PENA DE MORTE
Trabalho apresentado à Faculdade de Teologia
do Seminário Concórdia de São Leopoldo, em
cumprimento ao requisito da disciplina de Ética Teológica.
Professor: Orlando Ott
Aluno: Luís Claudio Viana da Silva
ÍNDICE
INTRODUÇÃO.............................................................................................................................. 3
I – O QUE A PENA DE MORTE ABRANGE? ...................................................................... 4
1.1. Que tipo de crime merece pena de morte?...................................................................4
1.2 A questão social brasileira............................................................................................4
1.3 Punição ou vingança?...................................................................................................5
II – A BÍBLIA E A PENA DE MORTE....................................................................................7
2. 1 Textos que apoiam a pena de morte ...........................................................................7
2.2. E as exortações de Cristo sobre sentimento de vingança?..........................................8
2.3. A Bíblia diz Deve ou Pode o governo usar a pena de morte?......................................8
III – AS CONSEQUENCIAS DA PENA DE MORTE PARA UM PAÍS ...................9
3.1 Na Economia.................................................................................................................9
3.2. Serve a pena de morte de exemplo para outros?...........................................................9
3.3. O perigo da discriminação............................................................................................10
CONCLUSÃO.................................................................................................................................12
BIBLIOGRAFIA.............................................................................................................................13
INTRODUÇÃO
A pena de morte é um assunto que requer uma análise muito séria por parte tanto daqueles que são a favor da mesma quanto daqueles que são contra. Séria porque envolve vida, vida humana, criaturas de Deus.
Uma frase que me chamou a atenção no gabinete de um pastor foi a seguinte: o próprio Deus não julga a vida de alguém antes de sua morte, por que o faríamos eu ou você? Tem esta frase algo a nos dizer sobre a pena de morte? É esta frase correta ou não?
Podemos nós nos basearmos na Palavra de Deus para apoiar a Pena de Morte? Se a resposta qual for, como fundamentá-la?
Muitos vêem a pena de morte como sendo um sentimento de vingança que brota em alguém por causa de um crime que lhe tenha acontecido ou para alguém que lhe era muito estimado. Mas se for assim, o que dizer sobre as exortações constante de Cristo sobre isto?
Nas páginas seguintes discorreremos sobre este assunto com o intuito de dar um parecer sobre a pena de morte e suas conseqüências para um país ou estado que a tem adotado.
I – O QUE A PENA DE MORTE ABRANGE?
A questão sobre pena de morte tem gerado discussões sem fim tanto no âmbito da sociedade, em geral, como também dentro das igrejas. Esta questão abrange muitos aspectos de grande importância para as pessoas, entre os quais o mais importante é a nossa vida.
Na edição de junho/91, o Mensageiro Luterano trouxe uma ampla reportagem sobre este assunto, enfocando pontos de vista e argumentações dos que estão a favor e dos que se opõem a esse tipo de punição, do qual nos valemos para este estudo.
1.1 Que tipo de crime merece pena de morte?
Vivemos dentro de uma sociedade onde o respeito pela vida humana é o que menos importa, pelo menos quando o assunto é a vida do outro. Nos noticiários diários o que mais encontramos é assaltos, estupros, exploração, assassinatos, etc. Crimes chocantes que deixam famílias revoltadas e neuróticas. Vidas são tiradas sem mais nem menos. Mata-se até mesmo por brincadeira. Não seria justo a punição de morte para aqueles que se acham no direito de tirar a vida das pessoas como se fossem donos da mesma?
Esta é uma questão difícil para todos os que apoiam a morte como punição para alguém que comete um crime, mesmo de morte. Creio que a resposta é ainda mais difícil de ser dada quando se trata de um cristão que sabe que diante de Deus não existe pecado considerados “pequenos” e outros “grandes”, pois diante de Deus qualquer pecado tem como salário a morte. Todavia, isso é no âmbito espiritual. Mas o que dizer sobre o social, ou quanto às leis governamentais? Sobre isto tentaremos discorrer mais adiante quando abordaremos o ponto sobre a “Bíblia e a pena de morte.”
1. 2 A questão social brasileira
Em 1991 houve uma discussão, sobre a pena de morte, iniciada por um deputado do PDS, Amaral Neto. Conforme um artigo no Mensageiro Luterano, o deputado estava propondo um plebiscito nacional para se dizer “sim” ou “não” à pena de morte no Brasil.[1] Mesmo tendo sido derrubado em sua proposta, a idéia de Amaral repercutiu em todo o país. A Data Folha constatou que 83% da população nas dez maiores capitais do País aprovou a realização do plebiscito, e que 60% dos brasileiros votariam a favor da implantação da pena de morte no país.
Embora não seja dito e esclarecido o porquê dessa opinião do povo, podemos deduzir que não poderia ser diferente, quando se trata de um povo que em sua maioria vive sendo explorado, e de um país onde “educação” é ainda um privilégio de alguns e não de todos.
Nos Estados Unidos da América, alguns estados tem adotado a pena de morte. Mas deveríamos perguntar: será que ela tem resolvido o problema da criminalidade? É claro que não! E isso se tratando de um país de Primeiro Mundo, onde leis governamentais são respeitadas e valem para grandes e pequenos. E onde “educação” é algo que está ao alcance de todos. Assim, se mesmo em um pais como EUA, a pena de morte não resolveu o problema, o que dizer do Brasil?
Aquele que aprova a pena de morte o faz dizendo que a mesma é necessária para o bem da coletividade. Os que se opõem afirmam que até hoje inexistem provas convincentes de que a pena de morte proteja a sociedade da delinqüência, satisfaça as exigências de justiça e dissuada mais fortemente que outros métodos punitivos.
Astomiro diz no seu artigo que “é sabido que a atitude do público diante da pena de morte varia conforme a situação de maior ou menor tranqüilidade social.”[2]
1.3 Punição ou vingança?
Não podemos deixar de enfatizar que, em geral, há um sentimento de vingança dentro dos apoiadores da pena de morte, mesmo sendo indiretamente.[3] Mas até onde podemos dizer que vingança é justiça? Podemos chamar de justiça um ato que a própria justiça e a sociedade condenam?
Em geral, se tratando do campo emocional, nós seres humanos pensamos em revidar imediatamente uma violência com uma violência maior, ou igual: olho por olho, dente por dente; matou tem que morrer.
Citando Nereu, o presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Astomiro Romais diz em seu artigo que o indivíduo age por raiva, por vingança, por paixão; O estado não pode colocar-se no mesmo plano do indivíduo, mas precisa responder racionalmente. Afirma que nem sempre um indivíduo pode impedir que uma pessoa imponha sofrimento a outra, mas pode e deve-se impedir que o Estado o faça, pois a evolução da justiça, ao longo dos séculos, foi para superar a vingança particular.[4]
II – A BÍBLIA E A PENA DE MORTE
2. 1 Textos que apoiam a pena de morte
Entre todas as colocações feitas por Astomiro em seu artigo, uma das que mais me chamou a atenção foi a da “Comissão Irlandesa de Justiça e Paz” a qual diz que ao levarmos a cabo uma execução, eliminamos definitivamente toda possibilidade, por mais remota que seja, de um arrependimento, de uma conversão, de uma reconciliação posterior; excluímos para todo o sempre a possibilidade de uma evolução moral e do desenvolvimento de uma consciência.[5]
Isto, como cristãos, não podemos negar que é verdade. Mas o que dizer dos textos bíblicos que apoiam a pena de morte, como por exemplo Gn 9.6; Lv 24.17; Êx 21.12; Nm 35.21; Dt 19.11; Rm 13.4 e At 25.11?
Não é possível aqui fazermos uma análise de cada um destes textos especificamente, no entanto, acreditamos que estes textos do Antigo Testamento que apoiam (?) a pena de morte, parecem não ser uma regra no Novo Testamento. Todavia, também não podemos negar que, especialmente os textos como de Romanos 13.4 e At 25.11, deixam a entender que o estado, ou as autoridades como ministro de Deus têm o poder para decidir usar ou não a pena de morte como um método para manter a ordem e castigar o malfeitor.
Em o Novo Testamento é claramente dito que Deus delega o seu direito de ‘vingança’ (Rm 12.19) ou retribuição ao governo, ainda que este não seja perfeito, pois ‘traz a espada’ para castigar o aquele que pratica o mal. Entretanto, esse direito não pode ser considerado isoladamente, é preciso observar as circunstâncias. Pois pode ocorrer abusos na sua aplicação. E este é em minha opinião um dos maiores problemas da pena de morte, visto está posto sob o poder o humano.
2.2. E as exortações de Cristo sobre sentimento de vingança?
É verdade também que Cristo exortou muitas vezes contra sentimentos de vingança, mas não podemos tomar estas exortações como prova de que não é cristã a pena de morte.
Em seu artigo na Igreja Luterana, Richard Allen Bodey escreveu que as exortações de Cristo no Novo Testamento contra o sentimento de vingança, têm claramente o intuito de orientar a conduta pessoal. O que significa é que tais padrões não podem ser levados à esfera social sem nenhuma apropriada adaptação a uma estrutura ética diferente. É impossível interpretar os ensinos éticos de Jesus com fidelidade, se nos recusamos a manter a distinção que Ele próprio fez entre a esfera individual e social.[6]
2.3. A Bíblia diz Deve ou Pode o governo usar a pena de morte?
Nenhum dos textos bíblicos que falam sobre este assunto, como os que citamos acima, atribuem a pena de morte como um “dever” do governo, mas antes os textos deixam a entender que as autoridades “podem” fazer uso da pena capital para castigar o mal feitor, ou o assassino.
III – AS CONSEQUENCIAS DA PENA DE MORTE PARA UM PAÍS
Argumenta-se que as conseqüências causadas pela pena de morte são muitas para um país ou estado que adota a mesma. Destacamos aqui algumas delas.
3.1 Na Economia
Os entrevistados na pesquisa DataFolha, conforme registrado por Astomiro Romais[7] argumentam que custa muito caro para um país sustentar bandidos preguiçosos. Diz-se que o salário que os assassinos custam aos cofres públicos estariam melhor empregados no ensino e na ajuda ao menor abandonado. Coloca-se que em 1991 cada um dos 42 mil presos existentes nas cadeias de São Paulo custava cerca de setenta e oito mil cruzeiros, na época.
Certamente o dinheiro gasto com os presos seria bem melhor empregado com educação de crianças, ou em qualquer outro bem para a sociedade mas também se sabe que uma execução, como por exemplo nos Estados Unidos, custa duas vezes mais do que custaria manter um encarcerado em prisão perpétua. Cada processo de execução custa aos cofres públicos 1.8 milhões de dólares, gastos especialmente na sofisticação do aparato judicial para evitar enganos – o que não se confirma pela realidade, visito que só nos EUA 350 pessoas condenadas à morte entre 1900 e 1985 eram inocentes, sendo 23 delas executadas efetivamente, diz Astomiro.[8] Assim, podemos dizer que este não é um argumento que fundamente a pena de morte como método para que a ordem seja mantida em um país.
3.2. Serve a pena de morte de exemplo para outros?
Se usa muito o argumento de que a pena de morte serve de exemplo para que outros não cometam o mesmo delito. Mas será que isto realmente é verdade?
Parece-nos que nos países que adotam a pena de morte, como por exemplo a Inglaterra e Estados Unidos, o argumento acima não tem qualquer fundamento, visto que tem-se observado que a criminalidade até mesmo aumenta quando alguém é executado.
O psicanalista Abrão Slavutzky diz o seguinte sobre esta questão:
Há uma lógica perfeita, visto que a propensão ao crime é uma manifestação doentia da mente e que, por isso, em vez de inibir o criminoso, a visão da morte estimula ao crime. Como exemplo brasileiro, diz que desde que se criaram os grupos de extermínio e esquadrões da morte, especialmente na baixada fluminense, pequenos criminosos são assassinados todos os dias...Cita ainda o exemplo da Inglaterra de Henrique VIII, quando o furto era punido com a forca. Diz que, enquanto a platéia assistia às execuções, os batedores de carteira faziam tranqüilamente seu trabalho, correndo o risco de serem pendurados pelo pescoço no instante seguinte. Lembra, ainda, que na mesma Inglaterra, das 250 pessoas executadas na forca, 180 já tinham assistido outras pessoas serem executadas.[9]
3.3. O perigo da discriminação
Creio que além de causar prejuízo aos cofres públicos, e talvez ainda estimular cada vez mais a criminalidade, a pena de morte em um país de terceiro mundo como é o caso do Brasil, ainda se corre o risco da discriminação.
Se mesmo em países de primeiro mundo, como vimos acima, o índice de execução de pessoas inocentes é demasiadamente grandioso, quanto mais em meio ao caos como está nosso país.
Um governador do estado de Ohyo (USA), diz: “durante a minha vida de governante descobri que as pessoa presas no corredor da morte tinham uma coisa em comum, ‘não tinham dinheiro’”, diz Romais.
As leis do nosso país são feitas, mas não são cumpridas, com raras exceções. Em nosso país a pena de morte corre o risco de ser “um privilégio de pobres.” Por isso, acredito que este não é um meio que serviria como meio de se colocar “ordem na casa”, se tratando do Brasil, mesmo sabendo que o estado tem todo o direito de usá-lo como instrumento para manter a ordem. Todavia, vale lembrar que a última execução judicial no Brasil ocorreu em 1885. Posteriormente se descobriu que o executado era na realidade inocente.
CONCLUSÃO
A discussão sobre pena de morte sempre volta à tona uma vez ou outra, mais ainda em meio a tanta violência que se abate em nossa sociedade. Sempre haverá os que são a favor e os que são contra a mesma, usando-se diversificados argumentos para isso.
Com esta pesquisa quisemos apenas trazer alguns pontos que precisam ser levados em conta quando o assunto é a pena capital. Pretendemos mostrar que a pena de morte é um direito que o estado possui como um direito, encontrando apoio mesmo na Palavra de Deus. No entanto, por não ser uma ordem para que as autoridades usem a mesma como um recurso para se manter a ordem, é salutar que cada governo, cada sociedade medite muito bem se este é o melhor recurso para o bem do seu povo.
Acredito que no Brasil este não é, ao menos no momento, um método aconselhável, levando-se em conta a pobreza e o caos que ronda até mesmo aqueles que governam, que fazem as leis, mas que não as praticam para que assim pudesse se dar o exemplo para seus governados.
Olhando a nossa história e a realidade em que vivemos, cabe a pergunta: Se novamente surgisse a idéia, como em 1991, de se votar novamente a favor ou contra a pena de morte, o que faríamos? Talvez seria melhor responder da seguinte forma: como votar sobre a pena de morte no Brasil, se ela nunca deixou de existir? Basta olharmos os noticiários e veremos os genocídios que acontecem por todo o país. Genocídios como aquele que aconteceu no Pará, num verdadeiro massacre, quando 100 garimpeiros foram mortos quando bloqueavam uma ponte no Rio Tocantins.[10]
Se Deus permite que a pena de morte seja usada para que o estado mantenha a ordem, então oremos a Ele para que guie o nosso governo e abençoe o nosso país, a fim de que nunca tenhamos que optar por um castigo tão drástico mesmo para os mal feitores. Mas antes que o governo encontre meios de restabelecê-los à sociedade.
BIBLIOGRAFIA
ROMAIS, Astomiro. Pena de Morte – Em julgamento o direito de matar. In: Mensageiro Luterano (Junho/1991).
BODEY, Richard A. A Bíblia e a Pena de Morte. In: Igreja Luterana, XXI, 261-65, 5/6 60.
SILVA, Edson. 500 anos de Pena de Morte no Brasil. In: Revista Eclesiástica Brasileira, V.51 (Março de 1991).
PINTO, G. Nery. A Pena de Morte e dignidade da Pessoa humana. In: Revista Eclesiástica Brasileira, V.54 (Junho de 1994).
[1] ROMAIS, Astomiro. Pena de Morte. Em julgamento o direito de matar. In: Mensageiro Luterano (junho/91), p.5-8.
[2] Id. Ibid, p.5.
[3] Por “indiretamente” me refiro ás pessoas que se sentem chocadas por um crime que mexeu com seus sentimentos, mesmo que não seja um parente ou amigo, sentindo assim um desejo de punição para o culpado.
[4] Op. Cit, p.6.
[5] Op. Cit. p.6
[6] BODEY, R. A. A Bíblia e a Pena de Morte. Igreja Luterana, XXI: 261-65, 5/6 60.
[7] Op. Cit, p.6
[8] Astomiro apud Ricardo Balestreri, id. ibid, p.7.
[9] Astomiro apud Abrão Slavutzky, p.7.
[10] SILVA, Edson. 500 anos de Pena de Morte no Brasil. In: Revista Eclesiástica Brasileira, V.51 (Março de 1991).