Disciplina: Exegese do Antigo Testamento
Professor: Dr. Acir Raymann
Alunos: Geomar Martins e Miquéias Eller
Data: 11/10/07
A Narrativa Babilônica do Dilúvio: Similaridades e Contrastes
De todas as tradições antigas que se relacionam com o Antigo Testamento, a estória do Dilúvio babilônico, incorporada à Epopéia de Gilgamesh, manifesta a mais impressionante e minuciosa semelhança com a história do dilúvio da Bíblia. Ela está baseada na tradição suméria, sua antecessora, porém muito mais ampla. Constitui o décimo - primeiro livro da famosa Epopéia assírio-babilônica de Gilgamesh. O texto, na forma existente, vem da biblioteca do rei assírio Assurbanípal (669-626 a .C.), mas fora transcrito de originais muito mais antigos.
Similaridades
- Ambas as narrativas sustentam que o dilúvio foi divinamente planejado.
Deus decide destruir a humanidade por meio do dilúvio. /Os deuses decidem destruir os seres humanos.
- Concordam que a catástrofe iminente fora divinamente revelada ao herói do dilúvio.
Deus avisa a Noé. / Ea, deus da sabedoria, avisa Utnapistim.
- Relacionam o dilúvio com a corrupção da raça humana.
Porque todos homens tinham se pervertido. /Os deuses não suportavam o ruído produzido por eles
- Falam da libertação do herói e sua família.
Entraram na arca Noé, sua esposa, seus filhos e suas noras./ Entraram Utnapistim , sua família e os artesãos que o ajudaram na construção da barca.
- Afirmam que o herói do dilúvio fora instruído divinamente para construir um enorme barco para preservar a vida.
Deus ordena Noé construir uma arca para que se salvem./ Ea manda Utnapistim criar uma barca para que se salvem
- Indicam as causas físicas do dilúvio.
Romperam-se todas as fontes do grande abismo, e as comportas dos céus se abriram (Gn 7: 11)./ Babilônica: chuvas torrenciais e ventos destruidores acompanhados por relâmpagos e trovões, rompimento de diques, canais e reservatórios.
- Especificam a duração do dilúvio.
Iniciou o dilúvio, que durou quarenta dias e quarenta noites./ O dilúvio durou sete dias e sete noites
- Citam o lugar onde o barco encalhou.
A arca repousou nas montanhas do Ararate./ A barca repousou no monte Nisir.
- Descrevem atos de adoração praticados pelo herói depois do seu livramento.
Noé levantou um altar e ofereceu sacrifícios a Deus./ Utnapistim ofereceu um sacrifício de ação de graças aos deuses.
- Falam de bênçãos especiais dadas ao herói, depois do desastre.
Deus abençoa Noé e sua família./ Enlil abençoa a Utnapistim e permite que deixe de ser mortal.
Contrastes
1. As duas narrativas estão em grande contraste, quanto às suas concepções teológicas.
Enquanto na narrativa bíblica impera o monoteísmo, na babilônica encontramos provas de um politeísmo forte. Em vez de atribuir o Dilúvio ao Único e Eterno Deus, como está registrada no livro de Gênesis, a narrativa babilônica inclui uma grande quantidade de divindades que não se dão uma s com as outras.
2. Estão em grande contraste quanto às suas concepções morais.
Na narrativa babilônica não é apresentada uma posição clara sobre o pecado e por fim o dilúvio aparece apenas como um capricho dos deuses. Já o relato bíblico o dilúvio é um julgamento moral justo enviado por Deus. E por isso pune o pecador impenitente mesmo que isto acarrete destruição do mundo, mas salva aquele que se arrepende dos grandes pecados com seu poder e de forma divina.
3. Estão em contraste quanto às suas concepções filosóficas.
A narrativa babilônica confunde matéria e espírito tornando ambos eternos. Desse modo falha em diferenciar espírito de matéria, e o espírito finito do Espírito infinito. Mostra o dilúvio como sendo vários fenômenos físicos em forma de divindades e ainda é ignorante quanto aos princípios causais.
O relato Bíblico atribui o dilúvio ao Criador de todas as coisas, o qual coloca as forças naturais de sua criação para atingir seus objetivos.
Explicações das semelhanças
- Os babilônicos se apropriaram da narrativa hebraica.
Provavelmente no período do exílio Babilônico
- Os hebraicos se apoderaram da narrativa babilônica.
Um dos principais argumentos é o suposto colorido da história do Dilúvio Hebraico.
- Tanto a narrativa hebraica como a babilônica provém de uma fonte comum de fato, que se originou de uma ocorrência verdadeira.
Ambas as narrativas provém de uma origem comum entre os semitas, onde uns foram para a Babilônia enquanto outros foram para a Palestina levando consigo estas tradições.
Paralelos entre o relato Bíblico e o babilônico do Dilúvio
Relato bíblico Epopéia de Gilgamés (Gn 6.1—9.17 ) (Tablete XI) | |||
Motivo | Deus decide destruir a humanidade por meio do dilúvio, porque todos tinham se pervertido (Gn 6.13). | Os deuses não suportavam o ruído produzido pelos seres humanos; decidem destruí-los por meio do dilúvio. | |
Aviso | Deus avisa a Noé, o único que fazia a vontade divina, de sua decisão. Ordena construir uma arca para que se salvem Noé, sua família e os animais (uns poucos de cada espécie) (Gn 6.9,11-21). | Ea, o deus das águas doces (e um dos criadores da humanidade), avisa Utnapistim da decisão dos deuses. Manda-o criar uma barca para que se salvem ele e a semente de toda a vida. Indica-lhe o que dizer se lhe perguntarem o que estava acontecendo. | |
Construção da Arca | Noé obedeceu a Deus; construiu a arca nas medidas que Deus lhe deu. Entraram Noé, sua esposa, seus filhos e suas noras, e os animais (Gn 6.22—7.9). | Utnapistim obedeceu a Ea; construiu a barca com as medidas que lhe deram. Entraram ele, sua família e os artesãos que o ajudaram na construção da barca, e os animais. Utnapistim levou consigo suas riquezas. | |
O dilúvio | Deus fechou a porta da arca. Iniciou o dilúvio, que durou quarenta dias. Deus faz com que as chuvas cessem. As águas cobriram a terra por quase um ano. A arca repousou no monte Ararate (Gn 7.10-8.14). | Utnapistim fechou a porta da barca. O dilúvio durou sete dias; foi tão terrível que os próprios deuses se espantaram e fugiram para o mais alto dos céus. As águas cobriram a terra por pouco mais de um mês. A barca repousou no monte Nisir. | |
Saída da Arca | Noé, sua família e os animais saem da arca à ordem de Deus (Gn 8.15-20). | Utnapistim vê o estado da terra. Abre as portas da barca e todos saem, menos ele, pois viu os cadáveres espalhados por toda a terra, convertidos | |
O sacrifício e seus efeitos | Noé levantou um altar e ofereceu sacrifícios a Deus. Os sacrifícios agradaram ao Senhor, que prometeu não voltar a amaldiçoar a terra por causa da humanidade, nem voltar a destruir todos os animais (Gn 8.20-22). | Utnapistim ofereceu um sacrifício de ação de graças aos deuses, os quais acudiram rapidamente e se juntaram como moscas ao redor do sacrifício. A deusa Istar convidou todos os deuses a participarem do sacrifício, menos Enlil (o deus que causou a devastação, inesperada para os outros deuses). Enlil se enfureceu porque alguns seres humanos escaparam. Logo ao dialogar com outros deuses, Enlil se tranqüilizou. | |
A bênção divina | Deus abençoa Noé e sua família. Diz a eles que encham a terra e lhes dá poder sobre os animais. Poderão comer todos os animais e verduras que queiram. Não podem comer carne com sangue. Deus pedirá contas pela vida de cada ser humano (Gn 9.1-7). | Enlil abençoa a Utnapistim e permite que deixe de ser mortal e se converta em um semelhante aos deuses. | |
A aliança de Deus com o ser humano | Deus fez uma aliança com Noé e com seus descendentes (ou seja, com toda a humanidade): não voltar a destruir o ser humano nem os animais por meio de um dilúvio. (Gn 9.8-17) |
Bibliografia
Bíblia de Estudo Almeida. São Paulo, Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
KIDNER, Derek. Gênesis: Introdução e Comentário. São Paulo, Vida Nova e Mundo Cristão, 2005.
HEIDEL, Alexander. The Gilgamesh Epic and Old Testament Parallels. ed. 2, Chicago . University of Chicago Press, 1949.
UNGER, Merril F. Arqueologia do Velho Testamento. Trad. Yolanda M. Krievin. São Paulo, Imprensa Batista Regular, 1989.
MORRIS, Henry. Criação ou Evolução? São Paulo, Fiel, s.d.