigos, pouca sensibilidade à autoridade e força do Espírito Santo, e a pronta aceitação de resultados mínimos em contraste aos grandes resultados que se deveriam esperar. As metas que são inadequadas, não-mensuráveis ou inatingíveis são evitadas. Há preocupação quanto a quantidade e qualidade quando se verifica a atuação e se propõe metas e estratégias para uma maior eficácia e alcance do Evangelho. Assim, o grupo precisa ser uma igreja responsável."
10 Kent R. Hunter, op. cit., p. 144.
growth. It is based on faith - trusting that the Lord will build His church. It is also based on prayer - prayer that the Lord of the harvest will send laborers into His harvest. It is finally based on a congregational commitment to seek the Lord's will for the comprehensive growth of His Kingdom. 11
Concluímos este capítulo a respeito do histórico do movimento Church Growth com a convicção de que, para compreendê-lo adequadamente precisamos compreender sua origem dentro da teologia reformada e a influência da cultura americana que busca eficácia e funcionalidade em todos os seus empreendimentos.
CAPITULO II
DEFINIÇÃO DO CHURCH GROWTH
O que é o movimento do Church Growth? Quais os seus propósitos? Estas perguntas são respondidas de duas maneiras pelos próprios defensores do movimento. De um lado eles dizem o que o Church Growth não é, ou seja, procuram defender-se de acusações que lhes são feitas. Por outro lado, procuram elaborar uma definição positiva deste movimento.
Hunter diz que o Church Growth não é apenas mais um programa para a igreja; não é um "jogo de números", onde a preocupação esteja apenas em conferir resultados numéricos; não é algo novo, mas tem suas origens no Novo Testamento; não é algo centrado no ser humano, mas está centrado em Jesus Cristo; não é o caminho mais fácil, mas um trabalho árduo. 12
Werning, igualmente, defende-se de acusações dizendo que classificar o movimento do Church Growth como um simples jogo de números é um criticismo pérfido. 13
Ao definir positivamente o que é o Church Growth, e o que pretende, Werning diz: The church growth concept rests upon true biblical and theological foundations. It help leaders to analyze situations by getting the facts and clearing up misunderstandings and mistakes. It considers the dynamics by which the church grows, in order to discover and apply principies of growth, to establish priorities, and to set goals on the basis of possibilities for growth by the Spirit of God in each unique environment. Formulation of good exciting, and attainable plans are proposed for action. 14
Hunter já se preocupa muito mais que Werning em proporcionar uma boa definição do que seja o Church Growth. E ele é muito cuidadoso nesta definição. Ele fornece uma definição formal para o movimento, no entanto, diz que isto não é suficiente para compreendê-lo. Para se entender exatamente o que seja o Church Growth seria necessário analisá-lo sob cinco perspectivas diferentes, sendo a definição formal apenas uma destas perspectivas.
A definição formal fornecida por Hunter é a que segue:
Church Growth can be formally defined as that science which investigates the nature, function and health of Christian churches, as they relate to the effective implementation of the Great Commission to "... make disciples of all nations ..." (Matt. 23:19). Church growth is simultaneo-usly a theological conviction and an applied science, striving to combine the eternal prin-ciples of God's Word with the best insights of contemporary social and behavioral sciences. 15
A segunda perspectiva sob a qual, segundo Hunter, é preciso ver o Church Growth, é a perspectiva eclesiológica. Neste aspecto, a igreja é vista como um organismo vivo. Hunter afirma com os reformadores que a igreja está onde a palavra é proclamada e os sacramentos administrados, e acrescenta que onde a igreja não cresce ali existem problemas. A esta altura ele divide a igreja em dois aspectos: um divino, onde Deus é o Senhor, e outro humano, composto pelas pessoas. Sob o ponto de vista eclesiológico, a teoria do Church Growth teria
Nota de Rodapé
11 Idem, ibidem, pp. 145-146. Tradução: "Uma projeção da fé ocorre quando uma congregação propõe uma meta maior do que o seu crescimento previsto. Baseia-se na fé - crendo que Deus edificará Sua igreja. Baseia-se também na oração - oração que o Senhor da ceifa enviará trabalhadores para a sua seara. Por fim, baseia-se no compromisso congregacional de buscar a vontade de Deus para um significativo crescimento do seu Reino".
12 Idem, ibidem, pp. 18-21.
13 Waldo J. Werning, Vision and Strategy, p. 10
14 Idem, ibidem, p. 12. Tradução: "O conceito do Church Growth baseia-se em verdadeiros fundamentos bíblicos e teológi-cos. Ele auxilia líderes a analisar situações pela tomada dos fatos e o esclarecimento de equívocos e erros. Ele considera a dinâmica pela qual cresce a igreja, a fim de descobrir e aplicar os princípios de crescimento, para estabelecer prioridades, para por metas com base nas possibilidades para o crescimento pelo Espírito de Deus em cada situação peculiar. Propõe-se para ação com a formulação de planos bons, vibrantes e atingíveis".
15 Kent T. Hunter, op. cit., p. 23.
Tradução: "O Church Growth pode ser definido como aquela ciência que investiga a natureza, função e saúde das igrejas cristãs, em sua relação para com a efetiva implementação da Grande Comissão para “... fazer discípulos de todas as nações . . ." (Mt 28.19). O Church Growth é simultaneamente uma convicção teológica e uma ciência aplicada, empenhando-se por combinar os princípios eternos da Palavra de Deus com as melhores percepções das ciências sociais e comportamentais da atualidade."
a capacidade de diagnosticar os problemas que entravam o crescimento da igreja e de achar os meios para levá-la de volta ao crescimento. 16
A terceira perspectiva pela qual se deve olhar o Church Growth é a perspectiva da filosofia de mi-nistério. A filosofia de ministério seria a identidade de uma igreja. Reconhece o Church Growth que cada igreja tem características diferentes, embora exista uma só fé. Assim sendo, o Church Growth se preocupa em providenciar uma linha comum de atitudes similares em referência à missão da igreja. A filosofia de ministério seria este aspecto unificador da atividade da igreja. Neste aspecto, Hunter afirma que:
(A) A filosofia de ministério do Church Growth é construída sobre os meios da graça (palavra e sacramento) e sobre a oração. Com isto, a igreja tem uma experiência espiritual, tem abertura para a graça e o perdão de Deus em Cristo, tem um respeito renovado pela palavra de Deus como norma de fé e prática, e tem a disposição de viver sob o se-nhorio de Jesus Cristo, pelo poder do Espírito Santo;
(B) A filosofia de ministério do Church Growth baseia-se no objetivo do evangelismo dado pela Grande Comissão e sua ênfase desloca-se do "ganhar membros" para o fazer discípulos;
(C) A filosofia de ministério do Church Growth reconhece que todo membro da igreja tem um ministério a cumprir;
(D) A filosofia de ministério do Church Growth é sensível às necessidades das pessoas. O evangelho deve ser anunciado por palavras e ações e deve haver coerência entre o ensino e a prática;
(E) A filosofia de ministério do Church Growth é voltada para a missão. A igreja foi envia da ao mundo e ela realmente deve ir e não esperar que o mundo venha a ela;
(F) A filosofia de ministério do Church Growth cria uma consciência de que o evangelho deve ser pregado em todo o mundo. 17
Analisando o Church Growth a partir de sua filosofia de ministério, cremos que os pontos B, C, D, E, e F dão uma boa colocação sobre como deveria ser o ministério. No entanto, no ponto A existem algumas dificuldades. Ao colocar lado a lado os meios da graça e a oração como fundamentos da filosofia de ministério, abrem-se as portas para o subjetivismo e para o sinergismo. Os meios da graça
procedem de Deus. A oração parte do homem. Este mesmo subjetivismo se nota também quando se fala que há uma experiência espiritual. O sinergismo fica claro quando se fala em abertura para a graça. Não há, da parte do ser humano, abertura da graça. A graça é de Deus, e é pelo poder de Deus é que o homem a recebe.
Seguindo na análise das diversas perspectivas sob as quais o Church Growth deve ser encarado, a quarta é a que entende o crescimento da igreja como um processo. Assim sendo, os princípios do Church Growth tendem a unificar os vários aspectos do trabalho da congregação, e o processo de crescimento irá perpassar e revolucionar todos os segmentos da mesma.
Finalmente, deve-se analisar o Church Growth como sendo uma atitude. Church Growth é uma atitude de otimismo, uma atitude pragmática, uma atitude de quem deve prestar contas, e uma atitude que reflete urgência. 18
O que se pode concluir estudando as definições do que seja o Church Growth, é o mesmo que já se notou no estudo do mesmo sob a perspectiva histórica, ou seja, que sua teologia provém de meios não-luteranos. Autores luteranos tentaram adaptá-lo de forma a ser aceitável para luteranos.
Esta adaptação é reconhecida por Werning que
diz:
"Full recognition is given to the church growth leaders, founder Donald McGravan and his colleagues, whose insights permeate all church growth materials, including this book." 19 E, logo adiante, Werning diz que seu livro é inspirado nas leituras de livros de líderes do Church Growth, tais como Donald McGavran, C. Peter Wagner, Vergil Gerber, Win Arn, Ralph Winter, e outros. 20
A linguagem luterana (como citação de con-fissões luteranas, meios da graça, distinção entre lei e evangelho, etc.), no entanto, nem sempre consegue ocultar a teologia diferente que dirigiu os criadores da teoria do Church Growth. Este aspecto iremos analisar no capítulo seguinte.
Nota de Rodapé
16 Idem, ibidem, pp. 25-26.
17 Idem, ibidem, pp. 26-29.
18 Idem, ibidem, pp. 29-30.
19 Waldo J. Werning, Vision and Strategy, p. 10. Tradução: "Pleno reconhecimento é dado aos líderes do Church Growth, ao fundador Donald McGravan e a seus colegas cujas percepções permeiam todo o material do Church Growth, inclusive este livro."
20 Idem, ibidem, p. 10.
CAPÍTULO III
O PRINCÍPIO TEOLÓGICO E O MÉTODO PRÁTICO
O Church Growth vê a si próprio como sendo
uma ciência aplicada, algo prático, não somente uma teoria. 21 Além disto, o Church Growth diz de si mesmo que ele procura dirigir a atividade da igreja em direção ao evangelismo, conforme expresso na Grande Comissão. 22 Estes dois princípios não são maus, até, pelo contrário, são bons. A própria teologia não é apenas algo teórico. A teologia volta-se á realidade e é, por isto, prática. Além disto, a atividade da igreja cristã deve ser voltada para o evangelismo. Toda a atividade da igreja, se não tiver os olhos voltados para o evangelismo, perde o foco correto de ser igreja no mundo.
Sendo a teologia uma atividade prática, devem-se discutir duas questões pertinentes: uma, é a dos objetivos que se pretendem alcançar; a outra, é a dos meios a serem empregados para os objetivos serem alcançados. Os objetivos são determinados pelo princípio teológico.
Nos capítulos anteriores vimos que o Church Growth, em suas origens, teve forte influência evan-gelical e não da teologia luterana. Qual seria a diferença entre estas duas teologias? Karl L. Barth, num discurso que proferiu por ocasião das celebrações dos 500 anos de Lutero, enfocou os princípios cardeais do luteranismo e da "teologia evangelical". Diz ele: "The difference stems from a different starting point. At the heart of Reformed theology is the sovereignty of God. At the heart of Lutheran theology is the grace of God. The latter evokes, first of all, faith and trust, the former obedience." 23
O objetivo da teologia luterana é a salvação, que se encontra na graça de Deus em Cristo. Esta graça é apreendida pela fé. O objetivo da teologia evangelical é a soberania de Deus, caracterizada pela busca da obediência por parte dos homens. A teologia luterana, por enfatizar a graça de Deus em Cristo, aponta para a fé. A teologia reformada, evangelical, por enfatizar a soberania de Deus, aponta para a obediência.
A teologia luterana, reconhecendo o monergismo divino, tem forte consciência do valor dos meios da graça para a vida de fé. A teologia reformada, procurando melhorar a obediência, aponta para o caminho do treinamento na vida cristã. Vemos assim, que para a teologia reformada a questão dos métodos é de grande importância para o desen-volvimento do próprio princípio teológico. Na teologia luterana os métodos nunca estão em primeiro plano, visto que a graça é de Deus, e a própria fé é humana na obra da salvação. Para luteranos, o homem não tem nenhuma parte a fazer visto Cristo ter feito tudo pela salvação. A santificação, na teologia luterana, é parte importante da vida crista, é distinta da justificação, mas não pode ser separada da mesma. Na teologia reformada em geral, e no Church Growth em particular, a santificação aparece como separada da justificação. Assim, a pessoa, depois de crer, precisa tornar-se discípula. 24
Toda a questão da ênfase na obediência e na eficácia na obra da igreja, tira o centro da teologia do "sola gratia" e o coloca naquilo que o ser humano faz. A obra da salvação não aparece mais como obra exclusiva de Deus, mas depende, fundamentalmente, da participação humana. Com isto, cresce a importância de estudar bem o comportamento humano para efetuar um bom trabalho no reino de Deus. O Church Growth enfatiza muito este estudo do comportamento humano. A teologia, segundo o Church Growth, embora deva ser boa, não é tão fundamental na eficácia da obra da igreja. Leia-se o que diz Hunter:
Effectiveness does not fluctuate because of changes in the Gospel or the willingness of the Holy Spirit. These divine qualities are constant. But the methods and the receptors are constantly changing. Research is the key. The church must Be constantly asking, "is the message getting through? If not, why not? What can be done to clear channels for God to reach people through the church? How are people coming into the church? What is working? What can be done to utilize that which is working so that the mission and ministry can be more effective? What communication method is working? What churches are growing? Why? What can the local congregation learn from the effective examples of other churches?" 25
O que se percebe, lendo autores do Church
21 Kent R. Hunter, op. cit., p. 23.
22 Idem, ibidem, p. 27.
23 Karl L. Barth, "Cardinal Principles of Lutheranism and "Evangelical Theology", Concordia Journal (St. Louis, Missouri: Concordia Seminary, March, 1981), pp. 56-57. Tradução: "A diferença provém de um ponto de partida diferente. No coração da teologia reformada está a soberania de Deus. No coração da teologia luterana está a graça de Deus. Esta produz, antes de tudo, fé e confiança, a anterior obediência."
24 Kent R. Hunter, op. cit., p. 64.
25 Idem, ibidem, p. 99. Tradução: "A eficácia não varia por causa de mudanças no Evangelho ou na disposição do Espírito Santo. Estas qualidades divinas são constantes. Mas os métodos e os receptores estão constantemente mudando. Pesquisar é a chave. A igreja precisar questionar: "A mensagem está sendo passada adiante? Se não, por que não? O que pode ser feito para desobstruir os canais para Deus a fim de alcançar o povo através da igreja? Como as pessoas entram para a igreja? O que está dando certo? O que pode ser feito para utilizar aquilo que está funcionando de forma que a missão e o ministério possam ser mais efetivos? Qual o método de comunicação está funcionando bem? Quais igrejas estão crescendo? Por quê? O que a congregação local aprende dos exemplos efetivos de outras igrejas? "
25
Growth, é que eles pressupõem doutrina sadia. Muitas vezes, tratando-se de coisas práticas, se age desta forma. No entanto, a questão doutrinária nun-ca pode ficar em segundo plano. Ela é fundamental. Perdendo-se a boa doutrina, perde-se tudo. Dentro do luteranismo, a afirmação do "sola gratia, sola fi-de, sola Scriptura" sempre foi fundamental e ante-rior à preocupação pelo método.
Quando se trata de assunto tão importante como o evangelismo na igreja cristã, o conteúdo do evangelho a ser propagado não pode ficar no suben-tendido. É preciso explicitar qual é este evangelho, porque apenas ele é "poder de Deus para a salvação de todo o que nele crê" (Rm 1.16), e não a organiza-ção de uma instituição eclesiástica, por mais perfeita e funcional que ela seja.
Analisar o Church Growth a partir de método prático que o mesmo aplica, ou analisar qualquer teologia a partir do que ela representa para a vida das pessoas e das igrejas é sempre um bom elemento de pesquisa. Muitas vezes o método prático denun-cia a existência de uma falsa teologia. O grande pe-rigo e dano, no entanto, nunca está no método e sim na teologia. Assim, também no Church Growth, muito pode ser aprendido em seus estudos da prática da vida da igreja, mas muito pode ser perdido quan-do falsos conceitos teológicos são aplicados na práti-ca.
CAPÍTULO IV
PRINCIPAIS DOUTRINAS ENVOLVIDAS
A questão da doutrina não pode ser nunca desprezada ou relegada a um segundo plano dentro da igreja cristã. É sobre um artigo de doutrina, a doutrina da justificação, que a igreja permanece ou sucumbe. A questão da organização da igreja e do trabalho da igreja não deixa de ser importante. Ela deve sempre estar a serviço dos meios da graça. A organização não pode acrescentar nada ao poder e eficiência da palavra e dos sacramentos, mas pode criar barreiras que dificultem a distribuição dos meios da graça. Neste aspecto, o estudo da organi-zação e dos métodos torna-se bastante interessante, embora, voltamos a insistir, nenhum método, ne-nhuma organização, nada enfim, pode acrescentar algo de eficiência aos meios da graça.
Hunter reconhece que a doutrina correta é im-portante. Ele diz claramente: "Order in the church is a secondary concern. Correct doctrine is essen-tial." 26
O que resta saber é se as principais doutrinas cristãs, as quais são essenciais, não foram obscureci-das, modificadas ou negadas ao longo da discussão a respeito de técnicas e de organização da igreja. Se assim for, é importante deixar de lado o secundário (organização) e ficar com o que é essencial (doutrina correta).
Analisaremos a seguir algumas das principais doutrinas envolvidas pela teoria do Church Growth. Não pretendemos ser exaustivos nesta análise. Fi-xamo-nos apenas em algumas que julgamos estão mais diretamente envolvidas.
1. A doutrina da justificação.
A doutrina da justificação, como lembramos anteriormente, é o artigo sobre o qual a igreja per-manece ou sucumbe. Em tomo desta doutrina estão os principais artigos da fé, expressos nas confissões luteranas, como a salvação pela graça mediante a fé, a doutrina da igreja, dos sacramentos, do ministério, do pecado original, e assim por diante.
A Confissão de Augsburgo afirma:
Ensinam também que os homens não podem ser justificados diante de Deus por forças, méritos ou obras próprias, senão que são jus-tificados gratuitamente, por causa de Cristo, mediante a fé, quando crêem que são recebi-dos na graça e que seus pecados são remitidos por causa de Cristo, o qual através de sua morte fez satisfação pelos nossos pecados. Essa fé atribui-a Deus como justiça aos seus olhos. Rm 3 e 4. 27
Os luteranos afirmam o monergismo divino. Deus planejou nossa salvação. Deus, em Cristo, efetuou nossa salvação. Deus nos dá a salvação me-diante a fé, que é também um dom da parte dele. Deus faz tudo por nós. Não há nenhuma espécie de colaboração possível nem requerida, antes da fé, na fé, ou para complementar a obra da salvação. Deus age por nós e em nós.
Segundo Hunter, um dos axiomas chaves para uma igreja saudável é que ela esteja disposta e queira pagar o preço do crescimento. 28 Quando a igreja tem esta disposição e paga uma parte do preço, no entanto, temos que responder, ao menos, a doutrina da justificação por graça fica obscurecida. Mesmo que este preço, segundo os defensores do Church Growth, faça parte da santificação, os problemas continuam sendo muito semelhantes.
26 Idem, ibidem, p. 152. Tradução: "Ordem na igreja é uma preocupação secundária. Doutrina correta é essencial".
27 Livro de Concórdia, Trad. Arnaldo Schüler (São Leopoldo, Porto Alegre: Sinodal, Concórdia, 1980), Confissão de Augsburgo, IV, 1-3, pp. 64-65.
28 Kent R. Hunter, op. cit., p. 165.
26
A doutrina da justificação e da santificação devem ser distinguidas, mas não separadas. Quando não se distingue entre estas doutrinas, falha-se na distinção entre lei e evangelho. Quando se separa estas doutrinas, então se cria classes de cristãos dentro da igreja, cria-se elites espirituais, onde uns seriam superiores aos outros. Isto obscurece e afronta a doutrina da justificação, pois pela fé todos são igualmente justificados. O incentivo à santificação é necessário e é fundamentado na graça que Deus nos dá em Cristo. As boas obras devem ser estimuladas por serem vontade de Deus, mas não tornam as pessoas mais ou menos cristãs.
As confissões luteranas tratam longamente destes assuntos, especialmente na Apologia da Confissão de Augsburgo e na Fórmula de Concórdia. O Church Growth parte do princípio que há diferença entre ser apenas membro da igreja e ser discípulo. 29 Quando uma pessoa chega à fé, ela é membra da igreja, mas não é ainda um discípulo. Diz Hunter: "Disciples are made, not born. Making disciples requires on-the-job training." 30
Se examinarmos com maior cuidado o texto de Mt 28.19-20, veremos que realmente discípulos são feitos. Mas são feitos por Deus, através do batismo e do ensino, ou seja, através dos meios da graça que Deus concedeu para este fim. O batismo é também chamado em Tt 3.5,6 de "lavar regenerador e renovador do Espírito Santo". E Jesus diz a Nicodemos que "quem não nascer da água e do espírito não pode entrar no reino de Deus" (Jo 3.5). Disto conclui-se que realmente discípulos são feitos, mas são feitos por Deus, quando estes nascem novamente, e não através de um processo mais ou menos longo.
Na vida cristã busca-se um crescimento na fé, no conhecimento, mas este crescimento não nos torna melhores ou mais aceitáveis diante de Deus. Con-tinuamos sendo totalmente e simultaneamente pecadores e justos. Este crescimento referido é fruto da fé. O Deus que concede a fé, concede o crescimento, mediante os meios da graça que ele dá.
É preciso dizer, a bem a verdade, que em muitas passagens os autores do Church Growth procuram enfatizar a justificação por graça, mediante a fé. No entanto, passagens como as que citamos neste item, abrem portas para doutrinas errôneas, que obscurecem os méritos de Cristo como Salvador. E, quando isto ocorre, perde-se o artigo mais importante da fé.
2. A doutrina do pecado original.
A doutrina do pecado original, conforme as confissões luteranas, afirma que depois da queda de Adão todos os homens propagados segundo a natureza nascem com pecado, isto é, sem temor de Deus, sem confiança em Deus, e com concupiscência, e que essa enfermidade ou vício original verdadeiramente é pecado, que condena e traz morte eterna ainda agora aos que não renascem pelo batismo e pelo Espírito Santo. 31
Esta doutrina ensina que não há, por parte do homem, nenhuma reação ou participação positiva que possa conduzir ou facilitar o caminho para a fé.
A teoria do Church Growth fala de um "princípio da colheita" segundo o qual os cristãos devem orar a Deus pedindo que Deus os conduza a testemunhar junto a pessoas que tenham corações abertos para o evangelho. Estes corações estariam abertos devido a situações de vida em que o Espírito Santo começou a cultivar os corações para o milagre da fé 32 Em outro texto Hunter diz que "relevant communication of the Gospel always requires an awareness of the receptor." 33 Uma das maneiras para que se saiba onde encontrar pessoas receptivas ao evangelho seria através de pesquisas.
Sem dúvida alguma, pesquisar a cultura, os problemas, a linguagem, os costumes de um determinado lugar, para depois apresentar-lhe o evangelho, é algo que pode ser feito e algo útil. No entanto, em lugar nenhum se encontrará um coração descrente "aberto" para o evangelho. Todo o ser humano precisa do evangelho. Aprendemos de Jesus que os campos já banquejam (Jo 4.35). No entanto, sabemos também, por natureza o ser humano é espiritualmente cego, morto e inimigo de Deus. A colheita é feita, não mediante a procura de corações "abertos", mas mediante a farta pregação da palavra de Deus, com o cuidado de distinguir corretamente lei e evangelho. A lei é o aio que conduz para Cristo (Gl 3.23-25).
3. A doutrina da graça.
Duas ênfases importantes que a doutrina da graça manifesta é que a salvação do ser humano é um ato de soberana misericórdia de Deus, e, por outro lado, a doutrina da graça ensina que esta salvação é totalmente realizada por Deus em Jesus Cristo, sem nenhuma participação do ser humano, visto que o homem em nada pode contribuir nas coisas espirituais.
29 Idem, ibidem, p. 173.
30 Idem, ibidem, p. 167. Tradução: "Discípulos não nascem, são feitos. Fazer discípulos requer treinamento prático".
31 Livro de Concórdia, Confissão de Augsburgo, II, 1-2, p. 64.
32 Kent R. Hunter, op. cit., p. 81.
33 Idem, ibidem, p. 97. Tradução: "Comunicação relevante do evangelho sempre requer uma conscientização da parte do receptor".
27
Valdo Werning, em seu livro Vision and Strategy for Church Growth, tem um bom capítulo sobre o reengajar de membros da congregação que estão se afastando da fé. E ele, no início deste capítulo, salienta com propriedade a doutrina da graça de Deus em Cristo, mostrando que esta deve ser apresentada ao pecador para motivá-lo à vida cristã. Apelos eclesiásticos, não são meios da graça de Deus e por isto não conduzem a nada. Eis o que Werning diz:
Too often some try humanistic appeals and pressures and then wonder why there is little or no result. A simple testimony about the truth of God's grace in Christ will achieve much. Repeated witness by a number of fellow Christians is needed. They need to give a witness to Christ rather than a "come to church" appeal. Most Christians and congregations make a serious mistake in their contact with weak members by merely inviting them to change their church attendance habits instead of an effective and practical Christian witnesses which educates such delinquents about God's Word. 34
Lendo a citação acima, temos uma excelente indicação da aplicação da doutrina da graça de Deus em Cristo ao pecador, dentro da congregação cristã. O meio da graça utilizado é a palavra de Deus. No entanto, no mesmo capítulo, mais adiante, o autor sugere que a congregação faça visitas a membros inativos e que os visitadores sejam preparados para tanto com algumas técnicas. Aí, contraditoriamente, o que o autor dizia antes, é substituído exatamente pelo que entendemos por apelos eclesiásticos. A doutrina da graça de Deus em Cristo é obscurecida por uma ênfase na ação do homem em compreender e aceitar a obra de Cristo, e em colocar Cristo no lugar mais importante da sua vida. Examinaremos a seguir algumas citações em que estes problemas aparecem.
God has given the basic responsibility for the spiritual training of children to their parents. Parents can be learners along with their chil-
dren. In fact, we are all pupils of the Lord Jesus. We must not act as if we have tossed aside our Bibles and catechisms. By encouraging our children to attend Sunday School and weekday classes regularly, we will be building up a healthy Christian climate in our home. 35
Na citação acima, no início da mesma, apa-rentemente se irá conduzir a argumentação para Cristo e o que ele fez por nós, mas, na parte final, o que ocorre é um simples apelo eclesiástico. Freqüentar regularmente uma classe de Escola Dominical, por si não constrói um clima cristão no lar. É claro que a palavra de Deus, o meio da graça, o faz, e se esta palavra for ensinada nesta classe, o efeito será sentido no lar.
Mais adiante Werning diz:
The strongest power in the world is the cross of Christ. The cross can fift you from your problems; worldliness, sinful habits, the things that bog you down. The cross can take away your guilt. It can help you grow in strength and constancy. Your realization and acceptance of the drawing power of the cross will help you put God back in your life. 36
No início desta citação temos a ênfase na cruz de Cristo. Tudo é por graça de Deus. No final da mesma, já temos como agentes a compreensão e aceitação humanas, as quais irão ajudar a colocar Deus no lugar devido na vida. Obscurece-se o "sola gratia".
Para deixar bem clara esta dificuldade em sa-lientar apenas a graça de Deus, apenas mais uma breve citação do mesmo autor:
The blessings are ours only as we surrender our wills to His will. . . . Try to work with Him instead of against Him so that you may enjoy the fruits of His Spirit in your home. 37
Mesmo com citações onde a doutrina da graça se apresenta bem confusa, é preciso dizer também, que, por outro lado, vemos um grande esforço nos autores estudados em manter esta doutrina. Este esforço, por vezes, sucumbe quando tentam colocar esta doutrina na prática da congregação. Aí, nem sempre a cooperação humana é negada na obra da
34 Waldo J. Werning, Vision and Strategy, pp. 64-65. Tradução: "Com muita freqüência alguns pregadores tentam apelos e pressões humanísticos e, então, perguntam-se por que há tão pouco ou nenhum resultado. Um simples testemunho a respeito da verdade da graça de Deus em Cristo vai realizar mais. O testemunho constante de muitos cristãos é necessário. Eles precisam mais testemunhar do que o apelo "venha à igreja." A maioria dos cristãos e congregações cometem um sério erro em seu contato com membros fracos quando simplesmente os convidam a mudar sua participação na igreja ao invés de um testemunho cristão efetivo e prático que educa tais relapsos acerca da Palavra de Deus."
35 Idem, ibidem, p. 78. Tradução: "Deus deu a responsabilidade básica do treinamento espiritual das crianças a seus pais. Os pais podem aprender junto com seus filhos. De fato, nós todos somos alunos do Senhor Jesus. Nós não devemos proceder como se tivéssemos jogado fora as nossas Bíblias e Catecismos. Encorajando nossas crianças a freqüentar regularmente a Escola Dominical e as aulas semanais, nós estaremos edificando um saudável clima cristão em nosso lar”.
36 Idem, ibidem, p. 78. Tradução: "A força mais poderosa do mundo é a cruz de Cristo. A cruz de Cristo pode lhe erguer dos seus problemas; mundanismos, hábitos pecaminosos e as coisas que lhe afundam. A cruz pode tirar a sua culpa. Ela pode ajudá-lo a crescer em seu vigor e constância. Sua compreensão e aceitação do poder da cruz o ajudará a trazer Deus de volta a sua vida."
37 Idem, ibidem, p. 79. Tradução: "As bênçãos são nossas somente quando nós rendemos nossas vontades à Sua vontade. Tenta trabalhar com ele ao invés de contra ele de modo que você possa gozar dos frutos do seu Espírito em seu lar”.
28
salvação. Desta forma, o que seria apenas um problema de método prático, denuncia confusão teológica em suas origens.
4. A doutrina dos meios da graça.
A doutrina dos meios da graça ensina que Deus transmite sua graça aos homens através de meios, ou seja, os meios da graça de Deus, que são palavra e sacramentos (Batismo e Santa Ceia). Na palavra de Deus deve-se distinguir entre lei e evangelho, sendo que a graça de Deus encontramos especificamente no evangelho. Tanto Werning como Hunter preocupam-se em enfatizar estes meios da graça. Talvez seja este um ponto alto na contribuição destes autores. No entanto, nem sempre é assim com todos os aspectos apresentados no Church Growth. A doutrina dos meios da graça, é importante dizer, firma-se na graça de Deus, ou seja, coloca a ênfase no Deus por nós, excluindo a participa-ção humana. Infelizmente, algumas vezes, os defensores do Church Growth misturam a ação de Deus com o agir humano. Vamos examinar o que Hunter diz:
A church growth philosophy of ministry is built on the means of grace (Word and Sacraments) and on prayer. When a church adopts a church growth philosophy of ministry, it is not an exercise in using certain gimmicks and gadgetry to aid the mission of God's people. First and foremost, when a church adopts a church growth philosophy of ministry, it is a spiritual experience. It includes repentance - turning away from sins, individually and as a corporate body. It includes openness to the grace and forgiveness of God in Christ. It means a renewed respect for God's Word as the rule and norm for faith and practice. It means a willingness, by the power of the Holy Spirit, to live with the Lordship of Jesus Christ. 38
O problema reside no fato de que frases onde se fala nos meios da graça, estes meios são colocados ao lado e no mesmo nível da oração como fundamento de uma filosofia de ministério. E a confusão continua, pois textos onde se fala de uma "abertura" para a graça, coisa que não existe, estão mesclados com afirmações corretas, onde se aponta com exatidão para os meios da graça de Deus, como na citação que segue:
It always comes from God. It comes through the means of grace, the Word, Baptism and the Lord's Supper. It is the power of the Holy Spirit. It is the foundation for genuine church growth. 39
Esta falta de exatidão doutrinária pode resultar em grande prejuízo para a igreja, como a própria história da igreja já comprovou muitas vezes no passado.
Quando se fala na doutrina dos meios da graça, ainda deve ser dito que o batismo não recebe a consideração merecida por parte de todo o Church Growth. Em geral, a doutrina do batismo não recebe a atenção que a teologia luterana lhe dá. Isto se deve, especialmente, porque se separa a doutrina da justificação da doutrina da santificação. 40
Apesar dos esforços em salientar palavra e sa-cramentos como os meios da graça de Deus, e, fe-lizmente, chamando a atenção para a importância deste meio para a vida da igreja, falta maior cuidado no trato de matéria tão importante.
5. A doutrina do ministério eclesiástico.
Uma outra doutrina que, nos parece, mereceria maior atenção ao confrontarmos a teoria do Church Growth é a doutrina do ministério eclesiástico. Este ministério, ou ofício da pregação, é o único instituído por Deus na igreja. Ele tem um fim específico que é muito bem descrito na Confissão de Augsburgo: "Para que alcancemos essa fé, foi instituído o ministério que ensina o evangelho e administra os sacramentos." 41 O Church Growth, em seus escritos, enfatiza muito uma outra doutrina, a do sacerdócio universal dos crentes. Estas duas doutrinas são bíblicas e não são contraditórias. Deus visa, através delas, a edificação da igreja. Entretanto, deve-se ter o cuidado de uma não substituir a outra e de manter ambas de forma salutar.
Os defensores do Church Growth não enfatizam como tarefa do ofício da pregação aquilo que as confissões luteranas enfatizam, ou seja, a pregação da palavra e a administração dos sacramentos. O resultado é que, por vezes, a tarefa do ofício da pregação é atribuída ao sacerdócio universal dos crentes e o ministério eclesiástico é visto sob uma ótica não bem focada. Leia-se o que Werning diz:
38 Kent R. Hunter, op. cit., p. 27. Tradução: "A filosofia do ministério do Church Growth está edificada sobre os meios da graça (Palavra e Sacramentos) e sobre a oração. Quando uma igreja adota a filosofia do ministério do Church Growth isto não é um exercício no uso de certos truques e fórmulas para ajudar a missão do povo de Deus. Em primeiro lugar e principalmente, quando uma igreja adota a filosofia do ministério do Church Growth, isto é uma experiência espiritual. Inclui arrependimento - afastar-se dos pecados, individual e corporativamente. Inclui abertura para a graça e perdão de Deus em Cristo. Significa um respeito renovado pela Palavra de Deus como a regra e norma para a fé e a prática. Significa uma disposição, pela força do Espírito Santo, para viver com o senhorio de Jesus Cristo”.
39 Idem, ibidem, p. 42. Tradução: "Isto sempre vem de Deus. Vem através dos meios da graça, Palavra, Batismo e a Ceia do Senhor. É o poder do Espírito Santo. É o fundamento para o genuíno church growth”.
40 Hans-Lutz Poetsch desenvolve bastante este problema no artigo mencionado na nota 6.
41 Livro de Concórdia, Confissão de Augsburgo, v. 1, p. 65.
29
One of the chief tasks of the pastor is to be a teacher, enabler, and discipler of others who, in turn, minister with the Word to be "salt" and "light" in all the earth. This follows the example of Jesus, who trusted nonprofes-sionals with major responsibilities in the church. Having taught them His Word, He carefully trained them how to make the Gospel known (Luke 9:1-6; 10:1-24). 42
A tarefa que é atribuída ao pastor, tem como ênfase principal o treinamento dos membros para que estes ministrem a palavra sendo sal e luz do mundo. Até aí não haveria maior problema. No entanto, quando ele fala que este é o exemplo que Cristo deixou, cita como texto bíblico as instruções que Jesus deixou para os doze apóstolos e para os setenta que ele enviou. Certamente os doze apósto-los, na realidade do Novo Testamento, estavam mais próximos do ministério eclesiástico do que do sacer-dócio universal dos crentes, o que vem mostrar a mistura feita nas duas doutrinas.
A mesma questão está presente nos escritos de Hunter. Falta uma visão mais clara e mais consis-tente do que seja o ministério eclesiástico. Diz Hunter:
The Church Growth Movement emphasizes that all Christians are to be involved in the mission and ministry of the church. This prin-cipie is based primarily on the New Testament images of the church as a royal priesthood and the body of Christ.
The early church expanded quickly throu-ghout much of the Mediterranean world. One of the heys to the rapid growth of the first century church vas that it was primarily a lay movement. It was not a situation in which the pastor performed all the functions of minis-try. 43
Podemos concordar com os autores em ques-tão que muitas vezes não se destaca na igreja o tra-balho dos leigos. Os leigos deveriam ser incentiva-dos muito mais a desempenharem as suas funções de sacerdotes dentro da cristandade. Por vezes, o pro-blema dos leigos inativos nas congregações é pro-blema que se deriva daqueles que estão desempe-nhando o ofício da pregação. A solução disto, no entanto, não está em modificar ou colocar outras ênfases no ministério eclesiástico, mas em cada um voltar-se ao que Deus determinou como sua missão.
6. A doutrina da santificação.
Esta doutrina está muito presente em toda a teoria do Church Growth. Já vimos, no item em que tratamos da justificação, alguns problemas com res-peito à área da santificação. A Confissão de Augs-burgo afirma a santificação ao dizer:
Ensinam também que aquela fé deve produzir bons frutos e que é necessário se façam boas obras ordenadas por Deus, por causa da von-tade de Deus, não para confiarmos que mere-cemos por essas obras a justificação diante de Deus. Pois a remissão dos pecados e a justifi-cação são apreendidas pela fé, como também testifica a palavra de Cristo: "Quando tiver-des feito tudo isso, dizei: Somos servos inú-teis." 44
Toda vez que alguém voltar-se criticamente para a questão da santificação, pode dar a impressão de ser contrário à prática das boas obras. É um risco que se corre. Por outro lado, historicamente, erros na doutrina da santificação muitos prejuízos já cau-saram na doutrina da justificação e na honra que de-ve ser atribuída a Jesus Cristo. Prova evidente disto encontramos em algumas das controvérsias que aconteceram no meio do luteranismo e que resulta-ram na Fórmula de Concórdia.
O Church Growth pretende, em princípio, o crescimento da igreja. Para alcançar este cresci-mento, depende de uma análise detalhada da ativida-de da congregação, de um estudo do local onde pre-tende trabalhar, do estabelecimento de objetivos e metas mensuráveis. Aplicando-se estes conheci-mentos de forma adequada, o resultado deverá ser uma igreja de sucesso, onde há crescimento.
Os principais problemas que se encontram nesta área devem-se à confusão entre lei e evangelho e a falhas na tarefa de distinguir, porém não separar a justificação da santificação. A santificação não pode ser isolada e ser vista como um capítulo à parte na vida da igreja. Se a santificação não estiver funda-mentada na correta doutrina da justificação, em vez de crescimento, teremos ativismo religioso, e, pode-ríamos dizer, em vez de consagração, teremos su-cesso.
42 Waldo J. Werning, Vision add Strategy, pp. 37-38. Tradução: "Uma das principais tarefas do pastor é ser um ensinador, capacitador e discipulador de outros que, por sua vez, ministram com a Palavra para ser "sal" e "luz" em toda a Terra. Isto segue o exemplo de Jesus, que confiou grandes responsabilidades na igreja a pessoas não especializadas. Tendo lhes ensinado a sua Palavra, Ele os treinou com cuidado para anunciar o Evangelho (Lc 9.1-6; 10.1-24)”.
43 Kent R. Hunter, op.cit., p. 58. Tradução: "O Movimento do Church Growth enfatiza que todos os cristãos devem ser envolvidos na missão e no ministério da igreja. Esse princípio está baseado principalmente nas imagens neo-testamentárias da igreja como sacerdócio real e corpo de Cristo.
A igreja primitiva expandiu-se rapidamente em grande parte do mundo Mediterrâneo. Um dos segredos para o rápido crescimento da igreja do primeiro século foi que ela era primariamente um movimento leigo. Não era uma situação na qual o pastor executava todas as funções do ministério".
44 Livro de Concórdia, Confissão de Augsburgo, VI, 1-2, p. 65.
30
CAPÍTULO V
ASPECTOS POSITIVOS NO CHURCH GROWTH
O estudo de um movimento como o Church Growth, sem dúvida alguma, oferece aspectos positivos. Muita coisa útil pode ser aprendida pelo estudo dos autores desta teoria. Concordamos com Hans-Lutz Poetsch que afirma e ao mesmo tempo admoesta:
Wer sich mit allen diesen Auffassungen und Methoden gründlicher beschäftigt, wird fes-tstellen, dass sie viel gutes und sehr hilfreiches Material anbieten; es lässt sich jedoch nicht ubersehen, dass sie so, wie sie praktiziert wer-den, im pietistischen Gnadenmittelverständnis verwurzelt sind.45
Gostaríamos de citar alguns destes aspectos positivos no Church Growth. Talvez o que mereça ser citado em primeiro lugar seja o fato de o Church Growth colocar ênfase na tarefa do evangelismo, e a coloca sob duas perspectivas: o evangelismo é tarefa de toda a igreja e o evangelismo é tarefa de toda a igreja em todo o mundo. Esta visão é extremamente salutar quando se pensa em organizar uma igreja para o trabalho.
Também é importante apontar a grande preo-cupação dos autores pelo crescimento da igreja, isto não apenas como um fim em si, mas o crescimento como termômetro para a tarefa de salvar almas. Este entusiasmo e busca para salvar mais pessoas realmente deveria tomar conta da igreja.
Outro aspecto positivo é o estudo e análise das estatísticas da igreja. Muitas igrejas fazem estatísticas e não se utilizam destes instrumentos para analise e planejamento. Muitas idéias excelentes são encontradas neste aspecto da teoria do Church Growth.
Outro campo em que o Church Growth provi-dencia bom material é no campo da organização da igreja para a ação. Com maior ou menor grau de complexidade a igreja precisa se organizar de forma efetiva. Esta organização deve ter em vista os objetivos da congregação cristã no mundo e deve, igualmente, levar em consideração as características locais. Neste aspecto pode-se aprender bastante dos autores do Church Growth.
Destacamos também a preocupação com os membros que estão esfriando na fé. Hunter até escreveu um livro chamando a atenção para este aspecto, entitulado Your Church Has Doors, cujo subtítulo é "How to open the front and close the back".46
Muitas vezes a igreja não está devidamente organizada de forma a engajar as pessoas no trabalho dentro do reino de Deus. E, quando se falha em envolver as pessoas com a palavra e os sacramentos, facilmente as pessoas enfraquecem na fé e, correm o risco de perder a mesma. Manter o rebanho unido e ativo é uma tarefa que Deus realiza através da igreja mediante o uso dos meios da graça.
O Church Growth também aponta como ins-trumento eficaz para o crescimento da igreja, que esta inicie novas congregações. Plantando novas congregações está-se intensificando a distribuição dos meios da graça, está-se oferecendo novas oportunidades para criar líderes que venham a desenvolver cada vez mais o trabalho.
CONCLUSÃO
A igreja luterana sempre deve ser vista como uma igreja confessional. O conceito de igreja confessional, por vezes, é mal compreendido. A igreja luterana não é uma igreja confessional apenas porque tem confissões reunidas no Livro de Concórdia de 1580. Este é apenas um dos aspectos da confessionalidade. A preocupação maior em confessar e confessar a doutrina correta está em que esta doutrina é palavra de Deus para a salvação de todo aquele que crê. Se não confessarmos a doutrina correta, estaremos confessando palavras humanas, que em nada podem ajudar na salvação de uma pessoa. E, se apenas retivermos a doutrina correta, sem a confes-sarmos, estaremos descumprindo a vontade de Deus que quer que o confessemos diante dos homens.
A igreja, portanto, movimenta-se entre dois perigos: o da chamada ortodoxia morta, que preo-cupando-se apenas com a doutrina correta, não a vive e não a confessa; e, por outro lado, há o risco da doutrina falsa nortear a atividade da igreja, onde, como conseqüência, tem-se um ativismo que em nada irá beneficiar ninguém, pois está longe da verdade de Deus.
Estudando adaptações ao luteranismo de mo-vimentos surgidos em outras teologias, como aconteceu com o Church Growth, vê-se a necessidade que há de teólogos luteranos trabalharem arduamente, no sentido de que, fundamentados em boa teologia confessional, s e procure uma teologia prática livre dos riscos da doutrina falsa e da ortodoxia morta. Cremos que esta tarefa está a desafiar todos os que vivem a realidade da igreja no mundo. A igreja precisa confessar a verdade corretamente, para que o Salvador Jesus Cristo seja anunciado, e "toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai" (Fp 2.11).
45 Hans-Lutz Poetsch, op. cif., p. 38. Tradução: "Quem se ocupa com estas formas e métodos mais a fundo, verificará, que elas oferecem material muito bom e útil; não se pode, porém, deixar de notar que, assim como são aplicadas, estão arraigadas numa compreensão pietísta dos meios da graça."
46 Kent R. Hunter, Your Church Has Doors (Coruna, Indiana: Church Growth Analysis and Leaming Center, 1982). Tradu-ção: Sua Igreja Tem Portas, cujo sub-título é "Como abrir a porta da frente e fechar a dos fundos."
31
BIBLIOGRAFIA
BARTH, Karl R. "Cardinal Principles of Lutheranism and "Evangelical Theology". Concordia Journal. St. Louis, Missouri: Concordia Seminary, March, 1981.
GERBER, Virgil. Sua Igreja Precisa Crescer. — 3. ed. - São Paulo: Vida Nova, 1980.
HUNTER, Kent R. Foundations for Church Growth. New Haven, Missouri: Leader Publishing Company, 1983.
Your Church Has Doors. Coruna, In-
diana: Church Growth Analysis and Learning Center, 1982.
Livro de Concórdia. Trad. Arnaldo Schüler. São Leopoldo, Porto Alegre: Sinodal - Concórdia, 1980.
POETSCH, Hans-Lutz. "Gedanken zur "Church Growth Theory". Evangelium 'euaggelion' Gospel. Bremen: Lutherischen Stunde, August, 1978.
. "Gnadenmittel und Evangelisation".
Evangelium 'euaggelion' Gospel. Bremen: Lutherischen Stunde, April, 1979.
. Theologie der Evangelisation. Bremen:
Verlage Stelten & Co., 1967.
TIPPELT, Alan R. A Palavra de Deus e o Crescimento da Igreja. São Paulo: Vida Nova, 1970.
VOGEL. Larry M. "The Witness Workshop Manual". Concordia Journal. St. Louis, Missouri: Concórdia Seminary, November, 1984.
WERNING, Waldo J. Chamado à Mordomia. - 2. ed. - Porto Alegre: Concórdia, 1981.
MATHIAS, Elmer W. "This Lutheran Sees Value in Church Growth". Concordia Journal. St. Louis, Missouri: Concordia Seminary, March, 1984.
. The Radical Nature of Christianity.
Editado por Waldo J. Werning, 1975.
. Vision and Strategy for Church Growth.
Chicago: Moody Press, 1978.
Vox Concordiana, Ano 3, Número 2, 1987.