ATOS DOS APOSTÓLOS NO CONTEXTO DO SÉCULO XX APRESENTANDO Nao sao poucos os títulos que constam no programa editorial do Departamento de Comunicado - o qual tem como atribuicóes principáis centralizar, coordenar, editorar e promover todas as publicacóes da Igreja Evangélica Luterana do Brasil. Feito o levanta- mento das obras existentes e efetuada urna pesquisa sobre prioridades ñas mais diver- sas áreas e setores da igreja, tornou-se possível e necessário elaborar um esquema de publicacóes a curto, medio e longo prazos. Atos dos Apostólos no Contexto do Século XX é a primeira obra que a Igreja Evangélica Luterana do Brasil edita em forma de comentario bíblico sobre o novo Novo Testamento. Daí a sua prioriedade e importancia para a igreja. Atos dos Apostólos no Contexto do Século XX, um estudoteológico-devocional sobre os 28 capítulos de Atos, deverá formar urna coletánea de tres volurnes. Os estudos deste volume I, que abordam os cinco primeiros capítulos de Atos e que analisam os "variados e táo maravilhosos relatos da a^áo do Espirito Santo nos primordios da igreja de Cristo", como lembra o autor, seráo de extraordinario proveito para os estudos, reflexóes e meditacóes neste ano do 75.° aniversario da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, quando os seus 170.000 fiéis esíaráo examinando a temática "Cristo, Cabeca da Igreja", tendo por lema as palavras de Paulo aos Efésios: "Crescamos em tudo naquele que é a cabeca, Cristo". (4.15). O autor - nasceu na Alemanha, que fez seu curso de teologia nos Estados Unidos, que veio ao Brasil em 1934, que exerceu o seu pastorado de 1934 até 1952 ñas paróquias de Cruz Machado, PFt, e Sao Leopoldo, RS - é, desde 1952, professor do Novo Testamento na Faculdade de Teologia do Seminario Concordia, Porto Alegre, RS. Além de fazer o Mestre em Teologia, recebeu dois títulos de Doutor em Teologia "honoris causa" por sua destacada atividade teológica na igreja luterana. Conhecido como consagrado professor e pregador, o Dr. Rottmann é um excelente escritor, pois além de redator de dois periódicos, preparou um sem número de estudos, tratados e monografías, como também é autor de tres outros livros. Mais cinco títulos estáo em fase de acabamento. Atos dos Apostólos no Contexto do Século XX tem como autor um homem que conhece, domina e vive o mundo do Novo Testamento. Esta obra, como veículo ñas máos de Deus, fará crescer no conhecimento e na graca, na fe e no amor, na esperanca e na consagracáo a todos aqueles que a examinarem sob a orientacáo e assisténcia do Espirito Santo. Porto Alegre/janeiro/1979 Leopoldo Heimann Secretario Executivo Departamento Comunicacáo PREFACIO "Atos dos Apostólos" ocupa lugar de destaque nao so entre os documentos neotestamentários mas também entre os livros históricos da antiguidade em geral. Mesmo assim, em nossa língua, existe bem pouca literatura teológico-devocional de enverqadura sobre este livro táo empolgante, escrito pelo evangelista-historiador e médico Lucas. Isso justifica a publicaoáo de Atos dos Apostólos no contexto do século XX. Os estudos que ora apresentamos nao pretendem em primeiro lugar suprir urna lacuna no campo literario. Foram iniciados por razóes de ordem totalmente particular. Em meus estudos e meditacóes pessoais sobre este livro, seus variados e táo maravilhosos relatos da acáo do Espirito Santo nos primordios da igreja de Cristo, percebi que a primeira geracáo crista aparentemente sentiu com mais inten- sidade do que nos, igreja no final do século XX, a presenca real, apesar de invisível, do Senhor e Salvador. Sentí a necessidade de mostrar que o mesmo Espirito e o mesmo Senhor estáo ativos hoje, da mesma maneira e com tanta evidencia quanto naquela época. Por isso o título destes estudos: Atos dos Apostólos no contexto do século XX. Aquela primeira geracáo de cristáos e ministros de Cristo nao era infalível nem perfeita. O historiador deixa claro que eles experimentaram dificuldades, sofreram com suas falhas, foram derrotados. Mas alcancaram igualmente grandiosas Vitorias. Eram ao mesmo lempo pobres pecadores e justos diante de Deus através do sacrificio de Cristo e da fe nos méritos do Salvador, como nos. — Em sua historia Lucas nos mostra que fazer parte da igreja de Cristo ainda nao implica viver em perfeicáo celestial. Ele. aprésenla urna comunidade heterogénea, composta de pessoas diferentes entre si: Pedro e Joáo; Saulode Tarso, perseguidor e discípulo de Cristo; Ananias e Sátira; Barnabé e Marcos; Áquila e Priscila; as viúvas de tala grega em Jerusalém e os judaizantes de Antioquia da Siria; os pesquisadores da verdade em Beréia; Lidia e a jovem adivinhadora de Filipos; Lucas e Demás; etc. etc. Se comecarmos a meditar sobre os atos e o modo de pensar daqueles cristáos, pouco a pouco chegaremos á conclusáo de que, em sua esséncia, aquela igreja nao diferia tanto assim da nossa. Foi especialmente por este motivo que comecei a trazer para o contexto do século XX as pessoas, os eventos, a vida de Vitorias e derrotas daquela igreja. A principio eu o fiz com grupos de estudantes de Teología do Seminario Concordia e depois também com nossos congregados da igreja "Concordia" de Porto Alegre, RS. Este livro é o primeiro fruto resultante destes estudos, reflexóes •e meditacóes. Muitas pessoas, no decurso do lempo, solicitaram-me que fossem publicados. Faco- o agora, com esta humilde súplica ao Senhor da igreja: que sirvam de auxilio e subsidio a irmáos que, como eu, oram e trabalham para que também em nosso tempe a palavra do Senhor cresca mais e mais e de continuo aponte o sinal verde do caminho certo rumo á patria celeste. Com respeito á forma dos estudos, convém esclarecer que inicialmente foram presentados em culto normal da congregacáo, urna vez ao* mes. Isso elucida tal ca?óes que- por vezes- se limitam a situacóes específicas desta congregacáo e rfm certas ^ePeti<?óes de falos marcantes. Lembramos que os participantes do citad tlnham a Blbl¡a em máos e "ue a leitura do texto e de outras passagens as era feíta, ou em conjunto, ou por alguém invidualmente. Houve dias em que, toen e10 estlJdo> el'a cantado um hiño ou algumas estrofes alusivas ao assunto em No plano geral da obra estão previstas três partes: a primeira com estudos sobre Atos 1-5; a segunda, mui provavelmente com o estudo de 6 a 17; e-a terceira, se Deus o permitir, abrangendo o restante deste notável livro. Quero aqui expressar minha mais profunda gratidão a meu outrora aluno, agora colaborador, Rev. Vilson Scholz, pela grande dedicação com que preparou os manus- critos desta obra para a impressão. Rogamos ao mesmo Espírito Santo, que fez a palavra crescer numa proporção tão maravilhosa durante a primeira geração cristã, que acompanhe também estes estudos, preparados e apresentados por um simples membro do corpo de Cristo nestes tempos do fim, para flue todos possam reconhecer a veracidade da última promessa de nosso Senhor: "Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos!" O autor 1 — ATOS DOS APÓSTOLOS — Lucas, o autor 1.1. O título e a importância do livro. O livro do Novo Testamento entitulado Atos dos Apóstolos é um dos documen- tos mais importantes que já se escreveu na história da humanidade. Sem este livro, pouco ou quase nada saberíamos dos primórdios do cristianis- mo; nada de definitivo saberíamos a respeito daqueles homens que receberam do Senhor da Igreja a incumbência de serem seus embaixadores e representantes pleni- potenciários, os apóstolos. Faltando esse livro, desconheceríamos a história daquele homem de Deus, sem o qual, humanamente falando, a Igreja de Cristo não teria passado de uma simples seita judaica: o jovem rabino Saulo. Escriba e fariseu fanáti- co, pela graça de Deus veio a ser Paulo, o intrépido bandeirante da causa de Cristo, que desfraldou a bandeira da cruz e tinha nos lábios a mensagem da graça de Deus em Cristo. Atos dos Apóstolos: o livro que conta a história da primeira geração cristã. Seu relato abrange um período de aproximadamente 30 anos: do ano 30 ao ano 60 de nos- sa era. Esses 30 anos começam numa sala, num cenáculo, num refeitório de uma casa particular de Jerusalém (At 1.13), onde se reúnem alguns atemorizados galileus e algumas mulheres fiéis a seu Senhor Jesus, e terminam em Roma, capital do mundo e centro do poder mundial na época. São 30 anos que terminam, mais especifi- camente, no Pretório, no quartel-general do regimento da Guarda Imperial, localizado perto dos aposentos do imperador e dominador do mundo civilizado. O livro de Atos pode ser estudado de diversas maneiras. Pode ser lido, por exem- plo, como um documento histórico que relata, às vezes com minúcias impressionan- tes, acontecimentos que marcaram o desenvolvimento do cristianismo primitivo. Pode ser analisado como manual de métodos missionários e evangelísticos. Pode igualmente ser encarado como uma mensagem que, em suas múltiplas facetas, se dirige a nós, cristãos no final do século XX, e que nos revela caminhos de Deus na vida de sua Igreja em todos os tempos. Nos estudos sobre 'este livro tentaremos seguir esta última diretriz, não deixando igualmente de enfocar outros aspectos quando estes se nos oferecerem. Nestes estudos deve guiar-nos o propósito que o evangelista João teve em mente ao escre- ver seu evangelho: "Estes (sinais, histórias, etc.) foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome" (Jo 20.31). — Portanto, queremos estudar Atos dos Apóstolos como um livro escrito para nós, para mim, para minha congregação. E então estas histórias se tornarão reais, vivas, para nós. 1.2. Quem foi o provável autor? Devo admitir que, a partir do Novo Testamento, não posso apresentar provas se- guras, incontestáveis, finais, que indiquem o autor deste livro. O autor não se identi- fica diretamente. Hoje, no entanto, à base dos mais antigos e fidedignos testemu- nhos patrísticos, podemos afirmar que dois dos maiores livros do Novo Testamento foram escritos por Lucas. Baseada em Irineu e no Cânon Muratoriano — ambos de meados do segundo século depois de Cristo —, a Igreja aceita para o terceiro evangelho e o livro de Atos a autoria de Lucas, o médico de Paulo. Quem era Lucas? Quem era este homem inspirado por Deus? Seu nome aparece apenas três vezes no Novo Testamento. O pouco que dele sabemos está nestas passagens: Colossenses 4.10-14: "Saúda-vos Aristarco..., e Marcos, primo de Barnabé..-, e Jesus, conhecido por Justo, ... os únicos da circuncisão que cooperam comigo pelo reino de Deus ... Saúda-vos Epafras. ...Saúda-vos Lucas, o médico amado..." Destas notícias de Paulo endereçadas aos cristãos de Colossos aprendemos três coisas: a) Lucas não era judeu ("da circuncisão"); b) Lucas era médico; c) Lucas era amigo íntimo ("amado") de Paulo. Filemom 24: Esta passagem menciona os mesmos colaboradores de Paulo cita- dos em CI4.10.14. Isto, além de outros fatores, nos leva a aceitar que estas duas cartas foram escritas no mesmo lugar e na mesma data. Também é inegável que Filemom era membro da Igreja de Colossos. Sobre Lucas esta passagem nos informa que era um dos cooperadores de Paulo, além de ser médico. 2. Timóteo 4.11: A simples menção de Lucas nesta carta, considerada o "testa- mento" do grande apóstolo, já deveria bastar para que ele fosse amado por nós também. Paulo está na prisão úmida e escura, velho, alquebrado, doente, solitário, abandonado por velhos amigos. Paulo está sozinho. Sozinho? Não. "Somente Lucas está comigo". Palavras áureas. Palavras que dão a este médico um lugar de destaque na história de Deus. Lucas, o médico, assiste o apóstolo em seus momentos derra- deiros neste mundo. O último, o único amigo presente. Mas, como e quando foi este gentio convertido? Nada podemos afirmar de modo absoluto. Entretanto, há alguns aspectos que convém mencionar. O texto do Codex Bezae (e outros manuscritos da mesma família, bem como Agostinho) apresenta em Atos 11.28 a seguinte leitura: synestramménon hemõn, um genitivo absoluto traduzi- do "estando nós reunidos". Uma vez confirmada essa leitura, ela indicaria que Lucas esteve em Antioquia quando Ágabo deu a entender que estava por vir grande fome por todo o mundo. Neste caso, Lucas era membro da congregação de Antioquia da Síria por volta do ano 43 d.C. Essa suposição concordaria então com uma outra, a saber: Lucas e "Lúcio de drene" (At 13.1) são uma só e a mesma pessoa. Lúcio de Cirene era um dos profetas e mestres em Antioquia. Bom número de exegetas aceita essa hipótese, e estou bas- tante inclinado a aceitá-la também. É verdade: há intérpretes que apontam para a dificuldade em harmonizar as formas "Loukas e Loukios Mas Origines, certa- mente uma autoridade inconstestável na solução de tais aparentes enigmas envol- vendo a nomenclatura grega, diz que o "Loukios" de Romanos 16.21 é o mesmo Lu- cas, autor do terceiro evangelho. E esse fato certamente solidifica a identificação acima-referida. Tudo isso nos levaria então ao dia do Pentecoste, ou ainda à Sexta-Feira Santa, o dia culminante na história da salvação. Ali nos deparamos com Simão de Cirene (Lc 23.26), o homem que foi forçado a carregar a cruz de Cristo. Será que este homem levou a mensagem da cruz até Cirene?! — Repetidas vezes ouvimos falar de pessoas provenientes desta região do norte da África. No dia do Pentecoste havia uma repre- sentação de Cirene em Jerusalém (At 2.9). Atos 6.9 fala da sinagoga dos "Cireneus", cujos membros discutiram com Estêvão, juntamente com Saulo, e o acusaram peran- te o Sinédrio. (Será que Lucas estava ali, ao lado de Saulo, na qualidade de proséli- to?) — Antioquia da Síria foi o centro irradiador da missão gentílica. Não é perfeita- mente possível que entre aqueles que "eram de Chipre e de Cirene" e que "falavam também aos gregos, anunciando-lhes o evangelho do Senhor Jesus" (At 11.20) esti- 4 vesse também Lucas/Lúcio? 1.3. Como podia Lucas escrever este livro? Esta pergunta é importante. De quem recebeu este homem as informações abso- lutamente necessárias para escrever este livro do inicio ao fim? Sabemos que ele não era judeu, não integrava o círculo dos primeiros discípulos de Jesus e que não estava entre os 120 que receberam e experimentaram o milagre do Pentecoste. Precisamos então atentar para a introdução de seu evangelho. Ali o autor apre- senta seu modo de agir e seu método de trabalho: "Visto que muitos houve que empreenderam uma narração coordenada dos fa- tos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o princi- pio foram deles testemunhas oculares, e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem..." (Lucas 1.1-3). Esse relato apresenta claramente o método de trabalho de Lucas. Ele não se ba- seou em lendas ou noticias que corriam de boca em boca, elaboradas e embeleza- das. Não. Para escrever seu evangelho ele foi direto às fontes. Ele pesquisou, pergun- tou, obteve suas informações em primeira mão. É evidente que na elaboração de Atos, a segunda parte de sua grandiosa história da obra de Jesus, ele seguiu o mes- mo método de pesquisa e redaçâo. Assim sendo, ele escreve a Teófilo na introdução desta segunda parte: "Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as cousas que Jesus começou a fazer e ensinar..." — Para a devida compreensão do propósito de Lucas, é importante que corrijamos o texto da Almeida (Revista e Atualizada), dando ao primeiro versículo de Atos a seguinte formulação: "Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando tudo o que Jesus começou a fazer e ensinar..." (No grego temos "érxato", do verbo "árcho", "começar".) Uma tal formulação parece indicar a seguinte continuação do versículo um, não escrita por Lucas: "Este segundo livro pretende agora relatar aquilo que Jesus continuou fazer e ensinar..." E é exatamente este o propósito de Lucas: não glorificar a homens, mas destacar o que Jesus, tendo subido ao céu, continuou e con- tinua a fazer e ensinar por intermédio dos seus apóstolos. Neste sentido podería- mos dizer que toda a história da igreja é história daquilo que Jesus faz por intermé- dio dos mensageiros que trabalham no poder do Espírito Santo. Para escrever este livro é evidente que Lucas foi às fontes, a exemplo do que fizera anteriormente. Quais as fontes consultadas para escrever sobre aqueles episó- dios dos quais ele não foi testemunha ocular? Não o sabemos, ao menos não em de- talhes. Isto requereria um estudo à parte. Uma coisa no entanto é certa: na história relatada na segunda parte de Atos o próprio Lucas esteve direta ou indiretamente presente. O emprego da primeira pessoa do plural ("nós") leva-nos a esta conclusão. Assim sendo, o autor está pela primeira vez envolvido diretamente nos episódios relatados no capítulo 16. Contando a segunda viagem missionária de Paulo (na qual Silas e Timóteo o acompanharam), diz o autor no v. 8: "... e tendo contornado Mísia, desceram a Trôade". O autor fala "deles", os outros, emprega a terceira pessoa do plural. Ele próprio ainda não está presente. Em Trôade o apóstolo Paulo teve a visão do homem da Macedônia que o chamava. E Lucas, dando continuidade a seu rela- tório, diz em Atos 16.10: "Assim que teve a visão, imediatamente procuramos partir para aquele destino..." O autor fala em "nós", emprega a primeira pessoa; logo, esteve presente, era companheiro de viagem de Paulo. Disto se conclui que, até a vinda de Paulo, Lucas trabalhava (certamente como médico) na cidade de Trôade. Abandonou esta atividade e acompanhou os missionários até a Macedônia. Chegaram a Filipos, "cidade da Macedônia, primeiro do distrito, e colónia" (de Roma) (At 16.12 ss.). Nesta cidade Lucas acompanhou a atividade de Paulo e Silas. Esteve presente nos cultos, presenciou a cura milagrosa de uma jovem possessa e não pôde evitar a prisão de Paulo e Silas. Certamente esteve ao lado de Paulo quan- do este, na qualidade de cidadão romano, exigiu satisfação do tratamento que lhe haviam dispensado os magistrados de Filipos. (Um cidadão romano não podia ser açoitado.) Uma vez garantida a continuação do trabalho missionário em Filipos, Pau- lo e Silas partiram para novos campos missionários. No entanto Lucas ficou em Fili- pos. Certamente permaneceu ali para ser o líder deste grupo de cristãos que cresceu pouco a pouco até se tornar uma das principais congregações da Macedônia. Lucas relata isto de maneira resumida em At 16.40: "... tendo-se retirado do cárcere, dirigi- ram-se para a casa de Lídia e, vendo os irmãos, os confortaram. Então partiram" — sem o autor, é claro. Na qualidade de médico-missionário em Filipos, Lucas teve um amplo campo de atividade diante de si. Quanto tempo permaneceu ali? Se viajou ou não para outras localidades adjacentes não sabemos. Se foi para o interior da província da Macedô- nia também não. Em todo caso, apenas depois de alguns anos é que Lucas volta a entrar em cena neste relato histórico das atividades de Paulo. Neste entretempo Pau- lo, Silas e Timóteo fundaram as congregações de Tessalônica e Beréia, ainda na Macedônia. Certamente demoraram-se ali por várias semanas, se não meses. Perse- guido, especialmente por judeus, Paulo deixou Silas e Timóteo na Macedônia e foi para Atenas, onde teve algumas experiências amargas. Saindo de Atenas foi a Corin- to, onde permaneceu no mínimo "um ano e seis meses" (At 18.11) ou até mais tempo. De Corinto voltou a Jerusalém e Antioquia da Síria, onde encerrou a segunda viagem missionária. Em sua terceira viagem Paulo permaneceu aproximadamente três anos em Éfeso (At 20.31). Depois disto, atravessando a Macedônia e a Grécia, chegou outra vez a Corinto onde se demorou por três meses (At 20.2,3). De Corinto iniciou sua viagem de regresso, via Filipos. E é neste ponto que Lucas volta à cena. Em Filipos, "depois dos dias dos pães asmos" (páscoa de 57 d.C., segundo os melhores cálculos), Lucas rein- tegra-se à comitiva de Paulo (cf. At 20.5,6 ss.). A partir deste momento Lucas volta a contar sua história na primeira pessoa do plural; logo, ele presenciou o que descreve. Desta maneira terminou uma certamente abençoada atividade médico-missionária de mais ou menos sete anos em Filipos. Durante estes sete anos Lucas teve participa- ção ativa na organização, expansão e fortalecimento desta congregação que trouxe muita alegria e conforto ao apóstolo Paulo (cf. a carta aos Filipenses). Na continuação da viagem passaram por Trôade. Nesta cidade, onde Lucas esti- vera estabelecido anteriormente, ocorreu aquele incidente quase pitoresco com o jo- vem Èutico. Adormecido profundamente em virtude do prolongado discurso do após- tolo, que foi até meia-noite, o jovem caiu do terceiro andar abaixo e foi levantado morto. Não se pode fazer o texto dizer que Èutico sofreu apenas um choque cerebral e que, portanto, apenas estava inconsciente. Quem declara que o jovem estava morto é o médico Lucas. Sem muita hesitação ele teria lavrado o atestado de óbito: morreu em virtude de uma queda da altura de aproximadamente 12 metros. Mas é o mesmo médico quem afirma que, diante da ação do apóstolo, ele retornou à vida (At 20.7-12). A partir dai Lucas acompanhou Paulo até Jerusalém. — Sempre de novo me admira o silêncio de Lucas em face dos acontecimentos desta viagem a Jerusalém, especial- mente no que diz respeito às várias admoestações no sentido de que não prosseguisse viagem. Lucas historia fatos, acontecimentos. Sua opinião pessoal não importa. Ele simplesmente narra a história de Deus. O importante não é o que ele pensa ou julga, e, sim, o que Deus quer e faz. Eis o que ele relata a respeito da chegada de Paulo em Jerusalém: "Tendo nós (Lucas está presente!) chegado a Jerusalém, os irmãos nos receberam com alegria. No dia seguinte Paulo foi conosco encontrar-se com Tiago, e todos os presbíteros se reuniram. E. tendo-os saudado, contou minuciosamente o que Deus fizera entre os gentios por seu ministério. Ouvindo-o, deram eles glória a Deus..." (At 21.17-20a). O autor de Atos presenciou os acontecimentos verdadeiramente espantosos que sucederam a Paulo em Jerusalém. Ele relata isto com detalhes até interessantes em Atos 21.20b - 23.30. É bastante provável que ele tenha ido com Paulo até Cesaréia (At 23.31-35). onde o apóstolo ficou aproximadamente dois anos, prisioneiro das autoridades romanas. — É bem possível que durante este tempo Lucas tenha encontrado muitas das testemunhas oculares da vida de Jesus, fazendo com que investigasse e anotasse o que lhe interessava a respeito da vida e dos ensinamentos de seu Senhor (cf. Lc 1.1-3). Quando o apóstolo, cansado das maquinações de funcionários subalternos inte- resseiros, finalmente apelou para César, sua única possibilidade de, humanamente falando, chegar a Roma, — como há muito planejara — (Rm 1.12) e esta viagem a Ro- ma se concretizou, Lucas foi com ele. Isso se prova mais uma vez pela narrativa na primeira pessoa do plural: "Quando foi decidido que navegássemos para a Itália..." (At 27.1 ss.). — Tudo isso aconteceu no último trimestre do ano 59 d.C. A acidentada viagem de Paulo e sua escolta a Roma é descrita em Atos 27. É de- veras interessante este relato do médico particular do prisioneiro de César. Segundo os peritos em literatura, o capítulo 27 de Atos é um dos relatos mais minuciosos e realistas que temos de uma viagem marítima daquela época. Prova de que foi escrito por uma testemunha ocular. Chegados a Roma, é bastante provável que Lucas ficou ao lado do amigo Paulo. Estamos convictos de que durante estes dois anos (At 28.30,31) o apóstolo escreveu as assim-denominadas "cartas da prisão" (Efésios, Colossenses, Filemom, Filipenses). E é precisamente em duas destas que o apóstolo menciona Lucas, o mé- dico amado, seu cooperador (Cl 4.14; Fm 24). É mui provável que, segundo várias fontes da patrística, Paulo tenha sido libertado ao final de dois anos. Viajou então até "aos confins do ocidente" (1 Ciem 5.5-7), o que na época correspondia à Espanha de hoje (Acta Petri 1-3; Cânon Muratoriano 34-39). Se Lucas o acompanhou ainda des- ta vez, não sabemos. A última referência a Lucas no Novo Testamento nos coloca numa situação de- veras diferente. — O mais provável é que Paulo tenha voltado da Espanha, dirigindo- se novamente para a parte oriental do império romano. Evitou passar por Roma, onde havia começado a perseguição de Nero (depois do incêndio de Roma, a 19 de julho de 64), na qual provavelmente morreu Pedro. Novamente não sabemos se Lucas o acompanhou. As atividades do apóstolo neste período refletem-se parcialmente em 1 Timóteo e Tito. Também desconhecemos como de Nicópolis no Epiro (Tt 3.12), onde pretendia passar o inverno (de 66/67), veio parar em Roma, onde ele manda escrever sua última carta, 2 Timóteo. Esta carta mostra que desta vez a situação de Paulo era muito mais delicada que da primeira. Paulo sente que o fim está próximo. E nesta reta final de sua exis- tência terrena o único que está a seu lado é Lucas. "Somente Lucas está comigo" (2 Tm 4.11). Paulo foi martirizado possivelmente no início do ano 67 d.C., durante o inverno europeu (cf. 2 Tm 4.13: "traze a capa que deixei em Trôade na casa de Carpo"). Penso que foi Lucas quem escreveu a segunda carta a Timóteo, em nome e sob responsabilidade de Paulo, já que este, durante esta prisão, não podia escrever. Sim Paulo foi martirizado — e Lucas ficou. Será que, sendo médico, pôde assistir Paulo nos momentos que antecederam a execução — ele, o último amigo? E enquanto a história silencia a respeito de Lucas, o médico amado, ele mesmo em nome de Deus e sob inspiração do Espírito Santo escreve história, "narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram..." (Lc 1.1) — seu "primeiro livro". E mais: se neste "primeiro livro" (o evangelho) ele narrou "todos as cousas que Jesus começou a fazer a ensinar" (At 1.1), então nesta segunda parte da narrativa (Atos dos Apóstolos), ele relatou aquilo que Jesus continuou a fazer e ensinar através dos apóstolos, seus instrumentos escolhidos. 2. O PRÓLOGO DE UM GRANDIOSO LIVRO (Atos1. 1,2) "Escrevi o primeiro livro, ó Teófilo, relatando todas as cousas que Jesus fez e ensinou, até ao dia em que, depois de haver dado mandamentos por intermédio do Espirito Santo aos apóstolos que escolhera, foi elevado às alturas". "Escrevi..." — Quem escreveu foi Lucas, o médico amado de Paulo (Cl 4. 14), conforme constatamos no estudo anterior. "Primeiro livro" — Lucas introduz este seu "primeiro livro" da seguinte maneira: "Visto que muitos houve que empreenderam uma narração coordenada dos fatos que entre nós se realizaram, conforme nos transmitiram os que desde o princípio foram deles testemunhas oculares, e ministros da palavra, igualmente a mim me pareceu bem, depois de acurada investigação de tudo desde sua origem, dar-te por escrito, excelentíssimo Teófilo, uma exposição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído" (Lc 1. 1.4). Temos, então, diante de nós a segunda parte de uma obra histórica que, conforme o costume da antiguidade, foi dedicada a determinada pessoa. Quem foi o destinatário desta tão volumosa e profunda obra? Certamente trata-se de uma pessoa de destaque. Os escritores da época, não dispondo de recursos financeiros suficientes para a publicação de determinada obra, muitas vezes dedicavam-na a uma pessoa conhecida — de preferência rica — para que esta, assim honrada, financiasse sua publicação, o que sempre era bastante dispendioso. Entretanto, os anais históricos da época não registram o nome mencionado no prólogo de ambas as partes desta obra. E do motivo apresentado no prólogo deduz- se facilmente que esta dedicatória não visava lucros. Quem foi então o destinatário desta que é, reconhecidamente, uma das maiores obras históricas da época? "Teófilo" — É um nome que ocorre com certa frequência na época e significa "amigo de Deus". É bem verdade que podemos estar diante de um nome fictício, da- do por Lucas ao destinatário para, desta forma, mostrar que ele era homem digno de toda a consideração. Alguns exegetas defendem esta tese. — No entanto, já que em ambas as partes da obra é mencionado este mesmo nome, e ainda mais que ele tem uma conotação diferente de uma parte para a outra, julgamos que se trata de uma pessoa real. Em Lucas 1.3, Teófilo é entitulado "krátiste", que quer dizer, "excelen- tíssimo". Este era um título dado somente a altos funcionários do Império Romano. Além desta passagem, Lucas emprega este termo em mais três passagens, sempre auando se refere à mais alta autoridade provincial, o governador (Féiix - At 23.26; 243- Festo - At 26. 25). Por este motivo podemos dizer que Teófilo era um dignitário de alta posição na hierarquia do Império Romano. Nada sabemos, todavia, acerca da natureza do seu ofício e onde possa tê-lo exercido. O lugar mais provável, no entanto, é Roma. O que chama atenção é que Lucas emprega este "excelentíssimo" apenas na in- trodução da primeira parte de sua obra, o Evangelho; na segunda parte, em Atos, ele não mais aparece. A meu ver isto se explica da seguinte maneira: Lucas, que esteve com Paulo em Roma durante a primeira prisão deste (entre 60 e 62 d.C. - cf. Cl 4. 14; Fm 24), participou ativamente da atividade missionária do apóstolo, que gozava rela- tiva liberdade para tanto (cf. At 28. 30,31). Em Filipenses 1. 13 e 4. 22 menciona-se de modo especial sua atividade entre membros da Guarda Imperial e outra gente da "casa de César". É bem possível que Lucas, na privilegiada condição de médico, te- nha tido fácil acesso às camadas superiores da corte de Nero. Não seria perfeita- mente possível que entre aqueles a quem Lucas testemunhou de Cristo estivesse jus- tamente o "excelentíssimo Teófilo"? É igualmente possível que Lucas, antes de abandonar Roma (teria ele acompanhado o apóstolo em sua viagem à Espanha, após sua libertação em 62 d.C.? - cf. Rm 15.28), e a pedido de Teófilo, que ainda não estava totalmente convicto da doutrina cristã, tenha entregue a este, por escrito, "uma expo- sição em ordem, para que tenhas plena certeza das verdades em que foste instruído (até esta altura)" (Lc 1. 3,4). Este é o evangelho de Lucas, a primeira parte desta obra histórica, e que foi escrito para ser uma espécie de catecismo para este alto funcio- nário. Na dedicatória da segunda parte Lucas se dirige a Teófilo sem o "excelentíssi- mo". Possivelmente se passaram alguns anos entre a composição da primeira e da segunda parte, o suficiente para que Teófilo se convertesse ao Cristianismo. E deste momento em diante caem os títulos: cristãos são irmãos entre si. Esta segunda parte o irmão Lucas dedica a Teófilo, o irmão em Cristo. O que levou Lucas a enviar esta segunda parte a Teófilo? — Lucas apenas insinua qual seja seu propósito, deixando que Teófilo e nós tiremos a conclusão. Diz ele: "Escrevi o primeiro livro... relatando todas as cousas que Jesus começou a fazer e ensinar..." Esta deve ser a tradução do primeiro versículo, a base do original grego: "êrxato (iniciou, começou) Jesoús poiéin te kai didáskein". A continuação lógica des- ta introdução, segundo as nossas exigências literárias, deveria ser esta: "envio-te es- te segundo livro relatando aquilo que Jesus continuou a fazer e ensinar". E é exata- mente este o propósito deste "segundo livro", desta segunda parte da história de Je- sus. Este é então, segundo indicação do próprio autor, o conteúdo de sua obra histó- rica completa: O "primeiro livro" relata os acontecimentos "até ao dia em que Jesus, depois de haver dado ensinamentos... foi elevado às alturas". O segundo livro principia com o faustoso evento da ascensão de Jesus e passa então a relatar o que Jesus continuou a fazer e ensinar, de modo especial através de seus instrumentos escolhidos: Pedro e Paulo, até que esta mensagem chegou a Ro- ma, a capital do mundo (At 28. 30.31). 9 É possível, e muitos intérpretes são desta opinião, que Lucas tencionasse escre- ver uma terceira e última parte desta sua obra histórica. Esta relataria o que Jesus houve por bem continuar a fazer e ensinar até a morte de seu bandeirante enviado ao mundo: Paulo. Entretanto, esta terceira parte não foi escrita. Sentimos profundamente sua falta. Esta terceira parte eliminaria as múltiplas conjeturas a res- peito do avanço do evangelho depois da libertação de Paulo em sua primeira prisão. Com esta terceira parte em mãos poderíamos também enquadrar as Cartas Pastorais nesta última etapa da atividade do apóstolo; teríamos, possivelmente, a solução para o problema da autoria da Epistola aos Hebreus. — Entretanto, Deus houve por bem não permitir que estas histórias fossem escritas. Devemos nos dar por satisfeitos com os relatos que temos. Sim, devemos ser profundamente gratos, de modo especial por aquilo que Lucas — em nome de Deus — nos relata no livro que recebeu o nome de "Atos dos Apóstolos". Não sabemos com absoluta certeza a data em que foi escrito este livro. Temos, porém, alguma base para afirmar que ele foi escrito entre a primeira libertação de Paulo (62 d.C.) e seu segundo aprisionamento, que foi também o último pois culmi- nou com sua morte de mártir, mui provavelmente ao final de 66 d.C., ou princípios de 67 d.C. — Segundo a tradição esta obra foi escrita na Grécia, em lugar indefinido, e enviada a Roma. "Relatando todas as cousas" — É evidente que Jesus, durante sua intensa ativi- dade de mais de três anos, fez e ensinou muito mais do que um evangelista even- tualmente'poderia relatar. Convém lembrar o que-João diz a respeito do que relatou em seu evangelho: "Há, porém, ainda muitas outras cousas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio eu que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos" (João 21.25). — Lucas escreveu aquilo que era necessário para uma instrução completa nas verdades divinas. Certamente ele estava consciente daquilo que João afirma e explica com respeito à seleçâo de sinais de Jesus relatados em seu evangelho: "Na verdade fez Jesus diante dos discípulos mui- tos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome" (João 20. 30,31). "... depois de haver dado mandamentos" — A palavra "mandamentos" pode pa- recer ambígua; por isso, é preferível que se traduza o particípio do aoristo "enteilá- menos" por "tendo-lhes dado instruções". Isto porque, de fato, Jesus deu instruções e ensinamentos a seus discípulos durante aqueles 40 dias depois da ressurreição. Os discípulos passaram por um curso intensivo de teologia e missiologia durante es- ta estada tão especial do Mestre entre eles, muitas vezes visível, mas constante de modo invisível. O que sentiram de modo especial durante estas aproximadamente seis semanas foi a presença do Espírito Santo, se bem que não na mesma medida em que ele se fez sentir no dia do Pentecoste. Segundo Lucas, estas instruções lhes foram dadas "por intermédio do Espirito Santo". Esta é, sem dúvida alguma, uma referência àque- le ato de Jesus, quando apareceu aos discípulos depois da ressurreição e — segun- do o relato de João 20. 21,22 — deu-lhes a primeira ordem no sentido de que doravan- te fossem seus representantes aqui na terra: "Paz seja convosco! Assim como o Pai me enviou, eu também vos envio. E, havendo dito isto, soprou sobre eles, e disse- lhes: Recebei o Espírito Santo..." Esta ação, segundo nossa compreensão da passagem, limita-se, antes de tudo, aos Onze (Doze antes da Sexta-Feira, Doze depois da Ascensão), isto é: "... aos apóstolos que escolhera" - É natural que o Mestre sempre se refira em 10 primeiro lugar aos "apóstolos", mesmo depois de sua ressurreição. Eles foram esco- lhidos para serem seus substitutos humanos aqui na terra; era através deles que ele nueria "continuar" sua obra de evangelização; eles seriam — e este é o sentido do termo "apóstolos" — seus embaixadores, seus representantes plenipotenciários. A estes ele escolhera, conforme nos relata Marcos: "... para estarem com ele e para os enviar a pregar, e a exercer a autoridade de expelir demónios..." (Marcos 3. 13,14; cf. também Mt 10.1-4; Lc 6. 12-16). "até ao dia em que ... foi elevado às alturas" — O "primeiro livro" de Lucas, de- dicado a Teófilo, fez uma "narração coordenada dos fatos que entre nós se realiza- ram" até aquele memorável dia, o dia que marcou o fim da presença visível do Mestre aqui na terra: o dia da ascensão. Este faustoso evento, no evangelho, é relatado em poucas palavras. Depreende-se do texto que Lucas tencionava escrever mais a respeito deste evento. Isto porque nunca jamais um evento de tal envergadura foi descrito com tão poucas palavras: "Então os levou para Betânia e, erguendo as mãos, os abençoou. Aconteceu que, enquanto os abençoava, ia-se retirando deles, sendo elevado para o céu" (Lucas 24. 50,51). 3-40 DIAS DE SUMA IMPORTÂNCIA (Atos 1.3-5) "A estes (aos apóstolos) também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas provas incontestáveis, aparecendo-lhes durante quarenta dias e falando das cousas concernentes ao reino de Deus. E, comendo com eles, determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém, mas esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes: Porque João, na verdade, balizou com água, mas vós sereis balizados com o Espirito Santo, não muito depois destes dias". A presença toda especial do Jesus Ressuscitado beneficiou, em primeiro lugar, os apóstolos. Conforme constatamos, durante este tempo de suma importância foi- lhes administrado um curso intensivo, em particular. Entretanto, não somente os ensinamentos foram de especial importância para eles. O mais importante de tudo foi, possivelmente, este ato da parte de Jesus: "... a estes também, depois de ter padecido, se apresentou vivo..." Verifica-se no relato de Lucas que o término do convívio de Jesus com seus discípulos se dá precisamente com o padecimento e morte de Jesus. E era exatamente este fato que os discípulos não conseguiam compreender; até o último instante eles não se conformavam quando Jesus anunciava seu padecimento e morte. Basta que lembre- mos o protesto de Pedro contra uma tal "ideia": "Tem compaixão de ti, Senhor; isso de modo algum te acontecerá" (Mt 16.22). Pedro chegou ao ponto de reprovar o Mes- tre por causa deste pensamento (Mc 8.32). E Pedro não foi o único; os outros dis- cípulos também não conseguiam compreender o porquê do padecimento e morte. Exemplo disto são Tiago e João, filhos de Zebedeu, que se declararam aptos a beber o mesmo cálice que estava destinado a Jesus (Mt 20. 22,23; Mc 10. 38,39). Sim, sa- bemos que Pedro e os demais, com duas espadas, estavam dispostos a defender seu Mestre e evitar a traição e o aprisionamento (Lc 22. 38,49). Não se tratava de uma me- ra ideia; era de fato uma determinação, como bem o demonstra Pedro que, no instan- te do aprisionamento, cortou a orelha de Malco (Jo 18. 10,11). Sim, para os discípulos o padecimento e a morte de Jesus constitui-se no fim horrível de uma vaga esperan- ça. Por este motivo, foi de suma importância que Jesus, depois de sua morte, "se 11 apresentou vivo" aos discípulos. "O Jesus crucificado vive!" Esta era, sem dúvida alguma, a maior mensagem que os discípulos poderiam levar ao mundo. "Christus Vi- »it!" — Este foi, é, e sempre será o centro da mensagem verdadeiramente cristã. Sem esta mensagem o cristianismo não subsiste. Sem esta mensagem o cristianismo se- ria apenas mais uma dentre as religiões humanas que têm como centro grandes perso- nalidades que, todavia, morreram e vivem são somente na memória dos seus se- guidores. O cristianismo é fundamentalmente diferente: Cristo vive de fato, realmen- te, e não apenas na memória dos seus seguidores ou porque os apóstolos pregaram que ele está vivo. Lucas deixa isto bem claro quando constata que ele "se apresen- tou vivo" — "paréstesen heautón zônta". Lucas não deixa dúvidas: ele "apareceu" de fato, visivelmente, ele apresentou-se ("heautón"); logo, não se tratava de uma figura qualquer, mas, sim, era o próprio Jesus, o mesmo que eles haviam conhecido antes de seu padecimento e morte. Essa manifestação do Mestre vivo deu-se através de "muitas provas incontestá- veis". Fala alguém que certamente também ouviu contestações. Já nas primeiras ho- ras da Páscoa surgiram contestações. Para a razão de Maria Madalena o túmulo va- zio só podia ter esta explicação: "levaram o meu Senhor, e não sei onde o puseram" (Jo 20. 12). A "contestação" dos lideres judaicos foi forjada, como sabemos. O relato dos guardas convenceu-os da veracidade do fato; por isso, como subterfúgio, "deram grande soma de dinheiro aos soldados, recomendando-lhes que dissessem: Vieram de noite os discípulos dele e o roubaram, enquanto dormíamos" (Mt 28. 12,13). Lucas certamente ouviu ainda outras contestações — algumas das quais Paulo analisa com grande convicção em 1 Coríntios 15. Até os nossos dias, o que fere profunda- mente o cristianismo são precisamente as contestações que são levantadas contra este fato estabelecido que é a ressurreição de Cristo; e isto se dá de modo especial quando estas contestações partem daqueles que se consideram teólogos do Novo Testamento. — Lucas simplesmente constata que Jesus "apresentou-se vivo com muitas provas incontestáveis". Em seguida ele enumera três categorias de provas: a) "aparecendo-lhes durante quarenta dias"; b) "falando das cousas concernentes ao reino de Deus"; c) "e comendo com eles". "... aparecendo-lhes durante quarenta dias". É verdade: nenhum ser humano es- teve presente ao instante da ressurreição. A modalidade e o tempo exato deste gran- dioso acontecimento Deus não nos revelou. Todavia, a realidade da ressurreição nin- guém pode contestar. Os evangelistas bem como Paulo confirmam este fato: o pró- prio Jesus, que foi morto e sepultado, apareceu, mostrou-se a si mesmo vivo. — Não é tarefa fácil reconstruir a sequência dos aparecimentos de Jesus que nos são relata- dos. Nem sabemos o número exato de aparições, além das poucas — se bem que ex- traordinárias — relatadas. A expressão grega "di' hemerôn tesserákonta", "durante quarenta dias", tem sentido distributivo. É evidente que as aparições se sucediam du- rante estes 40 dias. Nem sempre eram de caráter momentâneo; em muitos casos pro- longavam-se, mui provavelmente, por várias horas. Elaboramos uma relação dos apa- recimentos do Cristo vivo durante os 40 dias numa tentativa de colocá-los em se- quência e para demonstrar quão fortes são as evidências para a ressurreição, à base do relato bíblico: Durante o dia da Páscoa foram estes os aparecimentos do Cristo ressuscitado: a) Aparição a Maria Madalena: "Então saiu Maria Madalena anunciando aos dis- cípulos: Vi o Senhor!" (Jo 20. 11 ss). — "Havendo ele ressuscitado de manhã cedo no primeiro dia da semana, apareceu primeiro a Maria Madalena" (Mc 16. 9). 12 b) Às outras mulheres: Mt 28. 1 ss — "No findar do sábado, ao entrar o primeiro dia da semana" (cf. Marcos: "cedo no primeiro dia da semana"; "sendo ainda escu- ro" — Jo 20. 1) as mulheres encontraram o túmulo aberto. Ao que parece, Maria Ma- dalena, sozinha, chegara antes das demais; vendo o túmulo aberto voltou imediata- mente a Jerusalém para avisar os discípulos. — Entrementes chegaram as outras mulheres. A estas Jesus apareceu, não nas proximidades do sepulcro, mas, sim, no caminho de volta. "Retirando-se elas apressadamente do sepulcro... eis que Jesus veio ao encontro delas e disse: Salve!" (Mt 28. 8,9). — Os exegetas divergem no que diz respeito ao nome das mulheres às quais Jesus apareceu nesta caminhada de re- oresso do sepulcro. — Lucas inicia seu relato dos acontecimentos da manhã da Páscoa dizendo: "...no primeiro dia da semana, alta madrugada foram elas ao túmulo" (a saber, as mulheres que tinham estado ao pé da cruz — Mt 27. 56, e "que o tinham seguido desde a Galiléia" — Lc 23. 49,55). Segundo o relato dos Evangelhos, excetuando Maria Madalena e eventualmente outras mulheres cujos nomes desco- nhecemos, são estas as mulheres que estão incluídas no "elas" do evangelista Lu- cas: Maria, mãe de Jesus - Jo 19. 25. Salomé — mulher de Zebedeu e mãe de João e Tiago (Mc 16.1), e que, certamen- te, era irmã de Maria, mãe de Jesus (Jo 19. 25). Maria — "a outra Maria" (Mt 28. 1), "mãe de Tiago e de José" (Mt 27. 56; Mc 15. 47; 16. 1) e ao mesmo tempo "mulher de Clopas" (Jo 19. 25). Joana — "mulher de Cusa, procurador de Herodes" (Lc 8. 3; Lc 24. 10). c) Aparição a Pedro — Entre os que tiveram a ventura de ver a Jesus, Paulo, em 1 Co 15. 5, menciona em primeiro lugar "Cefas". A partir de Lucas 24. 34 conclui-se que isto sucedeu ainda antes da noite do primeiro dia da Páscoa. Os discípulos que foram a Emaús, voltaram a Jerusalém e relataram sua experiência; em confirmação ao que disseram, foi-lhes dada a faustosa notícia: "O Senhor ressuscitou e já apare- ceu a Simão" — Também neste caso desconhecemos o "onde" e o "como". d) Aos discípulos no caminho a Emaús — Estes relatam com exatidão a hora e o local do aparecimento do seu Senhor: a caminho de Emaús, um trajeto de 60 está- dios, ou seja, onze quilómetros e meio (1 estádio equivale a 192 metros). O estranho que se aproximou dos dois conversou com eles por um período de, ao menos, duas horas, expôs-lhes "o que a seu respeito constava em todas as Escrituras" e finalmente deu-se a conhecer quando "estavam à mesa". Esta história relatada em Lucas 24. 13-35 é uma das mais comoventes dentre as que se relacionam à Páscoa. Marcos já menciona este encontro, se bem que de passagem (Mc 16. 12,13). e) Aos discípulos atrás de portas trancadas, de noite, estando ausente Tomé — Esta é certamente uma das mais importantes aparições do ressuscitado. Isto porque . veio confirmar aquelas aparições que aconteceram durante o dia a diversas pessoas individualmente. É importante também porque aí temos a expressiva identificação do Jesus ressuscitado com o Jesus crucificado: "Vede as minhas mãos e os meus pés, que sou eu mesmo... E ele comeu na presença deles" (Lc 24. 36-43; Jo 20. 19 ss). Durante os quarenta dias que se seguiram houve, sem dúvida, muitos outros aparecimentos. Menciona-se expressamente os seguintes: a) Aparição a Tiago, "o irmão do Senhor", e possivelmente também aos irmãos deste. Este Tiago, segundo o testemunho de João (Jo 7. 5), não creu em Jesus. Entre- tanto, logo após a ascensão de Jesus, encontramo-lo, junto com seus irmãos, entre os seguidores de Jesus (At 1. 14). Segundo Paulo (1 Co 15. 7), Tiago teve uma apari- 13 cão toda especial de Jesus — se bem que não podemos fixar hora nem lugar. É pos- sível que esta aparição tenha tido o propósito de revelar-lhe os planos de Deus que queriam vê-lo como "bispo" da congregação de Jerusalém (At 15, etc). b) A todos os discípulos, estando presente Tomé — Esta aparição deu-se "pas- sados oito dias" (Jo 20. 24 ss). É provável que, por esta ocasião, tenham estado reuni- dos não somente os onze apóstolos mas também outros discípulos com eles. É igual- mente possível que esta aparição seja idêntica àquela mencionada de modo resumido em Mc 16. 14 ss, ocasião em que Jesus "censurou-lhes a incredulidade e dureza de coração". Quer-me parecer que o fato de que "estavam à mesa" indica isto.No entanto, pode tratar-se perfeitamente de uma outra aparição de Jesus, dentre as muitas que aconteceram durante aqueles quarenta dias de suma importância. c) Na Galiléia — È um tanto enigmático o que o Novo Testamento relata sobre estes aparecimentos de Jesus na Galiléia. Depois de permanecerem ainda em Jerusalém mais ou menos uma semana, os discípulos certamente obedeceram à or- dem que Jesus deu no dia da Páscoa e foram à Galiléia (Mt 28. 10). — E ali, onde Je- sus pela primeira vez chamou seus discípulos para que fossem seus seguidores e apóstolos, ele lhes apareceu durante várias semanas e — certamente através de constantes diálogos — fez com que penetrassem ainda mais profundamente nos mistérios do reino de Deus. — As seguintes passagens aludem ao fato: 1) Mt 28. 16,17 — uma constatação geral; 2) Jo 21. 1-14 — aparição especial a sete de seus discípulos; 3) Jo 21. 15-22 — manifestação a Pedro em particular, para reinstituí-lo no apostolado. Durante este tempo certamente sempre de novo ele se manifestava. Isto é o que deduzimos de nossa passagem que constata: "durante quarenta dias". d) "Depois foi visto por mais de quinhentos irmãos de uma só vez" (1 Co 15.6) — Os Evangelhos não relatam diretamente quando e onde aconteceu esta extraordinária aparição. Prevendo que possivelmente surgiriam dúvidas quanto a esta aparição, o apóstolo conclama o arrolamento de testemunhas oficiais, dizendo: "... dos quais a maioria sobrevive até agora", isto é: "Se vocês querem, podem convocá-los para que testemunhem a respeito do fato!" — A maioria dos exegetas inclui esta aparição na passagem de Mt 28. 16,17 que, de modo generalizado, constata as aparições que ocorreram na Galiléia. Será difícil contradizer esta opinião. e) Aparições pouco antes da Ascensão — Passagens como Mt 28. 18-20; At 1. 6-9 ligada a Lc 24. 50 ss e At 1. 9-12 nos levam à conclusão de que a Ascensão deu- se nas proximidades de Jerusalém e que Jesus, antes disto, apareceu aos discípulos — aos 11 — aos 120 (At 1. 15) — mais uma ou até por diversas vezes, "falando das cousas concernentes ao reino de Deus". Esta era precisamente uma das finalidades das aparições do Jesus ressuscitado: fazer com que os discípulos, que seriam a vanguarda do exército de Cristo no estabelecimento de seu reino aqui na terra, fossem, na medida do possível, introduzidos nos "mistérios do reino de Deus" (Mt 13. 11; Mc 4. 11). E isto para que pregassem ao mundo inteiro o Evangelho, aquela mensagem divina da graça de Deus em e por meio de Jesus Cristo, um mistério que a razão humana não poderia ter in- ventado, porque "jamais penetrou em coração humano o que Deus tem preparado para aqueles que o amam" (1 Co 2. 9). "... falando das cousas concernentes ao reino de Deus" — Tendo em mente a pergunta um tanto tola que os discípulos logo em seguida dirigiram a Jesus (v.6), surge a seguinte questão: até que ponto compreenderam eles o que Jesus lhes ensinava durante este tempo? Diante desta pergunta não podemos esquecer que por 14 trás de tudo isto estava a promessa do Consolador, a promessa do Espírito Santo que, segundo Jesus, lhes ensinaria todas as cousas e faria com que lembrassem de tudo que ele lhes dissera (Jo 14. 26). Para mim, este "vos fará lembrar de tudo que vos tenho dito" sempre foi a chave para a compreensão deste grande enigma que a vida dos apóstolos nos apresenta, a saber: como se explica que mesmo ao findar os 40 dias ainda tão ingenuamente perguntam pelo "quando" da restauração do reino de Israel (um reino político-religioso) e, passados apenas dez dias, eles falam com tan- ta clareza a respeito do estabelecimento do reino de Deus espiritual? — Acontece que dez dias depois o Espirito Santo já fizera com que se lembrassem de tudo o que Jesus lhes dissera referente ao reino de Deus. — Quão profundos são os planos de Deus para com seus filhos! "E comendo com eles..." — Esta foi a terceira maneira em que Jesus se mostrou vivo, ressuscitado. Interessante é que exatamente isto foi um sinal, uma prova da res- surreição. Para os discípulos, que durante três anos conviveram e compartilharam com Jesus os — às vezes escassos — alimentos, o fato de que novamente "comia com eles" deve ter sido uma prova absolutamente incontestável de que ele havia res- suscitado. Aquele que outra vez estava no meio deles não era um fantasma, uma ima- gem ilusória, mas sim, o próprio Jesus. É notável o relato do sóbrio historiador Lucas: "E, por não acreditarem ainda eles por causa da alegria, e estando admirados, Jesus lhes disse: Tendes aqui alguma cousa que comer? Então lhe apresentaram um peda- ço de peixe assado. E ele comeu na presença deles" (Lc 24. 41-43). — Também João recorda-se muito bem de um acontecimento à beira do Lago de Genesaré. Após uma noite de pesca mal sucedida, os discípulos, sob o mandado de Jesus, tornaram a lançar as redes e efetivamente apanharam — imaginem — 153 grandes peixes! Sim, João lembra que ali, à beira do Lago, estavam "umas brasas e em cima peixes", que "havia também pão" e que Jesus convidou-os dizendo: "Vinde, comei!" — De fato, era desnecessário perguntarem: "Quem és tu? porque sabiam que era o Senhor" (Jo 21. 4-14). Sem hesitar Lucas relata que Jesus, "com muitas provas incontestáveis", se apresentou vivo a seus discípulos, confiando-lhes a missão que ele principiara: evan- gelizar o mundo! "... determinou-lhes que não se ausentassem de Jerusalém" — Depois de perma- necerem algumas semanas na Galiléia, os discípulos voltaram a Jerusalém e recebe- ram a ordem de que deveriam permanecer ali. Deveriam permanecer na capital da An- tiga Aliança. Deveriam permanecer na cidade em que o Descendente da mulher cum- priu a promessa que Deus fizera, e morreu a morte que estava destinada aos pecadores; onde ele esmagou a cabeça da serpente com o seu grito: "Está consumado!", e entregou a humanidade redimida a Deus. Deveriam permanecer no lugar em que, pelo rasgar do véu que simbolizava a separação entre Criador e criatu- ra, Deus mostrou que agora não mais era necessária uma tal separação, que o caminho agora estava desimpedido. Ali em Jerusalém deveria surgir e viver o novo povo de Deus, o povo que descendia de Abraão, não segundo a carne, mas, sim, segundo a fé e o Espírito. Ali, disse Jesus, cumpria que... "... esperassem a promessa do Pai, a qual, disse ele, de mim ouvistes" — Esta "promessa do Pai" era a promessa do Espírito Santo, o Consolador, É sem dúvida alguma notável que esta promessa se encontra pela primeira vez naquele capítulo em que Jesus consola seus discípulos depois de ter-lhes comunicado sua partida, o capí- tulo que inicia assim: "Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, credes em 15 mim" (Jo 14. 1). Não foi fácil para os discípulos conformar-se com a ideia de neste capítulo, é o que Jesus lhes diz referente ao fato de que deveriam "crer" nele. Era evidente que eles criam em Deus; doravante, contudo, esta fé deveria incluir a fé nele, Jesus, o Filho do Pai. E, em meio a estas significativas explicações, Jesus promete o Consolador: "Eu rogarei ao Pai, e ele (na minha ausência visível) vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o espírito da verdade... Não vos deixarei órfãos..."' (Jo 14. 16-18). No capítulo seguinte (Jo 15), o Mestre torna a falar deste Consolador em termos mais explícitos: "Quando vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim; e vós também testemunhareis..." (Jo 15. 26,27). — Os grandiosos capítulos em que o apóstolo João — e somente ele — nos transmite os ensinamen- tos que Jesus deu a seus discípulos pouco antes de seu padecimento e morte, na verdade só podem ser entendidos plenamente à luz dos acontecimentos do Pentecoste. — E agora tudo isto estava por se cumprir; por isso, convinha que os dis- cípulos não se afastassem de Jerusalém. Ligando a iminente vida do Consolador ao início da nova era, o Mestre, em outras palavras, explica o que estava por acontecer nesta vinda: "Porque João, na verdade, balizou com água, mas vós sereis balizados com o Espirito Santo não muito depois destes dias". Referindo-se a João Batista, Jesus faz com que os discípulos relembrem como tudo havia começado. João balizou lá no Jor- dão; e foi ali que se ouviu o primeiro grito da Nova Aliança: "Arrependei-vos, porque o reino de Deus está próximo". Ali no Jordão também ouviu-se o primeiro testemunho público de que o Messias prometido havia chegado: "Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo!" — Sim, foi ali que os primeiros discípulos ouviram o decisivo "Segue-me!" do Mestre. — Foi ali que, no batismo de Jesus, o Espírito Santo se manifestou e João Batista testificou: "Aquele sobre quem vires descer e pousar o Es- pírito, esse é que batiza com o Espírito Santo". E isto que os evangelistas relatam no início da nova era, agora entraria em pleno vigor. Desta maneira, liga-se o início da atividade terrena de Jesus ao início da atividade dos seus apóstolos, seus representantes aqui na terra. Houve e ainda há muita discussão quanto ao significado da expressão "batismo com o Espírito Santo". As discussões apenas confundem. De antemão, no entanto, deve ficar claro que o "falar em línguas" não é prova absoluta do batismo com o Espírito Santo, ao contrário do.que os.pentecostais extremados afirmam. De momen- to — já que posteriormente se falará mais sobre este assunto — dizemos apenas que no dia de Pentecoste aconteceu exatamente o que fora prometido aos discípulos: o batismo com o Espírito Santo. Não que os apóstolos tenham "falado em línguas"; eles não "falaram em línguas" assim como alguns cristãos de Corinto falaram. Os apóstolos que até aquele momento não haviam falado em público, que, atemorizados, permaneceram em silêncio atrás de portas trancadas, no momento, em que recebem o Espírito Santo abrem as portas, vencem o medo, enfrentam a multidão, enfrentam os poderosos inimigos e testificam, é verdade, em muitas línguas diferentes. Entretanto, o batismo com o Espírito Santo não foi este falar em línguas diferentes. O batismo com o Espirito Santo foi a concessão daquela ousadia, daquela alegria em falar, testificar ao mundo "as grandezas de Deus", isto é — segundo o resumo de Pedro — que "não há salvação em nenhum outro; porque abaixo do céu não existe nenhum outro nome, dado entre os homens, pelo qual importa que sejamos salvos" — a não ser no nome de Jesus de Nazaré, que foi cruci- ficado, ressuscitou e subiu ao trono de Deus "donde há de vir a julgar os vivos e os mortos". 16 é ni^to aue consiste o batismo com o Espírito Santo, o Espírito da verdade que, f^rme o próprio Mestre lhes prometera, "vos ensinará todas as cousas e vos fará oonf Tde tudo o que vos tenho dito" (Jo 14.26). - E isto sucederia "não muito lembrarae in ^ ^^ estamos dentro dos quarenta dias de suma importância. depois aesie ^ ^as do Mestre tenham sido pronunciadas nos últimos dias E antecederam a Ascensão, durante aqueles dias em que Jesus repetidas vezes se ^ifestou a seus discípulos para dar os últimos ensinamentos. ÏÍ maravilhoso plano de Deus! Ele reservou 40 dias depois da ressurreição do Se- ^rnara um curso intensivo de aperfeiçoamento teológico daqueles que receberiam •cumbência de levar a mensagem salvífica a todo o mundo. - Ainda hoje ^sfruïamos os benefícios daqueles tão importantes quarenta dias. Isto porque, durante eles, todas as riquezas dos mistérios de Deus foram reveladas aos discípulos e, através destes, ao mundo inteiro. 17 4 • UMA REUNIÃO MEMORÁVEL (At 1.6-8) "Então os que estavam reunidos lhe perguntavam: Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel? Respondeu-lhes: Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reser- vou para sua exclusiva autoridade; mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas tes- temunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra". Os versículos anteriores a essa passagem dão a entender que Lucas está resu- mindo em poucas palavras o que aconteceu naqueles 40 dias entre a ressurreição de Jesus e sua ascensão. Estes dias foram inesquecíveis para os discípulos. Durante es- te tempo o Mestre os preparava, eles que haviam sido seus seguidores durante três anos, para serem seus apóstolos, seus enviados, seus embaixadores para o mundo inteiro. Quarenta dias de intensa atividade de Jesus. É necessário termos em mente que essa atividade era diferente daquela dos três anos anteriores, também no que diz respeito ao estado do próprio Jesus. Ele não mais estava submetido às limitações terrenas. Ele já não mais estava, como dizem os dogmáticos, no "estado de humilha- ção". Porém, do ponto de vista dos discípulos a atividade de Jesus foi intensa. E es- sa atividade teve por alvo um aprimoramento dos conhecimentos de seus futuros em- baixadores. O meio empregado para tanto foi falar "das cousas concernentes ao reino de Deus" (v. 3). Depois da ressurreição de Jesus os discípulos ficaram em Jerusalém ao menos pelo espaço de oito dias. Tiramos esta conclusão comparando os relatórios de Lucas e de João no que diz respeito aos acontecimentos da páscoa. Segundo Lucas, depois do retorno dos dois discípulos de Emaús, eles comentavam os acontecimentos de Jerusalém, bem como os sucedidos no caminho a Emaús, "quando Jesus apareceu no meio deles e lhes disse: Paz seja convosco" (Lc 24.36).lsto, segundo João, aconte- ceu "ao cair da tarde daquele dia, o primeiro da semana" (Jo20.19). Muito tempo mais tarde, ao escrever seu evangelho, João ainda acrescenta a este relatório objetivo, quase que envergonhado, que essa primeira aparição se deu estando "tran- cadas as portas da casa... com medo dos judeus". — "Passados oito dias, estavam outra vez ali reunidos os seus discípulos e Tomé com eles" (Jo 20.26). Depois destes oito dias, foram à Galiléia. Ali, às margens do Mar da Galiléia, o Ressuscitado várias vezes se revelou aos discípulos e, sem dúvida, foi especialmente durante estes dias que lhes falou "do reino de Deus". — Em todo caso, encontramo- los novamente em Jerusalém para esta reunião da qual fala o nosso texto. É possível que tenham recebido uma ordem expressa de Jesus no sentido de irem da Galiléia a Jerusalém, ordem à qual atenderam sem fazer muitas perguntas. Talvez pensavam também na festa do Pentecoste, uma das festas de peregrinação dos judeus, que es- tava próxima. Foi aqui então que Jesus lhes ordenou "que não se ausentassem de Jerusalém, 18 mas esperassem a promessa do Pai" (v. 4). Estas palavras lembram o que ele havia prometido antes de sua morte: "Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, a fim de que esteja para sempre convosco, o Espírito Santo" (Jo 14.16,17) e "o Consola- dor, o Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome, esse vos ensinará todas as cousas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito" (Jo 14.26). Os 40 dias haviam chegado ao fim. Mais uma vez agora estavam os discípulos reunidos com seu Mestre, (v. 6). Não sabemos onde essa reunião memorável se reali- zou. Pode ser, e o contexto parece indicá-lo, que já estavam reunidos no monte "cha- mado Olival" (v. 12). Este não era propriamente um "monte", mas, sim, uma elevação a leste da cidade de Jerusalém, no caminho que vinha de Jericó. Dali pela primeira vez os peregrinos podiam avistar toda a beleza da cidade. Esse certamente era o lu- gar adequado para tão memorável reunião de Jesus com seus discípulos. Neste lugar Jesus, em sua última visita à cidade, parara e profetizara a queda da cidade, lamentando sua incredulidade. Ao pé desta elevação, no jardim chamado Getsêmani, pela última vez ele se reunira com seus discípulos antes de uma morte e dali começa- ra sua última caminhada: rumo à cruz (Mt 26.30,36 ss). Esta elevação ficava a mais ou menos 2000 metros do centro da cidade. Ali'estavam eles reunidos. — Quem? — Não sabemos quantos eram. Gostaria, porém, de colocar aqui os 500 que Paulo menciona em 1 Co 15.6 como testemunhas da ressurreição. — E todos estes homens e mulheres tinham um elo que os ligava, que os unia: Jesus Cristo, o Ressuscitado. — Cada um deles era um mundo à parte, cada um deles tinha sua própria história, sua própria vida, suas próprias experiências com Jesus, seus próprios problemas, alegrias, tristezas. — Só uma cousa tinham em comum: cada um deles, de uma ou de outra maneira, tivera um encontro espe- cial e particular com seu Senhor Jesus. Lá estava entre eles P e d r o, o outrora líder dos doze. Quantos encontros especiais! E apesar de tudo, três vezes ele negou covardemente a seu Senhor: "Não conheço este homem!" No entanto, lá está ele. E isto porque mais uma vez o Mestre se encontrara com ele, porque ele estivera a sós com o ressuscitado (Lc 24.34; 1 Co 15.5) num encontro que foi decisivo para sua vida pessoal. Depois deste encontro houve outro ainda, decisivo para seu ministério e apostolado. Nesta ocasião, como que em resposta à sua tríplice negação, Jesus o colocou diante da tríplice pergunta: "Simão, filho de João, amas-me?" — e então por três vezes o reinstituiu no apostolado: Apascenta os meus cordeiros, apascenta as minhas ovelhas! — Sim, lá estava ele, reunido com os outros; não o grande líder, mas apenas um entre muitos, muitos seguidores. Lá estava Tomé — o cético como é chamado. — Não sai, não sei! — Teria eu agido de modo diferente? Não foram célicos todos os que estiveram reunidos no pri- meiro dia da ressurreição? Não está o evangelista atribuindo ceticismo aos onze indistintamente, quando relata que Jesus "censurou-lhes a incredulidade e a dureza de coração, porque não deram crédito aos que o tinham visto já ressuscitado" (Mc 16.14)? — Mais uma vez: não teríamos nós também duvidado? — Porém — pela graça do seu Senhor — lá está também o cético. Seu senhor lhe propiciara a oportunidade de um grandioso encontro pessoal, que sucitou a sublime confissão: "Meu Senhor e meu Deus!" Lá estava Maria, a mãe de Jesus. Nada de rainha do céu; era simplesmente uma fiel seguidora de seu Mestre e Salvador, que pela graça de Deus lhe foi dado como filho. — Lá estava também Tiago, aquele irmão de Jesus que não havia 19 acreditado nele e que fazia parte dos habitantes de Nazaré que expulsaram Jesus de sua terra, levando-o a lamentar: "Não há profeta sem honra senão na sua terra, entre os seus parentes, e na sua casa" (Mc 6.4). Deste Tiago João, o evangelista, testifica: "nem mesmo os seus irmãos criam nele" (Jo 7.5). Porém agora lá está também ele, mui provavelmente com seus irmãos. Também ele teve seu encontro especial e parti- cular com Jesus, conforme diz Paulo em 1 Co 15.7 — E lá estava Maria Mada- lena, aquela pobre criatura que tinha perdido todas as esperanças quando encontrou o sepulcro vazio, quando constatou que o corpo do seu querido Mestre não mais estava no lugar; que, no entanto, também teve seu glorioso encontro todo pessoal com ele, como nos relata João (20.11ss). — E lá estavam os dois discípulos — figuras enigmáticas — que foram a Emaús como homens totalmente desanimados e que voltaram correndo e jubilando: O Senhor vive! Reconhecemo-lo "no partir do pão" (Lc 24.35). E lá estavam todos os outros — 120 ao menos (At 1.15), e provavelmente até os 500 mencionados por Paulo (1 Co 15.6). Que reunião extraordinária! Quando refleti sobre esta reunião, veio-me à mente que nós aqui e agora tam- bém estamos reunidos. — Cada um de nós com sua própria vida a viver, com seus problemas pessoais, particulares, com suas alegrias, suas tristezas, suas horas cheias de amor e suas noites de solidão. — No entanto, temos um elo que nos liga, que nos une um ao outro: nosso Senhor Jesus Cristo, o Ressuscitado, que morreu em nosso lugar a fim de termos — e já temos — vida, vida verdadeira, vida eterna. Os que estiveram reunidos naquela reunião memorável tiveram — cada um — seu encontro pessoal e particular com o Senhor. E nós? — e tu, meu irmão? -Irmãos, eu vos poderia contar dos encontros que meu Senhor teve comigo. Foi ele — não eu — quem os providenciou. Algumas vezes parecia-me que tudo estava errado, sim, tudo! Porém então a mão do meu Jesus me tocou — algumas vezes bem de leve, ou- tras vezes com mais intensidade. Porém, o encontro era real. Estive com meu Senhor: às vezes como Pedro, às vezes como Tomé, às vezes como os dois caminhantes a Emaús — no entanto, era o meu Senhor! E tudo estava em ordem outra vez! E tu? Acho que todos nós temos uma história particular a contar, uma história dos nossos encontros com Jesus. O que no entanto quero ressaltar agora é que neste momento, nesta hora de devoção, Jesus está conosco, está tendo um encontro conosco. — Iniciamos esta hora devocional em nome de Jesus. E também para hoje vale a palavra do meu Senhor: "... onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome ali estou no meio deles" (Mt 18.20). (Os que conhecem o grego sabem que o tempo presente dum verbo denota ação contínua. Se Jesus diz "Eu sou!", eu estou, então essa ação perdura: ontem, hoje, sempre.) Sim, vaie sem dúvida também aquela afir- mação, feita possivelmente neste mesmo dia: "Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos". — Nes- tas últimas palavras do Evangelho de Mateus temos o mesmo "Ego eimi" que ocorre em Mt 18.20. É a garantia da presença absolutamente certa do eterno Filho do eterno Deus: Eu sou! — Ele está em nosso meio — hoje — no domingo que vem — sempre, até "a consumação dos séculos", isto é, até finalmente terminar a contagem dos dias e começar — para nós — a eternidade. — Confirmemos esta nossa certeza confessando e cantando: Cristo está presente, o Senhor clemente. Por seu sangue recebemos sumo beneficio; fez ao Pai propício, e perdão inteiro temos. Padeceu e morreu, húmil e obediente. Cristo está presente! (H.E.L. 5, estrofe 2) 20 Nesta reunião memorável entre Jesus e seus seguidores, aconteceu algo que, sempre que me coloco na situação, me perturba profundamente. É o seguinte: Durante mais de três anos Jesus procurara, com toda a paciência possível e com todos os meios à disposição (histórias, parábolas, ensinamentos éticos, sermões pro- féticos, milagres) esclarecer e demonstrar a seus seguidores quem ele era, é, e por que e para que veio ao mundo. Durante mais de três anos ele lhes havia ensinado que, com sua vinda, o reino de deus se realizaria, se concretizaria aqui na terra. Com bastante clareza, e com bastante insistência, demonstrara que este reino não seria um reino terreno, com limites delineados e sinais visíveis, mas que seria totalmente espiritual, que existiria dentro deles, no seu coração, no meio dos seus verdadeiros seguidores. Interrogado pêlos fariseus sobre quando viria o reino de Deus, Jesub lhes respondeu: Não vem o reino de Deus com visível aparência; nem dirão: Ei-lo aqui! ou: Lá está! porque o reino de Deus está dentro em vós" (Lc 17. 20,21). (Um parêntese com respeito a essa passagem em Lucas; A expressão "entós hymõn", na tradução de Almeida "dentro de vós" — certamente não pode significar "em vossos corações", porque o reino de Deus não estava neles, nos incrédulos. O "sentido já seria melhor se fosse traduzido "em vosso meio", porque então poder-se- ia apontar para os discípulos de Jesus, que viviam no meio deles. No entanto, o melhor é tomar a expressão não como indicação de lugar, mas sim como indicação do caráter, da essência do reino de Deus. É um reino não visível, como bem descreve o Senhor na primeira parte de sua resposta. É um reino espiri- tual, um reino do qual também os homens ali presentes faziam partes. — E notável quão profundamente enraizada estava no pensamento de todos os judeus a ideia de um reino visível, palpável, sim, terreno!). Entretanto, Jesus havia sido bem claro no que diz respeito a seu ensinamento sobre o reino de Deus. Na verdade, não havia lugar para uma ideia errónea a esse res- peito, da parte dos discípulos. — Que este era o entendimento da teologia judaica do tempo de Jesus vê-se pelas acusações que os judeus levantaram contra e'e durante o julgamento perante Pilatos. Apesar de ter sido maliciosa a acusação dos judeus, dizendo que Jesus se declarara rei — contra César — a concepção errónea sobre o "rei- no de Deus" estava igualmente por detrás desta acusação. Conhecemos a resposta de Jesus que é de uma clareza extraordinária: "O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim, para que não fosse eu entregue aos judeus; mas o meu reino não é daqui". E então? A pergunta do agnóstico Pilatos procede logicamente: "Logo tu és rei?" — Pode ser que os discípulos não ouviram a soberana resposta de Jesus, caso contrário sua pergunta em nosso texto seria absolutamente ridícula. — "Respondeu Jesus: Tu dizes que sou rei. Eu para isso nasci e para isso vim ao mundo, a fim de dar testemunho da verdade. Todo aquele que è da verdade (que vive na esfera da verdade) ouve a minha voz", (Jo 18.33 ss). Portanto, se Jesus "aparecendo-lhes durante quarenta dias" falou com os discípulos "das cousas concernentes ao reino de Deus" (At 1.3), então tudo isto deveria ter sido evidente e claro para eles. Por isso é tão perturbadora — para nós — sua pergunta nesta ocasião: "Senhor, será este o tempo em que restaures o reino a Israel?" — Será este o tempo em que restaures aquele reino de Oavi, reino glorioso, em que não éramos escravos de ninguém, não estávamos sujeitos a nenhum poder 21 estrangeiro, nem aos sírios, nem aos egípcios, nem aos gregos, nem aos romanos — senão somente a ti, que és o filho prometido de Davi, como tu mesmo sempre de novo o afirmaste? — É este o tempo? Gostaríamos de saber, Senhor! Tento transportar-me àquela situação, colocar-me no lugar dos discípulos. Tento seguir seu raciocínio. Deve ter sido lógico. Procedia de um pensamento, uma ideia, tão profundamente enraizado em seus corações que simplesmente não podiam raciocinar de outra maneira. Tento, outrossim, imaginar o nosso querido Mestre e sua reação a esta pergunta absolutamente improcedente. Posso vê-lo baixando a cabeça — e silenciar por um instante; ao fim meneia a cabeça: Será possível? Como é possível!? — — Quando fico meditando um pouco mais sobre esta passagem, imagino-me diante de um estudante de teologia — na última semana antes de. sua formatura, pronto a receber o chamado, a incumbência de ser pastor, pregador, apóstolo de Jesus Cristo neste Brasil afora — lançando-me esta pergunta: "E este Jesus Cristo — seu reino — sua obra — que significam??" — Irmãos, não haveria eu de sentir-me frustrado, desanimado, pronto a pedir demissão? — E Jesus? Que faz ele? — É exatamente isto que, neste episódio relatado por Lucas, sempre de novo me admira — e me consola: Essa total dedicação do meu Se- nhor até ao fim; essa paciência absoluta, esse não desanimar com as fraquezas humanas, as fraquezas dos que seriam seus representantes na terra. Pode ser que por um momento ele tenha baixado a cabeça; pode ser que por alguns momentos te- nha ficado calado. No entanto, ele não se irrita, não ralha, não repreende. Com a calma de um grande pedagogo, ele tem uma resposta a esta pergunta tola. Ele não responde diretamente a pergunta formulada, isto é, a pergunta pelo estabelecimento visível do reino. Mas sua resposta aponta para um — pelo menos para eles — novo aspecto do reino de Deus, do verdadeiro reino. Ele responde como se a pergunta formulada tivesse .sido: Quando se concretizará a glória final do reino de Deus? Quando será o dia da volta de Cristo para estabelecer definitivamente seu reino num novo céu e numa nova terra? — "Não vos compete conhecer tempos ou épocas que o Pai reservou para sua exclusiva autoridade!" — Está claro? — Que lição tremenda para os doentios calculadores do fim do mundo! Que lição também para nós, que tanto gostaríamos de saber o "quando"! Porém, essa é só a primeira parte da resposta; uma negativa. Saber quando afi- nal não mais existirá aquilo que perturba a nós e a igreja de Cristo aqui na terra: pe- cado, aflições, tristezas, dores, doenças, perseguição, morte... não nos compete. — Porém! "Mas"! Cristo acrescenta um "mas". E este "mas" é de suma importância: mostra que, durante estes tempos, estas épocas em que somos chamados a viver neste mundo, não devemos fechar os olhos e cruzar os braços esperando passiva- mente que as coisas aconteçam "como Deus quiser". Oh não! A segunda parte da resposta de Jesus é um plano, um programa, um programa de açâo. A segunda parte da resposta abre as portas do mundo e manda os discípulos abrirem os olhos: "Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espirito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra" (v.8). Que plano de ação, que estratégia formidá- vel! "Sereis minhas testemunhas!" Sereis minhas testemunhas! — Estas palavras parece que ecoam através dos séculos até nossos dias: Sereis minhas testemunhas! Parece ser pouco? È verdade. No entanto, nada mais é dito; só "minhas testemunhas". 22 — Parece ser muito? Sim, parece. No entanto, nada menos do que isto: "minhas tes- temunhas". Vemos os destaques? "Minhas Testemunhas!" — desde o instante daquela reunião memorável até aquela hora que o Pai reservou para sua ex- clusiva autoridade, até aquela hora em que soar a trombeta da segunda vinda, a trombeta do retorno do Rei, os discípulos de Jesus têm uma só incumbência no seu reino e no mundo, uma só incumbência divina: serem testemunhas de Jesus! Formidável! O mundo, onde o diabo tem o poder, onde os inimigos de Jesus tem a espada, as bestas, as fogueiras, os pelotões de execução para matar os seguidores deste — o mundo em trevas — este mundo deve ser ganho por Cristo. Impossível! — Sim, impossível seria se não fosse verdade o que diz este mesmo Cristo: "É-me dado toda a autoridade no céu e na terra, por isso ide..." — Impossível, sim , caso não existisse esta verdade: "... recebereis poder ao descer sobre vós o Espírito Santo". — Somente neste poder os poucos homens, homens ainda tão confusos, homens cheios de medo, somente neste poder poderiam finalmente cumprir aquele plano de ação preparado e delineado por seu Mestre. É verdade que a grande maioria daqueles que lá estiveram reunidos não foram além do primeiro passo indicado por Jesus: não foram além de sua cidade, de sua pá- tria. Mas isto já era muito. O passo mais importante numa caminhada que já tem seu alvo fixado é o primeiro passo. E o primeiro passo de uma testemunha de Jesus é testificar do seu Salvador em sua própria casa. Ali mesmo começa a luta contra os inimigos do reino. Deveríamos seguir a estratégia de Jesus. Somos chamados a sermos testemunhas dele — não na África, mas sim aqui em casa, no nosso lugar de trabalho. É essa a estratégia missionária que Jesus tem planejado. A este primeiro passo seguem-se os outros, e para estes foram chamados especialmente os Doze. Sim, e os Doze? Não é verdade que estes embaixadores de Cristo, em sua grande maioria, morreram por causa deste testemunho? Sim. É provável que dentre os Doze apenas um', João, tenha morrido morte natural. É verdade que nos séculos que se passaram, desde aquela memorável reunião até hoje, correram rics de sangue dos mártires, das testemunhas de Jesus. Porém nós, que hoje estamos aqui reunidos, somos prova viva de que os discípulos de então cumpriram o plano de açâo esboçado por Jesus: o de serem suas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra. — Estes confins da terra somos nós — hoje. Que reunião memorável! Também nós hoje estamos reunidos. Certamente o nosso Senhor está em nosso meio' Certamente cada um de nós teria uma perguntinha à parte a fazer-lhe. Talvez uma perguntinha muito importante aos nossos olhos. — No entanto: a resposta de Jesus certamente vai muito além dos nossos problemas particulares. (A estes ele há de responder também no seu tempo e à sua maneira!). Ele nos quer abrir os olhos pa- ra sua obra, para a única obra de valor eterno neste mundo: Sereis minhas testemunhas! — Notem!: Testemunhas! Sempre achei muito significativo e importan- te o fato de Jesus não ter dito "pregadores", "oradores". Nesta ordem não temos na- da a respeito do púlpito, nada a respeito da cátedra. Simplesmente "testemunhas"! Podes imaginar o que isto significa para ti? — Nada mais do que simplesmente tes- temunhar, falar, dizer a outrem do teu Senhor Jesus! Que mais significa isto? Significa em primeiro lugar que devemos ter tido encon- tro com Jesus, um encontro pessoal, particular, devemos saber, sim, devemos estar absolutamente convictos de que Jesus é nosso Senhor, é nosso Salvador! — Jesus, o Salvador do mundo! Que significa isto? Significa que é o Salvador também da minha esposa, do meu esposo, dos meus filhos e pais, dos meus vizinhos, do companheiro de viagem no ônibus ou de trabalho. - Será que eles sabem quem é o teu Salvador - e deles também? 23 vizinhos, do companheiro de viagem no ônibus ou de trabalho. — Será que eles sabem que é teu Salvador — e deles também? Por que é tão difícil falar destas cousas? Porque ainda temos conosco, qual um potente freio que nos segura, o nosso velho homem. Porém, se realmente estamos convictos e se realmente queremos abrir a boca em testemunho — o segundo passo nos será dado: Receberemos o poder do Espírito Santo. Não visivelmente, com línguas de fogo, nem audivelmente com som de um vento impetuoso — mas bem no silêncio, na escuridão da noite talvez, quando dobramos os nossos joelhos, oran- do, implorando... então — pode ser — que esta seja a hor.a abençoada em que ele nos concederá ficarmos "cheios do Espírito Santo". E então nos será dada aquela alegria, aquela ousadia de testificar sem sentirmos vergonha. Ah, que o poder do Espírito de Cristo nos invada, nos encha, nos dê aquela alegria e ousadia que foi dada aos apóstolos, de modo que também nós, até mesmo ante a inimizade do mundo, digamos: "não podemos deixar de falar das cousas que vimos e ouvimos". Sim, que isto nos seja dado hoje e amanhã, aqui, em casa, em todo lugar aonde formos! Amém. 24 5. A ASCENSÃO DE JESUS: O EVENTO CULMINANTE (Atos 1.9-11) "Ditas estas palavras, foi Jesus elevado às alturas, à vista deles, e uma nuvem o encobriu dos seus olhos. E, estando eles com os olhos fitos no céu, enquanto Jesus •ubia, eis que dois verões vestidos de branco se puseram ao lado deles, e lhe« perguntaram: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? Esse Jesus gue dentre vós foi assunto ao céu, assim virá do modo como o vistes subir". Sempre de novo nos impressiona o fato de a Escritura descrever em tão poucas palavras os eventos que estavam por modificar essencial e totalmente o curso da história da humanidade. Sobre a ascensão, seus antecedentes, o fato em si, suas consequências, certamente poderiam ser escritos espessos volumes de literatura teológica erudita. Assim pensam os homens. Deus, entretanto, houve por bem descrever este evento de universal importância em termos bem simples. Na verdade, uma única palavra é empregada para relatar este faustoso acontecimento: "epêrthe" (aor. pass. de "epáiro") — "foi levantado, elevado". Fico pasmado toda vez que me deparo com esta descrição, quase acanhada, de um acontecimento que bem poderia ser alvo de ufanosos elogios, dadas as circunstâncias: um homem sozinho, morrendo, vence a todos os seus inimigos, coloca-os sob seus pés, de modo que re- conhecem seu senhorio absoluto, e agora toma assento em seu trono e torna-se, desta maneira, Senhor absoluto de todos. Que história! Que drama! Que apoteose real! — E tudo isto descrito num único e pequenino verbo passivo: "foi levantado!" — Míseras palavras humanas não podem descrever as coisas grandiosas de Deus! Também no seu evangelho Lucas não entra em maiores detalhes ao descrever a ascensão de Jesus. Ele constata apenas que Jesus "diéste" — afastou-se — dos seus discípulos, sem realmente descrever como isto sucedeu. O único evangelista que entra em pormenores é Marcos — se bem que ele o faz cuidadosamente, dando a entender que não podia revelar parte daquilo que era um mistério inexplicável. Marcos, como que tomando uma posição que vai além de tempo e espaço, fala da consequência que este "levantar" teve para a eternidade: "... o Senhor Jesus, depois de lhes ter falado, foi recebido no céu, e assentou-se à destra de Deus" (Mc 16. 19). Nestas últimas palavras do evangelho de Marcos temos, sem dúvida alguma, um eco da repercussão que este glorioso evento teve na confissão da igreja, que desde en- tão, olhando para trás, confessa aquilo que nós ainda hoje afirmamos nas duas mais antigas confissões da igreja cristã (o Credo Niceno e o Apostólico): "Jesus Cristo... subiu ao céu e está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso". — Isto é tudo o que sabemos acerca de um dos mais gloriosos eventos da história da salvação, a ascensão de nosso Senhor. "Ditas estas palavras..." — A ascensão, descrita tão resumidamente, teve lugar depois que Jesus falara "estas palavras" — com muita ênfase, sem dúvida alguma. É evidente que isto não se limita às poucas palavras que Lucas relata neste livro. "És- as palavras" inclui também, e de modo especial, aquelas que são a grande ordem ^lamentaria de Jesus à sua igreja, bem como o fundamento de toda a atividade missionária, a saber, conforme o relato de Mateus: "Tendo ido (assim como vos ""viei), discipulai — fazei discípulos de — todos os povos!" Como? De duas aneiras: "... batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, e nsinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado..." esta ordem, con- 25 tudo, não foi dada a esmo. Ele teve por fundamento a sólida afirmação: Antes de colocar-vos como meus representantes na terra; antes de exigir que façais algo em meu lugar; antes de fazer de vós meus embaixadores plenipotenciários, eu vos decla- ro: "Toda a autoridade ("exousía" = poder, bem como autoridade para executar e exercitar este poder) me foi dada no céu e na terra". Portanto, ide, levai a mensagem porque atrás de vós e de vossa mensagem está a mais alta autoridade que há neste mundo e no além. — E esta força não apenas estará por trás de vós; ela se fará sen- tir em vossa vida e atividade; porque não estareis sozinhos a enfrentar o mundo, o diabo e suas forças: "Eis que eu estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos", até o dia em que a "trombeta do Dia do Senhor" soar, até o dia derradeiro (Mt 28.18-20). — Se isto é assim — e ninguém pode ter dúvidas a respeito — então os mensageiros deste Senhor ainda hoje lutam sob as mesmas condições quando se empenham em levar avante a obra da evangelização do mundo, mundo es- te que cientificamente está no auge, contudo, moral e religiosamente se encontra no nível mais baixo de toda a história da humanidade. "... foi Jesus elevado às alturas" — É notável que Lucas emprega o simples nome humano: Jesus. É evidente: não se tratava de um fantasma, mas, sim, era aquele Jesus de Nazaré, filho de Maria e, como alguns certamente ainda se lembra- vam, do já falecido José, como se supunha e como constava no rol dos habitantes de Nazaré. Sim, era "o carpinteiro..., irmão de Tiago, José, Judas e Simâo" (Mc 6.3). Este que "foi elevado às alturas" era precisamente o homem que, na cruz, se mostrou ven- cedor sobre o pecado e o diabo; que, descendo ao inferno, se mostrou vencedor das forças infernais, e que na ressurreição provou sua vitória sobre a morte. Onde teve lugar a ascensão, este evento que foi a culminância de tudo isto? Há uma aparente incerteza quanto ao lugar exato. Lucas, em seu Evangelho, escreve: "então os levou para Betânia e, erguendo as mãos, os abençoou" (Lc 24. 41). Segundo o que Lucas relata um pouco adiante neste primeiro capítulo de Atos, a ascensão ocorreu "no monte chamado Olival" (v. 12). Não era um "monte" como nós o entendemos hoje; tratava-se, isto sim, de uma colina a les.te da antiga Jerusalém, distando mais ou menos dois quilómetros do centro da cidade. Este monte é 40 m mais alto do que o "monte Siâo", o lugar onde estava .erigido o templo. Este centro da antiga Jerusalém fica a aproximadamente 773 m, o pico do "monte Olival" a apro- ximadamente 814 m acima do nível do mar. Um vale, ao fundo do qual corria o "ribeiro de Cedrom", separava este monte e a cidade antiga. Ao sopé do monte estava locali- zado o jardim de Getsêmani (Jo 18.1). Podemos harmonizar as duas referências que Lucas faz ao lugar em que se deu a ascensão de Jesus, nas duas partes de sua obra histórica, da seguinte maneira: Jesus atravessou o ribeiro de Cedrom (que também pode ser traduzido por "ribeirinho preto" — possivelmente devido à água que tomava uma coloração escura na época em que as chuvas eram escassas porque o ribeiro não tinha fonte natural e recebia o esgoto da cidade). Depois disto Jesus tomou o caminho a Betânia, ou seja, a estrada que levava de Jerusalém a Jericó. Betânia era uma pequena vila ao sopé do lado su- deste do "monte Olival". É possível que Jesus tenha passado por esta vila onde mo- ravam alguns de seus amigos mais íntimos, a saber: Lázaro, Maria e Marta, cuja casa era ponto de repouso na sua agitada vida e atividade; Simão, o leproso e outros mais (cf. Lc 10. 38; Jo 11. 1; e mais ainda Mt 26. 6 ss; Mc 14. 3 ss; Jo 12. 1 ss). Como passo seguinte ele dirigiu-se para aquele lugar onde queria despedir-se de seus discípulos e amigos, para doravante não mais estar com eles visivelmente senão que apenas invi- 26 ente Portanto, as duas localidades que Lucas indica não conflituam entre si. siveim ^ relata está em perferta harmonia: Jesus, via Betânia, foi ao monte Olival 0 Socorreu o grandioso e singular evento da ascensão de Jesus. O lugar da ascensão — convém não esquecer — corresponde ao lugar em que quando pela última vez veio da Galiléia para Jerusalém, parou e, "vendo a ci- dade chorou, e dizia: Ah! se conheceras por ti mesma ainda hoje o que é preciso nara conseguir a paz! Mas isto agora está oculto aos teus olhos..." (Lc 19 41.42). — Era precisamente o mesmo lugar em que, mais ou menos 50 dias antes, iniciara a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém sob o cântico jubiloso: "Bendito é o Rei que vem em nome do Senhor..." (Mt 21. 1-11 e paralelas), entrada esta que, aliás, terminaria no grito: "Crucifica-o! Crucifica-o!" Agora este Senhor se despede dos seus à vista deles, visivelmente. Doravante ele estaria com eles, e em toda parte onde seria pregada a sua mensagem, de modo invisível; sua presença, entretanto, seria absolutamente real. E isto "todos os dias até a consumação dos séculos". "... e uma nuvem o encobriu dos seus olhos" — Impressionante é o papel das nuvens na história da salvação de Deus! Nesta história, por diversas vezes, Deus colocou-as como símbolo de sua presença. Isto já ocorre por ocasião da primeira aliança que Deus fez com a humanidade, a aliança com Noé: "Disse Deus: Este é o sinal da minha aliança que faço entre mim e vós, e entre todos os seres viventes que estão convosco, para perpétuas gerações. Porei nas nuvens o meu arco; será por sinal da aliança entre mim e a terra..." (Gn 9. 12 ss). Toda vez que, ainda hoje, o arco- iris aparece nas nuvens, faz-se ver a presença de Deus: "O arco estará nas nuvens; vê-lo-ei e me lembrarei da aliança eterna entre Deus e todos os seres viventes de toda carne que há sobre a terra". Na peregrinação do povo de Israel, escolhido por Deus dentre todos os demais para que fosse seu povo, Deus, através do deserto, demonstrou sua presença numa nuvem: "O Senhor ia adiante deles, durante o dia numa coluna de nuvem, para os guiar pelo caminho, durante a noite numa coluna de fogo, para os alumiar, a fim de que caminhassem de dia e de noite. Nunca se apartou do povo a coluna de nuvem durante o dia, nem a coluna de fogo durante a noite." (Êxodo 13. 21,22). Também no Novo Testamento a nuvem é símbolo da presença graciosa de Deus. Exemplo disto temos no monte da transfiguração quando o Senhor transfigurado, ao lado de Moisés e Elias, falava com seus discípulos e "uma nuvem luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem, uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo: a ele ouvi" (Mt 17.5). Igualmente no dia derradeiro, o dia do retorno do Filho, a presença de Deus estará simbolizada numa nuvem. O próprio Cristo revelou isto a seus discípulos: "Então aparecerá no céu o sinal do Filho do homem; todos os povos da terra se lamentarâ'0 (no original está o verbo "kópsontai" que significa: bater no peito — segundo o costume oriental — em sinal de desespero por não mais poderem modificar sua situação diante do juízo iminente) e verão o Filho do homem vindo oore as nuvens do céu com poder e muita glória" (Mt 24. 30). Esta revelação quanto o seu retorno, ele a faz abertamente diante de seus adversários que o acusam e ndenam. Quando o sumo-sacerdote intimou-o: "Eu te conjuro pelo Deus vivo que tan3! s se tu és ° crist0' ° Filh0 de O^s", Jesus respondeu-lhe: "Eu o sou; entre- tod ° eu vos declar0 que d^de agora vereis o Filho do homem assentado à direita do mort os0' e vind0 sobre as nuvens do céu" (Mt 26. 63,64). De fato, depois da "a cruz, seus adversários não mais o viram na terra; contudo, indubitavelmente 27 vê-lo-ão retornando do seu trono divino para julgá-los. — As nuvens também simboli- zam a presença de Deus quando Paulo alude a elas, na primeira carta aos Tessalonicenses, ao explicar o retorno de Cristo e a situação da última geração de cristãos sobre a face da terra: "Porquanto o Senhor mesmo... descerá dos céus, e os mortos ressuscitarão primeiro; depois nós, os vivos, os que ficarmos, seremos arrebatados juntamente com eles, entre nuvens, para o encontro do Senhor nos ares, e assim estaremos para sempre com o Senhor" (1 Ts 4.16,17). "E, estando eles com os olhos fitos no céu, enquanto Jesus subia, eis que dois varões vestidos de branco se puseram ao lado deles..." — "Com os olhos fitos no céu — o verbo grego é "atenízo" e indica um olhar de espanto, um olhar fixo, demonstrando que quase não podiam acreditar no que estavam vendo. Nenhum deles por certo se deu conta de quanto tempo assim permaneceram com os olhos fixos no espaço que já não tinha mais nada a mostrar. E "eis!" — Discípulos de Cristo não estão na terra para ficar com os olhos fixos no espaço. O próprio Jesus faz com que voltem do êxtase à realidade. É verdade, não é ele pessoalmente, visivelmente, quem lhes aparece. São "dois varões vestidos de branco..." Os anjos, mensageiros de Deus aos homens, geralmente são descritos como tendo a forma de um "varão" ("anêr" é uma pessoa adulta do sexo masculino, em contra-posição a uma pessoa do sexo feminino ou uma criança). É evidente que esta palavra não se refere a uma eventual sexualidade dos anjos, que, como sabemos, não existe. Deus, para se manifestar aos homens, para falar com eles, para se comunicar diretamente com eles emprega uma forma visível. Tal qual a presença de Deus nas nuvens, fato que também impressiona é a presença de anjos no desenrolar dos grandes eventos sobrenaturais do Novo Testamento. Já no início do Novo Testamento, um anjo aparece a Zacarias anuncian- do que através de um milagre teria início a nova era (Lc 1. 11 ss). O mesmo anjo que se apresentou a Zacarias dizendo: "... eu sou Gabriel que assisto diante de Deus, e fui enviado..." (Lc 1.19), anunciou a Maria o glorioso evento da iminente vinda do Filho de Deus que dela nasceria, por intermédio do Espírito Santo (Lc 1.26 ss). Foi "um anjo do Senhor" quem, na noite de Natal, anunciou aos pastores nos campos de Belém o incompreensível porém verídico acontecimento: "... hoje vos nasceu na cidade de Davi, o Salvador, que é Cristo, o Senhor...'uma criança envolta em faixas e deitada em manjedoura..." (Lc 2. 11,12). Foi "um anjo do Senhor" quem deu inicio à operação salvamento do Salvador-criança da fúria diabólica de Herodes (Mt 2.13) e fez com que se cumprisse a, um tanto enigmática, profecia de Oséias 11.1: "do Egito chamei o meu Filho" (Mt 2. 15). — Anjos, sempre de novo anjos, estiveram à disposição do Filho de Deus e Salvador dos homens por ocasião das tentações do diabo lá no deserto, e por certo também nas muitas outras vezes em que foi tentado (Hb 4. 15 — "em todas as coisas"; notemos também Lc 4. 13! Mt 4. 11; Mc 1. 13). Ao final da terrível caminhada deste Ser sem pecado através da lama do pecado deste mundo, quando ele foi feito "pecado" por nós (2 Co 5. 21), anjos estiveram a seu lado para o "confortar" (Lc 22. 43). — Novamente anjos anunciaram aos discípulos — e por meio destes ao mundo — a incompreensível, porém garantida, verdade: "Ele não está aqui: ressucitou!" Portanto, "por que buscais entre os mortos ao que vive?" (Mt 28.1 ss); Mc 16. 1 ss; Lc 24. 1 ss). — É por este motivo que, segundo todo o desenvol- vimento da história da salvação, também aqui no evento da ascensão, o evento culminante, os anjos representam a Deus trazendo uma mensagem de ordem e instrução aos que foram escolhidos para levar a mensagem da salvação à 28 humanidade perdida. "... e lhes perguntaram: Varões galileus, por que estais olhando para as alturas? — "Varões galileus..." Notem bem a quem os anjos se dirigem! O céu não se enver- gonha em escolher homens do "hinteriand", homens desconhecidos, homens desprezados pelo mundo. Sim, porque, que credencial tinha alguém que procedia da Galiléia? Nenhuma! Não é verdade que até mesmo um "verdadeiro israelita", um tanto desconfiado, perguntou: "de Nazaré pode sair alguma cousa boa?!" Nazaré da Galiléia?! — O céu, entretanto, emprega esta expressão como título honroso: Varões galileus! — Cerca de 20 anos mais tarde, o apóstolo Paulo explica aos cristãos de Corinto a situação dos cristãos e das testemunhas de Jesus, quando escreve: "... não foram chamados muitos sábios segundo a carne, nem muitos poderosos, nem muitos de nobre nascimento; pelo contrário, Deus escolheu as cousas loucas do mundo, para envergonhar os sábios, e escolheu as cousas fracas do mundo para envergonhar os fortes; e Deus escolheu as cousas humildes do mundo, e as despre- zadas, e aquelas que não são, para reduzir a nada as que são; a fim de que ninguém se vanglorie na presença de Deus" (1 Co 1. 26-29). — "Varões galileus!" — titulo hon- roso para os seguidores de Jesus. Estes foram escolhidos, pela sabedoria de Deus, para serem vitoriosos sobre o mundo, para demonstrar que o reino de Deus não depende dos poderosos — de um Herodes, Tibério, Pilatos, de um sumo sacerdote; que o reino de Deus não depende dos sábios — de um Nicodemos, de um Gamaliel, de um Fito; que o reino de Deus depende única e exclusivamente da mensagem daqueles "varões galileus". Notem bem! — não dos homens em si, dos varões, mas sim, da mensagem que estes "varões" levariam ao mundo. — Por isso, o doutor Saulo de Tarso, doutor em duas Faculdades, um dos verdadeiros sábios daquela épo- ca, identifica-se com estes "varões", declara que é um deles e testifica: "Não me en- vergonho do Evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê..." (Rm 1. 16). "... varões galiteus, por que estais olhando para as alturas?" — Há trabalho por fazer! Há uma tarefa a realizar! Sonhadores não estão em condições de realizar a ta- refa que o Mestre planejou. Mãos à obra! De nada adianta ficar aí sonhando! De nada adianta entregar-se à nostalgia, pois "... esse Jesus" — esse vosso Mestre, que vos garantiu sua autoridade, que vos assegurou sua onipotente presença e, a base disto, incumbiu-vos da grandiosa tarefa de discipular as nações da terra, esse Jesus ordena que marchais. Por quê? Porque "esse Jesus... assim virá do modo como o vistes subir". Não consegui- mos imaginar este "assim"! Quer dizer, então, que o homem Jesus, que foi assunto ao céu, que está sentado à direita do Pai, vai retornar? — Exatamente! O Cordeiro divino, morto pelo pecador, virá outra vez, do mesmo modo, "assim" visivelmente. Contudo, não mais virá como Cordeiro e sim como Senhor dos senhores. — Sim, esse Jesus que "a si mesmo se humilhou, tornando-se obediente até à morte, e morte de cruz" virá! "Esse Jesus", a quem Deus, por causa disto tudo, "exaltou sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de todo o nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra, e debaixo da terra, e toda língua con- fesse que Jesus é o Senhor, para a glória de Deus Pai" (Fp 2. 8-11). — Sim, esse Je- sus assim virá! — Amém, meu Senhor! Amém! 29 6 - O RETORNO DO MONTE — OS APÓSTOLOS (Atos 1. 12,13) 12 • Então voltaram para Jerusalém, do monte chamado Olival, que dista daquela cidade tanto como a jornada de um sábado. 13 - Quando ali entraram, subiram para o cenáculo onde se reuniam Pedro, João, Tiago e André; Filipe, Tomé, Bartolomeu e Mateus; Tiago, filho de Alfeu, Simão o Ze- lote, e Judas, filho de Tiago. 6-1. O Retomo do Monte "Então voltaram para Jerusalém..." — Que retorno! Eles tinham ido para o mon- te em companhia de seu Mestre, o "Logos" eterno, o "Verbo" que "era no princípio" e que "estava com Deus" ("antes de todos os mundos"), e que "era Deus", segundo João. Tinham ido até lá acompanhados daquele a respeito de quem haviam confessado, por boca de Pedro: "Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo!'' Sim, tinham ido em sua presença, mas retornaram sem ele. Será mesmo: sem ele? — Ele fora le- vado aos céus, visivelmente. Eles viram-no desaparecer, encoberto por uma nuvem. Sim, retornaram sem sua presença visível; sua presença divina, contudo, estava com eles. tornou-se realidade incontestável aquilo que o Filho eterno do eterno Deus lhes havia prometido por ocasião de sua despedida visível: "Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos!" — Retornaram com o propósito de iniciar a segunda etapa de sua gloriosa peregrinação através do mundo — gloriosa por causa desta companhia —, apesar de todos os obstáculos. "... para Jerusalém" — Imediatamente após a páscoa ainda havia a possibilida- de de os discípulos se dispersarem. Foram para a Galiléia, para suas moradias, — sabe-se lá para onde —. Eu realmente gostaria de saber onde estava Tomé — em que atividade estava envolvido — na noite daquele "primeiro dia da semana" (Lc 24. 1,13), "ao cair da tarde daquele dia, o primeiro da semana", quando ele, "um dos doze—, não estava com eles quando veio Jesus" (Jo 20. 19,14). — Tomé, onde estiveste? — Agora, ao retornarem daquele monte, não mais desejavam afastar-se do convívio, da comunhão dos que pertenciam a Jesus. Voltaram "para Jerusalém" cientes e cons- cientes da recomendação de seu Mestre a que "não se ausentassem de Jerusalém, mas esperassem a promessa do Pai" (At 1. 4). A nova aliança passaria a entrar em exercício e vigor na cidade de Jerusalém, se- de da antiga aliança. Enquanto que do Monte Sinai, o monte da antiga aliança, até o ingresso na terra da promissão foram necessários 40 anos de peregrinação, a caminhada do Monte Olival, o monte da nova aliança, até Jerusalém foi bem curta: "tanto como a jornada de um sábado". Esta caminhada foi, por assim dizer, a última que os discípulos fizeram estando ainda sob o regime da antiga aliança. Andaram o trajeto que as leis da antiga aliança, as leis reguladoras do sábado, permitiam: a jor- nada de um sábado. No sábado ninguém podia caminhar além do limite estabelecido, o que em nossas medidas corresponde a exatamente 980 metros. A nova aliança exi- giria que seus apóstolos percorressem muitas jornadas de sábado. — Ah! ainda hoje os embaixadores de Jesus estão caminhando, perfazendo trajetos que equivalem a muitas jornadas de sábado, em cumprimento à ordem de seu Mestre: Ide! "Quando ali entraram..." — Será que ainda estavam lembrados daquele dia me- morável, uma semana antes da páscoa dos judeus, quando eles — junto com seu 30 Mestre — entraram em Jerusalém por aquele mesmo caminho? Será que ainda se lembravam de como haviam liderado o povo no cântico de salmos, na demonstração de que aquele homem de Nazaré, montado num jumentinho às portas de Jerusalém, era de fato o Messias prometido, ao cantarem a respeito dele: "Hosana ao Filho de Davi! Bendito o que vem em nome do Senhor! Hosana nas maiores alturas!" (Mt 21. 9)? — Será que ainda se lembravam? — Desta vez certamente não houve cânticos; nin- guém notou algo de especial. Todavia, eles voltaram para aquela cidade e aquele lu- gar onde entraria em vigor — como de fato entrou — a nova aliança. "... subiram para o cenáculo..." — O artigo definido que antecede a "cenácu- lo" deixa claro que se tratava de um lugar bem conhecido, um lugar definido. E de supor que se tratava daquele "espaçoso cenáculo" (Mc 14. 15,16) que, segundo-a pre- visão de Jesus, no dia em que enviou seus discípulos ao centro de Jerusalém para que preparassem sua última ceia pascoal, seria oferecido aos discípulos por um anó- nimo "dono de casa". Se isto é assim, então este "cenáculo" é aquele lugar santifi- cado pela instituição da Santa Ceia(Mc 14. 22 ss.; Mt 26. 26-30; Lc 22. 19-23). Neste lugar, na noite do dia da páscoa, Jesus pela primeira vez se mostrou vivo a todos os discípulos (Lc 24. 36). É bem possível que este cenáculo tenha sido propriedade de Maria, mãe de Marcos, e que mais tarde também se transformou em lugar de reunião de pelo menos parte dos cristãos de Jerusalém. Atos 12. 12 nos relata que Pedro, sendo milagrosamente libertado da prisão (no ano 44 d. C.), "resolveu ir à casa de Maria, mãe de João, cognominado Marcos, onde muitas pessoas estavam congrega- das e oravam". "onde se reuniam..." — A partir da palavra empregada no original, podemos concluir que não somente desta vez se reuniram ali, mas que este "cenáculo" era pal- co de reuniões regulares, diárias, reuniões que, aliás, se realizavam sob a promessa do Mestre: "Onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles (Mt 18. 20). O particípio empregado nesta passagem ("kataménontes") nos dá o ensejo de identificar este cenáculo com a "casa de Maria" (At 12), que mais ou menos 14 anos depois ainda serviu a Pedro como ponto de referência em seu cami- nhar noturno, algo sonambular, em busca dos irmãos. 6-2. Os Apóstolos A enumeração dos onze apóstolos, nesta passagem, nos oferece ocasião de uma vez falarmos a respeito de cada um deles individualmente. Sem dúvida, chama atenção o quão pouco na verdade conhecemos da vida e obra da grande maioria dos homens que Jesus escolheu para serem seus embaixadores ao mundo. Excetuando os dois primeiros, Pedro e João, sobre os quais poderiam ser escritos livros inteiros (como de fato o foram), a vida de todos eles, o cumprimento da missão e sua morte permanecem numa penumbra de história, lendas e tradições patrísticas. Por este motivo, adiando o estudo de Pedro e João para uma ocasião posterior e para referências mais extensas, apresentamos aqui o que nos é conhecido dos nove restantes, a base de diferentes fontes: "Tiago" — Este primeiro Tiago certamente era o "irmão de João", um dos "filhos de Zebedeu". Como sabemos, fazia parte do círculo íntimo dos discípulos do Mestre, juntamente com seu irmão João e Pedro. Como tal, teve o privilégio de presenciar pessoalmente a ressurreição da filha de Jairo (Mc 5.37), a transfiguração (Mt 17. 1), e a luta final que Jesus travou com as forças tentadoras no Getsêmani (Mt 31 26. 36). — Depois do Pentecoste, segundo tudo indica, permaneceu em Jerusalém, na qualidade de missionário e apóstolo aos judeus, até o dia em que sofreu o martírio da parte de Agripa l, no ano 44 d. C. (Atos 12. 1,2). Tanto quanto sabemos, foi o pri- meiro mártir dentre os apóstolos. "André" — Irmão de Pedro, natural de Betsaida. Juntamente com João, fazia parte do círculo dos discípulos de João Batista quando recebeu o chamado de Jesus. Estes dois, João e André, são, portanto, os primeiros homens que se tornaram discípulos do Mestre. André foi igualmente o primeiro mensageiro da Boa-Nova, transmitindo-a a seu irmão Simâo (Pedro): "Achamos o Messias!", bem como o pri- meiro evangelista quando "o levou a Jesus" (Jo 1. 37-40). Posteriormente recebeu o chamado oficial para ser companheiro constante de Jesus quando este, estando An- dré junto ao Mar da Galiléia no exercício de sua profissão, lhe deu a ordem e a promessa: "Vinde (ele e Pedro) após mim, e eu vos farei pescadores de homens" (Mc 1. 16,17 e Mt 4. 18,19) — Nos evangelhos, André desponta diversas vezes como um dos discípulos mais chegados a Jesus: Mc 13. 3 (junto com os três íntimos — Pedro, João e Tiago); na multiplicação dos pães ele foi um dos organizadores da multidão, bem como aquele que fez o levantamento dos recursos disponíveis, encontrando um rapaz que tinha cinco pães de cevada e dois peixinhos, o que fez com que perguntas- se, diante da absoluta insuficiência destes tão parcos recursos: "Mas isto que é para tanta gente?" (Jo 6.8,9) — Juntamente com Filipe de Betsaida serviu de intermediário entre alguns "gregos" (judeus que falavam a língua grega e possivelmente não enten- diam muito bem a língua aramaica) e Jesus, quando aqueles pediram a Filipe — que conhecia ambas as línguas, como quase todos os galileus —: "queremos ver a Je- sus" (Jo 12. 21,22). — Com a menção de seu nome nesta lista de Atos, André desa- parece dos relatos bíblicos' como, aliás, acontece com quase todos os demais após- tolos de Jesus. — A tradição relata que ele foi embaixador da mensagem de Cristo no interior da Ásia Menor (a atual Turquia) e na Grécia. Teria sido martirizado na pro- víncia da Acaia, dependurado numa cruz inclinada, advindo daí o símbolo da "Cruz de André": X. "Filipe" — Possivelmente era amigo de infância dos irmãos Simão Pedro e An- dré, todos eles naturais de Betsaida da Galiléia. "No dia imediato" ao chamado de Si- mão Pedro, quando Jesus estava por retornar à Galiléia, Filipe foi "encontrado" por Jesus que o chamou dizendo: "Segue-me!" É sem dúvida notável o que João relata em seu evangelho, a saber, que aparentemente no mesmo instante em que foi cha- mado tornou-se missionário e evangelista. Assim como ele próprio fora encontrado por Jesus, "Filipe encontrou Natanael e disse-lhe: 'Achamos aquele de quem Moisés es- creveu na lei, e a quem se referiram os profetas, Jesus, o Nazareno, filho de José" (Jo 1. 43.45). É quase inacreditável a rapidez com que Jesus convenceu este homem que, mui provavelmente, fazia parte daquele pequeno grupo de homens que não tinha perdido a verdadeira esperança no Messias espiritual, esperança cuja chama fora novamente ativada pelo testemunho do Batista. Igualmente é notável a maneira como argumentou contra as dúvidas de Natanael — "De Nazaré pode sair alguma cousa boa?" — empregando o único argumento possível e eficaz para convencer: "Vem, e vê!" — Só mesmo vindo, vendo e ouvindo é que Jesus pode entrar na vida de alguém e transformá-la — e isto desde aquele primeiro convite até o dia em que o úl- timo ser humano for convertido. É interessante também que os evangelhos sinóticos não se referem a Filipe a não ser nas três ocasiões em que apresentam a nominata dos apóstolos (Mt 10.3; Mc 3.18; Lc 6.14). João, entretanto, como se fosse uma feliz 32 retrospectiva, refere-se a ele diversas vezes em seu evangelho. Temos, por exemplo, aquela ocasião já mencionada, a multiplicação dos pães, em que os dois amigos ín- timos, André e Filipe, agiram em conjunto: Jo 6. 1ss. — É sobremaneira interessante e instrutivo aquele diálogo tão humano e — por que não? — atual que houve entre Jesus e Filipe. Jesus, "vendo que grande multidão vinha ter com ele, disse a Filipe: Onde compraremos pães para lhes dar a comer?" — Pergunta esquisita, não é?! João nos ajuda a compreendê-la, quando explica: Jesus "bem sabia o que estava para fazer", porém "dizia isto para o experimentar". — Será que nosso Senhor às vezes não nos coloca diante de problemas da fé com o propósito de nos "experimentar"?? — Filipe parece ter sido uma espécie de elemento de ligação entre os discípulos de Jesus e aqueles que não faziam parte deste círculo eleito. É isto que parece estar indicando aquele episódio — já referido — em que judeus helenistas buscam a Jesus. Estes judeus, vindos da dispersão helénica, haviam chegado a Jerusalém — a exemplo de Jesus e seus discípulos — para celebrar a Páscoa. Mui provavelmente assistiram à entrada triunfal de Jesus e ouviram o que se dizia a respeito dele entre os que participavam do cortejo. A curiosidade destes gregos era tanta que queriam — se possível — falar pessoalmente com Jesus. Filipe comunicou o pedido destes curiosos a André, e ambos o apresentaram a Jesus. Este fato propiciou a Jesus a oportunidade de falar e até mesmo dialogar com a multidão sobre o sentido da obra do Cristo prometido e sobre a hora de sua despedida, bem como sobre o que isto significava para o próprio Cristo e para o mundo. É deveras interessante a reação de Jesus ao pedido dos gregos, como também é importante seu pronunciamento, rela- tado por João em Jo 12. 20 ss. As palavras que Jesus dirigiu à multidão foram tão importantes para o evangelista que ele simplesmente "deu chá de sumiço" nos gregos; ele não relata o que aconteceu a eles. — Graças a uma pequena intervenção de Filipe temos, nestas palavras de Jesus, uma das mais profundas passagens sobre a essência e importância universal do ofício mesiânico de Jesus. — Uma outra oca- sião em que o evangelista João menciona Filipe é aquela em que tem lugar um dos poucos diálogos individuais entre Jesus e um dos seus discípulos, relatados nos evangelhos. Aconteceu durante a época em que o Mestre estava preparando os discí- pulos mais intensivamente, um pouco antes de sua paixão e morte. Pedro recebeu o aviso de que seria precisamente ele, ele que julgava ter maiores condições de resis- tência do que todos os demais, quem negaria seu Mestre "três vezes" (Jo 13. 26-28) Esse preanuncio evidentemente perturbou completamente os pensamentos dos discí- pulos, suas esperanças intimas, sim, toda sua visão do reino de Deus. Reage Tomé (Jo 14.5). Reage também Filipe. Ele ouvira as palavras absolutamente categóricas do Mestre: "... ninguém vem ao Pai senão por mim". Se este é o caso, raciocinou Filipe, então não é tão difícil assim: Conhecemos Jesus! Quem não conhecemos, é o Pai. E evidente que queremos estar unidos com Jesus e com o Pai. Mas, não conhecemos o Pai. Portanto: "Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta!" — Ah! Filipe, que inge- nuidade! Quão pequeno teu entendimento de tudo o que o Mestre ensinou até agora! — "Disse-lhe Jesus: Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me tens conheci- do? Quem me vê a mim, vê o Pai. Como — (Ah! Filipe, como?!) — dizes tu: Mostra- nos o Pai?" — Quando eventualmente nos encontrarmos lá "no fundo do poço" das dúvidas que nossa razão cavou, convém que leiamos as palavras que o Mestre, em sua divina paciência, dirigiu ao seu querido Filipe e a nós, e que estão relatadas por João em Jo 14. 1-15. Penso que Filipe, e o que dele nos relata o 'evangelho de João, merece ser lem- 33 brado, apesar de não conhecermos muito mais a respeito de sua vida depois desta reunião antes do Pentecoste. — Relata a tradição antiga que Filipe levou a mensa- gem do Salvador à região um tanto bárbara da Frigia, onde, na cidade de Hierápolis (que ironia: o nome quer dizer, "cidade santa"!) teria sofrido o martírio. Se isto teve lugar antes de Epafras — ao estar com Paulo em Roma por ocasião da escrita da car- ta aos Colossenses — se mostrar preocupado pêlos cristãos de Hierápolis (Cl 4. 12,13), não o sabemos. — Basta-nos o pouco que sabemos a respeito de Filipe, o nosso irmão! "Tomé" — "chamado Didimo". Não sabemos exatamente porque João, nas três passagens em que fala de Tomé, acrescenta "chamado Didimo". Trata-se, natural- mente, apenas da tradução do nome aramaico para o grego. Tanto Tomé quanto Didimo significam "gémeo". O nome aramaico (Tomé) lhe foi dado por ocasião da cir- cuncisão; talvez seu irmão gémeo tenha falecido antes disto, e o nome então lhe foi dado justamente para lembrar o irmão. Também é possível que, entre os leitores do evangelho de João, Tomé fosse mais conhecido por seu nome grego. — É novamente João quem nos relata aspectos da vida deste discípulo que não são mencionados pêlos demais evangelistas. Tome entrou para a história como o "célico" dentre os dis- cípulos; eu nome veio a significar alguém que tem e expressa dúvida. Será que não podemos compreender este ceticismo a base da situação em que Tomé e os outros discípulos se encontravam? — Vejamos. Lázaro, o amigo de Jesus, faleceu sem que Jesus fosse curá-lo, apesar do insistente chamado de suas irmãs. Estando ele "além do Jordão", para onde se tinha retirado por precaução, para que os judeus não o apanhassem "antes de sua hora", veio-lhe esta infausta notícia. Diante disto Jesus anunciou aos discípulos; "Vamos outra vez a Judéia", sem que seus seguidores — que sabiam perfeitamente os perigos que o aguardavam na Judéia — tivessem oportunidade de opinar. Eles ainda tentaram convencer Jesus de que esta certamente não seria uma hora propícia: "Mestre, ainda agora os judeus procuravam apedrejar-te! — E para lá agora queres voltar?" — Não faças isto!! Posso imaginar a perplexidade de todos diante desta atitude de seu Mestre. E certamente não foi o ceticismo, não foram as dúvidas que levaram Tomé à iniciativa. Como bom soldado que não quer permitir que seu capitão vá sozinho ao campo de batalha, ele disse "aos condiscípulos: Vamos Também nós para morrermos com ele!" (Leia-se Jo 10.40 - 11.16!) — Não! não pretendo defender um "cético". Quero, isto sim, colocar sua atitude, suas palavras e seus atos dentro do seu devido contexto. — Teria eu agido diferentemente? — Pois até acho que foi imbuído deste espírito de bom soldado que ele agiu e falou, acertadamente (naturalmente, segundo seu limita- do modo de entender), quando perguntou, na ocasião em que Jesus falava de um ir e voltar, bem como do caminho para este ir e voltar: "Senhor, não sabemos para onde vais; como saber o caminho?" (Jo 14. 5) — queremos acompanhar-te seja aonde for. — Não acham também que isto, antes de ser ceticismo, é fidelidade? E aquela outra história esquisita — e apesar de tudo tão natural, tão humana! — sim, aquela outra história, será que esta não caracteriza Tomé definitiva e eterna- mente como o grande cético? Convém que pensemos e nos coloquemos na situação de Tome, antes de proferirmos a sentença final a seu respeito: O evangelista João nos relata o seguinte: "Ao cair da tarde daquele dia (o dia da Páscoa), o primeiro da semana, veio Jesus, pôs-se no meio, e disse-lhes: Paz seja convosco! — Ora, Tomé... não estava com eles." (Jo 21.19-24) — Onde estava Tomé? Esta pergunta me preocupa há muito tempo. Em todo caso, ele não estava lá, atrás 34 de portas fechadas — como os outros. Mas, onde estava então? — Procurava traba- lho? "É inútil esperar e ficar sem fazer nada!" — será que era assim que ele raciocinava? — Tomé não estava com seus companheiros, seus co-participantes no reino e na tribulação. Penso que este foi seu erro fundamental: ele se tinha afastado da comunhão dos irmãos, procurava caminhos solitários. Em decorrência deste seu erro, perdeu o primeiro encontro com o Ressuscitado. — Sim, este é o perigo que um cristão corre quando se afasta da comunhão dos seus condiscípulos e anda cami- nhos próprios. Nesta situação pode-se facilmente perder um encontro decisivo com o Senhor! — Isto é o que em primeiro lugar nos ensina este erro de Tomé. — O que se segue, sua incredulidade, seu ceticismo, é nada mais nada menos do que consequên- cia direta deste seu afastamento da comunhão. Quer me parecer que o autor da epístola aos Hebreus teve em mente tais episódios quando admoesta seus leitores: "Não abandonemos a nossa própria congregação, como é costume de alguns; antes, façamos admoestações, e tanto mais quanto vedes que o dia se aproxima" (Hb 10.25) É verdade, a razão de Tomé levou-o a duvidar: "Se eu não vir nas suas mãos o si- nal dos cravos, e ali não puser o meu dedo, e não puser a minha mão no seu lado, de modo algum acreditarei" (Jo 20. 25 ss.). Isto, contudo, também foi consequência da tentativa de percorrer seus próprios caminhos. Ah! se Tomé não tivesse demonstrado o que não devemos fazer, certamente nos faltaria aquela prova da absoluta miseri- córdia do nosso Senhor. É verdade, Jesus o repreende; ele o adverte. Todavia, as pa- lavras que Jesus lhe dirige, não são elas o eco de um coração transbordante de amor e misericórdia para com um pobre desgarrado que se afastou da comunhão dos santos por um dia? Eis o que Jesus lhe diz: Pobre Tomé! "Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; chega também a tua mão e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente!" E eis o brado de alguém que retornou ao lar, o brado de alegria, o brado de absoluta confiança: "Senhor meu e Deus meu!" — Tomé errou, foi chamado, voltou... e foi se incorporar no exército de seu Senhor. — A última ocasião em que o evangelista João menciona seu nome é a passagem de Jo 21. 2 que nos apresenta Tomé em companhia dos discípulos, na Galiléia. Sobre sua atividade como apóstolo enviado ao mundo existem várias tradições e não se sabe ao certo quais delas têm fundamento histórico. Uma destas tradições apresenta-o como o evangelista dos habitantes da Partia, região a sudeste do Mar Cáspio, que mui cedo foi cristianizada e que teve na cidade de Edessa seu grande centro teológico. Segundo esta tradição, Tomé teria sido sepultado nesta cidade. Não se sabe se ele foi martirizado ou não. — A outra tradição refere-se a Tomé como o apóstolo das Índias Orientais. Ainda hoje existe naquela região uma espécie de igreja primitiva, com ritos mui antigos — a assim denominada Igreja Mar Toma — e que tem algumas dezenas de milhares de adeptos. Muitos consideram-na fruto da ati- vidade missionária do apóstolo Tomé. — Penso que as duas linhas da tradição antiga podem ser unidas e têm elementos de realidade histórica, visto que na antiguidade havia considerável intercâmbio entre Partia, Pérsia e Índia. — Se isto é assim, então o "cético" Tomé levou a mensagem de Cristo aos mais longínquos pontos do mundo conhecido de então! Assim são os caminhos de Deus! "Bartolomeu" — É o patronímico de Natanael (Jo 1. 46; 21.2), uma vez que signi- fica "filho de Tolmeu". É possível que seu pai tenha sido um homem público, ou, de certo destaque, motivo pelo qual ele era mais conhecido a partir do nome do pai. Isso também faz com que seu nome próprio (Natanael) não conste nas listas dos apósto- los. 35 Natanael, que quer dizer "dádiva de Deus", ingressou no círculo dos primeiros discípulos do Mestre de uma maneira notável. Eu o classificaria como "o primeiro racionalista convertido". Basta que leiamos como o evangelista João descreve o en- contro que Jesus teve com este homem: Jo 1. 45-51. Neste relato deparamo-nos com Filipe de Betsaida, discípulo recém-chamado que de imediato se tornou missionário. — Já nos referimos a estes "encontros": Jesus encontrou a Filipe! — É exatamente isto: o encontro entre Cristo e os homens sempre parte do alto. É Cristo quem encontra; os homens são por ele encontrados. — O reverso não existe: ninguém en- contra seu Salvador por si só. Esta seria uma procura totalmente fútil. O ato de procurar parte de cima: quando Cristo nos encontra, somos salvos; quando Cristo nos encontra, então nós encontramos a ele. E então inverte-se a situação: O procurado e achado passa a procurar! Homens que foram encontrados por Jesus, saem mundo afora procurando homens que andam e procuram algo que nunca acharão, para os levarem a Cristo, aquele que satisfaz todos os anseios humanos. — Eis o que João relata: "Filipe encontrou a Natanael e disse-lhe: Achamos aquele de quem Moisés escreveu na lei, e a quem se referiram os profetas". Até aqui tudo bem! Natanael era integrante daquele grupo — pequeno, aliás — "que esperava a consolação de Israel" (Lc 1. 25). Por isso, a exemplo de Simeâo, ele não se espanta diante do fato de Deus finalmente ter cumprido o que prometera. — No entanto, a partir de agora entra em cena a pobre razão deste Israelita, perturbando-o profundamente. Acho que eu teria caído na mesma cilada de Natanael. — No momento em que o bom Filipe menciona donde viera "a consolação de Israel", quando ele fala em "Nazaré", daquela vila na "Galiléia dos gentios" (Mt 4. 15), levanta-se a razão do piedoso filho de Israel e protesta: Não! Impossível! — De Nazaré não! Pois, "de Nazaré pode sair alguma coisa boa?" É claro que não! — Pos- so imaginar este encontro. Lá está o "filho de Tolmeu" batendo no ombro do amigo Filipe: "Desculpe, Filipe; não me leve a mal, mas isso é demais! De Nazaré? Nunca!" — Admiro profundamente a paciência de meu irmão Filipe. Apesar de sua absoluta convicção, ele não se exalta diante da teimosia de seu amigo Natanael. Calmamen- te ele lhe propõe: "Vem, e vê!" — Que convicção transparece destas três palavras! Filipe não tem dúvidas. Ele, por assim dizer, está com a prova na mão. Natanael pre- cisa apenas fazer uma pequena caminhada para ser convencido. — E Natanael não é cabeçudo. Ele se deixa guiar. Aproxima-se de Jesus. Ocorre, então, um dos mais impressionantes diálogos relatados no Novo Testamento: o diálogo entre Jesus e o, um tanto taciturno, Natanael. Vou apenas repetir o que João relata: "Jesus viu Natanael aproximando-se e disse a seu respeito: Eis um verdadeiro israelita em quem não há dolo! (homem íntegro, de um só modo de pensar, o que, aliás, se demonstrou em sua franqueza ao falar de Nazaré e ao expressar suas dúvidas quanto a qualquer um que de lá procedesse). Perguntou-lhe Natanael: Donde me conheces? Responde- lhe Jesus: Antes de Filipe te chamar, eu te vi, quando estavas debaixo da figueira". — Posso imaginar o impacto que estas palavras de Jesus causaram neste homem tão autêntico. Tal como fora autêntico em seu pensamento de israelita e franco na expressão de suas dúvidas, assim também agora ele se abre. Diante dele está algo so- brenatural, algo que no fundo de sua alma sempre tinha desejado: que Deus de fato cumprisse suas promessas feitas desde a antiguidade. Vencida sua razão, dissipadas suas dúvidas, ele abre seu coração, e com a mesma franqueza e clareza confessa: "Mestre, tu és o Filho de Deus, tu és Rei de Israel!" — Este seria apenas o início das revelações para este "israelita" feito discípulo de Jesus, pois, como 36 Jesus lhe afirma: "Maiores cousas do que estas verás!" — E Natanael efetivamente viu. Por isso ele ainda está com os discípulos de Jesus nesta reunião antes do Pente- coste. — De sua vida e atividade posteriores temos apenas escassas notícias, mesmo entre as tradições antigas. Diz-se que Bartolomeu é venerado pela igreja cristã da Ar- ménia, uma igreja que floresceu grandemente durante os primeiros séculos depois de Cristo e que relativamente cedo teve o Novo Testamento na língua do povo. — Hoje esta igreja está praticamente extinta na Arménia propriamente dita devido às aniqui- ladoras perseguições por parte da Turquia islamita, no inicio deste século, e~do co- munismo russo, alguns decénios depois. Porém, a igreja de Bartolomeu ainda sub- siste na Dispersão, tanto nas Américas como em vários países da Europa Ocidental, e também em alguns pontos do Oriente Próximo. — "Mateus" — Dentre os doze, Mateus, ao lado de João, foi incumbido de trans- mitir a mensagem de Cristo, não apenas através da pregação oral — incumbência que se estendia a todos os apóstolos — mas também por escrito. Mateus veio a ser o autor do primeiro dos quatro evangelhos. — Neste seu Evangelho ele mesmo nos relata o chamado que recebeu da parte de seu Mestre. A Natanael Jesus podia denominar de "verdadeiro israelita"; Mateus, entretanto, era exatamente o inverso disto, ao menos na opinião de seus conterrâneos. Mateus era um daqueles que os fariseus sempre colocavam no mesmo nível das meretrizes e dos pagãos, isto é, pessoas totalmente profanas. Ter contato pessoal com este tipo de gente poluía o caráter e a pessoa de um "filho de Israel", tornando necessária uma purificação cerimonial posterior. Sim, Mateus era publicano, oficial de alfândega, a serviço dos romanos que dominavam a terra judaica. O próprio fato de se ter colocado a serviço destes odiosos dominadores já o tornava um indivíduo ré- probo; a isto se acrescia ainda a facilidade com que estes funcionários defraudavam os cofres públicos e espoliavam os cidadãos no levantamento dos impostos alfandegários. — Sim, um indivíduo desta espécie era Mateus. O próprio Mateus fala de seu chamamento em termos bastante singelos e resume-o numa única frase: "Par- tindo Jesus dali (de Cafarnaum), viu (na saída da cidadezinha) um homem, chamado Mateus, sentado na coletoria, e disse-lhe: Segue-me! Ele se levantou e o seguiu" (Mt 9.9). E quando no seu evangelho apresenta a nominata dos doze (Mt 10.3), ele não se en- vergonha de acrescentar ao seu nome o tão desprezado titulo, "o publicano". — O que Mateus não nos relata, mas sabemos através de Marcos e Lucas, é que seu segundo nome era "Levi" e que, de acordo com Marcos, era "filho de Alfeu" (Mc 2.14; Lc 5.27). Aliás, é notável o fato de os três evangelistas sinóticos relatarem que logo após o chamamento de Mateus/Levi houve um banquete oferecido a Jesus. Este, segundo Marcos e Lucas, lhe foi oferecido pelo recém-chamado discípulo Levi/Ma- teus. Mateus evita indicar que ele na verdade foi o anfitrião. Este banquete suscitou críticas dos fariseus contra Jesus: "Por que come ele com os publicanos e pecado- res?" Esta crítica fez com que Jesus mais uma vez afirmasse que "os sãos (aqueles que, segundo seu próprio diagnóstico farisaico, são espiritualmente íntegros) não precisam de médico (espiritual, de um Salvador), e, sim, os doentes (aqueles que sentem-se condenados à morte por seus pecados); não vim chamar justos (aqueles que a si mesmo se declaram justos), e sim, pecadores" (aqueles que reconhecem-se como tais, a exemplo do publicano da parábola, e que, como ele, apenas suplicam: Ó Deus, sê propício a mim, pecador! - Lc 18.13 Mt 9. 10-12; Mc 2.15-17; Lc 5. 29-32. Na lista dos apóstolos que esperavam a vinda do Espírito Santo não aparece o 37 nome "LevI", o que Indica que o nome "Mateus" — que tem o mesmo significado de "Teodoro": "dádiva de Deus" — mui provavelmente era de conhecimento e aceitação oeral. Acerca de sua vida posterior, tenho por verdadeiros os seguintes dados que se baseiam em afirmações de Papias, Irineu e Origines, e que são relatadas por Eusébio em sua História Eclesiástica (340 d. C.): Mateus, que primeiramente pregou aos he- breus (judeus) da Palestina — não sabemos onde —, quando quis levar a mensagem de Cristo ainda a outros povos (não sabemos quais), escreveu um evangelho em sua língua materna (aramaica), porque com isto pretendia dar a seus ouvintes um substi- tuto para a pregação pessoal e verbal, da qual ficariam privados com sua saída." — Entretanto, não sabemos quando e onde teria escrito o evangelho que hoje temos e que leva o seu nome. É bem possível, contudo, que o nosso evangelho segundo Mateus seja idêntico, em seu conteúdo, àquele primeiro escrito em aramaico e que se perdeu, mas que, em sua forma grega, foi designado por Deus para ser instrumento de sua revelação ao mundo. — Este evangelho escrito é, sem dúvida o maior legado que um publicano desprezado — Levi/Mateus — deixou para a igreja de todos os tempos. Sim, ele era um publicano desprezado, mas, pela graça do Senhor, veio a ser seu apóstolo e porta-voz desta graça a todos os pecadores de todas as classes, raças e nações. "Tiago, filho de Alfeu" — Para distingui-lo do outro Tiago, seu nome sempre vem acompanhado do aposto "filho de Alfeu": Mt 10.3; Mc 3.18; Lc 6.15. Pergunta-se, na- turalmente, se o pai deste discípulo e o pai de Levi/Mateus são uma e a mesma pes- soa. Este parece não ser o caso, pelas seguintes razões: Entre as mulheres que, no dia da crucificação de Jesus, estavam "observando de longe", segundo Mc 15. 40, e "junto à cruz", segundo Jo 19. 25, vem mencionado o nome de "Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José" (Mc 15.40), identificada por João como "mulher de Clopas" (Jo 19.25). De modo geral aceita-se que "Tiago, filho de Alfeu", mencionado em nossa lis- ta dos apóstolos, é idêntico a "Tiago, o menor" de Mc 15.40; igualmente identifica-se Alfeu, o pai, com Clopas, pois os dois nomes são apenas duas maneiras diferentes de, em grego, expressar o mesmo nome hebraico. — Tais considerações colocam a família deste Tiago, especialmente também sua mãe, em ligação íntima com os pri- meiros seguidores de Jesus. Detalhes do chamamento deste Tiago nos são desconhecidos. Se o primeiro a seguir Jesus foi ele, ou, então, sua mãe — evidentamente por causa de sua relação de amizade com Maria, mãe de Jesus — não o sabemos. — Este Tiago é um dos apóstolos a respeito de cuja atividade pós-Pentecoste nada se sabe. Ele é um dentre os muitos servos de Jesus cujo nome desaparece aqui na terra, mas que certamente não foi riscado da relação daqueles que estão inscritos no Livro dos Eleitos de Deus- "Simão, o Zelote" — Este é o único dentre os apóstolos de Jesus que, antes de se tornar discípulo, sem dúvida alguma pertencia a um partido político judaico. Para distingui-lo do primeiro Simâo, a quem o Senhor cognominou de Pedro, ele ficou com o nome político, apesar de certamente não mais estar envolvido em atividades políti- cas. Os "Zelotes", isto é, "Zelosos" — talvez "Fanáticos" — constituíam um partido nacionalista que tinha por objetivo, sob o aspecto negativo, condenar como total blasfémia a submissão dos judeus ao imperador pagão, o imperador romano, e, sob o aspecto positivo, o reerguimento do reino político dos judeus, mesmo que fosse atra- vés de uma revolução sangrenta. — Até que ponto Simão tomou parte ativa nisto, antes de se tornar seguidor de Jesus, não nos é possível saber. Este apelido que lhe 38 foi dado certamente não tinha nada de pejorativo. Ao contrário, este'Simão nos mostra que a procedência dos seguidores de Jesus não esgota com uma determinada classe de pessoas: enquanto Natanael fazia parte do grupo dos "pietistas", dos "justos" dentre os judeus, e Mateus era um dos desprezados "publicanos", este Simão se preocupava antes com a situação política de seu povo. — Penso que não é licito deduzir-se do chamado deste Simâo que os cristãos devem necessariamente ser "homens políticos", homens que se preocupam também pelo bem-estar político de seu povo. Enquanto vive aqui na terra, o cristão certamente deve cumprir seus deveres cívicos e políticos; no entanto, nunca deve esquecer-se que ele é apenas peregrino nesta terra, estando sua verdadeira pátria no céu, e que, apesar de peregrinar neste mundo, não é cidadão dele no sentido espiritual. — Simão, "o Zelote", depois de ter sido chamado por Jesus, tornou-se um "Zelote", um zeloso por Cristo. Acerca de sua atividade apostólica depois do Pentecoste, carecemos de infor- mações mais precisas. Algumas tradições nos relatam que ele foi ao Egito e norte da África, donde teria sido levado às Ilhas Britânicas, recém-conquistadas pêlos roma- nos, sofrendo ali o martírio na cruz. — Uma outra corrente de tradições fala de sua atividade evangelistica na Pérsia e Babilónia. Ali, na região de Sunir, teria sido morto pêlos inimigos da mensagem da cruz. — O mais importante para um servo de Cristo não é o lugar, e sim o fato da atividade missionária em si! "Judas, filho de Tiago" — Este apóstolo, o último da lista, é apresentado por Lu- cas como sendo "filho de Tiago" (cf. também Lc 6.16). Marcos e Mateus indicam que seu nome era "Tadeu" (Mc 3.18;'Mt 10. 3). Portanto, está correio o folclore brasileiro quando denomina-o de "Judas Tadeu". — É, sem dúvida, interessante que João, um dos seus companheiros de luta e ofício, se refere a ele como sendo "Judas, não o Iscariotes". Isto ocorre em Jo 14. 22, onde se lê: "Disse-lhe Judas, não o Iscariotes: Donde procede, Senhor, que estás para manifestar-te a nós, e não ao mundo?". Esta pergunta era de tão grande significado para João que ele a inclui em seu evangelho, apesar de terem passado 70 anos desde que fora proferida. Examinemos a situação: Nas últimas exortações e nos ensinamentos finais que Jesus deu a seus discípulos, ele lhes falou do "Consolador", o "Espírito da verdade", que ele enviaria para que estivesse para sempre com eles. Com este envio do Espírito Santo, os discípulos de Jesus passariam a ocupar uma posição de absoluto contraste com o mundo. No futuro, apenas os discípulos veriam a Jesus, mediante a fé operada pelo Espírito Santo. O mundo — que já não o percebera quando de sua manifestação visível — não mais o poderia ver. Jesus se manifestaria apenas aos seus discípulos, aos que o amam. E neste contexto surge a importante pergunta de Tadeu. Ele não conseguia harmonizar esta tão marcante restrição da parte de Jesus com outras afirmações de seu Mestre que deixavam bem claro que ele era o Salvador do mundo inteiro. Por isto a pergunta. E é interessante notar que Judas não pergunta simplesmente, "Por quê?" — Ele vai mais longe. Ele indaga: "ti gégonen?" — "O que aconteceu, o que ocasio- nou esta (aparente) reviravolta?" Sim: "O que aconteceu, Senhor, para que agora pretendas restringir-te a nós em tua manifestação? Por que não (mais) ao mundo?" — E em sua resposta — que convém ser lida! — Jesus explica que dali por diante haveria uma completa distinção entre os que amam a ele e a seu Pai e — desta ma- neira — guardam sua palavra, e aqueles que não lhe pertencem pelo amor e pelo guardar de sua palavra. Foi oportuna tua pergunta, Judas Tadeu! Agora temos uma resposta clara e divina para a pergunta: "Será que não pode haver neutralidade? Será que não podem 39 existir aqueles que simplesmente 'ignoram' a Jesus?" E Jesus responde: Não! Não existe um terceiro caminho: Ou — ou! — Ou se é por Cristo — ou, então, contra Cris- to! Da vida posterior deste apóstolo existem apenas tradições contraditórias. A tra- dição que, dentre várias outras, merece a maior credibilidade é aquela que relata que os dois apóstolos mencionados por último nesta lista — Simâo, o Zelote e Judas Ta- deu — foram juntos para a Pérsia onde, então, se separaram com o propósito de espalhar o quanto mais possível o evangelho naquela parte do mundo. Tadeu teria sofrido o martírio em lugar desconhecido. Fizemos, assim, um exame da vida e atividade daqueles homens que o próprio Jesus escolheu como seus embaixadores plenipotenciários aqui na terra, e que foram enviados a um mundo em trevas sem nenhum outro poder que não fosse aquele que também estava por detrás da grande comissão que receberam, a saber: "É-me dada toda a autoridade no céu e na terra: Portanto, ide, fazei discípulos de to- das as nações..." Certamente nos impressiona o quão pouco de fato sabemos a respeito da atividade destes homens eleitos. Porém, as consequências de sua atividade, o sucesso que Deus lhes deu, estão historicamente comprovados no fato de que, ao final do primeiro século, a mensagem da graça de Deus em Cristo Jesus tinha sido espalhada a todo o mundo conhecido de então. — Os nomes, o dia a dia de nosso trabalho missionário podem não ter valor, podem passar despercebidos neste mundo. Deus, entretanto, tem seu próprio "Diário" a respeito de seus ministros aqui na terra. E neste não falta nenhum nome. Nele está anotada a atividade de Pedro, João, Tiago, André, e até mesmo a de Simâo, o Zelote e Judas Tadeu. — Lá também estará o meu "dia a dia". Que assim seja para mim! 40 7 • "TODOS ESTES — UNÂNIMES" (At 1.14) "Todos estes perseveravam unânimes em oração, com as mulheres, estando entre elas Maria, mãe de Jesus, e com os irmãos dele". O "todos estes" certamente não se limita aos onze mencionados nos versículos precedentes, cujas biografias foram delineadas no estudo anterior. A partir do versí- culo seguinte (v. 15) conclui-se que estavam reunidas ao menos "umas cento e vinte pessoas". O cenáculo onde se reuniram e que é mencionado no versículo 13 certamente era uma sala mais ou menos grande. "Perseveravam" — Entre o dia da Ascensão e o Pentecoste há um intervalo de dez dias. Esta "perseverança" não significa que de contínuo eles estiveram reunidos naquela sala espaçosa, como que em constante vigília. Não! Os primeiros cristãos eram pessoas normais. Tinham as suas famílias. O culto a Deus em geral não exige que os laços familiares sejam rompidos. Os casais sem dúvida voltaram a seus lares, instruíram e educaram seus filhos. Trata-se de uma grande aberração quando grupos e seitas exigem uma separação completa da família e o convívio dos adeptos numa assim-denominada "comuna". O cristianismo não destrói os laços que o próprio Deus prevê em sua ordem da criação. Portanto, não devemos imaginar que estes pri- meiros seguidores de Jesus foram revolucionários neste sentido. — Havia, porém, um cuidado constante: eles de certo se reuniram para oração, dia após dia, e não apenas esporadicamente. "... em oração" — Nestas horas de oração eles sentiram a presença de seu Mestre — apesar de sua ascensão aos céus — e falavam com ele como se estivesse corporalmente presente. — O segredo de uma oração verdadeira é este: sentir e crer — sim, ter certeza de que Jesus está presente de maneira tal que se pode falar com ele assim como a noiva fala com seu noivo, a esposa com seu esposo, — segredar- lhe os mais íntimos pensamentos, as mais íntimas dificuldades e dores. Certa feita li uma pequena história a respeito de uma mãe judia e seu filho — pouco importa se foi inventada ou é verídica. Esta mãe levou seu filho, em quem se haviam manifestado extraordinários dons intelectuais, ao rabino de sua comunidade, dizendo que agora ele deveria tomar conta da educação do rapaz. Ela não mais se considerava em con- dições para tanto. A mãe solicitou ao rabino que fizesse qualquer pergunta para o menino e ele prontamente responderia a todas elas. Depois de alguns momentos de reflexão o rabino perguntou: "Meu filho, diga-me onde está Deus?" — E o rapaz respondeu: "Mestre, responderei sua pergunta se me disser onde Deus não está". — Irmãos, é exatamente este o segredo da oração: saber que não existe lugar onde Deus não está. O rabino não estava em condições de dizer onde Deus não estava. E ele não está sozinho, porque o rei-salmista Davi já confessou: "Para onde me ausentarei do teu Espírito? para onde fugirei da tua face? se subo aos céus, lá estás; se faço a minha cama no mais profundo abismo, lá estás também; se tomo as asas da alvorada e me detenho nos confins dos mares: ainda lá me haverá de guiar a tua mão e a tua destra me susterá". (SI 139.7-10) 41 Portanto, em todas as nossas orações uma cousa é absolutamente essencial, sim, é a solução do mistério: saber e crer que Deus está presente ali onde eu necessito dele! — Foi este o segredo do poder da oração dos primeiros cristãos; foi por isto que "perseveravam na oração". — É possível que a resposta não seja imedia- ta; então é preciso insistir!, perseverar! — Lembrem-se daquela um tanto enigmática parábola de Jesus a respeito do "amigo importuno" (Lc 11.5 ss) que não desistiu de pedir — mesmo à meia noite — e, finalmente, foi atendido em seu pedido. — Os discípulos reunidos, perseverando na oração, certamente se lembravam da promessa de seu Senhor: "Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos sécu- los" (Mt 28.20). "... com as mulheres..." — É evidente que não podemos saber com exatidâo quais as mulheres que estavam presentes. No entanto, os evangelhos mencionam algumas que, sem dúvidas, estavam entre os seguidores reunidos naquele cenáculo. Em primeiro lugar, a "dona da casa". Possivelmente tratava-se de Maria, mãe de João cognominado Marcos", cuja casa mais tarde foi lugar de culto para uma parte da congregação de Jerusalém e para onde se dirigiu Pedro depois de ter sido maravi- lhosamente libertado do cárcere (At 12.12 ss). Esta mulher, apesar do pouco que dela conhecemos, teve, sem dúvida, uma influência marcante na primitiva igreja de Jeru- salém. Ao lado dela podemos certamente citar as duas irmãs de Betânia: Marta e Maria. A casa delas foi lugar de repouso do Mestre e palco de diálogos íntimos sobre os mistérios do reino de Deus. Elas experimentaram em suas vidas a gloriosa presença do Filho de Deus humanado e tomaram parte direta numa das grandiosas manifesta- ções da divina onipotência de Jesus, no dia em que ele ressuscitou seu irmão Lázaro. Se lermos Lc 10.38-42, Jo 11 e 12.1 ss, onde vemos a profunda dedicação de Maria ao Mestre, então teremos o suficiente para também inclui-las neste grupo de mulheres cristãs. Com certeza também estava presente aquela mulher que os debochadores do século XX estigmatizaram como "amante" de Jesus. Tratasse de Maria Madalena, ou seja, Maria de Magdala, uma localidade à beira do mar da Galiléia. Dela o Novo Tes- tamento apenas relata que Jesus a libertou de "sete demónios" (Lc 8.2). — Como sabemos, ela foi a primeira pessoa que, na madrugada da primeira páscoa, viu o túmulo de Jesus aberto, depois de ter sido uma das últimas testemunhas da morte de seu Senhor (cf. Mt 27. 56; 28.1). Foi ela também quem levou a mensagem do túmulo aberto a Pedro e a João e teve a ventura de ser a primeira pessoa a quem o Ressuscitado apareceu vivo (Jo 20.1-18). — Ah sim! Maria Madalena estava entre as mulheres em oração juntamente como os apóstolos. Outras mulheres? — Admira-me o fato de as feministas da atualidade não se terem dado conta da extraordinária libertação que as mulheres conseguiram com o surgimento do cristianismo. Nos círculos culturais judaicos e gregos era simples- mente inconcebível as mulheres reunirem-se com os homens em nível de igualdade. Cristo colocou a mulher em absoluto pé de igualdade com o homem. Sem dúvida é notável mencionar-se "mulheres" como integrantes do grupo dos 120 reunidos no ce- náculo. Outras mulheres? Quais, além das já mencionadas? Penso que ali estavam também algumas das que são mencionadas no início da história de Jesus, a saber, aquelas que "lhe prestavam assistência com os seus bens" (Lc 8.2,3), além de Maria de Magdala, "Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Suzana e muitas ou- tras". 42 Sem dúvida também estavam presentes as mulheres que ao lado de Maria, mãe de Jesus, e Maria Madalena acompanharam seu Mestre até à cruz e naquela manhã da primeira páscoa cristã desejavam prestar-lhe seu "último serviço", embalsamando o corpo — supostamente — morto no túmulo: Maria, mãe de Tiago, o menor; Salomé, mulher de Zebedeu e mãe dos apóstolos João e Tiago, e possivelmente a irmã de Ma- ria, mãe de Jesus. (Cf. os diferentes evangelhos!) Ninguém pode afirmar com certeza o número de mulheres reunidas ali, uma vez que os evangelistas repetidamente falam de outras mulheres, "muitas outras que haviam subido com ele (Jesus) para Jerusalém" (Mc 15.41, etc.)! Uma, no entanto, merece menção especial da parte do historiador e deve ser lembrada por nós também: "Maria, a mãe de Jesus". Esta é a última vez que a Biblia se refere a esta mulher "agraciada". E não há nada de extraordinário em relação a ela. Ela simplesmente estava "entre elas", entre as outras mulheres. Nada de adoração especial, nada de "Rainha do Céu", nada de intercessora especial; apenas uma "entre elas"! Maria certamente não desejava ser mais do que uma entre as outras. Assim como no inicio de sua missão de mãe do Salvador ela se declarara "a serva do Senhor" e dissera: "que se cumpra em mim conforme a tua palavra" (Lc 1.38), assim também depois de cumprida esta missão especialmente planejada por Deus ela se coloca como serva de seu Senhor "entre as outras mulheres". Ah! é verdade: cumprira-se a profecia do velho Simeão a respeito dela e que certamente lhe havia parecido enigmática e obscura: "Também uma espada transpassará a tua pró- pria alma" (Lc 2.35). Agora ela sabia o Significado desta espada traspassando sua alma. Os acontecimentos no alto do Gólgota certamente foram uma experiência que pode ser descrita nestes termos. Agora, no entanto, ela está "entre as mulheres", louvando e adorando a Deus, seu Senhor, em nome de Jesus, seu filho. "... e com os irmãos dele" — Uma das histórias mais estranhas do Novo Testa- mento é a dos "irmãos de Jesus". É provável que nunca se chegue a um denomina- dor comum nesta difícil questão. A esta altura não convém entrar nos pormenores da discussão a respeito de sua verdadeira identidade: Irmãos de fato, isto é, filhos de José e Maria? Meio-irmãos, isto é, filhos de um matrimónio anterior de José? Ou ain- da "primos", ou seja, filhos de uma irmã de Maria? A última destas três hipóteses me parece a menos provável; a segunda é a que melhor se enquadra nos textos existentes. De momento nos interessa apenas o fato de que eles se encontram no meio desta primeira congreação pós-pascal. Sua presença na verdade não é algo tão natural assim, visto que até a morte de Jesus estes "irmãos" não faziam parte do círculo dos seus seguidores. Eis alguns pontos que convém serem ponderados a respeito deles: O inicio desta história — triste, em certo sentido — remonta bem ao inicio da atividade profético-messiànica de Jesus. Quando, segundo o relato de João (testemu- nha ocular!), Jesus pela primeira vez retornou de Jerusalém (a primeira purificação do templo, Nicodemos, etc.) para a Galiléia, constatou, certamente com tristeza, "que um profeta não tem honra na sua própria terra" (Jô 4.44). Ele foi completamente rejei- tado por seus conterrâneos e parentes. Ao ler, expor a Escritura e aplicar a lei a seus ouvintes na sinagoga de Nazaré teve a seguinte reação: "Todos na sinagoga, ouvindo estas cousas, se encheram de ira. E levantando-se expulsaram-no da cidade e o levaram até ao cume do monte sobre o qual estava edificada, para de lá o precipitarem abaixo" (Lc 4.28,29). Não é de admirar que, diante de uma tal atitude, Jesus se tenha retirado do meio deles, afastando-se inclusive dos seus parentes. Já 43 antes disto ele se havta distanciado espiritualmente de seus parentes, explicando que sua família não era feita de consanguinidade ou parentesco, mas daqueles que cumpriam a vontade de Deus. Quando lhe disseram que seus familiares estavam do "lado de fora" e desejavam vê-lo, ele apontou para aqueles que estavam ouvindo seu ensino e disse: "qualquer que fizer a vontade de Deus, esse é meu irmão, irmã e mãe" (Mc 3. 31-35). Lucas igualmente dá o motivo por que não fizera muitos milagres em sua terra: "por causa da incredulidade deles" (Lc 13.53-58). Marcos constata que ele "admirou-se da incredulidade deles" (Mc 6.6). O evangelista João, amigo íntimo de Jesus e mui provavelmente primo por parte da mãe (a mãe de João era irmã de Maria, mãe de Jesus), encerra a questão do relacionamento espiritual entre Jesus e seus irmãos, afirmando sem qualquer eufemismo: "Nem mesmo os seus irmãos criam nele" (Jo 7.5). (João emprega o imperfeito do verbo grego "crer": ' episteuon". Isto indica incredulidade permanente e não apenas ocasional.) Constatado que os irmãos de Jesus não eram seus seguidores antes da Páscoa, surge diante de nós a seguinte pergunta: Como pode ser possível que poucos dias depois da morte e ressurreição de Jesus eles já integravam aquela congregação que se reunia de comum acordo, em adoração e oração diária, esperando a vinda do Espírito Santo prometido pelo Mestre quando da ascensão? Como e quando se deu esta transformação? Penso que a única resposta para esta pergunta nos é dada pelo apóstolo Paulo. No arrolamento das testemunhas oficiais e fidedignas da ressurreição de Jesus ele menciona — como se fosse do conhecimento de todos, o que certamente era o caso — o fato de que "depois foi visto por Tiago" (1 Co 15.7). Quer-me parecer que a menção desta aparição do Ressuscitado a Tiago, provavelmente o mais velho dos "irmãos" de Jesus, já que ele sempre é mencionado em primeiro plano (cf. Mt 13.55; Mc 6.3), responde a nossa pergunta. Da mesma forma como o Ressuscitado misericordiosamente se mostrou vivo a Pedro e a outros, assim ele certamente também convenceu a Tiago — e este posteriormente a seus irmãos — de que realmente era o Messias prometido no Antigo Testamento. — Deus havia escolhido Tiago, "irmão de Jesus", para ser o líder reconhecido e o bispo da primeira congregação cristã organizada — a de Jerusalém (Cf. At 15 e outras passagens do Novo Testamento). — Portanto, assim como Jesus teve misericórdia de Pedro, o dis- cípulo fraco e cambaleante; de Tomé, o célico; assim ele também se compadeceu de seus "irmãos" incrédulos, convencendo-os através de sua ressurreição de que ele era o Salvador, não só de Israel, mas, do mundo inteiro. "Todos estes perseveravam unânimes..." — Temos aqui o advérbio "homothymadón", traduzido em nosso texto por "unânime". Este advérbio é de gran- de significância para a vida congregacional daquela primeira geração — e deveria sê- 1o hoje também. Ele mostra-nos que o progresso da igreja apostólica dependia em grande parte do fato de eles estarem, orarem e crerem "homothymadón", isto é, "do comum acordo". Este advérbio não quer dar a entender que a oração, a adoração e a pregação da igreja apostólica funcionavam como que num "uníssono". É necessário que se faça distinção entre "uníssono" e "de comum acordo". O "de comum acordo" lembra a música. Lembra um "acorde". E um acorde nunca é feito de um tom apenas; pelo contrário, é resultante da emissão simultânea de três ou mais sons de frequên- cia diferente. E este acorde, apesar disto, é um som harmonioso. São os "acordes" que fazem com que a oração e a adoração da comunidade cristã soem "homothy- madón". — Antes de a harpista — em geral são mulheres — começar a tocar, ela 44 t precisa afinar as 46 cordas de seu instrumento; só então ela está em condições de tocar as tão belas músicas. É impressionante como Lucas emprega este advérbio na escrita de sua história da igreja apostólica. Ele faz uso deste termo do campo da música para descrever a ativa vida espiritual da primeira igreja. Basta examinarmos algumas passagens: At 1.14 (nosso texto): O fato de as orações deste primeiro grupo de seguidores de Jesus soarem diante do trono de Deus como os "acordes" de uma sinfonia de grande beleza era algo inédito e novo. "Unânimes", como uma sinfonia espiritual, não implica num recitar de orações em "uníssono". Não! Assim como o som de cada uma das cordas da harpa é diferente do da outra, assim certamente também as orações dos cristãos podem ser expressas de maneiras diferentes, com palavras diferentes; o conjunto das orações, entretanto, está em perfeita harmonia, forma acordes perfeitos. Aqui temos um dos segredos da força espiritual da igreja apostóli- ca: a oração de comum acordo. Foi assim antes do Pentecoste, e continuou assim depois do Pentecoste. Em At 2.46 temos a mesma palavra para dar expressão à vida congregacional. A igreja de Jerusalém crescera de tal maneira que não mais era possível a reunião de todos no mesmo lugar; já se haviam criado grupos que se reuniam ao redor da palavra e da celebração da santa ceia "de casa em casa". Porém a adoração, o culto em todos estes diferentes grupos nas casas, era absolutamente "homothymadón", "de comum acordo". E os acordes que se fizeram ouvir de maneira alguma foram tristes! Diz o texto que eles "tomavam as suas refeições com alegria". At 4.24: "Ouvindo isto (a libertação de Pedro e João depois de seu primeiro encarceramento por causa de seu testemunho), unânimes, "homothymadón", levan- taram a voz a Deus..." Sim, pela primeira vez na breve história da igreja se haviam cumprido as palavras proféticas de seu Mestre: "... acautelai-vos dos homens; porque vos entregarão aos tribunais e vos açoitarão nas suas sinagogas; por minha causa sereis levados à presença de governadores e de reis, para servir de testemunho a eles e aos gentios" (Mt 10.17,18). — Nesta primeira vez, é verdade, ainda não foram açoitados; porém os dois lideres foram soltos sob a severa ordem de que "absolutamente não falassem nem ensinassem em o nome de Jesus" (At 4.18). Apesar disso eles não se calaram. Havia neles uma força superior, um dínamo que os impulsionava pois, disseram eles, "nós não podemos deixar de falar das cousas que vimos e ouvimos" (v. 20). — Uma vez libertos, foram e relataram aos irmãos reunidos tudo o que acontecera. Que foi que houve então? Que medidas tomaram? Não houve vozes discordantes dizendo: Cuidado! Da próxima vez poderá ser pior! Cuidado! Vamos ser prudentes! Vamos ficar quietos por enquanto! — Nada disso. Ao contrá- rio: novamente soam as orações dos fiéis "de comum acordo" em direção do céu. Houve uma sinfonia de louvor, oração e gratidão — apesar de tudo. Passaram-se os anos. A igreja dos apóstolos não mais estava confinada a Jeru- salém e Palestina. Paulo e Barnabé haviam levado o evangelho centenas de quiló- metros ao norte, para a ilha de Chipre e para o "hinterland" da província da Galácia. Era mais ou menos o ano 49 — quase 20 anos depois do primeiro Pentecoste — quando um grave problema sacudiu a igreja. Surgiu a primeira controvérsia doutrinária. Tudo se resumia numa pergunta de difícil resposta nas circunstâncias de então: É necessário que os gentios, antes de se tornarem realmente cristãos, sejam circuncidados, isto é, devem tornar-se judeus antes de serem cristãos? Por causa das exigências dos da parte dos fariseus, houve uma grande discussão entre os cristãos. 45 Foi sem dúvida a mais grave crise que já sacudira a igreja. Lemos em At. 15.1,2: "Alguns indivíduos que desceram da Judéia (para Antioquia, a igreja-mãe da missão gentílica), ensinavam os irmãos: Se não vos circuncidardes segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos. Tendo havido, da parte de Paulo e Barnabé, contenda e não pequena discussão com eles, resolveram que esses dois e alguns outros dentre eles subissem a Jerusalém, aos apóstolos e presbíteros, com respeito a esta questão". — De momento quero assinalar apenas o seguinte: Ao final de tudo, quando pela graça de Deus fora evitada uma cisão que parecia iminente, soa de novo esta grande palavra "homothymadón" — "chegados a pleno acordo" (At 15.25). Sim. a harpa novamente soava em harmonia e gratidão. Fora do livro de Atos esta tão significativa palavra "homothymadón" ("de co- mum acordo") ocorre em apenas uma passagem: Romanos 15.5,6. Esta palavra que Paulo dirige à igreja de Roma deve guiar também a nós em nossa vida congregacio- nal, para que também entre nós haja "progresso para a edificação da igreja". Em Rm 15.5,6 temos um conselho apostólico — quase uma oração — que visa a nossa convivência na igreja de Cristo, tanto em Roma, Jerusalém, quanto no século XX aqui no Brasil: "Ora, o Deus de paciência e consolação vos conceda-o mesmo sentir de uns para com os outros, segundo Cristo Jesus, para que concordemente (homothy- madón) e a uma voz glorifiqueis ao Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo". Sim, este e o segredo da verdadeira vida espiritual numa igreja. Que Deus Espírito Santo nos dê para a nossa vida esta concordância, para que o nosso orar, o nosso louvar, toda a nossa vida se torne uma grandiosa sinfonia de acordes harmoniosos aos ouvi- dos de nosso Senhor Jesus Cristo!
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JO 9.1-41
JOÃO
JOÃO 20.19-31
JOÃO C. SCHMIDT
JOÃO C. TOMM
JOÃO N. FAZIONI
JOEL RENATO SCHACHT
JOÊNIO JOSÉ HUWER
JOGOS DE AZAR
JOGRAL
JOHN WILCH
JONAS
JONAS N. GLIENKE
JONAS VERGARA
JOSE A. DALCERO
JOSÉ ACÁCIO SANTANA
JOSE CARLOS P. DOS SANTOS
JOSÉ ERALDO SCHULZ
JOSÉ H. DE A. MIRANDA
JOSÉ I.F. DA SILVA
JOSUÉ ROHLOFF
JOVENS
JR
JR 28.5-9
JR 3
JR 31.1-6
JUAREZ BORCARTE
JUDAS
JUDAS ISCARIOTES
JUDAS TADEU
JUMENTINHO
JUSTIFICAÇÃO
JUVENTUDE
KARL BARTH
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KRETZMANN
LAERTE KOHLS
LAODICÉIA
LAR
LC 12.32-40
LC 15.1-10
LC 15.11-32
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LC 24
LC 24.13-35
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LC 5
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LC 7
LC 7.1-10
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LC 9.51-62
LEANDRO D. HÜBNER
LEANDRO HUBNER
LEI
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LEIGOS
LEITORES
LEITURA
LEITURAS
LEMA
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LEOCIR D. DALMANN
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LIBERDADE CRISTÃ
LIDER
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LILIAN
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LINK
LITANIA
LITURGIA
LITURGIA DE ADVENTO
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LITURGIA EPIFANIA
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LIVRO
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MANUAL
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MARIA J. RESENDE
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MARLUS SELING
MARTIM BREHM
MARTIN C. WARTH
MARTIN H. FRANZMANN
MARTINHO LUTERO
MARTINHO SONTAG
MÁRTIR
MATERNIDADE
MATEUS
MATEUS KLEIN
MATEUS L. LANGE
MATRIMÔNIO
MAURO S. HOFFMANN
MC 1.1-8
MC 1.21-28
MC 1.4-11
MC 10.-16
MC 10.32-45
MC 11.1-11
MC 13.33-37
MC 4
MC 4.1-9
MC 6.14-29
MC 7.31-37
MC 9.2-9
MEDICAMENTOS
MÉDICO
MELODIA
MEMBROS
MEME
MENSAGEIRO
MENSAGEM
MESSIAS
MÍDIA
MILAGRE
MINISTÉRIO
MINISTÉRIO FEMENINO
MIQUÉIAS
MIQUÉIAS ELLER
MIRIAM SANTOS
MIRIM
MISSÃO
MISTICISMO
ML 3.14-18
ML 3.3
ML NEWS
MODELO
MÔNICA BÜRKE VAZ
MORDOMIA
MÓRMOM
MORTE
MOVIMENTOS
MT 10.34-42
MT 11.25-30
MT 17.1-9
MT 18.21-45
MT 21.1-11
MT 28.1-10
MT 3
MT 4.1-11
MT 5
MT 5.1-12
MT 5.13-20
MT 5.20-37
MT 5.21-43
MT 5.27-32
MT 9.35-10.8
MULHER
MULTIRÃO
MUSESCORE
MÚSICA
MÚSICAS
NAAÇÃO L. DA SILVA
NAMORADO
NAMORO
NÃO ESQUECER
NASCEU JESUS
NATAL
NATALINO PIEPER
NATANAEL
NAZARENO DEGEN
NEEMIAS
NEIDE F. HÜBNER
NELSON LAUTERT
NÉRISON VORPAGEL
NILO FIGUR
NIVALDO SCHNEIDER
NM 21.4-9
NOITE FELIZ
NOIVADO
NORBERTO HEINE
NOTÍCIAS
NOVA ERA
NOVO HORIZONTE
NOVO TESTAMENTO
O HOMEM
OFERTA
OFÍCIOS DAS CHAVES
ONIPOTENCIA DIVINA
ORAÇÃO
ORAÇAODASEMANA
ORATÓRIA
ORDENAÇAO
ORIENTAÇÕES
ORLANDO N. OTT
OSÉIAS EBERHARD
OSMAR SCHNEIDER
OTÁVIO SCHLENDER
P172
P26
P30
P34
P36
P40
P42.1
P42.2
P70
P95
PADRINHOS
PAI
PAI NOSSO
PAIS
PAIXÃO DE CRISTO
PALAVRA
PALAVRA DE DEUS
PALESTRA
PAPAI NOEL
PARA
PARA BOLETIM
PARÁBOLAS
PARAMENTOS
PARAPSICOLOGIA
PARECIS
PAROQUIAL
PAROUSIA
PARTICIPAÇÃO
PARTITURA
PARTITURAS
PÁSCOA
PASTOR
PASTORAL
PATERNIDADE
PATMOS
PAUL TORNIER
PAULO
PAULO F. BRUM
PAULO FLOR
PAULO M. NERBAS
PAULO PIETZSCH
PAZ
Pe. ANTONIO VIEIRA
PEÇA DE NATAL
PECADO
PEDAL
PEDRA FUNDAMENTAL
PEDRO
PEM
PENA DE MORTE
PENEIRAS
PENTECOSTAIS
PENTECOSTES
PERDÃO
PÉRGAMO
PIADA
PIB
PINTURA
POEMA
POESIA
PÓS MODERNIDADE
Pr BRUNO SERVES
Pr. BRUNO AK SERVES
PRÁTICA DA IGREJA
PREEXISTÊNCIA
PREGAÇÃO
PRESÉPIO
PRIMITIVA
PROCURA
PROFECIAS
PROFESSORES
PROFETA
PROFISSÃO DE FÉ
PROGRAMAÇÃO
PROJETO
PROMESSA
PROVA
PROVAÇÃO
PROVÉRBIOS
PRÓXIMO
PSICOLOGIA
PV 22.6
PV 23.22
PV 25
PV 31.28-30
PV 9.1-6
QUARESMA
QUESTIONAMENTOS
QUESTIONÁRIO
QUESTIONÁRIO PLANILHA
QUESTIONÁRIO TEXTO
QUINTA-FEIRA SANTA
QUIZ
RÁDIO
RADIOCPT
RAFAEL E. ZIMMERMANN
RAUL BLUM
RAYMOND F. SURBURG
RECEITA
RECENSÃO
RECEPÇÃO
REDENÇÃO
REENCARNAÇÃO
REFLEXÃO
REFORMA
REGIMENTO
REGINALDO VELOSO JACOB
REI
REINALDO LÜDKE
RELACIONAMENTO
RELIGIÃO
RENATO L. REGAUER
RESSURREIÇÃO
RESTAURAR
RETIRO
RETÓRICA
REUNIÃO
RICARDO RIETH
RIOS
RITO DE CONFIRMAÇÃO
RITUAIS LITURGICOS
RM 12.1-18
RM 12.1-2
RM 12.12
RM 14.1-12
RM 3.19-28
RM 4
RM 4.1-8
RM 4.13-17
RM 5
RM 5.1-8
RM 5.12-21
RM 5.8
RM 6.1-11
RM 7.1-13
RM 7.14-25a
RM 8.1-11
RM 8.14-17
ROBERTO SCHULTZ
RODRIGO BENDER
ROGÉRIO T. BEHLING
ROMANOS
ROMEU MULLER
ROMEU WRASSE
ROMUALDO H. WRASSE
Rômulo
ROMULO SANTOS SOUZA
RONDÔNIA
ROSEMARIE K. LANGE
ROY STEMMAN
RT 1.1-19a
RUDI ZIMMER
SABATISMO
SABEDORIA
SACERDÓCIO UNIVERSAL
SACERDOTE
SACOLINHAS
SACRAMENTOS
SADUCEUS
SALMO
SALMO 72
SALMO 80
SALMO 85
SALOMÃO
SALVAÇÃO
SAMARIA
Samuel F
SAMUEL VERDIN
SANTA CEIA
SANTIFICAÇÃO
SANTÍSSIMA TRINDADE
SÃO LUIS
SARDES
SATANÁS
SAUDADE
SAYMON GONÇALVES
SEITAS
SEMANA SANTA
SEMINÁRIO
SENHOR
SEPULTAMENTO
SERMÃO
SERPENTE
SERVAS
SEXTA FEIRA SANTA
SIDNEY SAIBEL
SILVAIR LITZKOW
SILVIO F. S. FILHO
SIMBOLISMO
SÍMBOLOS
SINGULARES
SISTEMÁTICA
SL 101
SL 103.1-12
SL 107.1-9
SL 116.12-19
SL 118
SL 118.19-29
SL 119.153-160
SL 121
SL 128
SL 142
SL 145.1-14
SL 146
SL 15
SL 16
SL 19
SL 2.6-12
SL 22.1-24
SL 23
SL 30
SL 30.1-12
SL 34.1-8
SL 50
SL 80
SL 85
SL 90.9-12
SL 91
SL 95.1-9
SL11.1-9
SONHOS
SOPRANO
Sorriso
STAATAS
STILLE NACHT
SUMO SACERDOTE
SUPERTIÇÕES
T6
TEATRO
TEMA
TEMPLO
TEMPLO TEATRO E MERCADO
TEMPO
TENOR
TENTAÇÃO
TEOLOGIA
TERCEIRA IDADE
TESES
TESSALÔNICA
TESTE BÍBLICO
TESTE DE EFICIÊNCIA
TESTEMUNHAS DE JEOVÁ
Texto Bíblico
TG 1.12
TG 2.1-17
TG 3.1-12
TG 3.16-4.6
TIAGO
TIATIRA
TIMÓTEO
TODAS POSTAGENS
TRABALHO
TRABALHO RURAL
TRANSFERENCIA
TRANSFIGURAÇÃO
TRICOTOMIA
TRIENAL
TRINDADE
TRÍPLICE
TRISTEZA
TRIUNFAL
Truco
Turma
ÚLTIMO DOMINGO DA IGREJA
UNIÃO
UNIÃO ESTÁVEL
UNIDADE
UNIDOS PELO AMOR DE DEUS
VALDIR L. JUNIOR
VALFREDO REINHOLZ
VANDER C. MENDOÇA
VANDERLEI DISCHER
VELA
VELHICE
VERSÍCULO
VERSÍCULOS
VIA DOLOROSA
VICEDOM
VÍCIO
VIDA
VIDA CRISTÃ
VIDENTE
VIDEO
VIDEOS
VÍDEOS
VILS
VILSON REGINA
VILSON SCHOLZ
VILSON WELMER
VIRADA
VISITA
VOCAÇÃO
VOLMIR FORSTER
VOLNEI SCHWARTZHAUPT
VOLTA DE CRISTO
WALDEMAR REIMAN
WALDUINO P.L. JUNIOR
WALDYR HOFFMANN
WALTER L. CALLISON
WALTER O. STEYER
WALTER T. R. JUNIOR
WENDELL N. SERING
WERNER ELERT
WYLMAR KLIPPEL
ZC
ZC 11.10-14
ZC 9.9-12