8ª Tese – O exame e a ordenação do candidato
Nem o exame que alguém chamado ao ofício pastoral prestou diante de uma comissão instituída fora da Congregação que chama, nem a ordenação recebida igualmente por uma pessoa escolhida para tanto, tornará o chamado válido. Ambos os procedimentos pertencem, no entanto, aos procedimentos salutares da Igreja, especialmente a última, que tem a importante finalidade de declarar que o chamado é reconhecido pela igreja como legítimo e divino. Qualquer um que, desnecessariamente omite um e outro desses procedimentos, age de forma cismático, dando a entender, que ele pertence aos que a congregação escolheu segundo sua própria cobiça, como que sentindo coceira nos ouvidos (2 Tm 4.3).
Observação - 1
O apóstolo Paulo diz a respeito dos diáconos: Também sejam estes primeiramente experimentados; e, se eles se mostrarem irrepreensíveis, exerçam o diaconato (1 Tm 3.10). Se isto vale para os diáconos (diretorias das congregações), quanto mais para aqueles aos quais a congregação quer confiar o ofício da Palavra, cujo exame o apóstolo considera indiretamente, indispensável, como o apóstolo o afirma: E o que de minha parte ouviste, através de muitas testemunhas, isso mesmo transmite a homens fiéis e também idôneos para instruir a outros (2 Tm 2.2).
Deixemos Ludwig Hartmann falar, ele escreve: “Antes da ordenação é necessário examinar ou explorar a pessoa a ser ordenada. Na verdade, é necessário que isso anteceda à ordenação, pela dignidade do ofício e a salvação da congregação (2 Tm 2.2). Nem devemos impor as mãos precitadamente (levianamente, sem pensar, sem mais nem menos (1 Tm 5.22). Isto acontece quando pessoas más, ignorantes, e preguiçosas são ordenadas para o ministério, sendo confirmadas na sua ignorância e incredulidade, na sua audácia de quererem voar sem penas em tão alto cargo.
Destruindo dessa forma as congregações.”
“Tal exame é levado a efeito por um cuidadoso questionamento organizado conforme a palavra de Deus. Através do qual se quer descobrir se a pessoa, a ser ordenada ou chamada, é ortodoxa com respeito à fé, bem como apta para o santo ofício, a saber: 1) com respeito à necessária educação e conhecimentos; 2) à graça de poder explicar a Escritura e os dons para o ofício, necessários para a edificação da congregação; 3) aos conhecimentos bíblicos e sua vida santificada.”
“Tal exame é levado a efeito por um cuidadoso questionamento organizado conforme a palavra de Deus. Através do qual se quer descobrir se a pessoa, a ser ordenada ou chamada, é ortodoxa com respeito à fé, bem como apta para o santo ofício, a saber: 1) com respeito à necessária educação e conhecimentos; 2) à graça de poder explicar a Escritura e os dons para o ofício, necessários para a edificação da congregação; 3) aos conhecimentos bíblicos e sua vida santificada.”
“Para tornar isso bem claro, quero expressá-lo com as palavras do abençoado Tornov (professor de Teologia em Rostock, falecido em 1633) que disse entre outras coisas: “Duas coisas se requer de cada servo chamado da palavra de Deus, a saber: habilidade e vontade. Na palavra habilidade, incluímos:
1. O conhecimento (synesis) de toda a doutrina cristã, contida nos Catecismo e os lugares comuns (locis communibus) ou teológicos (theologicis) e os fundamentos ou os principais testemunhos da Escritura, sobre os quais os pontos principais se baseiam, pois, quem não entende o que diz ou o que ensina não é apto, conforme as palavras do apóstolo em 1 Tm 1.7.
2. O dom e a habilidade (dynamis hermeneuthike) de ensinar outros (2 Tm 2.2), que aquele pessoa a ser chamado deve ter em certa medida. Não somente para que ele guarde a Palavra, mas que ele tenha certeza e a possa ensinar, e que tenha poder para admoestar, exortar com a sã doutrina e refutar os que a contradizem (Tt 1.9). A saber, para apresentar a verdadeira doutrina da fé para a melhoria dos costumes morais na justiça, refutar as doutrinas falsas, censurar os viciados conforme o propósito da Escritura em 2 Tm 3.16, consolar os que sofrem com tentações e angústias (Rm 15.4).
3. Uma vida irrepreensível (anepileptos kai anegkletos bios, 1 Tm 3.2; Tt 1.6), que esteja livre de crimes e obras vergonhosas, que não são tolerados entre os servos da Palavra, e que seja adornado com todas as virtudes que são necessárias para que se apresente a si mesmo como cristão (Gl 5.6; 2 Pe 1.5-7), para edificar a outros.
Na palavra vontade, queremos, incluímos duas coisas:
1. O desejo de servir a igreja (1 Tm 3.1), a saber, não um servir forçado ou por necessidade, mas um servir voluntário que proceda do zelo para a glória de Deus e a salvação do povo, não por vantagens financeiras ou desejo de dominar outros (1 Pe 5.2-3).
2. Constância na fiel administração do ofício aceita em todas suas partes (1 Co 4.2). A isso pertence o esforço de, por meios corretos, despertar e crescer nos dons que Deus concedeu (2 Tm 1.6), que também é apresentado por outras passagens como 1 Tm 4.12,13, e ser paciente e laborioso nas tribulações, que é muito necessário para o pastor como bom soldado de Cristo (2 Tm 2.1) (Pastoral. ev., Lib. I, c. 8, p. 130s.).
A pergunta: Será que pode ser considerado suficientemente equipado com os dons necessários para o ofício aquele que aprendeu um pouco de latim e é capaz de recitar de cor um sermão escrito por outro? O teólogo dinamarquês Brochmand respondeu: “De forma nenhuma. Primeiro, porque toda a palavra de Deus deve ser conhecida a um servo de Deus” (Ml 2.7; Mt 13.52; 2 Tm 1.13; 3.14-15, 17).
“Segundo, um servo da palavra de Deus deve ser tão familiarizado com a palavra de Deus, que saiba aplicá-la sabiamente a seus ouvintes com respeito ao tempo, lugar, e circunstâncias diversas, como afirma o apóstolo Paulo: Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2 Tm 2.15).
“Terceiro, quem deseja ser considerado digno do ministério, deve ter feito tal progresso na palavra de Deus, que possa prestar contas do que ensina, se isto é requerido dele, bem como para tapar a boca daqueles que a contradizem, como o apóstolo Paulo o lembra em Tt 1.9”.
Por outro: Podem aqueles, que no exame não se mostram bem equipados com os conhecimentos da palavra de Deus sobre a fé, como requerido para o exercício do santo ministério, mesmo assim serem ordenados, mas com a condição de fazerem a sagrada promessa de se dedicarem sincera e cuidadosamente ao estudo? O Brochmand responde: “Não, de forma nenhuma. Pois em primeiro lugar, o apóstolo Paulo não permite que alguém receba o santo ofício que não seja apto para ensinar e capaz de se contrapor aos que contradizem a verdade” (1 Tm 3.2; Tt l.9).
“Segundo, o Espírito de Deus claramente nos lembra para não impor as mãos sobre uma pessoa não devidamente preparada, para que não nos façamos participantes no pecado de outros” (1 Tm 5.22).
“Terceiro, a experiência comprova, abundantemente, que aqueles que são admitidos ao santo ofício sem a devida educação, permanecem na sua condição, mesmo que tenha prometido estudar com diligência.”
“Quarto, como nós poderíamos responder a Deus se muitos dos ouvintes se perdem, antes de o pastor ter aprendido o que deve ensinar a outros” (Ez 33.1ss.) (Loci 30, c. 3, vol. II, p. 372, 375).
Disso vemos quão anti-bíblico, inescrupuloso e destrutivo é para as almas esse tal sistema de licenciamento conforme praticado em alguns Sínodos. De acordo com este sistema, aqueles que não foram aprovados por causa de suas deficiências em habilidade para o ofício, recebem somente o assim chamado licenciamento, à base do qual podem trabalhar numa congregação de forma probatória.
Observação - 2
A ordenação com a imposição das mãos ao pastor chamado para o ministério não é uma instituição divina, mas somente uma instituição apostólica, eclesiástica. Isso não necessita de provas bíblicas. Sua prática é mencionada na Escritura, mesmo silenciando ela sobre qualquer instituição divina. Quando se trata, no entanto, de uma instituição divina, o argumento do silêncio (a silentio) é válido, como o vemos da polêmica contra a Igreja Católica e de suas doutrinas dos sacramentos baseadas nas tradições.
A ordenação é um adiáforo que não vitaliza o chamado e o ofício, mas somente os confirma (Cf.: Livro de Concórdia, p. 357, Do poder e da jurisdição dos Bispos, § 69-71). [...]. Isto sempre foi a doutrina e de todos os professores ortodoxos em nossa igreja, e poderá ser visto no escrito: Die Stimme unserer Kirche in der Frage von Kirche und Amt, 2ª edição. Erlangen; Deichert, 1865. Parte II, tese 6B. Ao mesmo tempo é provado que isto foi o costume da igreja antiga, que também, como a igreja luterana, reprovava absolutamente a ordenação sem um chamado. Isto para evitar a impressão de que a pessoa entra no santo ministério pela ordenação, sendo assim qualificado como um sacerdote de Deus.
O benefício e a relativa necessidade da ordenação, no entanto, encontramos também no escrito citado, da clara exposição de nossos teólogos. Aqui citaremos somente as palavras de um sincero lutador pela ortodoxia, Johann Fecht (professor de Teologia em Rostock, falecido em 1716), que diz o seguinte: “A ordenação é um costume eclesiástico que deve ser altamente estimado por causa do seu propósito de que o candidato é encontrado apto e digno para que almas humanas possam lhe ser confiadas. Segundo, este costume torna o próprio candidato publicamente certo de ser legitimamente chamado e que a igreja reconhece seu ofício. Terceiro, a comunidade toda ora por ele, para que os dons necessários para a igreja sejam nele multiplicados, para que lhe seja concedido coragem para servir a Deus com firmeza e cuidar da salvação das almas”.
Aqui se levanta também a pergunta: O que dizer a respeito da necessidade e do costume da ordenação? Ela deve ser respondida à base do que ouvimos. Dois extremos devem ser evitados. Primeiro, que não se atribua a este ato, como os papistas, uma absoluta necessidade. Pois, conforme eles, a ordenação imprime à pessoa um novo caráter, transformando-a de uma pessoa mundana em uma pessoa espiritual, de um leigo, em um clérigo, apto a executar as funções santas, especialmente a consagração dos sacramentos. Por isso ordenam pessoas não chamadas para que, ao serem chamadas exercerem imediatamente suas funções. Segundo, que não se despreze a ordenação como os calvinistas, como se nada dependesse dela. Pois, como não consideramos um matrimônio verdadeiramente cristão, se não foi abençoado publicamente, quanto mais o santo ministério”.
“Disto seguem duas regras: Primeiro, que uma pessoa chamada, se o caso de uma emergência o requerer, ou se por um impedimento qualquer ela não pôde ser imediatamente ordenada, possa exercer suas funções ministeriais. As congregações precisam ser orientadas de que nesses casos, a pregação e a administração dos sacramentos não dependem da ordenação, como se a ordenação fosse um meio para imprimir ao ato um sentido e valor sacro, sem o qual o servo não pudesse executar suas funções. Segundo, que, exceto em caso de necessidade, mesmo que chamado, não exerça suas funções. Não porque não tivessem valor, mas para não dar, a outros, motivo de escândalo, como se nessa questão santa e importante não se necessitasse das orações dos outros, podendo entrar no ofício como os animais ao cocho” (Instructio pastoralis, Cap. 5, Sectio 1.2; p. 47ss.)
Chr. Tim. Seidel nos lembra: “Na maioria das congregações é costume conectar a cerimônia da ordenação que a Santa Ceia seja administrada ao candidato, imediatamente após a ordenação. Isto para lembrar o candidato que, em sua congregação, ele não deve saber nada a não ser Cristo e este crucificado, a quem ele deve proclamar pelo ensino e pela vida. E que ele deve permanecer unido com Cristo, não somente por sua própria pessoa, mas também para apresentá-lo à congregação confiada a ele.” (Pastoraltheologie, ed. F.E.Rambach, Leipzig, 1769, p. 37).
Para que o ordenado possa concentrar seus pensamentos neste momento importante somente nesta santa cerimônia, ele normalmente não prega neste dia de sua ordenação.
Observação - 3
Onde possível, a ordenação deve ser feita sempre na congregação na qual o ordenado está entrando. Se isto não for possível, então é importante que o ordenado seja publicamente instalado nesta congregação. Por a ordenação não ser usualmente repetida em casos de transferência, quando outro chamado é aceito, a instalação é repetida toda a vez que o pregador assume um novo ofício.
Observação - 4
Na Igreja Evangélica Luterana, tanto na ordenação como na instalação, o pastor se compromete com os livros simbólicos. Friedrich Eberhard Rambach acrescentou à Pastoraltheologie de Seidel o seguinte: “Este costume de nossa igreja tem sido desaprovado e criticado por causa de um mal entendido. Por isso devemos lembrar o seguinte:
“1. Nós não consideramos os livros simbólicos a base de nossa fé, esta é unicamente a Escritura Sagrada; mas eles são somente a norma normada de nossa confissão de fé. Pela subscrição dos mesmos, para ensinar conforme esta confissão, nós queremos ter a garantia de que nossa igreja tem em seus professores e pastores servos e guias fiéis e não raposas e lobos. Ninguém é absolutamente forçado a fazê-lo, e se alguém tem alguma reserva a respeito de tal subscrição, ele pode deixar de fazê-lo e procurar outro trabalho pra se sustentar. Mas se alguém subscreveu a confissão e depois se afastar dela, então este não pode ser considerado um homem de caráter, honesto e honrável e precisa resignar e deixar seu ofício.”
2. Nossos livros simbólicos não são instrumentos de intromissão, para interferir na consciência de outras pessoas; mas eles foram escritos por causa da necessidade. A Confissão de Augsburgo foi elaborada por ordem do Imperador Carlos V, sob sérios perigos de vida dos confessores. Os Artigos de Esmalcalde foram elaborados pela necessidade de apresentá-los no Concílio que o Papa convocou para Mántua. Os dois Catecismos foram escritos por causa da grande ignorância do povo e a irresponsável negligência do clero romano. E a mesma coisa podemos dizer da Fórmula de Concórdia que muitas vezes é insultada por línguas impuras, que revelam ignorância e frivolidade. [...]. A liberdade de consciência não permite forçar alguém à religião verdadeira, mas também não permite conceder a cada um a liberdade de ensinar heresias e criar confusão na igreja (op. cit., p. 38).”
Da mesma forma seria algo irresponsável se um candidato se comprometesse com as Confissões somente para poder entrar no ofício, sem ter lido as mesmas, e sem ter-se convencido de ser esta a correta exposição das Escrituras no seu conteúdo e sua fraseologia (in rebus et frasibus).
Observação – 5
Após a ordenação, o pastor deveria filiar-se na próxima oportunidade a um Sínodo ortodoxo. Se ele, tendo a oportunidade, não o faz, ele demonstra com isso um espírito pecaminoso, independente e cismático, contrário à palavra de Deus: Ef 4.3; 1 Co 1.10-13; 11.18,19; Pv 18.1. Confira o livro: Die rechte Gestalt einer vom Staate unabhängigen evangelisch lutherischen Ortsgemeinde, St. Louis. Mo. 1863, p. 212-217; ou a tradução ao ingles: The Proper Form of an Evangelical Lutheran Local Congregation Independent of the State. St. Louis (Concordia Publishing House) 1863, p. 212-217.
Pior do que estar sozinho é quando um pregador, num espírito separatista, não quer se filiar a um sínodo por razões impuras. Ou, não sendo aceito em nenhum Sínodo por causa de sua indignidade, ou por causa de sua incapacidade, procura um Sínodo de caráter ambíguo, ou, então, se junta a pessoas incapazes como ele para formar um novo Sínodo, colocando-se como cabeça do mesmo, para escapar à acusação de separatista.