Trabalho: Contra os antinomistas. OS 4, 380-428
Ao todo, são seis séries de teses de Lutero contra os antinomistas, com o objetivo de lhes esclarecer a função da lei. Eles tinham uma compreensão errada da lei: uns achando que a lei foi abolida a partir do NT; e outros que ela servia para justificação da pessoa, ao invés de acusar o pecado e a consciência.
O primeiro debate de Lutero contra os antinomistas foi realizado em Wittenberg, no dia 18 de dezembro de 1537, em que os hereges estavam espalhando suas doutrinas ímpias, e através de escândalos e perseguições estavam atacando a verdadeira doutrina da justificação.
Sendo que a lei traz condenação e morte aos que não a cumprem, é nesse fato que os antinomistas são inimigos da lei. Eles se gloriam de ensinar muitas coisas a respeito de Deus, de Cristo, da graça, mas erram profundamente em relação à lei ao dizerem que ela não precisa ser ensinada. E quando ensinam algo sobre a lei de Moisés, não a ensinam de forma clara, mas colocam um véu sobre ela dizendo que ela não condena.
Os antinomistas dizem a respeito de Deus, de Cristo, da fé, da lei e da graça sem o verdadeiro entendimento. Portanto, Lutero adverte que esses ensinamentos sejam ignorados, pois eles não procuram agradar a Deus, mas sim aos homens, ao dizerem que a lei não condena ou que deve ser anulada.
É através da razão ou filosoficamente e com suporte na Bíblia que eles buscam vários argumentos para anular a lei que Deus deu a Moisés, como alguns deles, que dizem:
1º argumento: Não somos obrigados a coisas impossíveis. A lei é impossível. Logo, não somos obrigados a ela. (Só que erram em seus argumentos, pois se esquecem que a lei era possível sim, pois que antes da queda em pecado, era possível o cumprimento da lei e também era prazeroso, era cumprida de boa vontade e alegria no coração).
7º - o que estiver ab-rogado não tem eficácia. A lei foi ab-rogada. Logo, não deve ser ensinada. Que ela foi ab-rogada atesta-o Paulo em Rm 6.14: “não estais sob a lei, mas sob a graça”. Também atestam o mesmo nos discursos Pedro, Paulo, Barnabé e de outros em Atos.
9º - tudo que não procede da fé é pecado. A lei não procede da fé(Gl 3.12). Logo, a lei é pecado e, consequentemente, deve ser destruída e abolida.
10º - tudo que aumenta o pecado não deve ser requerido. A lei aumenta o pecado (Rm 5.20). Logo, não deve ser requerida.
16º - o Evangelho argüi os pecados. Logo, não há necessidade do ministério da lei, para que argüa os pecados no NT. Provo o antecedente: “a ira de Deus se revela desde o céu pelo Evangelho” (Rm 1.18) e Jo 16.8: “o Espírito Santo argüi o mundo do pecado”.
20º - Paulo é convertido pela voz de Cristo. A voz de Cristo é o Evangelho. Logo, é convertido pelo Espírito Santo e não pela lei.
25º - Abraão e outros patriarcas antes de Moisés conheceram o pecado e a morte. Abraão e semelhantes não tiveram a lei. Logo, o pecado e a morte podem ser conhecidos sem a lei. Prova da premissa menor é que a lei foi dada 430 anos depois de Abraão.
29º - a sombra não é eficaz. A lei é sombra, como diz Paulo, sombra das coisas futuras(Cl 2.17). Logo, a lei não é eficaz.
37º - é supérfluo fazer por mais o que pode ser feito por menos. O Evangelho pressupõe que temos pecados. Logo, não é necessário que a lei seja ensinada.
Cristo não veio para abolir a lei, mas para cumpri-la em nosso lugar. Se a lei fosse abolida, a vinda de Cristo teria sido em vão ou sem sentido. E o que nos mostraria o nosso pecado, se não existisse a lei?
Lutero entende que além da função de acusar, a lei também orienta o cristão que quer cumprir a lei gravada em seu coração e que foi novamente revelada nos Dez Mandamentos no Catecismo Menor.
Quando Deus criou o mundo e o ser humano, a lei de Deus existia, mas não acusava e trazia morte como a conhecemos. Ela passou a existir como que trazendo a morte sobre nós a partir da queda em pecado de Adão e Eva, com o objetivo de mostrar que somos pecadores, que estamos condenados à morte. Esta lei era inscrita em nossos corações, e mais tarde, Deus nos deu ela através de Moisés nos Dez Mandamentos. Essa lei que Moisés recebeu era impossível para nós cumprirmos, mas Deus em Seu imenso amor por nós, nos enviou Seu amado Filho para cumpri-la em nosso lugar.
Deus mesmo nos diz em sua Palavra : “Porque em verdade vos digo: até que o céu e a terra passem, nem um i ou um til jamais passará da lei, até que tudo se cumpra(Mateus 5.18)”. Portanto, vemos muito bem que Deus não quer que Sua lei seja anulada, e isso vale para nós hoje. E mesmo que ela nos seja impossível de cumprir, devemos lembrar que Cristo a cumpriu em nosso lugar, e que ao tentarmos cumpri-la, estaremos criando oportunidades para vivermos num mundo melhor.
I. Carta de Lutero ao digníssimo Gaspar Güttel
Lutero supõe que Güttel já tivesse sido informado dos acontecimentos e começa a sua carta expressando surpresa quanto à atitude daqueles que usaram mal os seus ensinamentos. Chega expressar a vontade de ter morrido quando esteve enfermo na confecção do documento para a apologia nos artigos de Esmalcalde. Este documento já estava pronto em dezembro de 1536 ao passo que foi assinada em fevereiro de 1537 pelo que se chamou de LIGA DE ESMALCALDE.
Lutero considera João Agrícola como o incitador de toda esta situação que provavelmente já havia chegado aos ouvidos de Güttel.
Dentro da confusão resultante da obra de Agrícola, Lutero expressa ter-lhe aconselhado a uma revogação pública. Crendo que isso faria bem a todos, pede que sua carta agora enviada não seja apenas pessoal, mas concomitantemente pública.
A seguir ele se defende de jamais ter desconsiderado os dez mandamentos, apontando para os seus escritos e ensinados agora praticados pela Igreja. O material impresso como a confissão, a Apologia, a recitação das crianças, hinos sobre o assunto e até mesmo seu próprio exemplo de recitar o decálogo como se fosse uma criança que o está aprendendo.
II. Lutero e a Lei
Lutero aproveitara um gancho de São Bernardo de Claraval ( 1091-1153 teólogo místico dos povos românicos), que a provocação à penitencia através da pregação que leva à contemplação do sofrimento de Cristo, o que resultaria no reconhecimento de que a Ira de Deus sobre o pecado não tinha outro remédio que não fosse a morte de seu filho em favor do homem, jamais levaria ao ensinamento de que se deva abolir a Lei. Aqui Lutero faz uso de Romanos 5:13 defendendo que se Cristo morreu por nós é por que há existência do pecado e este por que a Lei o aponta. Logo a abolição da Lei é na verdade a abolição de Cristo.
III. A vida Cristã e a Perfeição
Lutero usa o Magnificat para mostrar que não há ser humano seguro por si mesmo diante de Deus, usando uma forte expressão que denuncia a inimizade de Deus com os que por si mesmos se sentem seguros e aqueles que acabam com a lei e o pecado. O Katzenstülgen de Lutero revela a forma de ensinar destes que se rebelaram. Ensina-se a graça, depois a Ira buscando nunca pronunciar a Lei.
IV. A lista dos perseguidores
1º O papa.
2º Tomás Müntzer – 1468-1525. O fundador da ‘liga da fiel e Divina Vontade’. Sofrendo a influência dos ‘profetas de Zwincau’, substitui a justificação pela fé por uma”experiência com Deus” e Iluminação interior. Coloca-se a frente dos camponeses como “servo de Deus contra os ímpios cingindo a espada de Gideão, é derrotado e executado em 1525.
3º André karlstadt – 1480-1541. Quando Lutero estava refugiado em Wartburg, ele assume a liderança em Wittemberg produzindo reformas drásticas: torna nulo o celibato dos sacerdotes, convoca freiras e padres a abandonarem os mosteiros, introduz a Eucharistia sob duas espécies, ordena o afastamento das imagens nas igrejas. Lutero tem que retornar apara restabelecer a ordem.
4º Os Anabatistas. – grupo que batiza de novo. Radicais que rejeitam o batismo de crianças. Tomás Münzer foi um de seus defensores.
V. Quem preserva e sustenta a Igreja
Lutero é enfático quanto a subsistência da Igreja. Ele estabelece que esta não é sustentada por ele ou os Pais ou qualquer Hierarquia que seja. A igreja é sustentada pela palavra e presença do próprio Deus, quando cita a promessa de Cristo em Mt 28.20: “estou convosco todos os dias.” A Igreja não depende dos “heróis” que todos os dias se levando ao nosso redor, que acreditam, como diz Lutero, serem puramente Espírito, mas que no final cavalo e cavaleiro quebram o pescoço.
Instrução sobre como os Cristãos devem lidar com Moisés
A instrução sobre como os cristãos devem lidar com Moisés escrito pelo Dr. Martinho Lutero, muito mais do que literatura clássica é para a Igreja contemporânea uma aula de princípios de interpretações bíblicas assim como para a Igreja de sua época. O que talvez justifique isso é o fato de o texto pregado por Lutero no dia 27 de Agosto de 1525, tornar-se a introdução teológica para a publicação da obra que contava com inúmeras preleções do reformador relacionadas ao livro de Gênesis lançada em 1527.
O objetivo principal do escrito é colocar os fundamentos para a leitura correta do Pentateuco, em razão do seu uso indevido pelos entusiastas da época, que segundo Lutero faziam do Cristianismo uma seita ao adotar a lei de Moisés como base para a vida cristã.
Tendo como seus principais líderes Müntzer (monge e mestre em teologia que por recomendação de Lutero tornou-se pregador em Zwickau (Saxônia) 1520. Posteriormente seguiu por diversas cidades e mais tarde tornou-se líder de um grupo de camponeses. Morreu decapitado em 27 de maio de 1525 e hoje muitos historiadores o consideram o teólogo mais influente de sua época, depois de Lutero) e Karlstadt (dava aula de teologia desde 1505 em Wittenberg, obteve o grau de doutor em teologia em 1512, e em 1519 enfrentou João Eck juntamente com Lutero) os entusiastas destacavam-se pela impetuosidade que defendiam suas idéias.
Entre diversas coisas que discordavam de Lutero, estava à doutrina da Santa Ceia (para eles existia apenas a presença simbólica de Cristo nos elementos pão e vinho) e a crença de que Deus fala fora da escritura.
O reformador os chama de schwermer, que significa “enxamear”. Relacionando-os com um enxame de abelhas, procurando um lugar para se estabelecer. São pessoas com pensamento teológico confuso, inclinados a fugir da realidade.
A grande pergunta que está por traz do texto é: “Sendo a AT palavra de Deus para Israel, o que ele vale para a Igreja néotestamentaria?”.
Lutero começa dizendo que só existem duas pregações públicas vindas do céu:
1ª - Está em Êx 20, quando o próprio Deus se fez ouvir do céu outorgando a lei a Israel, e a 2ª - O dia de pentecostes em At 2, onde os apóstolos falavam em todas as línguas e faziam grandes prodígios anunciando o evangelho para a multidão.
Estas duas pregações são distintas. A primeira diz o que os homens devem fazer, e a segunda, o que Deus fez por todos eles.
Conforme Lutero a lei foi dada exclusivamente ao povo de Israel, tendo em vista textos como: Ex 20.2 “Eu sou o SENHOR, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão” (nós não fomos tirados do Egito), o Sábado que Moisés não diz respeito aos gentios nem Cristãos, e Gl 5.3 onde Paulo diz: Se aceitarem Moisés em um ponto terão obrigação de aceitar toda a lei. Prova de que nem o menor ponto da lei de Moisés nos diz respeito.
Então nos vem a seguinte pergunta: Porque pregar sobre Moisés?
E em resposta Lutero aponta pelo menos três pontos cujos quais revelam porque os escritos de Moisés são úteis para a Igreja.
1º - Os mandamentos que foram dados a Israel relacionados a questões exteriores estes não somos obrigados cumprir, a não ser que se queira.
O único compromisso que um Cristão tem, está relacionado aos mandamentos em sintonia com o direito natural, ou seja: a lei de Deus que está gravada no coração de todo ser humano conforme Rm 2.14-15 “Quando, pois, os gentios, que não têm lei, procedem, por natureza, de conformidade com a lei, não tendo lei, servem eles de lei para si mesmos. Estes mostram a norma da lei gravada no seu coração, testemunhando-lhes também a consciência e os pensamentos, mutuamente acusando- se ou defendendo- se.” (Para Lutero estes mandamentos correspondem ao decálogo).
2º - encontramos no Pentateuco elementos que não temos por natureza. As promessas de Deus em relação a Cristo. E isso é o que há de melhor em Moisés.
Os mandamentos não têm nada a ver conosco, porém as extraordinárias promessas sim, pois as mesmas nos fortalecem a fé.
Quando Deus fala a respeito da serpente em Gn 3.15 “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”, posteriormente referindo-se a descendência fala com Abraão em Gn 22.18 “nela serão benditas todas as nações da terra, porquanto obedeceste à minha voz”, e a todo o povo de Israel através de Moisés em Dt 18.15 “O SENHOR, teu Deus, te suscitará um profeta do meio de ti, de teus irmãos, semelhante a mim; a ele ouvirás,”.
Devemos atentar para estas palavras, pois as mesmas têm a ver conosco. Existem dois tipos de palavras na escritura: uma não tem a ver comigo e outra tange a mim e me da coragem. Este é o ponto, atentar para a palavra que se refere a nós. Lutero diz que se Cristo não tivesse dito “pregai a todas as criaturas”, ele não daria atenção para o evangelho, não desejaria ser batizado e iria ignorar tanto quanto ignora Moisés.
3º - Pelos exemplos de fé, amor e sofrimento nos Santos Patriarcas, bem como exemplos negativos de descrença e da ira de Deus sobre o ímpio.
“Isso procurei dizer a título de introdução a Moisés, de como encará-lo, como entende - lo e como acolhe-lo, sem descarta-lo totalmente, uma vez que ele contém tão bela ordem e governo exterior que é de se empolgar, afora o fato de ele descrever muita coisa bonita e esplêndida, como vocês ouviram, as quais não devem ser rejeitadas, mas tidas em alta consideração, acatadas de coração sincero para fomento e fortalecimento de nossa fé cristã pela qual nós, tanto quanto os amados patriarcas, fomos salvos.”